O poemário do cancioneiro português (incluindo fado, música tradicional e ligeira) pretende fomentar o gosto da poesia como parceira da música e a divulgação dos poetas cuja importância nem sempre é justamente reconhecida. Fontes: Blogue A Nossa Rádio, Álvaro José Ferreira.

Saudades

Canções de saudade

Letras

A saudade do teu cheiro

[ Ai o Meu Primeiro Amor ]

A saudade do teu cheiro
E o sorrir do teu olhar
Faz o meu corpo inteiro
Ganhar asas e voar

Num voo derradeiro
Sobrevoo o alto-mar
E nem o denso nevoeiro
Faz este fogo cessar

Ai o meu primeiro amor
Feito de um tímido beijo
É de todos o maior
É de todos o primeiro

Ai o meu primeiro Amor…

É um amor estrangeiro
Que vive em liberdade
Meu coração prisioneiro
Fica preso à saudade

Ai o meu primeiro amor
Feito de um tímido beijo
É de todos o maior
É de todos o primeiro

Ai o meu primeiro amor
Feito de um tímido beijo
É de todos o maior
É de todos o primeiro

Ai o meu primeiro Amor…
Ai o meu primeiro Amor…

Letra e música: Samuel Lopes
Intérprete: Citânia
Versão original: Citânia (in Livro/CD “Segredos do Mar”, Seven Muses, 2011)

Reciclanda

Reciclanda

O projeto Reciclanda promove a reutilização, reciclagem e sustentabilidade desde idade precoce.

Com música, instrumentos reutilizados, poesia e literaturas de tradição oral, contribui para o desenvolvimento global da criança e a qualidade de vida dos idosos. 

Contacte-nos:

António José Ferreira
962 942 759

A saudade enlouqueceu

[ A saudade Não existe ]

A saudade enlouqueceu
no dia em que tu partiste;
não sei o que é que me deu
se afirmei como um ateu
que a saudade não existe.

Então, o Fado fez pouco
da minha infelicidade
e nunca mais me deu troco.
Não sabe quem anda louco:
se sou eu ou a saudade

Coitado de quem a esquece,
nunca mais volta a ter paz.
Quando a saudade enlouquece,
a loucura é uma prece
com o Fado por detrás.
Coitado de quem a esquece,
nunca mais volta a ter paz.

A saudade ficou rouca
de tanto te ter chamado,
e anda de boca-em-boca;
comentam que ela está louca,
mas quem está louco é o Fado!

A Saudade Não Existe (A Saudade Enlouqueceu)
Letra: Tiago Torres da Silva
Música: Joaquim Campos (Fado Amora)
Intérprete: Cristina Nóbrega
Versão original: Cristina Nóbrega (in CD “Um Fado para Fred Astaire”, Watch & Listen, 2014)
Outra versão de Cristina Nóbrega (grav. no Largo do Teatro Nacional de São Carlos, Lisboa, 29 Ago. 2014, in CD “Ao vivo no Chiado”, Watch & Listen, 2015)

Cristina Nóbrega, Ao Vivo no Chiado
Cristina Nóbrega, Ao Vivo no Chiado

A saudade, meu amor

[ Saudade, Silêncio e Sombra ]

A saudade, meu amor,
É o martírio maior
Da minha vida em pedaços,
Desde a tarde desse dia
Em que ao longe se perdia
P’ra sempre o som dos teus passos.

Saudades fazem lembrar
Silêncios do teu olhar,
Segredos da tua voz
E essa antiga melodia
Que o vento na ramaria
Murmurava só p’ra nós.

Lembras-te daquela vez
Quando eu cantava a teus pés
Trovas que não tinham fim,
Quando o luar prateava
E quando a noite orvalhava
As rosas desse jardim?

Jardim distante e deserto,
Sinto tão longe e tão perto
O passado que te ensombra…
Devaneio e realidade,
Silêncio, sombras, saudade,
Saudades, silêncio e sombr

Letra: D. Nuno Lorena
Música: Pedro Rodrigues (Fado Primavera)
Intérprete: Tereza Tarouca (in EP “Saudade, Silêncio e Sombra”, RCA Victor, 1964; LP “Os Melhores Fados de Tereza Tarouca”, RCA Camden, 1978; 2LP “Álbum de Recordações”: LP 1, Polydor/PolyGram, 1985; CD “Temas de Ouro da Música Portuguesa”, Polydor/PolyGram, 1992; CD “Álbum de Recordações”, Alma do Fado/Home Company, 2006; CD “Tereza Tarouca”, col. Fado Alma Lusitana III, vol. 3, Levoir / Correio da Manhã, 2014)

Era uma vez um comboio

[ ‘Inda me Alembra a Azeitona ]

Era uma vez um comboio
Em que me fui a montar:
Abalei nele p’rá cidade,
Nunca mais quis eu voltar.

Nunca mais quis eu voltar,
Ilusão da vida minha;
‘Inda me alembra a azeitona
Quando o medo guarda a vinha.

‘Inda me alembra a azeitona,
‘Inda me alembra o lagar:
Vinha a seguir à castanha
E depois de vindimar.

Vinha a seguir à castanha,
À castanha redondinha;
‘Inda me alembra a azeitona
E de rabiscar a vinha.

Uma vez cá na cidade
Quis comer migas de pão;
Tinha tudo p’ra as fazer,
Faltava-me o coração.

Faltava-me o coração
Que eu deixei à tua beira;
‘Inda me alembra a azeitona,
Ai, queira eu ou não queira.

‘Inda me alembra a azeitona,
‘Inda me alembra o lagar:
Vinha a seguir à castanha
E depois de vindimar.

Vinha a seguir à castanha,
À castanha redondinha;
‘Inda me alembra a azeitona
E de rabiscar a vinha.

Agora quero eu voltar
E já não tenho ninguém;
O coração que eu deixei
Deixou-me a mim também.

Deixou-me a mim a cismar
De alecrim e manjerona;
Não sei qual deles cheirar
Se ‘inda me alembra a azeitona.

‘Inda me alembra a azeitona,
‘Inda me alembra o lagar:
Vinha a seguir à castanha
E depois de vindimar.

Vinha a seguir à castanha,
À castanha redondinha;
‘Inda me alembra a azeitona
E de rabiscar a vinha.

Letra: Vítor Reia
Música: Jorge Semião
Intérprete: Vá-de-Viró (in CD “Por Aí…”, Música XXI – Associação Cultural, 2013)

Se me Levam Águas

MOTE ALHEIO

Se me levam águas,
nos olhos as levo.

VOLTAS

Se de saudade
morrerei ou não,
meus olhos dirão
de mim a verdade.
Por eles me atrevo
a lançar as águas
que mostrem as mágoas
que nesta alma levo.

As águas que em vão
me fazem chorar,
se elas são do mar
estas de amor são.
Por elas relevo
todas minhas mágoas;
que, se força de águas
me leva, eu as levo.

Todas me entristecem,
todas são salgadas;
porém as choradas
doces me parecem.
Correi, doces águas,
que, se em vós me enlevo,
não doem as mágoas
que no peito levo.

Poema (vilancete em redondilha menor): Luís de Camões (in “Rimas”, org. Fernão Rodrigues Lobo Soropita, Lisboa, 1595; “Obras de Luís de Camões”, Porto: Lello & Irmão Editores, 1970 – p. 772-773)
Música: Luís Cília
Intérprete: Luís Cília (in LP “La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours – 1”, Moshé-Naïm, 1967; CD “La Poésie Portugaise de Nos Jours et de Toujours”, Moshé-Naïm/EMEN, 1996)

Em sonho lá vou

[ Longe Daqui ]

Em sonho lá vou de fugida,
Tão longe daqui, tão longe.
É triste viver tendo a vida
Tão longe daqui, tão longe.

Mais triste será quem não sofre
Do amor, a prisão sem grades.
No meu coração há um cofre
Com jóias que são saudades.

Tenho o meu amor para além do rio,
E eu cá deste lado cheiinha de frio.
Tenho o meu amor para além do mar,
E tantos abraços e beijos p’ra dar.

Oh bem que me dás mil cuidados,
Tão longe daqui, tão longe,
A Lua me leva recados,
Tão longe daqui, tão longe.

Quem me dera ir céu adiante,
Correndo veloz no vento:
Ter asas, chegar num instante
Onde está meu pensamento.

Tenho o meu amor para além do rio,
E eu cá deste lado cheiinha de frio.
Tenho o meu amor para além do mar,
E tantos abraços e beijos p’ra dar.

Tenho o meu amor para além do rio,
E eu cá deste lado cheiinha de frio.
Tenho o meu amor para além do mar,
E tantos abraços e beijos p’ra dar.

Nota: Na gravação original (amaliana), o primeiro verso da quarta estrofe tem a seguinte forma: “Ao bem que me dá mil cuidados”.

Letra: Hernâni Correia
Música: Arlindo de Carvalho
Intérprete: Cristina Nóbrega
Versão original: Amália Rodrigues (grav. 1970, in CD “Segredo”, EMI-VC, 1997; 3CD “É ou Não É?: os 45 rpm 1968-1975”: CD 1, Edições Valentim de Carvalho, 2018)

Amália Rodrigues em 1969
Amália Rodrigues em 1969

Eu tenho um xaile encarnado

[ Xaile Encarnado ]

Eu tenho um xaile encarnado
É uma lembrança tua
Tem um segredo bordado
Que às vezes eu trago à rua

Tem as marcas de uma vida
Que a vida marca no rosto
Mas ganha uma nova vida
Nas noites que o trago posto

Já foi lençol e bandeira
Vela de barco também
Tem marcas da vida inteira
Mas dizem que me cai bem

Se pensas que me perdi
Nalgum destino traçado
Para veres que não esqueci
Eu ponho o xaile encarnado

Letra: João Monge
Música: Armandinho (Fado da Adiça)
Intérprete: Aldina Duarte (in CD “Crua”, EMI, 2006)

Eu peguei em saudades tuas

[ Saudade solta ]

Eu peguei em saudades tuas
Fui plantá-las no meu jardim
Porque sei que assim continuas
Aqui bem juntinho a mim
E cantando a saudade eu sei
Algo aqui há-de nascer
Se tristeza eu semeei
Alegria hei-de colher
Alegria hei-de colher

Pedrinhas que houver eu hei-de tirar
E todas as ervas daninhas à volta
E o que vier virá lembrar
O que a vida prende a saudade solta
E sombras que houver eu hei-de afastar
E todas as ervas daninhas à volta
E o que vier virá lembrar
O que a vida prende a saudade solta

Novos dias vão chegar
Outras memórias felizes
E o vento que nos vergar
Não nos vai quebrar raízes
E cantando eu sei que fica
A saudade bem aqui
E a esperança que nos dá vida
Em mim não terá o fim
Sei que vais esperar por mim

Pedrinhas que houver eu hei-de tirar
E todas as ervas daninhas à volta
E o que vier virá lembrar
O que a vida prende a saudade solta
E sombras que houver eu hei-de afastar
E todas as ervas daninhas à volta
E o que vier virá lembrar
O que a vida prende a saudade solta

Pedrinhas que houver eu hei-de tirar
E todas as ervas daninhas à volta
E o que vier virá lembrar
O que a vida prende a saudade solta
E sombras que houver eu hei-de afastar
E todas as ervas daninhas à volta
E o que vier virá lembrar
O que a vida prende a saudade solta

Intérprete: Mariza

Eu preciso de te ver

Eu preciso de te ver,
Ausente d’amor sem razão,
Para te mostrar as sombras
Do quarto da solidão.
Eu preciso de te ver,
Ausente d’amor sem razão.

Eu preciso de te ver
Para matar este frio,
Que voa dentro de mim
Como as gaivotas no rio.
Eu preciso de te ver
Para matar este frio.

Eu preciso de te ver
Para matar esta saudade,
Que já começa a vestir
O tempo da minha idade.
Eu preciso de te ver
Para matar esta saudade.

Como ganhei a coragem
D’areia a beber a espuma,
Eu preciso de te ver
Mais uma vez, só mais uma.

Letra: Vasco de Lima Couto
Música: José Fontes Rocha (Fado Isabel)
Intérprete: Joana Amendoeira* (in CD “Amor Mais Perfeito: Tributo a José Fontes Rocha”, CNM, 2012)
Primeira versão (com a melodia do Fado Isabel): Beatriz da Conceição (in EP “Pomba Branca, Pomba Branca”, Banda/Movieplay, 1974; CD “Beatriz da Conceição”, col. O Melhor dos Melhores, vol. 75, Movieplay, 1997; CD “Beatriz da Conceição”, col. Clássicos da Renascença, vol. 21, Movieplay, 2000)
Outra versão de Beatriz da Conceição (in CD “Tears of Lisbon”, Sony Classical, 1996)
Versão original (com a melodia do Fado Menor do Porto): Lucília do Carmo (in LP “Recordações”, Decca/VC, 1971, reed. Edições Valentim de Carvalho/Som Livre, 2008; CD “Lucília do Carmo” (compilação), col. Caravela, EMI-VC, 1997)

Beatriz da Conceição

fadista Beatriz da Conceição

Fecho os olhos já cansados

[ Solidão e Xisto ]

Fecho os olhos já cansados.
Relembro os tempos passados,
as finas flores de cerejeira,
os cereais secos na eira.
No percurso da memória,
vem à luz a mesma história
da minha aldeia adormecida
Vem à luz a mesma história.
Minha terra, minha alma
que antes era canto e vida!

Fecho os olhos navegantes.
Relembro tempos distantes
das terras fecundadas,
dias de sol e sementes lançadas.
Eram campos de alegria.
Hoje são pó e nostalgia
nesta aldeia adormecida.
Hoje pó e nostalgia.
Minha terra, minha alma
que antes era canto e vida!

Fecho os olhos de mansinho,
sigo agora outro caminho.
Desta terra me despeço
no embalo das vozes antigas.
Num lamento adormeço
ao rumor de velhas cantigas.
Espalho-me em sementes de alma
na terra de todos os campos.
Dela brotarão flores em cantos:
Que ainda sou, ainda existo
nesta aldeia de solidão e xisto.

Letra: Joana Lopes
Música: António Pedro
Intérprete: Musicalbi
Versão original: Musicalbi (in CD “Solidão e Xisto”, Musicalbi, 2019)

Há uma saudade guardada

[ A nossa voz ]

Letra: Mariza
Música: Fred, Vicente Palma, André Dias
Intérprete: Mariza

Na noite

[ Mais do Que Saudade ]

Na noite, lá longe um cão a ladrar
E o som que, se solta, levita no ar
Como que uma dança, vai alguém a correr;
Há carros e motas abanando o escuro,
Lembro o teu sorriso tão lindo, inseguro…
Não te sei chamar, o que hei-de fazer?

Onde estás, meu amor? Onde pairas?
Será que pensas em mim?
Também, como eu, estás assim?
Na verdade, isto é mais do que saudade,
É mais do que saudade.

Porquê este aperto a lembrar, tal e qual,
Que o longe da vista é como um Carnaval:
Olhar e sorrir, não mostrar que estou triste?
Prefiro deixar o coração de lado,
Ir à beira-rio, andar um bocado…
Será que paraste? Será que me ouviste?

Onde estás, meu amor? Onde pairas?
Será que pensas em mim?
Também, como eu, estás assim?
Na verdade, isto é mais do que saudade,
É mais do que saudade.

A saudade tem destas coisas estranhas,
Tem trejeitos, amua, tem também suas manhas:
Não quer admitir, diz que não, bate o pé;
Na verdade, sem ela em qualquer circunstância
Sentiria por ti esta falta, esta ânsia…
Muito mais que saudade, nem eu sei o que é.

Onde estás, meu amor? Onde pairas?
Será que pensas em mim?
Também, como eu, estás assim?
Na verdade, isto é mais do que saudade,
É mais do que saudade.

Na verdade, isto é mais do que saudade,
É mais do que saudade.

Letra e música: Amélia Muge
Arranjo: Amélia Muge e Quiné Teles
Intérprete: Ela Vaz (in CD “Eu”, Micaela Vaz, 2017)

No alto daquela fraga

[ Aroma da Saudade ]

No alto daquela fraga,
Vi teus olhos cintilar.
A distância traz a mágoa
De não te poder beijar.

Que saudades do teu cheiro,
Dos teus lábios de romã,
Dos recatos do celeiro,
Faces rubor de maçã!

Trigueira do Alentejo
Tens o mel do meu desejo,
No teu beijo
Um aroma da saudade.

Teus cabelos cor de trigo,
Teu perfume de alecrim.
Ao ribeiro vou contigo;
Não te apartes mais de mim!

Na eira corre o suão
E um aroma de poejo.
Coentros, migas de pão
Alimentam o desejo.

Trigueira do Alentejo
Tens o mel do meu desejo,
No teu beijo
Um aroma da saudade.

Trigueira do Alentejo
Tens o mel do meu desejo,
No teu beijo
Um aroma da saudade.
Trigueira do Alentejo…

Letra e música: Álvaro M. B. Amaro
Intérprete: Dialecto*
Versão original: Dialecto (in CD “Aromas”, Dialecto/Cloudnoise, 2011)

O meu avô dançava

[ Baile em Segredo ]

O meu avô dançava
O que a avó trauteava
E, com movimento,
A valsa voava.

Foi no salão de dança,
Mesmo a meio do mar
Quando um navio avança,
Dança e balança o par;
Mesmo a meio do mundo,
Longe o pulsar do cais
Num silêncio profundo,
Toca uma nota mais.

Ai, guarda os teus sentidos
Ai, numa caixa aberta:
São os contos vividos
Que um quadro liberta!
Ai, guarda a tua vida
Ai, num frasco de sais:
No calor da avenida,
O sol de volta ao cais!

A dimensão que o mundo
Tem do silêncio ouvir
Vem dum saber profundo:
O saber de existir.

O meu avô dançava
O que a avó trauteava
E, com movimento,
A valsa voava.

Letra: João Afonso Lima
Música: João Afonso Lima e António Afonso
Arranjo: Quiné Teles
Intérprete: Ela Vaz, com Uxía (in CD “Eu”, Micaela Vaz, 2017)
Versão original: João Afonso com António Afonso (in CD “Outra Vida”, Vachier & Associados/Universal, 2006)

Olá! Como é que estás?

[ SMS ]

— Olá! Como é que estás? Como é que vais?
Os dias por aqui seguem iguais
E passam sem trazer mais novidades;
Há muito que não sei nada de ti,
Mas pelo coração já percebi
Que ainda guardo aqui muita saudade.

— Se tu quiseres podemos tomar
Um copo ou um café para falar,
Pôr a conversa em dia um destes dias:
Quero saber de ti e do que fazes,
Saber se por acaso ainda trazes
Contigo aquele brilho que trazias.

Podemos ver um filme no cinema.
— E dar os dois a mão naquela cena.
— Ficar assim até aos créditos finais.
— Podemos ir os dois beber um gin.
— Dizer que a vida vai assim-assim…
— Os dias por aqui seguem iguais.

— Podias pôr aquele teu vestido,
Aquele azul com o ombro descaído,
Estampado a padrões orientais;
Gostava de levar-te a jantar fora,
Por mim podemos ir a qualquer hora
Porque aqui os dias seguem sempre iguais.

— Desculpa se o telefone te acordou,
Escrevi-te porque o coração mandou,
Ele já não podia esperar mais;
Eu já ouvi dizer que o tempo cura
Mas sei que a tua falta ainda dura…
Os dias por aqui seguem iguais.

Não me leves a mal por te escrever
Nem sintas que é preciso responder,
É só uma mensagem, nada mais;
Só escrevo p’ra dizer que ainda te quero
E quando a lua vem ainda te espero…
As noites por aqui seguem iguais.

— As noites por aqui seguem iguais.
— As noites por aqui seguem iguais.
— Os dias por aqui seguem iguais.
— As noites por aqui seguem iguais.

Letra: José Fialho Gouveia
Música e arranjo: Rogério Charraz
Intérprete: Rogério Charraz com Katia Guerreiro (in CD “Não Tenhas Medo do Escuro”, Rogério Charraz/Compact Records, 2016)

Os olhos do meu amor

[ Dois Navios ]

Os olhos do meu amor são dois navios de guerra;
navegam pelo mar fundo, deitam faíscas à terra.
Ó pombinh’enrol’enrol’ai! ó meu pomb’enroladore;
já lá vem ‘àssobiare a caldeira do vapore.

A caldeira do vapor’ai! ó meu pomb’enrol’enrola.
Eu hei-d’ir par’à Espanha casar com ‘ma espanhola.
Casar com ‘ma espanhola, qu’elas são moças bonitas;
usam sai’à papo-seco, sapatos, meias e ligas.

Ó meu amor, eu fujo pelo mar’abaix’eu sou marujo.
Ó meu amor, eu fujo pelo mar’abaix’eu sou marujo.
Eu sou marujo mais ela.
Eu sou marujo mais ela.
Pelo mar’abaixo vai um barco à vela.
Pelo mar’abaixo vai um barco à vela.

Ó pescador da barquinha! Qu’ei lá! Volt’à trás que vais perdido!
Porquê? Essa mulher qu’aí levas!
Que tem? É casad’e tem marido!
Vá de banda, carabola, vá de banda, vá de banda, carol’olé!
Eu sei falar à ‘spanhola, cara linda, “mira usted”.
Vá de banda, carabola, vá de banda, vá de banda, carol’olé!
Eu sei falar à ‘spanhola, cara linda, “mira usted”.

Vá de banda, carabola, vá de banda, vá de banda, carol’olé!
Eu sei falar à ‘spanhola, cara linda, “mira usted”.
Vá de banda, carabola, vá de banda, vá de banda, carol’olé!
Eu sei falar à ‘spanhola, cara linda, “mira usted”.

Letra e música: Tradicional portuguesa
Arranjo: Paulo Cunha
Intérprete: Vá-de-Viró (in CD “Por Aí…”, Música XXI – Associação Cultural, 2013)

Quando o amor se cansar

[ O Que É Que Eu Digo à Saudade? ]

Quando o amor se cansar e tu partires,
Ficarmos no silêncio desta idade,
Sem um adeus sequer tu me dizeres,
Uma palavra, um gesto de amizade;
Sem um adeus sequer tu me dizeres,
Amor, que vou dizer nesta saudade?

O que é que eu digo à saudade
Sem teus olhos p’ra me olhar?
O que é que eu digo à saudade
Sem teus lábios p’ra beijar?
O que é que eu digo à saudade
Sem teu corpo para amar?
O que é que eu digo à saudade
Se não me vens abraçar?
O que é que eu digo à saudade
Sem teu cheiro respirar?
O que é que eu digo à saudade
Com tanto amor para dar?

E na cama sozinha em que te penso,
Em que me venço inteira, com verdade,
Sendo a ti, meu amor, a quem pertenço,
Porque não és de mim outra metade?
E se é pensando em ti que eu adormeço,
O que é que eu digo à noite e à saudade?

O que é que eu digo à saudade
Sem teus olhos p’ra me olhar?
O que é que eu digo à saudade
Sem teus lábios p’ra beijar?
O que é que eu digo à saudade
Sem teu corpo para amar?
O que é que eu digo à saudade
Se não me vens abraçar?
O que é que eu digo à saudade
Sem teu cheiro respirar?
O que é que eu digo à saudade
Com tanto amor para dar?

O que é que eu digo à saudade
Sem teu cheiro respirar?
O que é que eu digo à saudade
Com tanto amor para dar?

O que é que eu digo à saudade
Sem teu cheiro respirar?
O que é que eu digo à saudade
Com tanto amor para dar?
O que é que eu digo à saudade
Sem teu cheiro respirar?
O que é que eu digo à saudade
Com tanto amor para dar?

Letra: José Luís Gordo e Mário Rainho
Música: José Fontes Rocha
Intérprete: Joana Amendoeira (in CD “Amor Mais Perfeito: Tributo a José Fontes Rocha”, CNM, 2012)
Versão original: Maria da Fé (in LP “Amor na Minha Voz”, MBP, 1989, reed. CD “Estar Contigo”, Ovação, ?)
Outra versão de Maria da Fé (in CD “Canto Lusitano”, Ovação, 1993; CD “Maria da Fé”, col. Estrelas da Música Portuguesa, Ovação, 2015)

A Vida Que Há na Saudade

Quando o silêncio me diz
que a vida está por um triz,
e eu sei que fala verdade,
vou p’ra trás de uma guitarra
e a minha voz agarra
a vida que há na saudade.

Vem um fado e outro fado
e o coração, cansado,
diz que não quer sofrer tanto,
porque já sabe de cor
o que lhe faz o Menor
de cada vez que eu o canto.

Mas o guitarrista toca
uma guitarra que evoca
outra guitarra mais triste:
está guardada no meu peito
e toca um fado que é feito
da dor mais forte que existe.

Ao escutá-la no meu sangue,
o meu coração exangue
volta a bater com vontade:
e é nas cordas da viola
que a minha vida se enrola
na vida que há na saudade!

Letra: Tiago Torres da Silva
Música: Alfredo Duarte “Marceneiro” (Fado Cravo)
Intérprete: Cristina Nóbrega (ao vivo no Teatro da Luz, Lisboa)
Versão original: Cristina Nóbrega (in CD “Um Fado para Fred Astaire”, Watch & Listen, 2014)

Alfredo Marceneiro
Alfredo Marceneiro

Quando se tem pouca idade

[ A Vida Como Ela É ]

Quando se tem pouca idade
Só se percebe a saudade
Se espreitamos à janela;
E ao vermos a mãe partir
Só pensamos em fugir
P’ra baixo das saias dela.

Saudade é ter que ir p’rá cama
Após vestir o pijama
E sonhar com temporais;
Mas por ter medo do escuro
Ir num passinho inseguro
Dormir p’rá cama dos pais.

É estar com gripe ou anginas,
Encharcado em aspirinas
E saber que os companheiros
Lá foram jogar à bola
No campeonato da escola,
Mas não foram os primeiros.

É o brinquedo estragado,
É o sapato apertado
Que já não cabe no pé;
É tudo o que ao ir embora
Nos obriga a ver agora
A vida como ela é.

Letra: Tiago Torres da Silva
Música: Casimiro Ramos (Fado Três Bairros)
Intérprete: Joana Amendoeira* (in CD “Brincar aos Fados”, Farol Música, 2014)

Saudosos estão os meus olhos

[ Saudade Atrás de Saudade ]

Saudosos estão os meus olhos
do fitar do teu olhar;
Saudosas estão minhas mãos
das tuas mãos afagar.

Saudoso está o meu corpo
do teu corpo me abraçar;
Saudosa está minha voz
de ouvir a tua falar.

Saudade atrás de saudade,
saudade só me ficou
do tempo em que a tua vida
p’la minha vida passou.

Saudade atrás de saudade,
saudade só me ficou
do tempo em que a tua vida
p’la minha vida passou.

Saudoso está meu penar
do tempo em que não penava;
Saudosa está minha boca
da tua quando a beijava.

Saudosa está minha alma
por tua alma não ter;
Saudoso está o meu riso
podia já não saber.

Saudade atrás de saudade,
saudade só me ficou
do tempo em que a tua vida
p’la minha vida passou.

Saudade atrás de saudade,
saudade só me ficou
do tempo em que a tua vida
p’la minha vida passou.

Saudade atrás de saudade,
saudade só me ficou
do tempo em que a tua vida
p’la minha vida passou.

Saudade atrás de saudade,
saudade só me ficou
do tempo em que a tua vida
p’la minha vida passou.

Letra: Dina Carapeto
Música: Jorge Semião
Intérprete: Vá-de-Viró (in CD “Por Aí…”, Música XXI – Associação Cultural, 2013)

Três Paus

Três paus
é só quanto custa um bilhete
para percorrer o velho tapete
daquele cinema
onde passa aquele filme que vimos mil vezes

Três paus
não pagaram o que fizeste
o beijo e a mão que então tu me deste
Foi na sala escura
que acendeste a luz da minha velha prece

Venham, venham ver o maior filme de sempre!
Hoje no Cinema Central
uma história de amor como não há igual.
Ela foge p’ra casar… Ele morre atropelado
O pai desembestado
rouba o neto à sua mãe… e mais não conto!
Só custa três paus!

Três paus
é já quanto custa um sorvete
mais caro que um copo de clarete
servido bem frio
numa tarde longa de um Verão quente

Três paus
eram de morango e folia
gargalhadas do mais doce que havia
soltavam no ar
coisas muito tolas que enchiam os dias

É frut’ó chocolate!
P’ró menino e p’rá menina!
Ó minha senhora, não vai um geladinho?
Refresca até o cabelo, o meu sorvete fresquinho.
Prove lá, avozinha!
Não me diga que não gosta desta categoria?!
Só custa três paus!

Três paus
marcam o sabor de uma vida
que nunca se acaba na despedida
nos anos felizes
da idade nova breve e distraída

Letra: Eugénia Ávila Ramos
Música: Carlos Lopes
Intérprete: Rua da Lua* (in CD “Rua da Lua”, Rua da Lua, 2016)

António Variações

Canções sobre a vida

Letras

A contas com o bem

[ Inquietação ]

A contas com o bem que tu me fazes
A contas com o mal por que passei
Com tantas guerras que travei
Já não sei fazer as pazes

São flores aos milhões entre ruínas
Meu peito feito campo de batalha
Cada alvorada que me ensinas
Oiro em pó que o vento espalha

Cá dentro inquietação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei – ainda

Há sempre qualquer coisa que está p’ra acontecer
Qualquer coisa que eu devia perceber
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei – ainda

Ensinas-me fazer tantas perguntas
Na volta das respostas que eu trazia
Quantas promessas eu faria
Se as cumprisse todas juntas

Não me largues esta mão no torvelinho
Pois falta sempre pouco p’ra chegar
Eu não meti o barco ao mar
P’ra ficar pelo caminho

Cá dentro inquietação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei – ainda

Há sempre qualquer coisa que está p’ra acontecer
Qualquer coisa que eu devia perceber
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei – ainda

Cá dentro inquietação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Mas sei
É que não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que está p’ra acontecer
Qualquer coisa que eu devia perceber
Porquê, não sei
Mas sei
É que não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que eu tenho que fazer
Qualquer coisa que eu devia resolver
Porquê, não sei
Mas sei
Que essa coisa é que é linda!

Letra e música: José Mário Branco
Intérprete: José Mário Branco (in 2LP “Ser Solidário”: LP 2, Edisom, 1982, reed. EMI-VC, 1996, Parlophone/Warner Music Portugal, 2017, 2018)

Amigos cento e dez

[ Os Amigos ]

Amigos cento e dez, ou talvez mais,
Eu já contei. Vaidades que sentia!
Supus que sobre a Terra não havia
Mais ditoso mortal entre os mortais.

Amigos cento e dez, tão serviçais,
Tão zelosos das leis da cortesia,
Que, já farto de os ver, me escapulia
Às suas curvaturas vertebrais.

Um dia adoeci profundamente.
Ceguei. Dos cento e dez houve um somente
Que não desfez os laços quase rotos.

— Que vamos nós (diziam) lá fazer?
Se ele está cego, não nos pode ver…
Que cento e nove impávidos marotos!

Um dia adoeci profundamente.
Ceguei. Dos cento e dez houve um somente
Que não desfez os laços quase rotos.

— Que vamos nós (diziam) lá fazer?
Se ele está cego, não nos pode ver…
Que cento e nove impávidos marotos!

Poema: Camilo Castelo Branco (ligeiramente adaptado)
Intérprete: Afonso Dias (in CD “Geometria do Sul”, Edere, 2002)

De tanta vida que prendo

[ Fado do Cansaço ]

Do Que um Homem É Capaz

Do que um homem é capaz,
As coisas que ele faz
P’ra chegar aonde quer:
É capaz de dar a vida
P’ra levar de vencida
Uma razão de viver.

A vida é como uma estrada
Que vai sendo traçada
Sem nunca arrepiar caminho;
E quem pensa estar parado
Vai no sentido errado
A caminhar sozinho.

Vejo gente cuja vida
Vai sendo consumida
Por miragens de poder.
Agarrados a alguns ossos
No meio dos destroços
Do que nunca vão fazer,

Vão poluindo o percurso
Co’ as sobras do discurso
Que lhes serviu pr’ abrir caminho;
À custa das nossas utopias
Usurpam regalias
P’ra consumir sozinhos.

Com políticas concretas
Impõem essas metas
Que nos entram casa dentro,
Como a Trilateral
Co’ a treta liberal
E as virtudes do centro.

No lugar da consciência
A lei da concorrência
Pisando tudo p’lo caminho;
P’ra castrar a juventude
Mascaram de virtude
O querer vencer sozinho.

Ficam cínicos, brutais
Descendo cada vez mais
P’ra subir cada vez menos:
Quanto mais o mal se expande
Mais acham que ser grande
É lixar os mais pequenos.

Quem escolhe ser assim,
Quando chegar ao fim,
Vai ver que errou o seu caminho:
Quando a vida é hipotecada
No fim não sobra nada
E acaba-se sozinho.

Mesmo sendo os poderosos
Tão fracos e gulosos
Que precisam do poder,
Mesmo havendo tanta gente
P’ra quem é indif’rente
Passar a vida a morrer,

Há princípios e valores,
Há sonhos e há amores
Que sempre irão abrir caminho;
E quem viver abraçado
À vida que há ao lado
Não vai morrer sozinho;
E quem morrer abraçado
À vida que há ao lado
Não vai viver sozinho.

Letra e música: José Mário Branco (para a peça “Gulliver”, adaptada por Hélder Costa do romance “As Viagens de Gulliver”, de Jonathan Swft, levada à cena pelo grupo de teatro “A Barraca” em 1997)
Intérprete: José Mário Branco (in CD “Resistir É Vencer”, José Mário Branco/EMI-VC, 2004, reed. Parlophone/Warner Music Portugal, 2017)

É ou não é

É ou não é
Que o trabalho dignifica
É assim que nos explica
O rifão que nunca falha?
É ou não é
Que disto, toda a verdade,
Que só por dignidade
No mundo, ninguém trabalha!

É ou não é
Que o povo nos diz que não,
Que o nariz não é feição
Seja grande ou delicado?
No meio da cara
Tem por força que se ver,
Mesmo a quem o não meter
Aonde não é chamado!

Digam lá se é assim ou não é?
Ai, não, não é!
Digam lá se é assim ou não é?
Ai, não, não é! Pois é!

É ou não é
Que um velho que à rua saia
Pensa, ao ver a minissaia:
Este mundo está perdido?!
Mas se voltasse
Agora a ser rapazote
Acharia que saiote
É muitíssimo comprido?

É ou não é
Bondosa a humanidade
Todos sabem que a bondade
É que faz ganhar o céu?
Mas a verdade,
Nua sem salamaleque,
Que tive de aprender
É que ai de mim se não for eu!

Digam lá se é assim ou não é?
Ai, não, não é!
Digam lá se é assim ou não é?
Ai, não, não é! Pois é!

Digam lá se é assim ou não é?
Ai, não, não é!
Digam lá se é assim ou não é?
Ai, não, não é! Pois é!

Digam lá se é assim ou não é?
Ai, não, não é!
Digam lá se é assim ou não é?
Ai, não, não é! Pois é!

Letra: Alberto Janes
Intérprete: Mariza

Estrada da vida

Estrada da vida,
Oh estrada do meu destino,
Onde, feito peregrino,
Meu coração se perdeu!
Estrada da vida,
Feita de dor e de esperança,
Quem a subiu não se cansa,
Que o diga quem a desceu.

Estrada da vida,
Longa estrada onde eu sigo,
Sem ter mesmo um braço amigo
Onde me possa apoiar;
Estrada da vida,
Onde os passos mal dados
Ficam p’ra sempre marcados
Como na pele a sangrar.

Volta depressa,
Ó minha esperança perdida!
Um rumo certo na vida
Quero por fim encontrar.

Volta depressa,
Ó minha esperança perdida!
Um rumo certo na vida
Quero por fim encontrar.

Volta depressa,
Ó minha esperança perdida!
Um rumo certo na vida
Quero por fim encontrar.

Letra e música: João Dias Nobre
Intérprete: Ricardo Ribeiro (in CD “Hoje É Assim, Amanhã Não Sei”, Ricardo Ribeiro/Parlophone/Warner Music, 2016)
Versão original: Maria José da Guia (in EP “Barro Divino”, Estúdio/Mundusom, 1969?)

Reciclanda

Reciclanda

O projeto Reciclanda promove a reutilização, reciclagem e sustentabilidade desde idade precoce.

Com música, instrumentos reutilizados, poesia e literaturas de tradição oral, contribui para o desenvolvimento global da criança e o bem estar dos idosos. Faz ACD e ALD (formações de curta e longa duração), realiza oficinas de música durante o ano letivo e dinamiza atividades em colónias de férias. Municípios, Escolas, Agrupamentos, Colégios, Festivais, Bibliotecas, CERCI, Centros de Formação, Misericórdias, Centros de Relação Comunitária, podem contratar serviços Reciclanda.

Contacte-nos:

António José Ferreira
962 942 759

Eu nasci lá para os lados do rio

[ A Escola ]

Eu nasci lá para os lados do rio
passava os dias a jogar à bola
mas eu não era excepção
e antes que desse por isso
já estava na escola

O programa elementar
entre o Euclides e o Arquimedes
mas sempre que a informação
dá uma volta no espaço
eu quero sintonizar

A escola ainda não acabou
há sempre tanta matéria a estudar
que eu chego mesmo a ter medo
de em qualquer momento
já não ter lugar
já não ter lugar
para mais conhecimento

Já consigo filosofar
sei uma ou duas palavras em grego
enquanto o tempo deixar
e a escola não se afundar
vou alterando o meu ego

Vou deixando as moscas pairar
vou vendo se o Godot já chegou
e quando me dá na tola
dou um chuto na bola
só p’ra me aliviar

A escola ainda não acabou
há sempre tanta matéria a estudar
que eu chego mesmo a ter medo
de em qualquer momento
já não ter lugar
já não ter lugar
para mais conhecimento

A escola ainda não acabou
há sempre tanta matéria a estudar
que eu chego mesmo a ter medo
de em qualquer momento
já não ter lugar
já não ter lugar
para mais conhecimento
mais conhecimento

Letra e música: Jorge Palma
Intérprete: Jorge Palma (in LP “Bairro do Amor”, Philips/Polygram, 1989, reed. Philips/Polygram, 1998, Universal Music Portugal, 2014, 2015; CD “Dá-me Lume: O Melhor de Jorge Palma”, Mercury/Universal Music Portugal, 2000)

Eu sei

[ O tempo não para ]

Eu sei, que a vida tem pressa
que tudo aconteça,
sem que a gente peça,
Eu sei,
Eu sei, que o tempo não pára,
tempo é coisa rara
e a gente só repara,
quando ele já passou

Não sei, se andei depressa demais
Mas sei que algum sorriso eu perdi
Vou pedir ao tempo,
que me dê mais tempo
para olhar para ti
De agora em diante,
não serei distante
Eu vou estar aqui

Cantei,
cantei a Saudade da minha cidade
e até com vaidade, cantei
Andei, pelo Mundo fora
e não via a hora
de voltar para ti

Não sei, se andei depressa demais
Mas sei que algum sorriso eu perdi
Vou pedir ao tempo,
que me dê mais tempo
para olhar para ti
De agora em diante,
não serei distante
Eu vou estar aqui

Música: Miguel Gameiro
Intérprete: Mariza

Eu tenho o domingo

[ Dia em Dia ]

Eu tenho o domingo
p’ra fechar os olhos
crer na felicidade
crer na felicidade
por dentro de um sonho

Eu tenho a segunda
p’ra saber chegar
sem surpresa aos dias
sem surpresa aos dias
que me hão-de matar

Tenho a terça-feira
p’ra comer as horas
umas depois doutras
umas depois doutras
entre um sim e um não

E na quarta-feira
eu já estou além
olho para trás
olho para trás
entre hoje e ontem

E na quinta-feira
não há mais questões
há só que encontrar
há só que encontrar
boas conclusões

Sexta faço, invento
o fim de uma frase
que de toda a semana
que de toda a semana
justifica o meu tempo

Sábado já sei
não estou só com
meus vagares
pois há sempre dois
nas histórias lunares

Sábado já sei
não estou só com
meus vagares
pois há sempre dois
nas histórias lunares

Poema e música: Amélia Muge (ao Zeca Afonso)
Intérprete: Amélia Muge (in CD “Múgica”, UPAV, 1992)

Hoje, a semente

[ O Melhor de Mim ]

Letra: AC Firmino
Música: Tiago Machado
Intérprete: Mariza

Largar, partir

Largar, partir
Desta terra pardacenta
Desta gente sempre igual
Macambúzia, pachorrenta
Indiferente e desatenta
Deste imenso lamaçal
De chorincas
Eternos sorumbáticos
De sopinhas sem sal
Dengosos e apáticos
Seus choros melismáticos
Lamúrias em caudal
A verter, a verter
Pois chorar é beber!

Largar, partir
Rumo a terras misteriosas
Com segredos sem ter fim
Criaturas majestosas
Outras tantas tenebrosas
Como nunca vi assim
E tesouros
Druidas, feiticeiros
E pós de perlimpimpim
Princesas e arqueiros
Sereias, viageiros
Tudo novo para mim
A encher, a encher
Pois partir é crescer!

Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
A não ser p’ra voltar a partir

Largar, partir
Rumo a terras misteriosas
Com segredos sem ter fim
Criaturas majestosas
Outras tantas tenebrosas
Como nunca vi assim
E tesouros
Druidas, feiticeiros
E pós de perlimpimpim
Princesas e arqueiros
Sereias, viageiros
Tudo novo para mim
A encher, a encher
Pois partir é crescer!

Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
A não ser p’ra voltar a partir

Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
A não ser p’ra voltar a partir

Letra e música: Manuel Maio
Intérprete: A Presença das Formigas (in CD “Pé de Vento”, A Presença das Formigas/Careto/XMusic, 2014)

Gaivotas

Muda de vida

Muda de vida se tu não vives satisfeito
Muda de vida, estás sempre a tempo de mudar
Muda de vida, não deves viver contrafeito
Muda de vida, se a vida em ti a latejar

Ver-te sorrir eu nunca te vi
E a cantar, eu nunca te ouvi
Será te ti, ou pensas que tens… que ser assim?

Muda de vida se tu não vives satisfeito
Muda de vida, estás sempre a tempo de mudar
Muda de vida, não deves viver contrafeito
Muda de vida, se a vida em ti a latejar

Ver-te sorrir eu nunca te vi
E a cantar, eu nunca te ouvi
Será te ti, ou pensas que tens… que ser assim?

Olha que a vida não, não é nem deve ser
Como um castigo que tu terás que viver

Muda de vida se tu não vives satisfeito
Muda de vida, estás sempre a tempo de mudar
Muda de vida, não deves viver contrafeito
Muda de vida, se a vida em ti a latejar

Letra e música: António Variações
Intérprete: Manuela Azevedo / Humanos (in CD “Humanos”, EMI-VC, 2004)

Não consigo dominar

[ Estou Além ]

Não consigo dominar
Este estado de ansiedade
A pressa de chegar
P’ra não chegar tarde
Não sei de que é que eu fujo
Será desta solidão
Mas porque é que eu recuso
Quem quer dar-me a mão

Vou continuar a procurar
A quem eu me quero dar
Porque até aqui eu só

Quero quem
Quem eu nunca vi
Porque eu só quero quem
Quem não conheci
Porque eu só quero quem
Quem eu nunca vi
Porque eu só quero quem
Quem não conheci
Porque eu só quero quem
Quem eu nunca vi

Esta insatisfação
Não consigo compreender
Sempre esta sensação
Que estou a perder
Tenho pressa de sair
Quero sentir ao chegar
Vontade de partir
P’ra outro lugar

Vou continuar a procurar
O meu mundo, o meu lugar
Porque até aqui eu só

Estou bem
Aonde eu não estou
Porque eu só quero ir
Aonde eu não vou
Porque eu só estou bem
Aonde eu não estou
Porque eu só quero ir
Aonde eu não vou
Porque eu só estou bem
Aonde não estou

Esta insatisfação
Não consigo compreender
Sempre esta sensação
Que estou a perder
Tenho pressa de sair
Quero sentir ao chegar
Vontade de partir
P’ra outro lugar

Vou continuar a procurar
A minha forma, o meu lugar
Porque até aqui eu só

Estou bem
Aonde eu não estou
Porque eu só quero ir
Aonde eu não vou
Porque eu só estou bem
Aonde eu não estou
Porque eu só quero ir
Aonde eu não vou
Porque eu só estou bem
Aonde não estou

Letra e música: António Variações (António Joaquim Rodrigues Ribeiro)
Intérprete: António Variações (in single “Povo Que Lavas no Rio / Estou Além”, EMI-VC, 1982; “Anjo da Guarda”, EMI-VC, 1983, reed. 1998; CD “O Melhor de António Variações”, EMI-VC, 1997)

Rapaz do Bairro da Lata

Nasci no Vale Escuro
Brinquei entre latas
Pulei o alão
Andei à pedrada
Escorreguei do muro
Caí no jará
Ganhei ao pião.
A jogar à bola
Perdi a sacola
Mais o que trazia
A fugir ao guarda
Que nos perseguia.
Mas que bem sabia
Faltarmos à escola!

Já rapaz crescido
Sequer fui ouvido
Só meu pai o quis:
Entrei de aprendiz
Para uma oficina
Minha negra sina
Ofício gritado
Estalo safanão
Era um pau-mandado
Nas mãos do patrão.

Lembrança dos jogos
Que tanto gostava
Deu-me pra pensar
Que jogo era aquele
Que só um jogava?
E no outro dia
Logo que o patrão
Levantou da mão
Para a bofetada
Peguei num martelo
Entrei na jogada.

Mudei de oficina
Subi de aprendiz
Dobrei uma esquina
Minha vida fiz.
Na escola nocturna
Meti-me a estudar
Tenho namorada
Vamos namorar
Tenho amigos certos
Vamos trabalhar
Todos a lutar
Pelas coisas da vida
Que queremos viver!

Poema: Manuel da Fonseca (De “Poemas Inéditos”, in “Poemas Completos”, pref. Mário Dionísio, 5.ª edição, Lisboa: Forja, 1975 – p. 171-172)
Música: Paulo Ribeiro
Intérprete: Paulo Ribeiro com Tim (in CD “O Céu Como Tecto e o Vento Como Lençóis”, Açor/Emiliano Toste, 2017)

Manuel da Fonseca

Manuel da Fonseca

Não tenhas medo do escuro

Não tenhas medo do escuro
Mesmo que seja tão duro
Ter à frente a noite inteira;
Vou cantar para tu dormires
E até tu conseguires
Fico à tua cabeceira.

Para que fiques descansada
E não durmas assustada
Vou deixar a luz acesa;
Assim podes ter certeza
Que não há sombra malvada
Que te apanhe de surpresa.

Não fiques assim de cara triste!
O que dói nunca resiste até mais não
E nada cai mais fundo do que o chão.

Tristeza não é feitio
E o calor depois do frio
É tão certo como o Verão;
Por maior que seja a ferida
Tu vais ver que tem saída
Essa dor no coração.

Mesmo que tudo pareça
Não ter pés nem ter cabeça,
Mete fé no que eu te juro;
Eu vou estar aqui por perto
E não há nada mais certo
Que a manhã depois do escuro.

Não fiques assim de cara triste!
O que dói nunca resiste até mais não
E nada cai mais fundo do que o chão.

Não fiques assim de cara triste!
O que dói nunca resiste até mais não
E nada cai mais fundo do que o chão.

E nada cai mais fundo do que o chão.

Letra: José Fialho Gouveia
Música: Rogério Charraz
Arranjo: Rogério Charraz, Paulo Loureiro e Jaume Pradas
Intérprete: Rogério Charraz (in CD “Não Tenhas Medo do Escuro”, Rogério Charraz/Compact Records, 2016)

Largar, partir

Largar, partir
Desta terra pardacenta
Desta gente sempre igual
Macambúzia, pachorrenta
Indiferente e desatenta
Deste imenso lamaçal
De chorincas
Eternos sorumbáticos
De sopinhas sem sal
Dengosos e apáticos
Seus choros melismáticos
Lamúrias em caudal
A verter, a verter
Pois chorar é beber!

Largar, partir
Rumo a terras misteriosas
Com segredos sem ter fim
Criaturas majestosas
Outras tantas tenebrosas
Como nunca vi assim
E tesouros
Druidas, feiticeiros
E pós de perlimpimpim
Princesas e arqueiros
Sereias, viageiros
Tudo novo para mim
A encher, a encher
Pois partir é crescer!

Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
A não ser p’ra voltar a partir

Largar, partir
Rumo a terras misteriosas
Com segredos sem ter fim
Criaturas majestosas
Outras tantas tenebrosas
Como nunca vi assim
E tesouros
Druidas, feiticeiros
E pós de perlimpimpim
Princesas e arqueiros
Sereias, viageiros
Tudo novo para mim
A encher, a encher
Pois partir é crescer!

Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
A não ser p’ra voltar a partir

Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
Largar, partir, voar
Sem ter certo onde ir
Sem ter por que voltar
A não ser p’ra voltar a partir

Letra e música: Manuel Maio
Intérprete: A Presença das Formigas (in CD “Pé de Vento”, A Presença das Formigas/Careto/XMusic, 2014)

O dia não te correu bem

[ A Mesma Camisola ]

O dia não te correu bem e não gostas do que fazes
E agora só pedes um pouco de atenção
Diz tudo para fora, estou pronto para ouvir
Diz-me algo que não saiba e que te dê a razão
Vais ter de mim um ar de sério compreensivo
Num abraço convincente, como se fosse um irmão
Diz agora o que te vai na mente e no que puder ajudar
Tens aqui um amigo com quem… com quem podes contar
No fundo, na frente, na mesma camisola,
A frio, a quente com a cara para dar
No bom, no mau, no que importa realmente
Levo a tua bandeira, onde consiga chegar

O dia não te correu bem e não gostas do que fazes
Não é culpa de ninguém e podes sempre mudar
Procura no que sabes um caminho para andar
Trata a vida sempre bem, que ela bem te vai tratar
Põe amor no teu caminho e a verdade ao de cima
Nunca ficarás sozinho e podes ajudar também
Se alguém no teu presente possa a vir necessitar
Faz de ti um amigo com quem… com quem se possa contar
No fundo, na frente, na mesma camisola,
A frio, a quente com a cara para dar
No bom, no mau, no que importa realmente
Levo a tua bandeira, onde consiga chegar

No fundo, na frente, na mesma camisola,
A frio, a quente e com a cara para dar
No bom, no mau, no que importa realmente
Levo a tua bandeira, onde consiga chegar

No fundo, na frente, na mesma camisola,
A frio, a quente e com a cara para dar
No bom, no mau, no que importa realmente
Levo a tua bandeira…

Letra e música: Luís Pucarinho
Intérprete: Luís Pucarinho com Jorge Benvinda (in CD “Orgânica Mente Humana”, Caracol Secreto Associação/Alain Vachier Music Editions, 2015)

O que é a vida?

[ Fala do Índio ]

O que é a vida? É o brilho.
O que é a vida? É a noite.
É o sopro do bisonte
no inverno, no inverno.

É sombra que corre na erva
e se perde ao fim do dia.
As cinzas dos antepassados
são p’ra nós sagradas
e quando os bosques sussurram
não sentimos medo,
e quando os bosques sussurram
não sentimos medo.

O que é a vida? É o brilho.
O que é a vida? É a noite.
É o sopro do bisonte
no inverno, no inverno.

É sombra que corre na erva
e se perde ao fim do dia.
As cinzas dos antepassados
são p’ra nós sagradas
e quando os bosques sussurram
não sentimos medo,
e quando os bosques sussurram
não sentimos medo.

O que é a vida?

O que é a vida? É o brilho.
O que é a vida? É a noite.
É o sopro do bisonte
no inverno, no inverno.

O que é a vida?
O que é a vida?

O que é a vida?

Letra e música: João Afonso Lima
Intérprete: João Afonso (in CD “Missangas”, Mercury/Polygram, 1997, reed. Universal Music, 2017)

João Afonso, Missangas

João Afonso, Missanga

Que do céu tombassem violinos

[ Epitáfio ]

Que do céu tombassem violinos
Decidindo por nós, gente maior,
Na forma, no projecto e na ideia,
No fazer sempre mais, sempre melhor!

Que o povo alcançasse em sentimento
Sempre a classe mais alta do poema
E a vida fosse mais que este momento
Entre farrapos de nada e alfazema!

Que a vida fosse alma e fosse vinho,
Fosse vento nas searas ondulantes
E orgasmos de prazer e rosmaninho
E luxo e sonho e fúria a cada instante!

E oceanos de espuma nos levassem
Cavalgando o desespero de partir!
E tudo fosse simples e elevado
Como um prado orvalhado no sentir!

De tudo, tanto que eu acreditei
Tantos anos de espera convertida,
Sobra um sabor de que nada aconteceu
Pelas regras que devia haver na vida.

Por isso, um dia, parto, assim, sem despedida
Entre memórias e cantos partilhados.
E este excesso fabuloso sem ter fim
Vai comigo, fiquem, disso, descansados.

Sobrará de mim, talvez, fraca memória,
Esta luxúria da vida, alguns recados,
Este modo amordaçado de sorrir
E uma montanha de amores nunca alcançados.

Espantosamente, como é qu’inda deixo sonhos?
Mais que o dobro dos feitos consumados!
Só não deixo meias-tintas nem favores,
Nem regras, nem peias, nem pudores.

Deixo excessos, truculências e humores.
Mas virtudes?! Nem pensar! Tudo pecados!

Espantosamente, como é qu’inda deixo sonhos?
Mais que o dobro dos feitos consumados!
Só não deixo meias-tintas nem favores,
Nem regras, nem peias, nem pudores.

Deixo excessos, truculências e humores.
Mas virtudes?! Nem pensar! Tudo pecados!

Poema e música: Pedro Barroso
Intérprete: Pedro Barroso* (in CD “Palavras ao Vento”, Ovação, 2014)

Pedro Barroso
Pedro Barroso
Beethoven

Canções aos clássicos

Letras

Quando me lembro

[ A Minha Quinta Sinfonia ]

Quando me lembro quem eras
Desse corpo que foi nosso
Desse amor que não deu certo
Era o tempo das quimeras
Das palavras em silêncio
Quando o mais longe era perto

Tinhas nos olhos a esperança
Os desejos de aventura
As ilusões que eram minhas
Nos momentos de ternura
Tinhas nos seios a graça
Das Primaveras que tinhas

E foste a música que em mim ficou
Quando a distância nos fez separar
Ando louco para te encontrar

Foste a Quinta Sinfonia
Fuga da nossa verdade
Sonata tocada em mim
Foste o meu sol afinado
Neste samba de saudade
Vinicius, Nara e Jobim

Foste verso de balada
Foste pintura abstracta
Meu Bolero de Ravel
Foste música sonhada
Numa canção de Sinatra
Com um poema de Brel

E foste a música que em mim ficou
Quando a distância nos fez separar
Ando louco para te encontrar

Foste estrela de cinema
Minha Dama de Xangai
Hiroxima, Meu Amor
A minha Grande Ilusão
Eras Fúria de Viver
Quanto Mais Quente Melhor

Grande Amor da Minha Vida
Senso, Silêncio e Paixão
Buñuel, Fellini e Truffaut
Foste Luzes da Ribalta
Música no Coração
E Tudo o Vento Levou

E és ainda o que me faz sentir
Dentro da vida para te cantar
Ando louco para te encontrar
Para te encontrar

Letra: Pedro Bandeira Freire
Música: Paco Bandeira (Francisco Veredas Bandeira)
Intérprete: Paco Bandeira (in “Com Sequências”, Discossete, 1987; CD “Paco Bandeira: O Melhor dos Melhores”, vol. 50, Movieplay, 1994; CD “Uma Vida de Canções”, Farol, 2006)

Reciclanda

Reciclanda

O projeto Reciclanda promove a reutilização, reciclagem e sustentabilidade desde idade precoce.

Com música, instrumentos reutilizados, poesia e literaturas de tradição oral, contribui para o desenvolvimento global da criança e o bem estar dos idosos. Faz ACD e ALD (formações de curta e longa duração), realiza oficinas de música durante o ano letivo e dinamiza atividades em colónias de férias. Municípios, Escolas, Agrupamentos, Colégios, Festivais, Bibliotecas, CERCI, Centros de Formação, Misericórdias, Centros de Relação Comunitária, podem contratar serviços Reciclanda.

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António José Ferreira
962 942 759

Quanto caminho andado

[ Adágio ]

Quanto caminho andado
desde o primeiro poema
ai quanto amor amassado
com mãos de alegria e pena
ai quanto caminho andado
serena.

Quanto verso ensanguentado
quanta distância de mim
quanto amor desesperado
quanto secreto jardim
ai quanto caminho errado
sem fim.

Morro por ti mas tu não vens
dentro de mim te chamo
mas tu não estás
mas tu não vês
o que arranquei de mim
meu amor tu não és
quem amo.

Ai quanto caminho andado
sozinha dentro de mim
ai quanto caminho errado
sem fim.
Canto por ti mas tu não és
dentro de mim te choro
mas tu não estás
mas tu não vês
já te arranquei de mim
é só por te não ter
que eu morro.

Poema: José Carlos Ary dos Santos
Música: Tomaso Albinoni
Intérprete: Teresa Silva Carvalho (in CD “Canções Gratas”, Strauss, 1994)

Contradições

Canções de contrários

Letras

A chuva choveu

[ Chuva de Paus ]

A chuva choveu num dia de sol
Um peixe cresceu em cima do anzol
Tenho dois corações para gostar melhor
Um bate cá dentro, o outro não tem lugar

Um rio balançou p’ra trás e p’rá frente
Tenho duas bocas p’ra cantar diferente
Uma tem tristeza e cheiro a manjerico
Quando a outra cant’a esta dá lhe o fanico

Chuva de Paus, Castelo de Areia
Grão-de-Bico é bom à sombra da bananeira
Tenho sete vidas e uma epifania
Sou gata, estou viva no reino de hoj’em dia

Chuva de Paus, Castelo de Areia
Grão-de-Bico é bom à sombra da bananeira
Tenho sete vidas e uma epifania
Sou gata, estou viva no reino de hoj’em dia

Letra: Miguel Cardina
Música: Pedro Damasceno
Arranjo: Diabo a Sete
Intérprete: Diabo a Sete (in CD “tarAra”, atrasdosbarrocos.com, 2011)

Alguém a ganhar

[ O Beijo da Medusa ]

Alguém a ganhar
Alguém a perder
Alguém a lucrar
Alguém a morrer
Nestas areias movediças
De ganâncias, de cobiças
Um sinistro ritual
Terra prometida
Prometida a quem?
Terra proibida
Terra de ninguém
É uma nova Babilónia
Por dentro da nossa insónia
Uma louca espiral
Pode ser fatal a voz da tua musa
Muito cuidado com o beijo da medusa
Pode ser fatal a voz da tua musa
Muito cuidado com o beijo da medusa
O ovo da serpente, a dança guerreira
Vê lá, não deites gasolina na fogueira
E pode ser fatal a voz da tua musa
Muito cuidado com o beijo da medusa
Salta, soldadinho
Da tua trincheira
Salta, soldadinho
Desta bandalheira
Será que a vida continua?
Esta guerra não é tua
Quem te quer endrominar?

Alguém a ganhar
Alguém a perder
Alguém a lucrar
Alguém a morrer
Sorte caipora
Já abriram a boceta de Pandora
Quem nos quer envenenar?

Pode ser fatal a voz da tua musa
Muito cuidado com o beijo da medusa
Pode ser fatal a voz da tua musa
Muito cuidado com o beijo da medusa
O ovo da serpente, a dança guerreira
Vê lá, não deites gasolina na fogueira
E pode ser fatal a voz da tua musa
Muito cuidado com o beijo da medusa
Gregos e troianos
Abutres e falcões
Há tantos enganos
Nas vossas missões
Rio de raiva e de veneno
Sanguinário, tão obsceno
Um pesadelo que não tem fim
Uivo de chacais
Voz que se apagou
Em lutas tribais
Pranto que secou
Vou questionar a tua sentença, a tua lei
Pois já nem sei
Se foi Abel que matou Caim

Letra e música: José Medeiros
Arranjo: Paulo Borges
Intérprete: José Medeiros (in Livro/2CD “Fados, Fantasmas e Folias”: CD 1, Algarpalcos, 2010)

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Anda cá

[ Tempos Anormais ]

Anda cá, se queres ver
As coisas que eu vi:
Um pato a endoidecer,
Outro a sorrir.

Anda cá, nem podes crer
Coisas de contar:
Uma centelha a chover,
Outra a congelar.

Anda cá, se queres ver
As coisas que eu vi:
Gente cansada a lançar
Pragas contra si.

Andam no ar vibrações,
Tempos anormais,
Gente que pede aflições
A quem lhas der mais.

Anda cá, se queres ver
As coisas que eu vi:
Um pato a endoidecer,
Outro a sorrir.

Anda cá, nem podes crer
Coisas de contar:
Uma centelha a chover,
Outra a congelar.

Anda cá, se queres ver
As coisas que eu vi:
Gente cansada a lançar
Pragas contra si.

Andam no ar vibrações,
Tempos anormais,
Gente que pede aflições
A quem lhas der mais.

Letra: Miguel Cardina
Música: Pedro Damasceno, Julieta Silva e Celso Bento
Intérprete: Diabo a Sete (in CD “Figura de Gente”, Sons Vadios, 2016)

A Verdade da Mentira

Coisas que o Mundo não me quer contar
Ou eu não sei entender;
Coisas que a vida me quer ensinar
E eu não quero aprender.

Será que os rios
Sabem o caminho do mar
P’ra lá chegar?
Ou alguém lhes vem mostrar?…

Se eu te contar a verdade
Sem te dizer quase nada,
Tu vais dizer com vontade
Que eu escondo a verdade calada.

Mas, se eu te contar a verdade
E te disser que é mentira,
Tu vais dizer com vontade
Que até a verdade se vira.

Por trás do muro há uma voz a falar,
Deste lado nada se vê;
Dizem-me sempre par’acreditar
Mas não me dizem em quê.

Tantas palavras cruzadas perdidas p’lo ar
E eu a pensar…
Como as hei-de eu arrumar?

Se eu te contar a verdade
Sem te dizer quase nada,
Tu vais dizer com vontade
Que eu escondo a verdade calada.

Mas, se eu te contar a verdade
E te disser que é mentira,
Tu vais dizer com vontade
Que até a verdade se vira.

Se eu te contar a verdade
Sem te dizer quase nada,
Tu vais dizer com vontade
Que eu escondo a verdade calada.

Mas, se eu te contar a verdade
E te disser que é mentira,
Tu vais dizer com vontade
Que até a verdade se vira.

Se eu te contar a verdade
Sem te dizer quase nada,
Tu vais dizer com vontade
Que eu escondo a verdade calada.

Mas, se eu te contar a verdade
E te disser que é mentira,
Tu vais dizer com vontade
Que até a verdade se vira.

Letra: Sebastião Antunes
Música: Paulo Loureiro
Arranjo: Paulo Loureiro e José Salgueiro
Intérprete: Ana Laíns (in CD “Portucalis”, Ana Laíns/Seven Muses, 2017)

Coisas que o mundo

[ A Verdade da Mentira ]

Coisas que o Mundo não me quer contar
Ou eu não sei entender;
Coisas que a vida me quer ensinar
E eu não quero aprender.

Será que os rios
Sabem o caminho do mar
P’ra lá chegar?
Ou alguém lhes vem mostrar?…

Se eu te contar a verdade
Sem te dizer quase nada,
Tu vais dizer com vontade
Que eu escondo a verdade calada.

Mas, se eu te contar a verdade
E te disser que é mentira,
Tu vais dizer com vontade
Que até a verdade se vira.

Por trás do muro há uma voz a falar,
Deste lado nada se vê;
Dizem-me sempre par’acreditar
Mas não me dizem em quê.

Tantas palavras cruzadas perdidas p’lo ar
E eu a pensar…
Como as hei-de eu arrumar?

Se eu te contar a verdade
Sem te dizer quase nada,
Tu vais dizer com vontade
Que eu escondo a verdade calada.

Mas, se eu te contar a verdade
E te disser que é mentira,
Tu vais dizer com vontade
Que até a verdade se vira.

Se eu te contar a verdade
Sem te dizer quase nada,
Tu vais dizer com vontade
Que eu escondo a verdade calada.

Mas, se eu te contar a verdade
E te disser que é mentira,
Tu vais dizer com vontade
Que até a verdade se vira.

Se eu te contar a verdade
Sem te dizer quase nada,
Tu vais dizer com vontade
Que eu escondo a verdade calada.

Mas, se eu te contar a verdade
E te disser que é mentira,
Tu vais dizer com vontade
Que até a verdade se vira.

Letra: Sebastião Antunes
Música: Paulo Loureiro
Arranjo: Paulo Loureiro e José Salgueiro
Intérprete: Ana Laíns (in CD “Portucalis”, Ana Laíns/Seven Muses, 2017)

Ana Laíns
Ana Laíns

Sou Dual

Eu quero andar sem pés no chão,
Talvez sim, talvez não…
Ser uma conta certa e errada,
Ser tudo, ser nada.

Escrever sem nada p’ra dizer
E falar só por querer;
Num contra-senso todo imenso
Sou eu, quando penso.

Certeza inquieta, que aperta,
Que oprime e liberta,
Que às vezes acerta:
Sou dual.

Puxar meu barco pela areia,
Volta e meia, desistir;
Dar-me a quem me quer ver feia,
E de quem me vê, fugir.

Senhora dos meus devaneios,
Imperfeita perfeição,
Carrego mil e um anseios
No peito e nas mãos.

Certeza inquieta, que aperta,
Que oprime e liberta,
Que às vezes acerta:
Sou dual.

Certeza inquieta, que aperta,
Que oprime e liberta,
Que às vezes acerta:
Sou dual.

Letra: Ana Laíns e Mafalda Arnauth
Música: Ivan Lins
Arranjo: Paulo Loureiro e Ana Laíns
Intérprete: Ana Laíns com Ivan Lins (in CD “Portucalis”, Ana Laíns/Seven Muses, 2017)

Ana Laíns, Portucalis

Ana Laíns, Portucalis

Tubarão tinha dentes de rainha

[ Tamboril ]

Tubarão tinha dentes de tainha
E a tainha tinha dentes de tambor
Toca traz tempo chuva tempestade
Tubarão trincou um touro nos taleigos da vontade

Tubarão tinha o tímpano trocado
E trocado (es)tava o tempo todo o ano
Toca traz tempo chuva tempestade
Tubarão tamborilou ‘inda a missa ia a metade

Tubarão traficou-se em tamboril
Troca-tintas com retoque teatral
Toca terça, quarta, quinta, noite e dia
Travestido no Entrudo c’uma tromba de enguia

Tamboril teve tísica ao contrário
Já tossia como tosse o tubarão
Toca terça, quarta, quinta, noite e dia
Tamboril entubarou num atalho p’rá Turquia

Tubarão tinha dentes de tainha
E a tainha tinha dentes de tambor
Toca traz tempo chuva tempestade
Tubarão trincou um touro nos taleigos da vontade

Tubarão tinha o tímpano trocado
E trocado (es)tava o tempo todo o ano
Toca traz tempo chuva tempestade
Tubarão tamborilou ‘inda a missa ia a metade

Tubarão traficou-se em tamboril
Troca-tintas com retoque teatral
Toca terça, quarta, quinta, noite e dia
Travestido no Entrudo c’uma tromba de enguia

Tamboril teve tísica ao contrário
Já tossia como tosse o tubarão
Toca terça, quarta, quinta, noite e dia
Tamboril entubarou num atalho p’rá Turquia

Letra: Miguel Cardina
Música e arranjo: Diabo a Sete
Intérprete: Diabo a Sete

Com um olhar de soslaio

[ Prosas Mordazes ]

Com um olhar de soslaio, não me vêem como eu sou
Atracados na memória, com quem ando e onde vou

E falam sobre mim, sem me conhecer
Dizem que é assim, não têm o que dizer
Não têm o que dizer, não têm o que dizer

Não sabem da minha vida, quem morreu e quem ficou
São nuances que descuram, que ninguém lhes segredou

E falam sobre mim, sem me conhecer
Dizem que é assim, nem sei que lhes dizer
Nem sei que lhes dizer, nem sei que lhes dizer

Entre dentes especulam, onde vou e o que faço
Não passam de vis criaturas a quem nego o meu enlaço

E falam sobre mim, sem me conhecer
Dizem que é assim, nunca hão-de saber
Nunca hão-de saber, nunca hão-de saber

E falam sobre mim, sem me conhecer
Dizem que é assim, não têm o que dizer
Falam sobre mim, sem me conhecer
Dizem que é assim, nem sei que lhes dizer
Falam sobre mim, sem me conhecer
Dizem que é assim, nunca hão-de saber
Nunca hão-de saber, nunca hão-de saber

Letra e música: Miguel Moita Fernandes
Arranjo: Lacre
Intérprete: Lacre
Versão original: Lacre (in CD “Opus 0”, Lacre/Tradisom, 2013)

Como diferem das minhas

[ Minhas Penas ]

Como diferem das minhas
As penas das avezinhas
Que de leves leva o ar
Só as minhas pesam tanto
Que às vezes nem já o pranto
Lhes alivia o pesar

As minhas penas não caem
Nem voam nunca, nem saem
Comigo desta amargura
Mostram apenas na vida
A estrada já conhecida
Trilhada pelos sem ventura

Passam dias, passam meses
Passam anos, muitas vezes
Sem que uma pena se vá
E se uma vem, mais pequena
Ai, depois nem vale a pena
Porque mais penas me dá

Que felizes são as aves
Como são leves, suaves,
As penas que Deus lhes deu
Só as minhas pesam tanto
Ai, se tu soubesses quanto…
Sabe-o Deus e sei-o eu

Só as minhas pesam tanto
Ai, se tu soubesses quanto…
Sabe-o Deus e sei-o eu

Letra: Fernando Caldeira
Música: Carlos da Maia
Intérprete: Maria Teresa de Noronha (in CD “O Melhor de Maria Teresa de Noronha”, EMI-VC, 1992)

Num dia sou quem me encontro

[ Caminho Certo ]

Num dia sou quem me encontro,
Num outro dia me perco
Na vida que conto
Tão longe e tão perto.
Será o caminho certo?

Vem de tão longe este espanto
Tão inquieto, tão perfeito
De tudo o que tenho de incerto.
Saudade,
Que é feito
Do caminho certo?

Faço o que tenho a fazer,
Longe daqui é mais perto.
Quem vai dizer?
Como saber
Qual o caminho certo?

Haja um dia que se encontre
Sem saber ao que virá,
Se fica p’ra lá do deserto.
Saudade,
Eu sei lá
Se é o caminho certo!

Vem de tão longe este espanto
Tão inquieto, tão perfeito
De tudo o que tenho de incerto.
Saudade,
Que é feito
Do caminho certo?

Letra: Viriato Teles
Música: Ricardo Fino
Arranjo: Quiné Teles
Intérprete: Ela Vaz (in CD “Eu”, Micaela Vaz, 2017)

Só por existir

Só por existir
Só por duvidar
Tenho duas almas em guerra
E sei que nenhuma vai ganhar

Só por ter dois sóis
Só por hesitar
Fiz a cama na encruzilhada
E chamei casa a esse lugar

E anda sempre alguém por lá
Junto à tempestade
Onde os pés não têm chão
E as mãos perdem a razão

Só por inventar
Só por destruir
Tenho as chaves do céu e do inferno
E deixo o tempo decidir

E anda sempre alguém por lá
Junto à tempestade
Onde os pés não têm chão
E as mãos perdem a razão

Só por existir
Só por duvidar
Tenho duas almas em guerra
E sei que nenhuma vai ganhar
Eu sei que nenhuma vai ganhar

Letra e música: Jorge Palma
Intérprete: Jorge Palma (in “Bairro do Amor”, Polygram, 1989)

Orblua, Retratos Cinéticos

Canções do tempo

Letras

Chorava por te não ver

[ Fado das Horas ]

Chorava por te não ver,
Por te ver eu choro agora;
Mas choro só por querer,
Querer ver-te a toda a hora.

Passa o tempo de corrida,
Quando falas e eu te escuto;
Nas horas da nossa vida
Cada hora é um minuto.

Quando estás ao pé de mim
Sinto-me dona do mundo;
Mas o tempo é tão ruim,
Tem cada hora um segundo.

Deixa-te estar a meu lado
E não mais te vás embora,
P’ra o meu coração, coitado,
Viver na vida uma hora.

Deixa-te estar a meu lado
E não mais te vás embora,
P’ra o meu coração, coitado,
Viver na vida uma hora.

Letra: António Sabrosa
Música: Maria Teresa de Noronha

Gosto de te ouvir cantar

[ Chuva nos Beirados ]

Gosto de te ouvir cantar,
Ó chuva, nos beirados,
Trauteando músicas de encantar,
Tornando os dias molhados:
É o Inverno a chegar.
Gosto de te ouvir cair,
Ó chuva, nos telhados,
Sussurrando melodias calmas;
O teu gotejo sincopado,
De sinfonia abstracta,
É como a amizade
Quando o amor nos falta!

Gosto de te ouvir cantar,
Ó chuva, nos beirados,
Trauteando músicas de encantar,
Tornando os dias molhados:
É o Inverno a chegar.
Gosto de te ouvir cair,
Ó chuva, nos telhados,
Sussurrando melodias calmas;
O teu gotejo sincopado,
De sinfonia abstracta,
É como a amizade
Quando o amor nos falta!
É como a amizade
Quando o amor nos falta!

Letra: Rogério Perrolas
Música e arranjo: Rogério Charraz
Intérprete: Rogério Charraz com António Caixeiro, Buba Espinho e Eduardo Espinho (in CD “Não Tenhas Medo do Escuro”, Rogério Charraz/Compact Records, 2016)

Reciclanda

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Com música, instrumentos reutilizados, poesia e literaturas de tradição oral, contribui para o desenvolvimento global da criança e o bem estar dos idosos. Faz ACD e ALD (formações de curta e longa duração), realiza oficinas de música durante o ano letivo e dinamiza atividades em colónias de férias. Municípios, Escolas, Agrupamentos, Colégios, Festivais, Bibliotecas, CERCI, Centros de Formação, Misericórdias, Centros de Relação Comunitária, podem contratar serviços Reciclanda.

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Já chove

[ As Nuvens Que Andam no Ar ]

[Cantiga primeira:]

Já chove, já está chovendo;
Já correm os barranquinhos;
Já o campo está alegre;
Já cantam os passarinhos.

[Moda:]

As nuvens que andam no ar,
Arrastadas pelo vento,
Vão buscar a água ao mar
P’ra regar em qualquer tempo.

P’ra regar em qualquer tempo,
Em qualquer tempo regar,
Arrastadas pelo vento
As nuvens que andam no ar.

[Cantiga segunda:]

Ó água que vais correndo
Mansamente, vagarosa,
Passa lá ao meu jardim!
Rega-me lá uma rosa!

[Moda:]

As nuvens que andam no ar,
Arrastadas pelo vento,
Vão buscar a água ao mar
P’ra regar em qualquer tempo.

P’ra regar em qualquer tempo,
Em qualquer tempo regar,
Arrastadas pelo vento
As nuvens que andam no ar.

Letra e música: Popular (Baixo Alentejo)
Intérprete: Grupo Coral “Os Ganhões de Castro Verde” com Luiz Avellar (in CD “As Nuvens Que Andam no Ar”, Associação de Cante Alentejano “Os Ganhões”, 2015)

Nesses dias em que as horas

[ Ondulações ]

Nesses dias em que as horas
se fazem dias sem fim,
já não sou eu quem acorda,
há alguém que dorme em mim.

Era mar ainda agora,
fiz-me rio sem saber
que o céu que em mim demora
é só foz e anoitecer.

Sou pedra em fogo lento
vaga sem lua nem vez,
conto em riso e lamento,
quanto o tempo desfez.

E quando um barco pressente
dessa noite o marulhar,
dou o peito à corrente,
sou um rio feito mar.

Era mar ainda agora
fiz-me rio sem saber
que o céu que em mim demora
é só foz e anoitecer.

Se me deres uma vez mais
a maré do teu olhar,
eu serei somente um cais
onde possas aportar.

Letra: Helena Carvalho
Música: Fernando Dias Marques
Arranjo: Fernando Marques
Intérprete: Fernando Marques Ensemble (in CD “(des)Encontros”, Fernando Marques Ensemble, 2016)

No mês de Janeiro

[ Calendário ]

No mês de Janeiro
Vem a chuva e vem o vento,
Enquanto em Fevereiro
Chega ao fim o meu tormento.

Nos idos de Março
Faço as malas e abalo;
Abril, o que faço?
Canto sempre e não me calo.

E no mês de Maio
Tiro a roupa e vou ao mar;
E nessa não caio:
De em Junho me calar.

No calor de Julho
Ainda mais canto com gosto,
E logo mergulho
O corpo no mês de Agosto.

Quando em Setembro
Eu finalmente descubro
Que ainda me lembro
Dos teus anos em Outubro.

E assim em Novembro,
Se eu agora não me engano,
Cheira-me a Dezembro,
Chega ao fim o fim do ano.

De novo em Janeiro…
Ainda algum tempo me sobra
Para em Fevereiro
Deitar enfim mãos à obra.

Fica tudo pronto
Lá para finais de Março;
Em Abril eu conto
Encontrar-te num abraço.

Em Maio de flores
Espero que a chuva não caia;
E em Junho, se fores ao mar,
Vês-me lá na praia.

O levante em Julho
Chega mesmo a meu gosto:
Dou mais um mergulho,
Faço anos em Agosto.

Partem em Setembro,
Rumo a sul, as andorinhas;
De Outubro a Dezembro
Ficam sem folhas as vinhas.

E assim terminamos
Mais um ano nesta lida:
Canção que acabamos
No seu ponto de partida.

Letra e música: Sérgio Mestre
Intérprete: OrBlua com Janita Salomé (in Livro/CD “Retratos Cinéticos”, Fungo Azul/Ocarina, 2015)

Nos dias de hoje

Nos dias de hoje,
Ninguém sabe a quantas anda:
Manda quem pode,
Pode quem manda.
Nos dias de hoje,
Não sentimos confiança:
Salva-se a música
E siga a dança!
Nos dias de hoje,
Ninguém sabe o que o espera,
Se é inverno ou primavera,
Indiferença ou compaixão.
Nos dias de hoje,
A justiça não impera,
A igualdade desespera,
É confusa a confusão.

Salva-se o amor,
Salva-se a esperança,
Salvam-se os olhos duma criança;
Salva-se a honra,
Salva-se a paz,
Salvam-se os beijos que tu me dás!

Nos dias de hoje,
Ninguém sabe o de amanhã,
E fazer planos
É coisa vã.
Nos dias de hoje,
Já não há motivação
Para dar às balas
O coração.
Nos dias de hoje,
Ninguém sabe o que o espera,
Se é um sonho ou uma quimera
Ter saudades do futuro.
Nos dias de hoje,
Ninguém põe as mãos no fogo
Por um amanhã mais novo,
Por um amanhã mais puro.

Salva-se o amor,
Salva-se a esperança,
Salvam-se os olhos duma criança;
Salva-se a honra,
Salva-se a paz,
Salvam-se os beijos que tu me dás!

Salva-se o amor,
Salva-se a esperança,
Salvam-se os olhos duma criança;
Salva-se a honra,
Salva-se a paz,
Salvam-se os beijos que tu me dás!

Salva-se a honra,
Salva-se a paz,
Salvam-se os beijos que tu me dás!

Letra e música: Tozé Brito
Intérprete: Ricardo Ribeiro (in CD “Hoje É Assim, Amanhã Não Sei”, Ricardo Ribeiro/Parlophone/Warner Music, 2016)

O tempo perguntou ao tempo

[ Charanga do Tempo ]

O tempo perguntou ao tempo
Quanto tempo o tempo tem;
O tempo respondeu ao tempo
Que o tempo tem tanto tempo
Quanto tempo o tempo tem.
Tempo que parece Deus
E Deus que parece a Vida;
Vida que pareço eu
Entre o riso e o pranto
Numa busca sem medida.

O tempo perguntou ao tempo
Quanto tempo o tempo tem;
O tempo respondeu ao tempo
Que o tempo tem tanto tempo
Quanto tempo o tempo tem.
Sobre o tempo ninguém sabe,
Talvez ele saiba de nós;
Não se vende, não se rende,
Tantas vezes não se entende
E quase sempre manda em nós!

O tempo perguntou ao tempo
Quanto tempo o tempo tem;
O tempo respondeu ao tempo
Que o tempo tem tanto tempo
Quanto tempo o tempo tem.
Mas sei qu’ele sabe o que faz
Sem se dar a entender;
Na verdade que trouxer
Venha o tempo que vier,
Hei-de ser tempo de paz.

O tempo perguntou ao tempo…
Sobre o tempo ninguém sabe…
O tempo perguntou ao tempo…
Talvez ele saiba de nós…
O tempo perguntou ao tempo…
O tempo, o tempo, o tempo…
O tempo, o tempo, o tempo, o tempo…
O tempo perguntou ao tempo
Quanto tempo o tempo tem.

Letra: Popular (refrão) e Ana Laíns
Música: Carlos Lopes
Intérprete: Ana Laíns
Versão original: Ana Laíns com Mafalda Arnauth (in CD “Portucalis”, Ana Laíns/Seven Muses, 2017)

São tempos

São tempos acesos
e os dias correndo,
e quanto mais corres
menos vais vivendo.

Os olhos são tristes,
os cravos murcharam,
a esperança ainda existe,
mas as vozes calaram.

Os campos são amplos,
a vida é às voltas,
mas, às páginas tantas,
eu morro em revoltas.

São tempos gritantes
e as horas passando,
e quantas mais passam
mais vais naufragando.

Nos teus olhos há sonhos
que a sombra encobriu.
Há restos da esperança
que um Abril floriu.

Os campos são amplos,
a vida é às voltas,
mas, às páginas tantas,
eu morro em revoltas.

São tempos de fúria
por servidões encoberta,
quando mais te enfureças
mais o meu canto desperta.

Nos nossos olhos há sonhos
que vão florescer,
na certeza que um dia
Abril vai romper.

Os campos são amplos,
a vida é às voltas,
mas, às páginas tantas,
eu morro em revoltas.

Letra: Joana Lopes
Música: António Pedro
Intérprete: Musicalbi
Versão original: Musicalbi (in CD “Solidão e Xisto”, Musicalbi, 2019)

Se o tempo não chega a ser

[ O Fado do Tempo Morto ]

Se o tempo não chega a ser
Mais que as horas a passar,
Talvez o mal de o perder
Me deixe um dia ganhar.

Das mil voltas que já dei
Ao mundo que já foi meu,
Fica-me o tempo em que amei
Todo o mundo que era teu.

Talvez de mim me perdesse
E me esquecesse de ti…
E então o tempo dos dois
Seria o que não vivi.

Não sei bem se inda te quero,
Ou se é sina que Deus me deu…
Meu amor, se não te espero
É porque o tempo morreu…

Letra: Carlos Leitão
Música: Popular (Fado Menor)
Intérprete: Ana Laíns
Versão original: Ana Laíns (in CD “Portucalis”, Ana Laíns/Seven Muses, 2017)

Sei quantas luas

[ Dias Cruzados ]

Sei quantas luas tu dormiste,
Neste teu mundo tão triste,
Neste teu encanto puro!

Foi uma vida sem história,
Quatro ventos sem memória,
Numa onda sem retorno!

E… cruzam-se os dias,
Mesmo… sem ter seu rumo próprio…
Nome… cada letra é teu gosto…
Cada gosto em teu luar, devagar!

Vem, nesse pensamento vago,
Onde choro e não me encontro,
Onde canto ao longe o Fado…

Traz esses dias que se cruzam,
Em redor de noites brancas,
Ao sabor de luas calmas.

E… cruzam-se os dias,
Mesmo… sem ter seu rumo próprio…
Nome… cada letra é teu gosto…
Cada gosto em teu luar, devagar!

Os dias cruzados, amados,
Vencidos, perdidos…
Enganados!

Amantes das luas,
Das noites cruzadas,
Amadas sentidas… Rotinas!…
Fugindo…

Os dias cruzados, amados,
Vencidos, perdidos…
Enganados!

Amantes das luas,
Das noites cruzadas,
Amadas sentidas… Rotinas!…
Fugindo, ouvindo o mar do dia!…

Os dias cruzados, amados,
Vencidos, perdidos…
Enganados!

Amantes das luas,
Das noites cruzadas,
Amadas sentidas… Rotinas!…
Fugindo…

Os dias cruzados, amados,
Vencidos, perdidos…
Enganados!

Amantes das luas,
Das noites cruzadas,
Amadas sentidas… Rotinas!…
Fugindo, ouvindo o mar do dia!…

Letra: José Flávio Martins
Música: António Pedro
Intérprete: Musicalbi
Versão original: Musicalbi (in CD “Solidão e Xisto”, Musicalbi, 2019)

Vamos embora, é tarde

[ Passam Horas, Passam Dias ]

Vamos embora, é tarde, tão tarde,
nem demos porque o tempo já passou.
Alguma coisa em nós se vai perdendo,
alguma coisa em nós se encontrou.
Vamos contar que há amanhã
p’ra tudo o que ainda não foi dito,
até ver, vamos lá viver.

Passam horas, passam dias,
horas nossas que lá vão,
uns passam, outros ficam.
Não vão.

Quem está? Quem foi embora?
No abrir e fechar da hora,
quem faz connosco a vida
não demora.

O que devemos ao tempo, vivendo,
que resgatamos à morte, no fim.
Uma andorinha cantando,
cantando à vida,
poisada no beiral da cantiga
e é este canto maior
que faz do tempo uma voz,
tecendo os dias em nós.

Passam horas, passam dias,
horas nossas que lá vão,
uns passam, outros ficam.
Não vão.

Quem está? Quem foi embora?
No abrir e fechar da hora,
quem faz connosco a vida
não demora.

Passam horas, passam dias,
horas nossas que lá vão,
uns passam, outros ficam.
Não vão.

Quem está? Quem foi embora?
No abrir e fechar da hora,
quem faz connosco a vida
não demora.

Letra: Amélia Muge
Música: José Barros
Arranjo: José Barros e Miguel Tapadas
Intérprete: José Barros e Navegante
Versão original: José Barros e Navegante (in CD “À’Baladiça”, Tradisom, 2018)

Orblua, Retratos Cinéticos

Orblua, Retratos Cinéticos

Santa Bárbara

Canções religiosas

Letras

Acorda, cristão

[ Encomendação das Almas ]

Acorda, cristão, que és terra!
Lembra-te que hás-de…
Lembra-te que hás-de morrer!
Hás-de dar estreitas contas
Do teu bom e mau…
Do teu bom e mau viver!

Não sei que p’ra ali ouvi
Para os lados do…
Para os lados do Nascente;
Eram as benditas almas,
Estão no fogo…
Estão no fogo ardente.

Acorda, cristão, acorda
Desse sono em…
Desse sono em que estais!
Lembra-te das benditas almas
Que elas clamam…
Que elas clamam e dão ais!

Acorda, cristão, acorda
Desse sono tão…
Desse sono tão profundo!
Lembra-te das benditas almas
Que já estão no…
Que já estão no outro mundo!

Rezemos um padre-nosso
Com uma ave…
Com uma ave-maria!
Seja por o amor de Deus.

Acorda, cristão, acorda!

Letra e música: Tradicional (S. Miguel, Guarda, Beira Alta)
Intérpretes: César Prata e Sara Vidal (in CD “Cantos da Quaresma”, Sons Vadios, 2018)

À porta das almas santas

[ Devoção das Almas ]

À porta das almas santas
Bate Deus a toda a hora.
As almas responderam:
«— Ó meu Deus, que quereis agora?»
«— Queremos que deixais o mundo;
Vinde já para a Glória!»
Ajoelhemos nós em terra,
Já não somos os primeiros.
Em nossa companhia anda
Jesus Cristo verdadeiro.
Ó Virgem da Piedade,
À devoção nos obriga;
Rezemos às almas santas,
Rezemos com alegria.
Atormenta a dor e dor
Do contínuo padecente.
Assim são as benditas almas
No Purgatório ardente.
Ouvi homens e mulheres
Deste povo auditório,
Dai esmola se pudéreis
Às almas do Purgatório.
Dai esmola se pudéreis,
Se com devoção a dais;
Já lá tendes vossas mães,
Vossos filhos e vossos pais.
Esses bens que possuirdes
Reparti-os em vossa vida;
Lá os achareis na Glória
Quando fordes na partida.
Aqui estamos de joelhos
A rezar a oração:
Ou nos venham dar a esmola
Ou de Deus venha o perdão.

Letra e música: Tradicional (Oliveirinha, Aveiro, Beira Litoral)
Recolha: Michel Giacometti (in LP “Beira Alta, Beira Baixa, Beira Litoral”, série “Antologia da Música Regional Portuguesa”, Arquivos Sonoros Portugueses/Michel Giacometti, 1970; 5CD “Portuguese Folk Music”: CD 3 – Beiras, Strauss, 1998; 6CD “Música Regional Portuguesa”: CD 4 – Beiras, col. Portugal Som, Numérica, 2008)
Intérpretes: César Prata e Sara Vidal (in CD “Cantos da Quaresma”, Sons Vadios, 2018)

Reciclanda

Reciclanda

O projeto Reciclanda promove a reutilização, reciclagem e sustentabilidade desde idade precoce.

Com música, instrumentos reutilizados, poesia e literaturas de tradição oral, contribui para o desenvolvimento global da criança e o bem estar dos idosos. Faz ACD e ALD (formações de curta e longa duração), realiza oficinas de música durante o ano letivo e dinamiza atividades em colónias de férias. Municípios, Escolas, Agrupamentos, Colégios, Festivais, Bibliotecas, CERCI, Centros de Formação, Misericórdias, Centros de Relação Comunitária, podem contratar serviços Reciclanda.

Contacte-nos:

António José Ferreira
962 942 759

Ai lá em cima

[ Martírios do Senhor ]

Ai lá em cima ao Calvário
Ai está um craveiro à Cruz;
Ai a água com que se rega
Ai é o sangue de Jesus.

Ai ó almas que tendes sede,
Ai vir ao Calvário a beber!
Ai que estão lá as cinco fontes
Ai todas cinco a correr.

Ai a Senhora chora, chora,
Ai chora que se ouve no adro,
Ai de ver o seu Filho morto,
Ai no caixão amortalhado.

Ai a Senhora chora, chora,
Ai chora que se ouve na rua,
Ai de ver o seu Filho morto,
Ai deitado na sepultura.

Ai a Senhora está de luto
Ai por estas sete semanas,
Ai que lhe morreu o seu Filho,
Ai filho das suas entranhas.

Letra e música: Tradicional (Zebreira, Idanha-a-Nova, Beira Baixa)
Intérpretes: César Prata e Sara Vidal* (in CD “Cantos da Quaresma”, Sons Vadios, 2018)

Com o Grande Peso da Cruz

Com o grande peso da Cruz
Quis Deus ser enfraquecido;
E com ela aqui caído
Jaz em terra o bom Jesus.

Procuraram levantar
Pela corda Lhe tirando;
Em se Ele levantando
Parece querer expirar.

Glória seja ao Pai!
Glória ao Filho juntamente!
Glória ao Espírito Santo
Que de ambos é procedente!

Letra e música: Tradicional (Proença-a-Velha, Idanha-a-Nova, Beira Baixa)
Intérpretes: César Prata e Sara Vidal (in CD “Cantos da Quaresma”, Sons Vadios, 2018)

E à porta das almas santas

[ Encomendação das Almas ]

E à porta das almas santas
Bate Deus a toda a hora,
Deus a toda a hora.

E as almas de lá respondem:
«— E ó meu Deus, que quereis agora?
Meu Deus, agora?»

«— Quero que venhais comigo
Para a minha eterna Glória!
Minha eterna Glória!

P’ra a companhia dos anjos
Mais a Virgem que Me adora!
Virgem que Me adora!»

E acordai se estais dormindo
Nesse sono tão profundo!
Sono tão profundo!

Rezemos um padre-nosso
Às almas do outro mundo!
Do outro mundo!

Letra e música: Tradicional (Idanha-a-Nova, Beira Baixa)
Intérpretes: César Prata e Sara Vidal (in CD “Cantos da Quaresma”, Sons Vadios, 2018)

Já Apareceu a Aleluia

[ Aleluia da Festa das Rosas ]

Já apareceu a Aleluia.
Quem a achou? Quem a acharia?
Achou-a o senhor vigário
No sacrário de Maria.

Desde a porta da igreja
Até à torre do sino
Vamos dar as boas-festas
Ao sacramento divino!

Desde a porta da igreja
Até à da sacristia
Vamos dar as boas-festas
À Virgem Santa Maria!

Aleluia! Aleluia!
Aleluia! Já é festa.
Alegrai-vos, Mãe de Deus:
Nossa alegria é esta!

Não há Senhora mais linda
Do que é a do Almurtão:
Tem o seu amado Filho
Ao lado do coração.

Eu hei-de ir à festa,
Hei-de lá ficar:
Tenho uma promessa,
Quero-la pagar.
Eu hei-de ir à festa,
Hei-de lá dormir:
Tenho uma promessa,
Quero-la cumprir.

Letra e música: Tradicional (“Aleluia da Festa das Rosas” – Monsanto, Idanha-a-Nova, Beira Baixa / “Já Apareceu a Aleluia” – Idanha-a-Nova, Beira Baixa)
Intérpretes: César Prata e Sara Vidal* (in CD “Cantos da Quaresma”, Sons Vadios, 2018)

* César Prata – voz, guitarra, kalimba, sanfona, hangdrum, ponteiro, adufe, matracas, percussões, shruti box, programações
Sara Vidal – voz, harpa celta, adufe
Arranjos – César Prata e Sara Vidal
Produção musical – César Prata e Sara Vidal
Gravado no estúdio RequeRec, Trancoso, em Novembro de 2017
Gravação, mistura e masterização – César Prata

Já pedem nas almas santas

[ As Excelências da Virgem ]

Já pedem nas almas santas
Que uma excelência lhe havemos de rezar,
À Senhora do Rosário,
Ao seu Santo Saclário.
Saclário já está aberto:
O Senhor saiu fora
Acompanhar uma alma
Que vai p’ra a Glória.

Já pedem nas almas santas
Que duas excelências lhe havemos de rezar,
À Senhora do Rosário,
Ao seu Santo Saclário.
Saclário já está aberto:
O Senhor saiu fora
Acompanhar uma alma
Que vai p’ra a Glória.

Já pedem nas almas santas
Que três excelências lhe havemos de rezar,
À Senhora do Rosário,
Ao seu Santo Saclário.
Saclário já está aberto:
O Senhor saiu fora
Acompanhar uma alma
Que vai p’ra a Glória.

Já pedem nas almas santas
Que quatro excelências lhe havemos de rezar,
À Senhora do Rosário,
Ao seu Santo Saclário.
Saclário já está aberto:
O Senhor saiu fora
Acompanhar uma alma
Que vai p’ra a Glória.

Já pedem nas almas santas
Que cinco excelências lhe havemos de rezar,
À Senhora do Rosário,
Ao seu Santo Saclário.
Saclário já está aberto:
O Senhor saiu fora
Acompanhar uma alma
Que vai p’ra a Glória.
Que vai p’ra a Glória,
Que vai p’ra a Glória,
Que vai p’ra a Glória.

Letra e música: Tradicional (Alcoutim, Algarve)
Recolha: Michel Giacometti (in LP “Algarve”, série “Antologia da Música Regional Portuguesa”, Arquivos Sonoros Portugueses/Michel Giacometti, 1962; 5CD “Portuguese Folk Music”: CD 5 – Algarve, Strauss, 1998; 6CD “Música Regional Portuguesa”: CD 6 – Algarve, col. Portugal Som, Numérica, 2008)
Intérpretes: César Prata e Sara Vidal (in CD “Cantos da Quaresma”, Sons Vadios, 2018)

Louvado no Sisso

Louvado no Sisso, meu Senhor Jesus Cristo,
Bendita seja a Vossa vinda!
Paixão e morte,
Bendito seja o Vosso sangue
(Que) Por nós derramásteis,
Pelo Vosso santo pé direito!

Louvado no Sisso, meu Senhor Jesus Cristo,
Bendita seja a Vossa vinda!
Paixão e morte,
Bendito seja o Vosso sangue
(Que) Por nós derramásteis,
Pelo Vosso santo pé esquerdo!

Louvado no Sisso, meu Senhor Jesus Cristo,
Bendita seja a Vossa vinda!
Paixão e morte,
Bendito seja o Vosso sangue
(Que) Por nós derramásteis,
Pelo Vosso santo joelho direito!

Louvado no Sisso, meu Senhor Jesus Cristo,
Bendita seja a Vossa vinda!
Paixão e morte,
Bendito seja o Vosso sangue
(Que) Por nós derramásteis,
Pelo Vosso santo joelho esquerdo!

Louvado no Sisso, meu Senhor, Jesus Cristo,
Bendita seja a Vossa vinda!
Paixão e morte,
Bendito seja o Vosso sangue
(Que) Por nós derramásteis,
Pela Vossa santa mão direita!

Louvado no Sisso, meu Senhor, Jesus Cristo,
Bendita seja a Vossa vinda!
Paixão e morte,
Bendito seja o Vosso sangue
(Que) Por nós derramásteis,
Pela Vossa santa mão esquerda!

Estais Senhor fruto
Do ventre sagrado
Da Virgem Puríssima
Santa Maria!

Letra e música: Tradicional (Penha Garcia, Idanha-a-Nova, Beira Baixa)
Intérpretes: César Prata e Sara Vidal* (in CD “Cantos da Quaresma”, Sons Vadios, 2018)

Lua benta

[ Benzedura da Lua ]

Lua benta, por aqui passaste
E a cor de Maria levaste,
E a tua por aqui deixaste,
E a tua por aqui deixaste.

Lua benta, torna a passar!
E a tua cor hás-de levar,
E a de Maria deves deixar.
E a de Maria deves deixar.

Lua benta, por aqui passaste
E a cor de Maria levaste
E a tua por aqui deixaste,
E a tua por aqui deixaste.

Lua benta, torna a passar!
E a tua cor hás-de levar
E a de Maria deves deixar,
E a de Maria deves deixar!

Letra: Oração tradicional
Música: César Prata
Arranjo: César Prata e Vânia Couto
Intérprete: César Prata e Vânia Couto
Versão original: César Prata e Vânia Couto (in CD “Rezas, Benzeduras e Outras Cantigas”, Sons Vadios, 2019)

Nome de Maria

Nome de Maria,
Que tão lindo é:
Salvai a minh’alma
Que ela Vossa é!

Que ela Vossa é,
Sempre o há-de ser!
Salvai a minh’alma
Quando eu morrer!

Quando eu morrer,
Quando eu acabar
Salvai a minh’alma
Para um bom lugar!

Para um bom lugar,
Dia de Juízo,
Salvai a minh’alma
Para o Paraíso!

Para o Paraíso,
Senhora das Dores,
Rainha dos anjos,
Mãe dos pecadores!

Mãe dos pecadores,
Numa boa hora
Salvai a minh’alma
P’ra o Reino da Glória!

Letra e música: Tradicional (Zebreira, Idanha-a-Nova, Beira Baixa)
Intérpretes: César Prata e Sara Vidal (in CD “Cantos da Quaresma”, Sons Vadios, 2018)

Ó Virgem dos Altos Céus

[ Dança das Oito Virgens ]

[Dança das oito virgens em honra

de Nossa Senhora dos Altos Céus:]

Ó Virgem dos Altos Céus,
Mãe do meu amparo, bem,
Conservai na vossa graça
Quem aqui visitar-vos vem!

Quem aqui visitar-vos vem
Com silêncio há-de vir;
Nós estamos aos vossos pés
Prontas para vos servir.

Prontas para vos servir
Do íntimo do coração;
Se não estamos purificadas,
Ó Virgem, dai-nos perdão!

Ó Virgem, dai-nos perdão
Ao nosso povo primeiro!
Sois Mãe de Misericórdia,
Perdoai ao mundo inteiro!

Perdoai ao mundo inteiro,
A toda a família em geral!
Fazei que em todo o mundo
Tenham o vosso sinal!

Tenham o vosso sinal;
Mãe da Glória, Imperatriz,
Conservai na vossa graça
Este nosso juiz!

Este nosso juiz
E todo o mundo inteiro;
Conservai na vossa graça
Este nosso tesoureiro!

Este nosso tesoureiro
E todo o fiel cristão;
Conservai na vossa graça
Este nosso escrivão!

Este nosso escrivão
E quem for do nosso partido;
Nós queremos continuar
Com o nosso uso antigo.

Com o nosso uso antigo
Pela graça do Senhor,
Vivam as oito donzelas
E o nosso tocador!

[Dança das oito virgens em honra

de Nossa Senhora dos Altos Céus:]

Ó Virgem dos Altos Céus,
Mãe do meu amparo, bem,
Conservai na vossa graça
Quem aqui visitar-vos vem!

Quem aqui visitar-vos vem
Com silêncio há-de vir;
Nós estamos aos vossos pés
Prontas para vos servir.

Prontas para vos servir
Do íntimo do coração;
Se não estamos purificadas,
Ó Virgem, dai-nos perdão!

Ó Virgem, dai-nos perdão
Ao nosso povo primeiro!
Sóis Mãe de Misericórdia,
Perdoai ao mundo inteiro!

Perdoai ao mundo inteiro,
A toda a família em geral!
Fazei que em todo o mundo
Tenham o vosso sinal!

Tenham o vosso sinal;
Mãe da Glória, Imperatriz,
Conservai na vossa graça
Este nosso juiz!

Este nosso juiz
E todo o mundo inteiro;
Conservai na vossa graça
Este nosso tesoureiro!

Este nosso tesoureiro
E todo o fiel cristão;
Conservai na vossa graça
Este nosso escrivão!

Este nosso escrivão
E quem for do nosso partido;
Nós queremos continuar
Com o nosso uso antigo.

Com o nosso uso antigo
Pela graça do Senhor,
Vivam as oito donzelas
E o nosso tocador!

Letra e música: Tradicional (Lousa, Castelo Branco, Beira Baixa)
Recolha: Ernesto Veiga de Oliveira / GEFAC
Intérprete: Macadame* (in Livro/CD “Firmamento”, Macadame, 2016)

Recordai, nobres senhores

[ Encomendação das Almas ]

— Recordai, nobres senhores,
Nesse sono tão profundo!
— Ouvirás vozes e clamores
Das almas do outro mundo.
— Cristandade tão unida
Ouvindo gritos e ais…
— Lá tem Deus na outra vida
Nossas mães e nossos pais.
— Tenham dó e compaixão
Daquela sentida voz!
— De repente para nós
As almas que em pena estão
Dos nossos pais e avós…
— ‘Tão rogando a vossos pais
Toda a noite e todo o dia;
— ‘Tão postos em agonia
Vendo que lhe não rezais
Sequer uma ave-maria.

— Ó tão tristes pecadores
Ouvindo tristes gemidos…
— Das almas estão em clamores
Dando gritos tão sentidos;
— Gritam contra os seus herdeiros
Pelos bens que lhes deixaram;
— Gritam contra os seus amigos
Que cá deixaram no mundo,
— Pois foi tal o seu descuido
Sendo vivos mas não dizendo,
Dá-me a mão que eu vos ajudo.
— Muito mal faz que(m) (d)esperdiça
Das almas a divação,
— Sendo das almas irmãos
Vamos-lhe ouvir uma missa,
Dou-lhe esta consolação.
— Desta sorte se consolam
As almas dos nossos pais;
— Uma missa que lhe ouvimos
E um pouco que lhe rezais;
— Fazes uma grande esmola
Porque vós nem meia dais.

Letra e música: Tradicional (Monte de Cabaços, Alcoutim, Algarve)
Recolha: Michel Giacometti (“Oração das Almas”, in LP “Algarve”, série “Antologia da Música Regional Portuguesa”, Arquivos Sonoros Portugueses/Michel Giacometti, 1962; LP “Cantos Religiosos Tradicionais Portugueses”, Philips, 1971; 5CD “Portuguese Folk Music”: CD 5 – Algarve, Strauss, 1998; 6CD “Música Regional Portuguesa”: CD 6 – Algarve, col. Portugal Som, Numérica, 2008)
Intérpretes: César Prata e Sara Vidal (in CD “Cantos da Quaresma”, Sons Vadios, 2018)

Santa Bárbara bendita

[ Oração a Santa Bárbara ]

Santa Bárbara bendita,
Que no céu estás escrita
Com papel e água benta,
Abrandai esta tormenta!

Que não haja pão, nem vinho,
Nem flor de rosmaninho,
Nem galo que cante,
Nem galinha que cacareje!

Santa Bárbara bendita,
Que no céu estás escrita
Com papel e água benta,
Abrandai esta tormenta!

Que não haja pão, nem vinho,
Nem flor de rosmaninho,
Nem galo que cante,
Nem galinha que cacareje!

Santa Bárbara bendita,
Que no céu estás escrita
Com papel e água benta,
Abrandai esta tormenta!

Santa Bárbara!
Santa Bárbara!
Santa Bárbara!
Santa Bárbara!
Santa Bárbara!

Santa Bárbara bendita,
Que no céu estás escrita
Com papel e água benta,
Abrandai esta tormenta!

Que não haja pão, nem vinho,
Nem flor de rosmaninho,
Nem galo que cante,
Nem galinha que cacareje!

Letra: Oração tradicional
Música: César Prata
Arranjo: César Prata e Vânia Couto
Intérprete: César Prata e Vânia Couto
Versão original: César Prata e Vânia Couto (in CD “Rezas, Benzeduras e Outras Cantigas”, Sons Vadios, 2019)

Santa Barburinha bendita

[ Bendito e Louvado das Trovoadas ]

— «Santa Barburinha bendita,
Livrai-nos das trovoadas!
Lev’as p’ra bem longe!

Santa Barburinha bendita,
Com um ramo de água benta
Arramai esta tormenta.»

Santa Bárbara pequenina
Se vestiu e se calçou,
Bordão na mão tomou.

— «Onde vais, Santa Barburinha,
Que no céu estais escrita?»
— «Eu vou p’ra bem longe!

Vou correr esta trovoada
Onde não há pão e vinho,
Nem bafo de menino!

Só a serpente e as sete filhas
Bebem leite de maldição
E água de trovão.»

Letra e música: Tradicional (Penha Garcia, Idanha-a-Nova, Beira Baixa)
Recolha: Ernesto Veiga de Oliveira
Intérprete: Segue-me à Capela
Primeira versão de Segue-me à Capela (in Livro/CD “San’Joanices, Paganices e Outras Coisas de Mulher”, Segue-me à Capela/Fundação GDA/Tradisom, 2015)

Santo António milagroso

[ Responso a Santo António ]

Santo António milagroso,
Filho de Deus poderoso,
Pelos hábitos que vestiste,
Pelos cordões que existem,
Pelos rosários que rezaste,
Pelos sagrados caminhos andaste,
Com Jesus Cristo te encontraste.
Jesus Cristo vos disse:
— «Beato Santo António, onde vais?»
— «Com Jesus quero ir.»
— «Comigo não virás. Na Terra ficarás.
E as coisinhas perdidas
Todas tu encontrarás.
Não morrerá mulher de parto,
Nem boizinho do arado,
Nem cavalo da estrebaria,
Quem disser esta oração:
Um pai-nosso e ave-maria.

E as coisinhas perdidas
Todas tu encontrarás.
Não morrerá mulher de parto,
Nem boizinho do arado,
Nem cavalo da estrebaria,
Quem disser esta oração:
Um pai-nosso e ave-maria.

Letra: Oração tradicional
Música: César Prata
Arranjo: César Prata e Vânia Couto
Intérprete: César Prata e Vânia Couto
Versão original: César Prata e Vânia Couto (in CD “Rezas, Benzeduras e Outras Cantigas”, Sons Vadios, 2019)

Gileno Santana

Canções com histórias

Letras

A grande nau Catrineta

[ Cantiga de levantar ferro ]

A grande nau Catrineta
Tem os seus mastros de pinho.
Ai lé, ai lé,
Marujinho, bate o pé.
O ladrão do despenseiro
Furtou a ração do vinho.
Ai lé, ai lé,
Marinheiro, vira à ré.

Antes de caçar as gáveas,
Põe-se o ferro sempre a pique.
Ai lé, ai lé,
Cada qual mostra o que é.
Para a nau ficar a nado
Abrem-se as portas ao dique.
Ai lé, ai lé,
Chega tudo cá p’rá ré.

Quando as gáveas vão aos rizes,
A maruja talha o lais.
Ai lé, ai lé,
Quem é moiro não tem fé.
Sobem dois a impunir,
A rizar sobem os mais.
Ai lé, ai lé,
Tu com tu, e cré com cré.

Quando o barco faz cabeça,
Ala braços, iça a giba.
Ai lé, ai lé,
Vai de longo que é maré.
Quando ele arranca o ferro,
Vira então de leva arriba.
Ai lé, ai lé,
Vira mar e San José.

E de usança, ao quarto d’alva,
Matar na coberta o bicho.
Ai lé, ai lé,
Deixa a maca, põe a pé.
Antes da baldeação,
Varre o moço, apanha o lixo.
Ai lé, ai lé,
Peito à barra, finca o pé.

Todo o barco que anda a corso
Caça outro que se veja.
Ai lé, ai lé,
Muito cafre tem Guiné.
E todo o moço do convés
Caça a isca na bandeja.
Ai lé, ai lé,
Mazagão não é Salé.

Letra: Autor desconhecido (possivelmente do séc. XVII)
Música: Francisco Pimenta
Intérprete: O Baú com Sebastião Antunes (in CD “Achega-te”, O Baú, 2012)

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Meloteca, recursos musicais criativos para crianças, professores, educadores e animadores

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A história que a gente vos quer contar

[ Travessa do Poço dos Negros ]

A história que a gente vos quer contar
Aconteceu um dia em Lisboa
Aonde o tempo corre devagar

Chegámos era cedo à ribeira
Ainda todo o peixe respirava
E a outra carga aos poucos definhava

O gemido do cordame das amarras
Juntava-se ao lamento dos porões
E o que nos chega fora são canções

A gente viu sair uma outra gente que dançava
Um estranho bailado em tom dolente
Marcado pelo bater das correntes

Anda linda
Vamos p’ra ver se é verdade
Que lá se pode ouvir cantar
Anda linda
Vamos ao poço dos negros
P’ra ver quem pode lá morar

Mais tarde fomos ter àquela parte da cidade
Que é mais profunda do que a maré baixa
E a Lua só visita por vaidade

De novo a estranha moda se dançava
Agora com suspiros de saudade
Agora com bater de corações

Anda linda
Vamos p’ra ver se é verdade
Que lá se pode ouvir cantar
Anda linda
Vamos ao poço dos negros
P’ra ver quem pode lá morar

Batiam com as barrigas e roçavam-se nas coxas
Os corpos já dourados de suor
E as bocas já vermelhas dos amores

Quisemos nós saber qual era o nome desta moda
Respondeu-nos um velho já mirrado:
Lundum, mas se quiserem chamem Fado

Anda linda
Vamos p’ra ver se é verdade
Que lá se pode ouvir cantar
Anda linda
Vamos ao poço dos negros
P’ra ver quem pode lá morar

Letra: Luís Represas
Música: João Gil
Intérprete: Trovante (in “Trovante 84”, EMI-VC, 1984; reed. 1988)

Reciclanda

Reciclanda

O projeto Reciclanda promove a reutilização, reciclagem e sustentabilidade desde idade precoce.

Com música, instrumentos reutilizados, poesia e literaturas de tradição oral, contribui para o desenvolvimento global da criança e o bem estar dos idosos. Faz ACD e ALD (formações de curta e longa duração), realiza oficinas de música durante o ano letivo e dinamiza atividades em colónias de férias. Municípios, Escolas, Agrupamentos, Colégios, Festivais, Bibliotecas, CERCI, Centros de Formação, Misericórdias, Centros de Relação Comunitária, podem contratar serviços Reciclanda.

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António José Ferreira
962 942 759

Ai apertem os cintos

[ Corpo Inteiro ]

Ai apertem os cintos, vamos começar
Vou contar uma história de desencantar
Eram quatro donzelas a olhar o Sol
Cada qual em busca do amor
Procurando saber o que arde sem se ver
Se é a dor ou se é o prazer

A primeira caiu num sono fatal
À espera que um sapo a salvasse do mal
A segunda abalou nas ondas do mar
Nunca mais veio p’ra contar
A terceira, devota subiu aos céus
Uma voz que fugiu do lugar

Vou contar uma história de desencantar
Eram quatro donzelas presas pelo olhar
Já três delas se foram por causa do amor
Como carne que estilhaçou
Se o que arde não cura e o desejo é fartura
Só a quarta é que se salvou

Vou contar uma história de desencantar
Vi a quarta donzela que olhava p’ra o mar
De improviso cantava para o último sol
A mais doce feitiçaria
Quatro flores cortadas e ela não murchou
E das febres fez alegria

Letra: Miguel Cardina
Música: Pedro Damasceno e Julieta Silva
Arranjo: Diabo a Sete e Julieta Silva
Intérprete: Diabo a Sete (in CD “Figura de Gente”, Sons Vadios, 2016)

Alguém viu a sereia

[ Canto de Embalar ]

Alguém ouviu a sereia,
Ouviu de noite cantar:
Andava à noite à candeia,
Andava à noite no mar.

Eu fui contigo ao inferno,
Fomos ao fundo do mar;
Oh, meu amor que eu mais amo,
Deixa-me eu te embalar!

Uma, duas ou três…
Tantas não sei contar;
Eu sei lá quantas vezes
Sai um barco p’ra o mar!
Mas à noite há segredos,
Deixa-me eu te embalar.

Uma, duas ou três…
Tantas não sei contar;
Eu sei lá quantas vezes
Sai um barco p’ra o mar!
Mas à noite há segredos,
Deixa-me eu te embalar.

Letra: Pedro Ayres Magalhães
Música: Carlos Paredes
Intérprete: Mariana Abrunheiro (in livro/CD “Cantar Paredes”, Mariana Abrunheiro/BOCA – Palavras Que Alimentam, 2015)

Beatriz foi à praça

[ Beatriz e João ]

Beatriz foi à praça para comprar o pão,
Pela manhã se arregaça, para a vida vencer
E, na cama deitado de ressaca, o João
Chegou embriagado, deitou tudo a perder

Beatriz sai porta fora, o João fica a chorar
Diz que se vai embora se isto continuar

Mulher feliz namora e não quer chorar
Não deixes ir embora quem te quer namorar!

O João volta a casa e promete mudar
Beatriz desconfia, tentando acreditar
Dedicou-se à mulher, entregou-se a valer
Mas ela sabe o que quer e não se quer perder

João sai porta fora, Beatriz fica a chorar
Diz que se vai embora se isto continuar

Homem feliz namora e não quer chorar
Não deixes ir embora quem te quer namorar!

Beatriz chama o João, com tanto p’ra discutir
Quis ouvir olhando nos olhos o João dizendo que não vai repetir
O João prometeu, pediu-lhe para acreditar
Beatriz respondeu: “Tudo bem, mas vou-me embora se isto continuar…”

Mulher feliz namora e não quer chorar
Não deixes ir embora quem te quer namorar!

Homem feliz namora e não quer chorar
Não deixes ir embora quem te quer namorar!

Letra e música: Luís Pucarinho
Intérprete: Luís Pucarinho* (in CD “SaiArodada”, Luís Pucarinho/Alain Vachier Music Editions, 2018)

De um trapo velho

[ Cinco Vidas ]

De um trapo velho fiz
cinco saias que querem rodar
Num pano branco cosi
cinco bolsos para te levar

De saco às costas parti
sem saber se ia voltar
Cabeça erguida
e olhos de quem quer olhar

Pus-te na minha mão
cinco dedos para me escapar
O mundo deu-me então
cinco vidas para me curar

E lá do bolso de trás
perguntaste se ainda podias falar
Cabeça erguida, respondi:
tanto me faz

Pela estrada andei
quantas voltas eu dei
sem encontrar
um motivo para voltar

De um trapo velho fiz
cinco saias que querem rodar
Num pano branco cosi
cinco bolsos para te levar

E lá do bolso de trás
perguntaste quando ia parar
Cabeça erguida, respondi:
até ter paz

Pela estrada andei
quantas voltas eu dei
sem encontrar
um motivo para voltar

tanto me faz
até ter paz

Letra: Eugénia Ávila Ramos
Música: Tiago Oliveira
Intérprete: Rua da Lua* (in CD “Rua da Lua”, Rua da Lua, 2016)

Deram-me uma burra

[ Cantiga da Burra ]

Deram-me uma burra que era mansa
Que era brava
Toda bem-parecida
Mas a burra não andava
A burra não andava
Nem p’rá frente nem p’ra trás
Muito eu lhe ralhava
Mas eu não era capaz
Eu não era capaz de fazer a burra andar
Passava do meio-dia e eu a desesperar
E eu a desesperar
Ai que desespero o meu
Falei-lhe num burrico
E a burra até correu

Deram-me uma burra que era mansa
Que era brava
Toda bem-parecida
Mas a burra não andava
A burra não andava
Nem p’rá frente nem p’ra trás
Muito eu lhe ralhava
Mas eu não era capaz
Eu não era capaz de fazer a burra andar
Passava do meio-dia e eu a desesperar
E eu a desesperar
Ai que desespero o meu
Falei-lhe num burrico
E a burra até correu

Letra e música: Sebastião Antunes, Manuel Meirinhos, Paulo Meirinhos, Alexandre Meirinhos e Paulo Preto
Arranjo: Luís Peixoto
Intérprete: Sebastião Antunes e a Quadrilha com Galandum Galundaina (in CD “Com Um Abraço”, Vachier & Associados, 2012)

Deu-se agora

[ Casório Divertido ]

Deu-se agora, há pouco tempo,
Um casório divertido:
A noiva mais que danada,
Lá pela noite adiantada,
Arrancou o nariz ao marido.

É o que acontece aos velhos
Que procuram mocidade…
Quando se despiu deitou
E o nariz lhe arrancou
Por não fazer a vontade.

Procuraram-lhe as vizinhas:
— «Que fizeste ao teu Viriato?»
— «Dormir com homem e ter frio,
Dormir com homem e ter frio,
Vale mais dormir com gato!»

Foi consultar o doutor,
Disse-lhe que não tinha cura;
E agora, por qualquer lado,
A chorar o desgraçado,
Faz uma triste figura.

Letra e música: Tradicional (Aldeia do Bispo, Guarda, Beira Alta)
Informante: Júlia Costa Fonseca
Recolha: Américo Rodrigues
Intérpretes: Ariel Ninas & César Prata (in CD “Cantos de Cego da Galiza e Portugal”, aCentral Folque, 2016)

Ele vinha sem muita conversa

[ Minha História ]

Ele vinha sem muita conversa, sem muito explicar
Eu só sei que falava e cheirava e gostava de mar
Sei que tinha tatuagem no braço e dourado no dente
Minha mãe se entregou a esse homem perdidamente

Ele assim como veio partiu não se sabe p’ra onde
E deixou minha mãe com o olhar cada dia mais longe
Esperando, parada, pregada na pedra do porto
Com seu o único velho vestido cada dia mais curto

Quando enfim eu nasci, minha mãe embrulhou-me num manto
Me vestiu como se eu fosse assim uma espécie de santo
Mas por não se lembrar de acalantos, a pobre mulher
Me ninava cantando cantigas de cabaré

Minha mãe não tardou a alertar toda a vizinhança
A mostrar que ali estava bem mais que uma simples criança
E não sei bem se por ironia ou se por amor
Resolveu me chamar com o nome do Nosso Senhor

Minha história é esse nome que ainda carrego comigo
Quando vou bar em bar, viro a mesa, berro, bebo e brigo
Os ladrões e as amantes, meus colegas de copo e de cruz
Me conhecem só pelo meu nome de Menino Jesus

Letra: Chico Buarque, a partir da letra original de Paola Pallotino para a canção “4 marzo 1943”
Música: Lucio Dala
Intérprete: Pensão Flor
Versão discográfica de Pensão Flor (in CD “O Caso da Pensão Flor”, Pensão Flor/Brandit Music, 2013)
Primeira versão de Chico Buarque (in LP “Construção”, Philips, 1971, reed. Philips, 1988, Universal Music, 2017)
Versão original: Lucio Dala (in LP “Storie di Casa Mia”, RCA Italiana, 1971, reed. RCA/BMG Ricordi, 1996)

Estava difícil combinar um café

[ Sabes? Eu Também ]

Estava difícil combinar um café, mas desta vez lá foi
Talvez possamos falar do que já lá vai, que às vezes ainda dói
Da coragem esquecida que já se perdeu
Quem deixou por dizer: foste tu ou fui eu?
Da lembrança guardada num canto qualquer
Da palavra apagada por não se entender
E dizer-te num gesto mais enternecido:
“Sabes? Eu também… ando um bocado perdido.”

Vou preparar-te um jantar. Com certeza, vou ser original
E vou escolher-te um bom vinho. Tu sabes, nunca me saí mal
E falar-te das voltas que a vida trocou
Das verdades que o tempo já entrelaçou
Entre sonhos queimados lançados ao vento
Entre a cor de um sorriso e o tom de um lamento
E dizer-te de um sopro empurrado pela sorte:
“Sabes? Eu também… ando um bocado sem norte.”

Olha, não fiz sobremesa. Deixa lá, fica p’ra a outra vez
Vamos deixar mais um copo ao falar dos quês e dos porquês
Uma história que nos apeteça lembrar
Um episódio que nunca nos deu p’ra contar
Um segredo guardado p’lo cair do pano
Um encontro marcado no cais de um engano
E dizer-te na hora em que a voz fraquejar:
“Sabes? Eu também… me apetece chorar.”

E vou chamar um táxi. É hora p’ra te levar a casa
Era suposto um de nós nesta altura ficar com a alma em brasa
Mas a vida é assim, não aconteceu
Pouco importa dizer: foste tu ou fui eu?
O que importa é o abraço que estava por dar
Há-de haver uma próxima e mais um jantar
E dizer-te a sorrir: “Já passa das três,
Dorme bem! E, quem sabe?, um dia talvez…”

Um dia talvez…
Um dia talvez…
Um dia talvez…

Letra e música: Sebastião Antunes
Arranjo: Miguel Veras
Intérprete: Sebastião Antunes (in CD “Singular”, Sebastião Antunes & Quadrilha/Alain Vachier Music Editions, 2017)
Versão original: Sebastião Antunes (in CD “Cá Dentro”, Vachier & Associados, 2009)

Estavam todas juntas

[ Ronda das Mafarricas ]

Estavam todas juntas
Quatrocentas bruxas
À espera, à espera
À espera da lua cheia

Estavam todas juntas
Veio um chibo velho
Dançar no adro
Alguém morreu

Arlindo coveiro
Com a tua marreca
Leva-me primeiro
Para a cova aberta

Arlindo, Arlindo
Bailador das fadas
Vai ao pé coxinho
Cava-me a morada

Arlindo coveiro
Cava-me a morada
Fecha-me o jazigo
Quero campa rasa

Arlindo, Arlindo
Bailador das fadas
Vai ao pé coxinho
Cava-me a morada

Letra: António Quadros (pintor)
Música: José Afonso
Intérprete: José Afonso (in “Cantigas do Maio”, Orfeu, 1971, reed. Movieplay, 1987)

Eu que me comovo

[ Bolero do Coronel Sensível Que Fez Amor em Monsanto ]

Eu que me comovo
Por tudo e por nada
Deixei-te parada
Na berma da estrada
Usei o teu corpo
Paguei o teu preço
Esqueci o teu nome
Limpei-me com o lenço
Olhei-te a cintura
De pé no alcatrão
Levantei-te as saias
Deitei-te no banco
Num bosque de faias
De mala na mão
Nem sequer falaste
Nem sequer beijaste
Nem sequer gemeste
Mordeste, abraçaste
Quinhentos escudos
Foi o que disseste
Tinhas quinze anos
Dezasseis, dezassete
Cheiravas a mato
À sopa dos pobres
A infância sem quarto
A suor a chiclete
Saíste do carro
Alisando a blusa
Espiei da janela
Rosto de aguarela
Coxa em semifusa
Soltei o travão
Voltei para casa
De chaves na mão
Sobrancelha em asa
Disse: “fiz serão”
Ao filho e à mulher
Repeti a fruta
Acabei a ceia
Larguei o talher
Estendi-me na cama
De ouvido à escuta
E perna cruzada
Que de olhos em chama
Só tinha na ideia
Teu corpo parado
Na berma da estrada
Eu que me comovo
Por tudo e por nada

Letra: António Lobo Antunes
Música: Vitorino
Intérprete: Vitorino (in CD “Eu Que me Comovo por Tudo e por Nada”, EMI-VC, 1992)

Façam roda

[ Conto do Bicho Papão ]

Façam roda a ver quem vai ao meio
cada um com seu par, tira a pedrinha
ciruma, acabei eu primeiro
ficas tu a tapar, não dá madrinha
já ninguém te pergunta quantos queres
já não ouves ninguém contar: um, dó, li, tá
afinal qual é o dedo que preferes
quem está livre, livre está

Ninguém fala do homem do saco
ninguém espreita por baixo do colchão
já ninguém acredita na côca
nem no bicho papão

Salta à corda, joga à barra do lenço
adivinha o que eu penso, dá a partida
falua, quem acerta na malha
danada da canalha está fugida
salta ao eixo a fugir à cabra cega
olha o meu pião, mas eu não to dou não
onde é que anda a viuvinha que não chega?
E a sardinha a dar na mão

Ninguém fala do homem do saco
ninguém espreita por baixo do colchão
já ninguém acredita na côca
nem no bicho papão

Ai se eu pudesse habitar
um jogo electrónico
voltava a ser falado,
voltava a assustar
imaginem lá qual não era a sensação
de uma consola
com o jogo do regresso do papão

Ninguém fala do homem do saco
ninguém espreita por baixo do colchão
já ninguém acredita na côca
nem no bicho papão

Letra e música: Sebastião Antunes
Intérprete: Quadrilha (in CD “Entre Luas”, Ovação, 1997)

Não sei se tinha chegado

[ Rapariga da Estação ]

Não sei se tinha chegado,
Se porventura partia…
Mas tinha um lugar sentado
E reparei no que lia.

Cabelos negros caídos
– Longos, lisos, deprimidos –
Escondem o decote ousado
Do seu cinzento vestido.

Não consegui dizer nada,
Preferi que fosse assim:
Antes só que acompanhada
Mesmo que seja por mim.

Condição de quem resiste:
Abandono, solidão…
Tão inspiradora e triste
Rapariga da estação.

Não consegui dizer nada,
Preferi que fosse assim:
Antes só que acompanhada
Mesmo que seja por mim.

Condição de quem resiste:
Abandono, solidão…
Tão inspiradora e triste
Rapariga da estação.

Letra e música: Duarte
Intérprete: Duarte* (in CD “Só a Cantar”, Duarte/Alain Vachier Music Editions, 2018)

Ia eu pelo concelho de Caminha

[ Coro das Velhas ]

Ia eu pelo concelho de Caminha
quando vi sentada ao sol uma velhinha
curioso, uma conversa entabulei
como se diz nuns romances que eu cá sei

Chamo-me Adozinha, disse, e tenho já
os meus 84 anos, feitos há
mês e meio, se a memória não me falha
mas inda vou durar uns anos, Deus me valha

Com esta da austeridade, meu senhor
nem sequer dá para ir desta pra melhor
os funerais estão por um preço do outro mundo
dá pra desistir de ser um moribundo

Rabugenta, eu? Não senhor
eu hei-de ir desta pra melhor
mas falo pelos que eu cá deixo
não é por mim que eu me queixo
não é por mim que eu me queixo

Ó Felisbela, ó Felismina
ó Adelaide, ó Amelinha
ó Maria Berta, ó Zulmirinha
vamos cantar o coro das velhas?
Vamos!

Cá se vai andando
co’a cabeça entre as orelhas

Não sei ler nem escrever mas não me ralo
alguns há que até a caneta lhes faz calo
é só assinar despachos e decretos
p’ra nos dar a ler a nós, analfabetos

E saúde tenho p’ra dar e vender
não preciso de um ministro para ter
tudo o que ele anda a ver se me pode dar
pode ir ele para o hospital em meu lugar

E quanto a apertar cinto, sinto muito
filosofem os que sabem lá do assunto
mas com esta cinturinha tão delgada
inda posso ser de muitos namorada

Rabugenta, eu? Não senhor
eu hei-de ir desta pra melhor
mas falo pelos que eu cá deixo
não é por mim que eu me queixo
não é por mim que eu me queixo

Ó Felisbela, ó Felismina
ó Adelaide, ó Amelinha
ó Maria Berta, ó Zulmirinha
vamos cantar o coro das velhas?
Vamos!

Cá se vai andando
co’a cabeça entre as orelhas

E se a morte mafarrica, mesmo assim
me apartar das outras velhas, logo a mim
digo ao Diabo, “não te temo, ó camafeu
conheci piores infernos do que o teu”

Rabugenta, eu? Não senhor
eu hei-de ir desta pra melhor
mas falo pelos que eu cá deixo
não é por mim que eu me queixo
não é por mim que eu me queixo

Ó Felisbela, ó Felismina
ó Adelaide, ó Amelinha
ó Maria Berta, ó Zulmirinha
vamos cantar o coro das velhas?
Vamos!

Cá se vai andando
co’a cabeça entre as orelhas

Letra e música: Sérgio Godinho
Intérprete: Sérgio Godinho (in “Salão de Festas”, Philips/Polygram, 1984; “Era Uma Vez Um Rapaz”, Philips/Polygram, 1985; “Noites Passadas: O Melhor de Sérgio Godinho (ao vivo)”, EMI-VC, 1995)

No centro da Avenida

[ Teresa Torga ]

No centro da Avenida,
No cruzamento da rua,
Às quatro em ponto, perdida
Dançava uma mulher nua.

A gente que via a cena
Correu para junto dela
No intuito de vesti-la,
Mas surge António Capela

Que aproveitando a barbuda
Só pensa em fotografá-la.
Mulher na democracia
Não é biombo de sala.

Dizem que se chama Teresa,
Seu nome é Teresa Torga;
Muda o pick-up em Benfica
E atura a malta da borga.

Aluga quartos de casa
Mas já foi primeira estrela;
Agora é modelo à força
Que o diga António Capela.

T’resa Torga, T’resa Torga
Vencida numa fornalha!
Não há bandeira sem luta,
Não há luta sem batalha!

T’resa Torga, T’resa Torga
Vencida numa fornalha!
Não há bandeira sem luta,
Não há luta sem batalha!

Letra e música: José Afonso
Intérprete: Ana Laíns
Versão discográfica de Ana Laíns (in CD “Portucalis”, Ana Laíns/Seven Muses, 2017)
Versão original: José Afonso (in LP “Com as Minhas Tamanquinhas”, Orfeu, 1976, reed. Movieplay, 1987, 1996, Art’Orfeu Media, 2012)

No mercado da Ribeira

[ O Namorico da Rita ]

No mercado da Ribeira
há um romance de amor
entre a Rita que é peixeira
e o Chico que é pescador

Sabem todos os que lá vão
que a Rita gosta do Chico
só a mãe dela é que não
consente no namorico

Quando ele passa por ela
ela sorri descarada
porém, o Chico à cautela
não dá trela nem diz nada

Que a mãe dela quando calha
ao ver que o Chico se abeira
por dá cá aquela palha
faz tremer toda a Ribeira

Namoram de manhãzinha
e da forma mais diversa
dois caixotes de sardinha
dão dois dedos de conversa

E há quem diga à boca cheia
que depois de tanta fita
o Chico de volta e meia
prega dois beijos na Rita

Quando ele passa por ela
ela sorri descarada
porém o Chico à cautela
não dá trela nem diz nada

Que a mãe dela quando calha
ao ver que o Chico se abeira
por dá cá aquela palha
faz tremer toda a Ribeira

Letra: Artur Ribeiro
Música: António Mestre
Intérprete: Amália Rodrigues (1946; 1958) (in CD “Fado Amália”, Movieplay, 1998)

No Sábado eu fui

[ O café da Sãozinha ]

No Sábado eu fui
beber o meu fino
ali ao café da Sãozinha
e lá a conversa por mais quieta
chega sempre à cozinha

O prato do dia
junto trazia o caso de uma senhora
Que disse ter visto a Zaida
sair de mão dada
com o Zé do Candal

E o morcão do homem dela
de barba à janela
A ler o jornal
E por entre tintos e brancos
Bagaços sandes de presunto
Como àgua a correr
de mesa pra mesa rodava o assunto

Sem se fazer caso
era vê-lo crescer
O irmão do barbudo
até então mudo
deixa sair uma posta
que a gaja é uma sostra
não faz nenhum
e sabe bem do que gosta
O Rui dos Guindais
que conhece os pais
chegou-se mais ao balcão
E de mão em concha confessa
que ele é uma peça
e não tem posição
que estoura o guito no casino
e em casa o menino
alimenta-se a pão
E por entre tintos e brancos
Bagaços sandes de presunto
Como água a correr
de mesa pra mesa
rodava o assunto
Sem se fazer caso
era vê-lo crescer
O homem da São
conhece a canção
e tira da manga a manilha
saca da raquete
e atira o filete
prós ouvidos da filha
eu sempre te disse
desta família
não há um que se aproveite
esquece o Candal ó Tininhas
e não queres ver
a madeira a queimar
se um anda perdido no jogo
o outro há de ter fogo
para a gente apagar
E por entre tintos e brancos
Bagaços sandes de presunto
Como água a correr
de mesa pra mesa
rodava o assunto

Sem se fazer caso
era vê-lo crescer
O Gusto do talho
pai da Zaidinha
chega e pede um cimbalino
E o Tó do café
faz conversa a ré
e encosta o pente fino
A São que sabia que na cantoria
não tinha sido a primeira
falou afiando as facas
O que há mais é vacas
E bois a pastar

O António estava como a cal
implorando a Jesus
para a São se calar

E por entre tintos e brancos
Bagaços sandes de presunto
Como água a correr
de mesa p’ra mesa
rodava o assunto
Sem se fazer caso
era vê-lo crescer

Letra: Manel Cruz
Música: Gileno Santana
Voz: Vitorino Salomé

Nem Sequer Dei por Isso

Pelo fim da tarde tu sais do emprego
E eu não sei porque é que aqui vim parar
É assim um desassossego
Tento ir sempre onde possas estar

Por sorte tu até sorris
E nem sequer me vens com muitos ‘porquês’
E dizes com um certo ar feliz:
“Com que então, por aqui outra vez?”

Num parque ao domingo
P’lo meio da cidade
Ou num café ao entardecer

Será que é mentira?
Será que é verdade?
Mas o que é que me está acontecer?

Já sei! Não há explicação
A cabeça está num reboliço
Se calhar apaixonei-me por ti
E nem sequer dei por isso

Ao virar da esquina, em qualquer transporte
Acabamos sempre por nos cruzar
E eu acho um caso de sorte
Cada vez que te posso encontrar

Está-me a correr bem, já ganhei o dia
Só porque me dissestes um “olá!”
E gosto da tua ironia
Se perguntas mais uma vez: “Por cá?”

Mensagem trocada, gesto embaraçado
Lá vou eu outra vez a planar
Desculpa, desculpa! Foi número errado
Mas ficamos uma hora a falar

Já sei! Não há explicação
A cabeça está num reboliço
Se calhar apaixonei-me por ti
E nem sequer dei por isso

Tanto melhor quando não se espera
E era bom que fosse como imaginei

Já sei! Não há explicação
A cabeça está num reboliço
Se calhar apaixonei-me por ti
E nem sequer dei por isso

Já sei! Não há explicação
A cabeça está num reboliço
Se calhar apaixonei-me por ti
E nem sequer dei por isso

Letra e música: Sebastião Antunes
Intérprete: Sebastião Antunes & Quadrilha (in CD “Perguntei ao Tempo”, Sebastião Antunes/Alain Vachier Music Editions, 2019)

Sebastião Antunes, TV Sintra

Sebastião Antunes, TV Sintra

P’lo artigo cento e tal

[ Fado Jurídico-Criminal ]

P’lo artigo cento e tal
Da regra dos bons costumes,
A maçã do senhor Nunes
É um bem celestial.

Estão a postos os jurados,
Numa sala as testemunhas;
O arguido rói as unhas,
Os juízes descansados.

«Não fui eu, foi a Serpente!
Não sei mais o que lhes diga!»
«Isso é história muito antiga
Contada por toda a gente».

«Comi por ter muita fome»,
Suplicou o acusado,
«Sou órfão de pai e mãe
E estou desempregado.»

«Quantos anos, p’ra que constem?»,
Perguntou o presidente;
«Oitenta feitos ontem»,
O meirinho diligente.

«O senhor não tem vergonha
De ter fome àquela hora?
Mas que vício ou que peçonha
O não deixou vir embora?»

«Já me custa muito a andar
E o que eu quero já me esquece…
Fui vítima de maus tratos
E não tinha GPS!»

«Não pense que nos engana,
É suprema esta questão:
A maçã que aqui se trata
É a Civilização!

E que sorte tem o senhor
Demandado nesta liça,
Que tem pago defensor,
Que a tremer pediu justiça.

«Vai o réu, pois, condenado
À pena mais capital!»
Disse o último jurado:
«Esconjurado está o mal!»

Tudo está no seu lugar:
A maçã dos bons costumes,
A árvore que é do Nunes,
Os polícias a acenar.

O arguido p’rá cadeia,
A cadeia a transbordar;
O meirinho p’ró IKEA,
Os juízes a jantar.

O meirinho p’ró IKEA,
Os juízes a jantar.

Letra: João Gigante-Ferreira
Música: André Teixeira
Intérprete: Helena Sarmento
Versão original: Helena Sarmento (in CD “Lonjura”, Helena Sarmento, 2018)

Quando entrei no restaurante

Quando entrei no restaurante
Que muitas vezes frequento
Testemunhei sem querer
O que em seguida comento

Estava à mesa uma família
Todos muito bem vestidos
Quando veio o empregado
P’ra recolher os pedidos

Notou-se um amor profundo
Bonito de apreciar
Mostrava-se ali ao mundo
Uma família exemplar

A decisão foi veloz
O menu nem foi olhado
Duas pizzas e um hamburguer
E foi o caso encerrado

E sem mais tempo perder
Os adultos e o fedelho
Com enorme agilidade
Sacaram do aparelho

Nota-se um amor profundo
Não há nada p’ra falar
Cada qual está no seu mundo
É uma família exemplar

O pai no seu telemóvel
Vê novidades da bola
E o filho entusiasmado
Mata zombies na consola

A mãe no motor de busca
Procura com precisão
A novelinha patusca
Que vai curtir ao serão

Nota-se um amor profundo
Que há harmonia no lar
Cada qual está no seu mundo
É uma família exemplar

No afã nos polegares
Num repasto a bom teclar
Nem uma simples palavra
Lograram articular

Por fim a pensar fiquei
Sem deixar de me afligir
Que raio de sociedade
Estamos nós a construir?

Notou-se um amor profundo
Que há-de frutificar
Com cada um no seu mundo
Temos um mundo exemplar

Aníbal Raposo, Forum Elos – Diálogos, 25 de junho de 2021

“(Acabado de fazer. Vou musicar)”

Uma velha, muito velha

[ Diabo da Velha ]

Uma velha, muito velha,
Veio aqui à minha aldeia
Com um saco pelas costas
Para fazer uma venda;
E o povo lá pedia…
Mas comprava o que não queria.

Foi para o largo apregoar:
«– Quem quer, quem quer?
Quem quer vir cá comprar
Belas coisas que aqui trago
Neste saco abençoado?
Venham que eu vendo barato!»

Fui lá ver o que ela tinha,
Queria eu uma sardinha;
Disse-me ela que não tinha
Mas que antes me vendia
Uma tampa de panela,
Ai o diabo da velha!

«– Oiça lá, ó menina,
P’ra que quer uma sardinha
Que até traz uma espinha
Que lhe pode fazer mal?
Antes disso leve a tampa
Que foi de nobre panela!
Pode confiar na velha,
Faço preço especial!»

Fui comprar eu a tampa:
Para que serve sem panela?!
Fui enganada, que tola!,
Pelo diabo da velha.

Uma velha, muito velha,
Veio aqui à minha aldeia
Com um saco pelas costas
Para fazer uma venda;
E o povo lá pedia…
Mas comprava o que não queria.

Foi para o largo apregoar:
«– Quem quer, quem quer?
Quem quer vir cá comprar
Belas coisas que aqui trago
Neste saco abençoado?
Venham que eu vendo barato!»

Voltei eu àquela venda:
Desta vez não caio, não!
Queria eu uma saia
Mas fez ela promoção:
Comprei quatro colchões,
Ai que bela ocasião!

«– Oiça lá, ó menina,
P’ra que quer uma saia
Que lhe dá ventos debaixo?
Ainda fica constipada…
Pela cara está cansada,
Deve andar a dormir mal…
Precisa de um colchão novo:
Vendo quatro ao preço de um.»

Fui comprar que era barato,
Lá caí eu na esparrela:
Vivo só, bastava-me um…
Fui enganada pela velha!

Uma velha, muito velha,
Veio aqui à minha aldeia
Com um saco pelas costas
Para fazer uma venda;
E o povo lá pedia…
Mas comprava o que não queria.

Foi para o largo apregoar:
«– Quem quer, quem quer?
Quem quer vir cá comprar
Belas coisas que aqui trago
Neste saco abençoado?
Venham que eu vendo barato!»

Eu também fui à venda,
Queria eu um serrote;
Vendeu-me ela um cavalo,
Sem saber andar a trote…
Ai o diabo da velha
E a minha triste sorte!

«– Oiça lá, belo moço,
P’ra que quer um serrote
Que sem dentes afiados
Não fazem nem um corte?!
Antes disso, um cavalo
Que sem dentes também corre
P’ra chamar a donzela
Que por certo trará sorte!»

Fui comprar aquele cavalo:
Para que serve sem a sela?!
Ainda nem uma donzela…
Fui enganado pela velha!

Uma velha, muito velha,
Veio aqui à minha aldeia
Com um saco pelas costas
Para fazer uma venda;
E o povo lá pedia…
Mas comprava o que não queria.

Letra e música: Carlos Norton
Intérprete: OrBlua (in Livro/CD “Retratos Cinéticos”, Fungo Azul/Ocarina, 2015)

Vivia num mundo próprio

[ O Músico Que Perdeu os Sapatos ]

Vivia num mundo próprio
onde não entra quem quer;
E se estava ou não sóbrio?
Se era homem ou mulher?
Não tinha que ser assim:
explicar porque aqui vim.

Musica è forma di vita
senza forma stabilita,
senza nessuno che decide
che non sai mai dire no,
senza nessuno che decide
che non sai mai dire no.

De andar sempre à procura,
há quem lhe decida a vida,
que esta coisa de Cultura
já de banal é esquecida.
E se chega a vida dura,
logo parte à despedida.

Lo spettacolo era un viaggio
e una bela fattoria,
naturale era il paesaggio
bela gente finta allegria
una nuvola de estate
tutto quanto poi bagnò.

Sapatos muito molhados
não dá jeito a carregar;
O calor dá pés descalços,
logo os venho aqui buscar.
E não estavam lá, partiram:
e nunca mais já se viram.

Si può perdere il controllo,
anche con la leggerezza,
si può perdere le scarpe
con una certa timidezza.
Ma musicista non ha età
mai perde la dignità.

Perso la notte, perso il dia,
Perso le scarpe e l’allegria.
Perso la notte, perso il dia,
Perso le scarpe e l’allegria.

Perdeu a noite, perdeu o dia,
Perdeu os sapatos e a alegria.
Perdeu a noite, perdeu o dia,
Perdeu os sapatos e a alegria.

Letra: José Barros
Música: José Barros e Mimmo Epifani
Intérpretes: José Barros & Mimmo Epifani*
Versão original: José Barros & Mimmo Epifani (in CD “Mar da Lua”, José Barros/Tradisom, 2015)

Vou falar-vos dum curioso personagem

[ Jeremias, o Fora-da-Lei ]

Vou falar-vos dum curioso personagem, Jeremias, o fora-da-lei
descendente por linha travessa do famigerado Zé do Telhado
Jeremias dedicou-se desde tenra idade ao fabrico da bomba caseira
cuja eloquência sempre o deixou maravilhado

Para Jeremias nada se assemelha à magia da dinamite
a não ser, talvez, o rugir apaixonado das mais profundas entranhas da Terra
e só quando as fachadas dos edifícios públicos explodirem numa gargalhada
será realmente pública a lei que as leis encerram

Há quem veja em Jeremias apenas mais uma vítima da sociedade
muito embora ele tenha a esse respeito uma opinião bem particular
é que enquanto um criminoso tem uma certa tendência natural para ser vitimado
Jeremias nunca encontrou razões p’ra se culpar

Porque nunca foi a ambição nem a vingança o que o levou a desprezar a lei
e jamais lhe passou pela cabeça tentar alterar a Constituição
como um poeta ele desarranja o pesadelo para lá dos limites legais
foragido por amor ao que é belo e por vocação

Jeremias gosta do guarda-roupa negro e dos mitos do fora-da-lei
gosta do calor da aguardente e de seguir remando contra a maré
gosta da maneira como os homens respeitáveis se engasgam quando falam dele
e da forma como as mulheres murmuram: o fora-da-lei

Gosta de tesouros e mapas, sobretudo daqueles que o tempo mais maltratou
gosta de brincar com o destino e nem o próprio inferno o apavora
não estando disposto a esperar que a Humanidade venha alguma vez a ser melhor
Jeremias escolheu o seu lugar do lado de fora

Caravela Vera Cruz

Canções com História

Letras

A flor traz saiinha branca

[ Ai, Flores ]

A flor traz saiinha branca
E amarela chapelinha
A flor traz saiinha branca
E amarela chapelinha
Se a saia, se a saia cair ao chão
Fica a flor mais pobrezinha

Fica a flor mais pobrezinha
Grande é a contradição
Fica a flor mais pobrezinha
Grande é a contradição
Uma coroa, coroa de rainha
Com o reino pelo chão
Uma coroa, coroa de rainha
Com o reino pelo chão

Com o reino pelo chão
Lá se foi quem já não é
Com o reino pelo chão
Lá se foi quem já não é
Lá dançam, lá dançam no terreiro
Os que ficaram de pé

Os que ficaram de pé
São a esperança da monção
Os que ficaram de pé
São a esperança da monção
Lá andam, lá andam na base da coroa
Inventam nova união
Lá andam, lá andam na base da coroa
Inventam nova união

Letra e música: Amélia Muge
Arranjo: António José Martins
Melodia incidental: José Mário Branco
Intérprete: Amélia Muge (in CD “Taco a Taco”, Mercury/Polygram, 1998)

A memória

[ Futuras Instalações ]

A memória faz de ti um povo
Que sabe o que quer.

Esta casa já foi casa
E casa inda vai ser:
As paredes são de pedra,
As janelas p’ra te ver.

Casa velha, bem antiga:
Já foi dos nossos avós;
Muita gente cá viveu
E agora estamos cá nós.

Casa velha, casa nova
Com gente para viver:
Nesta casa e nesta terra
Temos o sol a nascer.

Esta casa há-de ser casa
E casa inda vai ser:
Abram portas e janelas!
Há tanto p’ra fazer!

Casa velha, casa nova,
Casa que gosta de ser:
Vem de um tempo sem idade,
Tem tempo p’ra crescer.

Casa velha, casa nova
Com gente para viver:
Nesta casa e nesta terra
Temos o sol a nascer.

Esta casa há-de ser casa
E casa inda vai ser:
Abram portas e janelas!
Há tanto p’ra fazer!

Casa velha, casa nova,
Casa que gosta de ser:
Vem de um tempo sem idade,
Tem tempo para crescer.

Esta casa há-de ser casa
E casa inda vai ser:
Abram portas e janelas!
Há tanto p’ra fazer!

A memória faz de ti um povo
Que sabe o que quer.

Letra e música: César Prata
Intérprete: César Prata (in CD “Futuras Instalações”, César Prata/RequeRec, 2014)

Acorda, D. João III

[ Postal para D. João III ]

Ao Zeca Afonso

Acorda, João III!
Querem-te roubar a fama:
Um cardeal interesseiro
Pelo Santo Ofício chama.

Diz que vem p’ra nos salvar
Da tentação de Mafoma;
Metido numa redoma,
Jura que é inofensivo.

Traz baú de ordenações,
Cadafalso e sambenito;
Cara de corpo-delito,
Volta o polé p’ràs funções.

Eu, por mim, faço um manguito
Às amas do cardeal!
Vou-te mandar um postal
Com novas dos teus filhotes.

De todos a mais notada,
Com pergaminho d’elite,
Essa bastarda Judite,
Tens-lhe a alma confiada.

Bate-me à porta de noite,
Diz que sou um excomungado:
Mil heresias, culpado,
Carbonário, contumaz,

Diabo, anarquista negro,
Blasfémia não controlada…
Quer saber qual o segredo
Da alma duma granada.

Eu, por mim, faço um manguito…

Letra e música: Vitorino Salomé
Intérprete: Vitorino (in LP “Leitaria Garrett”, EMI/Vecemi, 1984, reed. EMI-VC, 1993; CD “As Mais Bonitas 2: Ao Alcance da Mão”, EMI-VC, 2002, EMI Music Portugal, 2012; 3CD “Tudo”: CD 2 – “Lisboa”, EMI Music Portugal, 2005)

Reciclanda

Reciclanda

O projeto Reciclanda promove a reutilização, reciclagem e sustentabilidade desde idade precoce.

Com música, instrumentos reutilizados, poesia e literaturas de tradição oral, contribui para o desenvolvimento global da criança e o bem estar dos idosos. Faz ACD e ALD (formações de curta e longa duração), realiza oficinas de música durante o ano letivo e dinamiza atividades em colónias de férias. Municípios, Escolas, Agrupamentos, Colégios, Festivais, Bibliotecas, CERCI, Centros de Formação, Misericórdias, Centros de Relação Comunitária, podem contratar serviços Reciclanda.

Contacte-nos:

António José Ferreira
962 942 759

Adeus, Maria

— «Adeus, Maria, até quando,
Eu até quando não sei…
Cá ando no Ultramar, a pensar
No dia em que voltarei.
Espera por mim, se quiseres…
Faz o que tu entenderes;
Acho que deves pensar em casar,
Eu posso por cá morrer.
Ninguém o pode saber,
É uma carta fechada…
E depois te chamarão, pois então,
Viúva sem seres casada.»

— «Ó António, Deus te guie
Nos campos do Ultramar!
Eu penso em ti, cá solteira, há quem queira
Se tu nunca mais voltares.
Espero por ti, meu amor!
Eu d’outro não quero ser!
Nunca mais me casarei, que eu bem sei,
Serei tua até morrer!
A carta que me mandaste
Com um conselho imprudente…
Meu amor, para contigo eu te digo:
‘Inda fiquei mais ardente.»
Meu amor, para contigo eu te digo:
‘Inda fiquei mais ardente.»

Letra: António Pardelha
Música: Monda
Intérprete: Monda com Katia Guerreiro (in CD “Monda”, Monda/Tánaforja, 2016)

Aldeia da Meia-Praia

[ Os Índios da Meia-Praia ]

Aldeia da Meia-Praia
Ali mesmo ao pé de Lagos
Vou fazer-te uma cantiga
Da melhor que sei e faço

De Monte Gordo vieram
Alguns por seu próprio pé
Um chegou de bicicleta
Outro foi de marcha à ré

Quando os teus olhos tropeçam
No voo duma gaivota
Em vez de peixe vê peças
De ouro caindo na lota

Quem aqui vier morar
Não traga mesa nem cama
Com sete palmos de terra
Se constrói uma cabana

Tu trabalhas todo o ano
Na lota deixam-te mudo
Chupam-te até ao tutano
Levam-te o couro cabeludo

Quem dera que a gente tenha
De Agostinho a valentia
Para alimentar a sanha
De esganar a burguesia

Adeus disse a Monte Gordo
(Nada o prende ao mal passado)
Mas nada o prende ao presente
Se só ele é o enganado

Oito mil horas contadas
Laboraram a preceito
Até que veio o primeiro
Documento autenticado

Eram mulheres e crianças
Cada um com o seu tijolo
Isto aqui era uma orquestra
Quem diz o contrário é tolo

E se a má língua não cessa
Eu daqui vivo não saia
Pois nada apaga a nobreza
Dos índios da Meia-Praia

Foi sempre a tua figura
Tubarão de mil aparas
Deixas tudo à dependura
Quando na presa reparas

Das eleições acabadas
Do resultado previsto
Saiu o que tendes visto
Muitas obras embargadas

Mas não por vontade própria
Porque a luta continua
Pois é dele a sua história
E o povo saiu à rua

Mandadores de alta finança
Fazem tudo andar pra trás
Dizem que o mundo só anda
Tendo à frente um capataz

Eram mulheres e crianças
Cada um com o seu tijolo
Isto aqui era uma orquestra
Quem diz o contrário é tolo

E toca de papelada
No vaivém dos ministérios
Mas hão-de fugir aos berros
Inda a banda vai na estrada

Letra e música: José Afonso
Intérprete: José Afonso (in “Com as Minhas Tamanquinhas”, Orfeu, 1976, reed. Movieplay, 1987, 1996)
Outras versões: Vozes da Rádio (in CD “Filhos da Madrugada Cantam José Afonso”, MG Ariola, 1994); Dulce Pontes (in CD “Lágrimas”, Movieplay, 1993); Paula Oliveira e Bernardo Moreira (in CD “Fado Roubado”, Universal, 2007)

Aqui, na Terra

[ Fala do Velho do Restelo ao Astronauta ]

Aqui, na Terra, a fome continua,
A miséria, o luto, e outra vez a fome.
Acendemos cigarros em fogos de napalme
E dizemos amor sem saber o que seja.
Mas fizemos de ti a prova da riqueza
Ou talvez da pobreza, e da fome outra vez,
E pusemos em ti nem eu sei que desejo
De mais alto que nós, e melhor, e mais puro.
No jornal soletramos, de olhos tensos,
Maravilhas de espaço e de vertigem:
Salgados oceanos que circundam
Ilhas mortas de sede, onde não chove.
Mas o mundo, astronauta, é boa mesa
(E as bombas de napalme são brinquedos),
Onde come, brincando, só a fome,
Só a fome, astronauta, só a fome.

Poema: José Saramago (Do ciclo “Poema a Boca Fechada”, in “Os Poemas Possíveis”, Lisboa: Portugália Editora, 1966 – p. 76; “Poesia Completa”, Lisboa: Assírio & Alvim, 2022)
Música: Manuel Freire
Intérprete: Manuel Freire (in CD “As Canções Possíveis: Manuel Freire canta José Saramago”, Editorial Caminho, 1999, reed. Ovação, 2005)

Brites de Almeida

Brites de Almeida,
Mulher sem rumo nem rota,
Guerreira nas horas vagas,
Padeira de Aljubarrota.

Nasceu em Faro
De família pobrezinha
Mas a fama que ela tinha
Era de ser bicho raro.

Ao desamparo,
Gostava de andar à briga,
Dos homens era inimiga:
Varria-os à bordoada.

À cabeçada,
Era forte como um touro;
Tinha um coração de ouro,
Tão temida como amada.

Quando um soldado
Por ela se apaixonou,
Sincero se declarou:
Queria ser seu namorado.

Apaixonado,
Aceitou-lhe as condições:
Lutarem como leões
P’ra ver quem era mais forte;

Mas quis a sorte
Ser o mancebo o mais fraco;
Ela fez dele um cavaco
E o pobre entregou-se à morte.

Brites de Almeida,
Mulher sem rumo nem rota,
Guerreira nas horas vagas,
Padeira de Aljubarrota.

Conta um jogral
Que abalou para Castela,
Embarcou num barco à vela
Para fugir ao Tribunal;

Mas, sem aviso,
Vieram piratas mouros,
Levaram gente e tesouros,
Foi escrava de improviso;

Foi prisioneira,
Mas num gesto triunfal
Fugiu para Portugal,
Acostou à Ericeira;

E caminheira
Partiu sem rumo nem rota,
Foi parar a Aljubarrota,
Teve ofício de padeira.

Mesmo sem querer
Heroína dos enganos:
Foi guerreira sem saber,
Martírio dos castelhanos,

Nuestros hermanos
Levaram com a pá do forno
E partiram sem retorno
Da terra dos Lusitanos.

Brites de Almeida,
Mulher sem rumo nem rota,
Guerreira nas horas vagas,
Padeira de Aljubarrota.

Brites de Almeida,
Seja História ou seja lenda,
Revelou-se na contenda
Modelo de liberdade.

Fazia pão,
Broa de milho e bolos;
Não sabia marcar golos,
Não foi para o Panteão.

Letra: Carlos Guerreiro
Música: Carlos Guerreiro e Sebastião Antunes
Arranjo: Carlos Guerreiro
Intérprete: Gaiteiros de Lisboa
Versão original: Gaiteiros de Lisboa (in CD “Bestiário”, Uguru, 2019)

Brites de Almeida, padeira de Aljubarrota
Brites de Almeida, padeira de Aljubarrota

Cheguei a meio da vida já cansada

[ Caravelas ]

Cheguei a meio da vida já cansada
De tanto caminhar! Já me perdi!
Dum estranho país que nunca vi
Sou neste mundo imenso a exilada.

Tanto tenho aprendido e não sei nada.
E as torres de marfim que construí
Em trágica loucura as destruí
Por minhas próprias mãos de malfadada!

Se eu sempre fui assim este Mar morto:
Mar sem marés, sem vagas e sem porto
Onde velas de sonhos se rasgaram!

Caravelas doiradas a bailar…
Ai quem me dera as que eu deitei ao Mar!
As que eu lancei à vida, e não voltaram!…

Poema: Florbela Espanca (in Livro de Soror Saudade, 1923)
Música: Tiago Machado
Intérprete: Mariza (in CD “Fado Curvo”, Virgin/EMI-VC, 2003)

Cidade de El Jadida

[ Mazagão ]

Cidade de El Jadida,
antiga Mazagão,
foste cidade perdida
sem nunca perder o chão.

És cidade sem tempo,
és o povo que te fez
de um caminhar muito lento
feito de muita altivez.

Mazagão foste, El Jadida és,
cisterna de belo encanto.
Procurei-te de lés-a-lés,
águas calmas do meu pranto.

Não há ninguém como tu

Letra e música: José Barros
Arranjo: José Barros
Intérprete: José Barros e Navegante
Versão original: José Barros e Navegante (in CD “À’Baladiça”, Tradisom, 2018)

Mazagão/Jadida, Marrocos
Mazagão/Jadida, Marrocos

Do longe se faz mais perto

[ Vou Falar Contigo ]

Do longe se faz mais perto
Se perto eu quero estar;
P’ra te ver vou ao deserto,
Volto a tempo do jantar.

Faço como a cotovia
Que canta e vai e vem;
Fico a inventar-te o dia:
Pensas de mim mal ou bem?

No verde do teu perfume,
Nos aromas da lareira,
Vou a salto e não regresso:
Dou um pulo à ribeira.

Vou falar contigo
Do mundo azul,
Nas ondas do mar;
Num cantar de amigo
Invento histórias
P’ra te contar.

Ouvi as canções do mundo
E algumas que fiz p’ra ti:
Mandei-tas pela saudade
De te ver ao pé de mim.

A ouvir o passar do vento
Que traz notas e luas,
Vamos ao saber do tempo
Cantar as notícias tuas.

Vou falar contigo
Do mundo azul,
Nas ondas do mar;
Num cantar de amigo
Invento histórias
P’ra te contar.

Galiza, quem te inventou?
Foram cravos, foram rosas…
Ou o poeta com prosas,
Ou o Zeca já cantou.

Um campo verde passei,
Há muito que te não via…
E acho que te encontrei
Nos versos de Rosalía.

Vou falar contigo
Do mundo azul,
Nas ondas do mar;
Num cantar de amigo
Invento histórias
P’ra te contar.

Vou falar contigo
Num cantar de amigo.

Letra e música: José Barros
Arranjo: José Barros e José Manuel David
Intérprete: Navegante com João Afonso & Amélia Muge (in CD “Meu Bem, Meu Mal”, Tradisom, 2008)

Ea, Judios

Ea, judios,
A enfardelar,
Que mandam los reys
Que passeis la mar!

[Meirinho:]

— Manda El-Rei, nosso Senhor:
[Judeu:]
— Bueno!
[Meirinho:]
— Que se lhe dê:
[Judeu:]
— Mejor!
[Meirinho:]
— Duzentos…
[Judeu:]
— Mil gracias.
[Meirinho:]
— Açoites!
[Judeu:]
— Vá El-Rei a la mierda!

Ea, judios,
A enfardelar,
Que mandam los reys
Que passeis la mar!

— Vá El-Rei a la mierda!

Ea, judios,
A enfardelar,
Que mandam los reys
Que passeis la mar!

Ea, judios,
A enfardelar,
Que mandam los reys
Que passeis la mar!

Letra e música: Popular
Informante: Judith da Silveira Pinto
Recolha: César da Neves e Gualdino de Campos (“A Expulsão dos Judeus”, in “Cancioneiro de Músicas Populares”, Vol. III, Porto: Empresa Editora César, Campos & C.ª, 1898 – p. 49)
Arranjo coral: Brigada Victor Jara, com a colaboração do maestro Virgílio Caseiro
Intérprete: Brigada Victor Jara (in LP “Contraluz”, CBS, 1984, reed. Sony Música, 1994; Livro/11CD “Ó Brigada!: Discografia Completa da Brigada Victor Jara – 40 Anos”: CD “Contraluz”, Tradisom, 2015)

Desfeitos um por um

[ Ilha de Moçambique ]

Desfeitos um por um os nós sombrios,
Anulada a distancia entre o desejo
E o sonho coincidente como um beijo,
Exalei mapas que exalaram rios.

Terra secreta, continentes frios,
Ardei à luz dum sol que é rumorejo
Para lá do que eu sou, do que eu invejo
Aos elementos, aos altos navios!

Trouxe de longe o palácio sepulto,
A cobra semimorta, a bandarilha,
E esqueci poços, prossegui oculto.

Desdém que envolve por completo a quilha,
Sou bem o rei saudoso do seu vulto,
Vulto que existe infante numa ilha.

Alberto de Lacerda (1928-2007)

Em Alcácer eram verdes

[ Alcácer Que Vier ]

Em Alcácer eram verdes as aves do pensamento
Eram tão leves tão leves como as lanternas do vento
Em Alcácer eram verdes os cavalos encarnados
Eram tão fortes tão negros como os punhos decepados

Em Alcácer eram verdes as armas que eu inventei
Eram tão leves tão leves tão leves que nem eu sei
Em Alcácer eram verdes os homens que não voltaram
Eram tão verdes tão verdes como os campos que deixaram

Em Alcácer eram verdes as maçãs feitas de lume
Eram tão frias tão frias como as dobras do ciúme
Em Alcácer eram verdes estas palavras que agora
são tão caladas tão cernes tão feitas desta demora

Em Alcácer eram verdes as flores da sepultura
Eram tão verdes tão verdes tão verdes como a loucura
Em Alcácer era verde meu amor o teu olhar
Era tão verde tão verde quase à beira de cegar

Em Alcácer eram verdes os lençóis onde morri
Eram tão frios tão verdes como os campos que eu não vi
Em Alcácer eram verdes as feridas do meu país
Eram tão fundas tão verdes como este mal de raiz

Em Alcácer era verde meu amor o teu olhar
Era tão verde tão verde quase à beira de cegar

Em Alcácer eram verdes os lençóis onde morri
Eram tão frios tão verdes como os campos que eu não vi
Em Alcácer eram verdes as feridas do meu país
Eram tão fundas tão verdes como este mal de raiz

Europa

[ Europa, Querida Europa ]

Europa nascida na Ásia profunda
Ó filha do Rei Fenício Agenor.
Que Zeus entranhado no corpo de um touro
levou-te p’ra Creta, cativo de amor.
Europa é de Homero,
de helénicas formas,
do fórum romano e da cruz.
De tantas nações, ariana e semita,
ventre das descobertas da luz.
Do diverso sistema, do modo diferente,
da era da guerra e agora da paz…
És assim, querida Europa.

Vem que eu te quero toda do mar à montanha,
vem que eu quero muito mais bela que o mar.
Vem vencendo cizânias que os povos sem feudos,
sempre se amaram brilhantes em todo o lugar.
O teu chão não é traste de meros mercados
de pauta aduaneira ou cifrão.
É um terrunho de almas,
uma ideia, um desejo,
de uma nova maneira em fusão.
Desfazendo complexos de mapas cor-de-rosa,
sem a má consciência no verso e na prosa…
Só por ti, querida Europa.

Para que sejas tu mesma a decidir o teu uso
Para que sejas tu mesma ainda mais natural
Não me toques o “beat” à americana,
que esse já nós conhecemos na versão original.
Aguenta-te firme, livre de imitações
espera só mais um pouco, já vai.
O que resta e o que sobra
aquela mesma saudade
toda a imaginação, ainda mais.
Não sentes um vago, um suave cheiro a sardinhas
a algazarra nas ruas e o troar dos tambores…
Somos nós, querida Europa.

Letra e música: Fausto Bordalo Dias
Intérprete: Fausto Bordalo Dias (in “Para Além das Cordilheiras”, CBS, 1987; “Atrás dos Tempos Vêm Tempos”, Sony, 1996)

Foi no sulco da viagem

[ Canto dos Torna-Viagem ]

Foi no sulco da viagem
Já sem armas nem bagagem
Nem os brazões da equipagem
Foi ao voltar

Pátria moratória
No coração da História
Que consumiste a glória
Num jantar

Foi como se Portugal
P’ra seu bem e p’ra seu mal
Andasse em busca dum final
P’ra começar

Ávida violência
Reverso de inocência
Sal da inconsciência
Que há no mar

Império tão pequenino
De portulano caprino
Bolsos de sina e de sino
Em cada mão

Pátria imaginária
De consistência vária
Afirmação diária
Do teu não

As malas dos portugueses
São como os olhos das rezes
Que se mastigam três vezes
Em cada chão

Cândida ignorância
Grande desimportância
Os frutos da errância
Já lá vão

Ai Senhora dos Navegantes me valei
De África, do sal e do mar só eu sobrei
Foi p’ra me encontrar que amanhã já me perdi
Longe vai o tempo em que eu já não estou aqui

Ai Senhora dos Talvez-Muitos-Mais-Sinais
Socorrei estes desperdícios coloniais
Foi na noite fria que o dia me cegou
Inda agora fui, inda agora cá não estou

Ai Senhora dos Esquecidos me lembrai
O caminho que p’ra lá vem e p’ra cá vai
Etecetra e tal, Portugal é nós no mar
Inda agora vim e estou longe de chegar

Ai Senhora dos Meus Iguais que eu subtraí
Foi pataca a mim e não foi pataca a ti
Se é tão grande a alma na palma do meu ser
Algum dia eu vou finalmente acontecer

Porque não tentar outro ponto de vista
A história dos outros, quem a contará
Se qualquer colónia sem colonialista
São os que já estavam lá

Tentemos então ver a coisa ao contrário
Do ponto de vista de quem não chegou
Pois se eu fosse um preto chamado Zé Mário
Eu não era quem eu sou

Os navegadores chegaram cá a casa
E foi tudo novo p’ra eles e p’ra mim
A cruz e a espada e os olhos em brasa
Porque me trataste assim?

Não é culpa nossa se quem p’ra cá veio
Não se incomodou ao saber do horror
A História não olha a quem fica no meio
E o que foi é de quem for

Letra e música: José Mário Branco
Intérprete: José Mário Branco e Fausto Bordalo Dias (in CD “Resistir é Vencer”, EMI, 2004)

Partistes à tardinha

[ Natália Rosa ]

Partistes à tardinha
«Adeus, ó ilha da Culatra!»
Num dia de Outono
Uma aventura
De sonho e paixão

Seguiste viagem
Meteste proa rumo a sul
Chegaste a Agadir
Depois a Dakar
Até ao Brasil

Heróica a Travessia
Ó Gente da terra
Da vila de Olhão

Foram dias e noites
Rotas por mares a navegar
Seguiste as estrelas
Ventos, vendavais
Alísios tropicais

Tormenta maior
Ao largo do mar de Marrocos
Dias sem comer
Dois homens, uma mulher
Sem nada a temer

A remo e à vela
Fizeste a mais bela
História de amor

“Natália Rosa”
Andas bem, lanchinha
Foste a mais linda
A mais formosa
Barca de amor

“Natália Rosa”
A remo e à vela
Foste a mais bela
A mais formosa
História de amor

“Natália Rosa”
Andas bem, lanchinha
Foste a mais linda
A mais formosa
Barca de amor

“Natália Rosa”
A remo e à vela
Foste a mais bela
A mais formosa
História de amor

Letra: José Francisco Vieira
Música: Ana Figueiras e José Francisco Vieira
Intérprete: Flor de Sal (in CD “Flor de Sal”, José Francisco Vieira & Ana Figueiras/Alain Vachier Music Editions, 2016)

Perguntei ao vento

[ Queda do Império ]

Perguntei ao vento
Onde foi encontrar
Mago sopro encanto
Nau da vela em cruz

Foi nas ondas do mar
De mundo inteiro
Terras da perdição
Parco império, mil almas
Por pau de canela e Mazagão

Pata de negreiro
Tira e foge à morte
Que a sorte é de quem
A terra amou
E no peito guardou
Cheiro da mata eterna
Laranja, Luanda sempre em flor

Pata de negreiro
Tira e foge à morte
Que a sorte é de quem
A terra amou
E no peito guardou
Cheiro da mata eterna
Laranja, Luanda sempre em flor

Perguntei ao vento
Onde foi encontrar
Mago sopro encanto
Nau da vela em cruz

Foi nas ondas do mar
De mundo inteiro
Terras da perdição
Parco império, mil almas
Por pau de canela e Mazagão

Pata de negreiro
Tira e foge à morte
Que a sorte é de quem
A terra amou
E no peito guardou
Cheiro da mata eterna
Laranja, Luanda sempre em flor

Letra e música: Vitorino Salomé
Intérprete: Vitorino (in “Flor de la Mar”, EMI-VC, 1983; reed. EMI-VC, 1992; CD “As Mais Bonitas”, EMI-VC, 1993; CD “Tudo”, EMI-VC, 2006)
Outra versão de Vitorino (in “Sul”, EMI-VC, 1985; reed. EMI-VC, 1994)

Pergunto ao tempo que passa

[ Trova do Vento Que Passa ]

Pergunto ao vento que passa
notícias do meu país
e o vento cala a desgraça,
o vento nada me diz.

Mas há sempre uma candeia
dentro da própria desgraça:
há sempre alguém que semeia
canções ao vento que passa.

Mesmo na noite mais triste,
em tempo de servidão,
há sempre alguém que resiste,
há sempre alguém que diz não.

Pergunto ao vento que passa
notícias do meu país
e o vento cala a desgraça,
o vento nada me diz.

Mas há sempre uma candeia
dentro da própria desgraça:
há sempre alguém que semeia
canções ao vento que passa.

Mesmo na noite mais triste,
em tempo de servidão,
há sempre alguém que resiste,
há sempre alguém que diz não.

Poema: Manuel Alegre (excerto)
Música: António Portugal
Intérprete: Senhor Vadio* (in CD “Cartas de um Marinheiro”, José Flávio Martins/iPlay, 2013)
Versão original: Adriano Correia de Oliveira (in EP “Trova do Vento Que Passa”, Orfeu, 1963; LP “Memória de Adriano”, Orfeu, 1983, reed. Movieplay, 1992; 7CD “Obra Completa”: CD “Trova do Vento Que Passa: Adriano canta Manuel Alegre I”, Movieplay, 1994, Movieplay/Público, 2007; CD “Vinte Anos de Canções”, Movieplay, 2001)

TROVA DO VENTO QUE PASSA

(Manuel Alegre, in “Praça da Canção”, Coimbra: cancioneiro Vértice, 1965 – p. 90-92)

Ao António Portugal

Pergunto ao vento que passa
notícias do meu país
e o vento cala a desgraça
o vento nada me diz.

Pergunto aos rios que levam
tanto sonho à flor das águas
e os rios não me sossegam
levam sonhos deixam mágoas.

Levam sonhos deixam mágoas
ai rios do meu país
minha pátria à flor das águas
para onde vais? Ninguém diz.

Se o verde trevo desfolhas
pede notícias e diz
ao trevo de quatro folhas
que eu morro por meu país.

Pergunto à gente que passa
porque vai de olhos no chão.
Silêncio – é tudo o que tem
quem vive na servidão.

Vi florir os verdes ramos
direitos e ao céu voltados.
E a quem gosta de ter amos
vi sempre os ombros curvados.

E o vento não me diz nada
ninguém diz nada de novo.
Vi minha pátria pregada
nos braços em cruz do povo.

Vi minha pátria na margem
dos rios que vão pró mar
como quem ama a viagem
mas tem sempre de ficar.

Vi navios a partir
(minha pátria à flor das águas)
vi minha pátria florir
(verdes folhas verdes mágoas).

Há quem te queira ignorada
e fale pátria em teu nome.
Eu vi-te crucificada
nos braços negros da fome.

E o vento não me diz nada
só o silêncio persiste.
Vi minha pátria parada
à beira de um rio triste.

Ninguém diz nada de novo
se notícias vou pedindo

Por este rio acima

Por este rio acima
Deixando para trás
A côncava funda
Da casa do fumo
Cheguei perto do sonho
Flutuando nas águas
Dos rios dos céus
Escorre o gengibre e o mel
Sedas, porcelanas
Pimenta e canela
Recebendo ofertas
De músicas suaves
Em nossas orelhas
Leve como o ar
A terra a navegar
Meu bem como eu vou
Por este rio acima

Por este rio acima
Os barcos vão pintados
De muitas pinturas
Descrevem varandas
E os cabelos de Inês
Desenham memórias
Ao longo da água
Bosques enfeitiçados
Soutos, laranjeiras
Campinas de trigos
Amores repartidos
Afagam as dores
Quando são sentidos
Monstros adormecidos
Na esfera do fogo
Como nasce a paz
Por este rio acima

Meu sonho
Quanto eu te quero
Eu nem sei
Eu nem sei
Fica um bocadinho mais
Que eu também
Que eu também
Meu bem

Por este rio acima
Isto que é de uns
Também é de outros
Não é mais nem menos
Nascidos foram todos
Do suor da fêmea
Do calor do macho
Aquilo que uns tratam
Não hão-de tratar
Outros de outra coisa
Pois o que vende o fresco
Não vende o salgado
Nem também o seco
Na terra em harmonia
Perfeita e suave
Das margens do rio
Por este rio acima

Meu sonho
Quanto eu te quero
Eu nem sei
Eu nem sei
Fica um bocadinho mais
Que eu também
Que eu também
Meu bem

Por este rio acima
Deixando para trás
A côncava funda
Da casa do fumo
Cheguei perto do sonho
Flutuando nas águas
Dos rios dos céus
Escorre o gengibre e o mel
Sedas, porcelanas
Pimenta e canela
Recebendo ofertas
De músicas suaves
Em nossas orelhas
Leve como o ar
A terra a navegar
Meu bem como eu vou
Por este rio acima
Por este rio acima

Letra e música: Fausto Bordalo Dias
Intérprete: Fausto Bordalo Dias (in “Por Este Rio Acima”, Sassetti, 1982; CBS, 1984; “Grande, Grande é a Viagem (ao vivo)”, Sony, 1999)

Tristemente embarcados

[ Peregrinações ]

«Peregrinos, somos nós, que andamos sempre a navegar com sérios riscos de irmos ao fundo! » A.Q.

I
Tristemente embarcados
com rumo sem rota
velejando no ar
com grande medo levados
em formosa frota
de casco a abanar
rebentam as ondas gigantes
coisas alucinantes
quebra-mar, quebra-mar
uma prece na garganta
Nossa Senhora Santa
almiranta
a vomitar, a vomitar
procurando novos mercados
em nome de Deus
vai el-rei engordar
como por nossos pecados
desatinados às cegas
no escuro do mar
salta um mostrengo barbudo
c’o peito peludo
a arrotar, a arrotar
nós senhores do barlavento
ao leme gemendo
tremendo
ai! quem soubera nadar

E com a pressa que podíamos
nos fizemos de volta
esquecendo mercês
se à vista daquilo que víamos
nos tremiam as carnes
nos dava a gaguez
ao serviço de Deus Nosso Senhor
regressa assim teu esposo
neste vento bonançoso
meu lindo e ditoso amor
confiado nesta promessa
enganado nesta esperança

neste vento bonançoso
meu lindo e ditoso amor
confiado nesta promessa
enganado nesta esperança

II
Mas o avarento agiota
depressa nos manda
de novo embarcar
banqueteados com muitos açoites
ao longo da costa
quem se há-de salvar
tragam pimenta
a fazenda
a prata sangrenta
a rezar, a rezar
metam o turco a tormento
fede a Mafamede
que fale
onde fica o bazar
e assim fomos de atropelo
sobre gente que não tinha
em boa conta
o nosso apogeu
nos merecia a latina cólera
por zelo
da honra de Deus
vivos lançados ao mar
com um grande penedo
ao pescoço
a afundar
ouvem-se as gritas
apupos
dos turcos malucos
eunucos
a atacar, a atacar

E foram tantas as pedras
os zargunchos, as lanças
e as chuças
de arremesso sobre nós
que fugíamos assaz
com a pressa que podíamos
depois de tanto pelejar
ao serviço de El-Rei
Nosso Senhor
regressa assim teu esposo
neste vento bonançoso
meu lindo e ditoso amor
confiado nesta promessa
enganado nesta esperança

neste vento bonançoso
meu lindo e ditoso amor
confiado nesta promessa
enganado nesta esperança

III
Foi-se o tempo passando
da nau ao paquete
lá vai Portugal
leva gente do arado
peões e joguetes
em calção colonial
negro trabalha canalha
que a tua mortalha
é este ultramar
colhe matumbo o café
que a gente tem fé
chimpanzé
de lucrar e lucrar
fomos misturando guitarras
ao som do batuque
bebendo maruvo
e num sentimento bizarro
casando com a negra
depois de viúvo
estoira uma força gigante
vermelha negra vibrante
a lutar, a queimar
liberta um povo oprimido
e perde o diamante
purgante
quem nos andou a mandar
e desmanchámos as casas
tornámos de volta
pobres numa muleta
balbuciando estranhas palavras
aka! que maka!!
acabou-se a teta
ao serviço de grandes senhores
regressa de vez teu esposo
neste vento bonançoso
meu lindo e ditoso amor
confiado nesta promessa
enganado nesta esperança

neste vento bonançoso
meu lindo e ditoso amor
confiado nesta promessa
enganado nesta esperança

Letra e música: Fausto Bordalo Dias (inspirado na obra “Peregrinação”, de Fernão Mendes Pinto)
Intérprete: Fausto Bordalo Dias (in “Histórias de Viageiros”, Orfeu, 1979; reed. Movieplay, 1991, 1999; filme “Acto dos Feitos da Guiné”, de Fernando Matos Silva, 1980)

Teresa Tarouca

Canções sobre instrumentos

Letras

A sono solto dormia

[ Águias Perdidas ]

A sono solto dormia há muito a cidade
e eu procurava como louca rua em rua
a tua sombra entre essas ruas da saudade
onde uma noite sobre nós raiara a lua

Na minha grande amargura de águia perdida
que começou com a tua ausência eu queria ser
ao encontrar-te a perfumada flor da vida
ou ser de novo uma alegria por viver

Mas fui tão pouco ao teu olhar desencantado
e o nosso abraço uma tristeza tão profunda
que entre o silêncio o amor com lágrimas quebrado
abandonou-se nas estranhas mãos da lua

Ergueu-se ao longe a sinfonia das guitarras
perdida a voz, quebrado o amor nada entendemos
beijei-te a fronte e assim sem mágoa nem palavras
serenamente unidos, meu amor, morremos

Letra: Manuel Lima Brummon
Música: Bernardo Lino Teixeira (Fado Ginguinha)
Intérprete: Tereza Tarouca (in LP “Portugal Triste”, Alvorada/Rádio Triunfo, 1980; CD “Tereza Tarouca”, col. O Melhor dos Melhores, vol. 32, Movieplay, 1994; CD “Álbum de Recordações”, Alma do Fado/Home Company, 2006)

Teresa Tarouca
Teresa Tarouca

Campaniça do despique

Campaniça do despique,
Na venda e bailes de roda:
Dedilhando o improviso
Ou trauteando uma moda.

Na rua do velho monte,
Com as moças a bailar
Os passos simples duma dança
E a viola a dedilhar.

Nas feiras e romarias,
Na serra e no alambique,
Na venda e bailes de roda:
Campaniça do despique.

O tocador da viola
É feio mas toca bem;
Se não casar por a prenda,
Formosura não a tem!

Campaniça do despique,
Na venda e bailes de roda:
Dedilhando o improviso,
Ou trauteando uma moda.

Na rua do velho monte,
Com as moças a bailar
Os passos simples duma dança
E a viola a dedilhar.

Nas feiras e romarias,
Na serra e no alambique,
Na venda e bailes de roda:
Campaniça do despique.

Letra e música: Pedro Mestre
Intérprete: Pedro Mestre (in CD “Campaniça do Despique”, Viola Campaniça Produções Culturais/Pedro Mestre, 2015)
Outra versão de Pedro Mestre (in DVD “No CCB: Pedro Mestre & Convidados”, Pedro Mestre, 2017)

Reciclanda

Reciclanda

O projeto Reciclanda promove a reutilização, reciclagem e sustentabilidade desde idade precoce.

Com música, instrumentos reutilizados, poesia e literaturas de tradição oral, contribui para o desenvolvimento global da criança e o bem estar dos idosos. Faz ACD e ALD (formações de curta e longa duração), realiza oficinas de música durante o ano letivo e dinamiza atividades em colónias de férias. Municípios, Escolas, Agrupamentos, Colégios, Festivais, Bibliotecas, CERCI, Centros de Formação, Misericórdias, Centros de Relação Comunitária, podem contratar serviços Reciclanda.

Contacte-nos:

António José Ferreira
962 942 759

Roncos do Diabo

Com três paus faz-se um bordão,
Com mais um faz-se um ponteiro:
O Demo anima a função
Encarnado num gaiteiro.

O Diabo já é velho
Mas é grande folião:
Na festa mete o bedelho
P’ra animar a bailação.

P’ra aquecer o bailarico
Abre a torneira ao tonel;
O cura dá-lhe um fanico,
Lá se vai o hidromel.

Essa bebida dos anjos
Que agrada tanto ao Demónio
Já tentou S. Cipriano,
S. João e Santo António.

Santo António milagreiro
Fez um pacto com o Demónio:
O Diabo era gaiteiro
E o santo tocava harmónio.

S. João tocava caixa
Com dois paus de marmeleiro;
Mas o delírio das moças
Era a gaita do gaiteiro.

Guinchava como um leitão
Quando se lhe puxa o rabo;
Pela copa do bordão
Jorravam roncos do Diabo.

Era a gaita do Demónio
Que soava endiabrada,
Afinava com o harmónio
Mas não estava homologada.

Estava fora das medidas,
Saía da convenção,
Tinha veias no ponteiro
E dois papos no bordão.

Criação de Belzebu,
Diabólica magia:
Nas voltas da contradança
Quem dançava enlouquecia.

E nas voltas da loucura,
As almas em desatino
Saltavam de corpo em corpo
Errando do seu destino.

O gaiteiro as reunia
Como se junta um rebanho:
Fê-las descer ao Inferno,
No fogo tomaram banho.

E já os corpos em brasa
Iam fazendo das suas,
As vestes esfarrapadas
Mostravam as carnes nuas.

Indulgencia absolutionem
et remitionem peccatorum
tribut ad nobis Dominum.

Com três paus faz-se um bordão,
Com mais um faz-se um ponteiro:
O Demo anima a função
Encarnado num gaiteiro.

As fêmeas eram lascivas:
Ondulantes de paixão,
Corroídas p’lo desejo
Contorciam-se no chão.

No terreiro da função
Os corpos se confundiam:
Seguidores de Belzebu
Das almas santas se serviam.

Foram pela noite fora
Perdidos no bacanal,
Ao som desta banda louca
Até ao Juízo Final.

Indulgencia absolutionem
et remitionem peccatorum
tribut ad nobis Dominum.

Letra e música: Carlos Guerreiro
Arranjo: Carlos Guerreiro
Intérprete: Gaiteiros de Lisboa
Versão original: Gaiteiros de Lisboa (in CD “A História”, Uguru, 2017; CD “Bestiário”, Uguru, 2019)

Gaiteiros de Lisboa, Roncos do Diabo
Gaiteiros de Lisboa, Roncos do Diabo

Ó sino da minha aldeia

Ó sino da minha aldeia,
Dolente na tarde calma,
Cada tua badalada
Soa dentro da minha alma.

E é tão lento o teu soar,
Tão como triste da vida,
Que já a primeira pancada
Tem o som de repetida.

Por mais que me tanjas perto
Quando passo, sempre errante,
És para mim como um sonho,
Soas-me na alma distante.

A cada pancada tua,
Vibrante no céu aberto,
Sinto mais longe o passado,
Sinto a saudade mais perto.

Por mais que me tanjas perto
Quando passo, sempre errante,
És para mim como um sonho,
Soas-me na alma distante.

A cada pancada tua,
Vibrante no céu aberto,
Sinto mais longe o passado,
Sinto a saudade mais perto.

Letra: Fernando Pessoa (ligeiramente adaptado)
Música: Uxía Senlle e Sérgio Tannus
Arranjo: Quiné Teles
Intérprete: Ela Vaz, com Rui Oliveira (in CD “Eu”, Micaela Vaz, 2017)

O tambor a tocar

[ O Primeiro Canto (dedicado a José Afonso) ]

O tambor a tocar sem parar,
um lugar onde a gente se entrega,
o suor do teu corpo a lavar a terra.
O tambor a tocar sem parar,
o batuque que o ar reverbera,
o suor do teu rosto a lavrar a terra.

Logo de manhãzinha, subindo a ladeira já,
já vai a caminho a Maria Faia…

Azinheiras de ardente paixão
soltam folhas, suaves, na calma
do teu fogo brilhando a escrever na alma.

Estas fontes da nossa utopia
são sementes, são rostos sem véus,
o teu sonho profundo a espreitar dos céus!

Logo de manhãzinha, subindo a ladeira já,
já vai a caminho a Maria Faia,
desenhando o peito moreno, um raminho de hortelã
na frescura dos passos, a eterna paz do Poeta.

Uma pena ilumina o viver
de outras penas de esperança perdida,
o teu rosto sereno a cantar a vida.

Mil promessas de amor verdadeiro
vão bordando o teu manto guerreiro,
hoje e sempre serás o primeiro canto!

Ai, o meu amor era um pastor, o meu amor,
ai, ninguém lhe conheceu a dor.
Ai, o meu amor era um pastor Lusitano,
ai, que mais ninguém lhe faça dano.
Ai, o meu amor era um pastor verdadeiro,
ai, o meu amor foi o primeiro.

Estas fontes da nossa utopia
são sementes, são rostos sem véus,
o teu sonho profundo a espreitar dos céus!

Mil promessas de amor verdadeiro
vão bordando o teu manto guerreiro,
hoje e sempre serás o primeiro canto!

Letra: João Mendonça, Dulce Pontes e António Pinheiro da Silva
Música: Dulce Pontes e Leonardo Amuedo
Intérprete: Dulce Pontes (in CD “O Primeiro Canto”, Polydor B.V. The Netherlands/Universal, 1999)

Quando uma guitarra trina

[ Guitarra ]

Quando uma guitarra trina
Nas mãos de um bom tocador
A própria guitarra ensina
A cantar seja quem for

Eu quero que o meu caixão
Tenha uma forma bizarra
A forma de um coração
A forma de uma guitarra

Guitarra, guitarra querida
Eu venho chorar contigo
Sinto mais suave a vida
Quando tu choras comigo

Letra dos poetas do fado (Popular)
Música: Pedro Ayres Magalhães e Rodrigo Leão
Intérprete: Madredeus (in CD “Ainda”, EMI-VC, 1995)

As Tuas Mãos, Guitarrista

São tuas mãos, guitarrista,
Que as cordas fazem vibrar,
Que me fizeram fadista
E não deixam que resista
Ao desejo de cantar.

A guitarra quere-te tanto,
Tem por ti tal afeição
Que te deu consentimento
P’ra desvendares o tormento
Que guardo no coração.

Em teu peito tem guarida,
Em tuas mãos seu penar;
Se tu não lhe desses vida
Ficava p’ra ali esquecida
E não voltava a trinar.

 

E se a tens abandonado
Não seria mais fadista;
Mesmo que fosse cantado,
Morria com ela o fado
Sem tuas mãos, guitarrista.

Letra: Maria Manuel Cid
Música: Joaquim Campos (Fado Tango)
Intérprete: Tereza Tarouca (in EP “Passeio à Mouraria”, RCA Victor, 1964; 2LP “Álbum de Recordações”: LP 2, Polydor/PolyGram, 1985; CD “Temas de Ouro da Música Portuguesa”, Polydor/PolyGram, 1992)

Teresa Tarouca
fadista Teresa Tarouca
Amores Perdidos

Canções do amor terminado

Letras

Fui de viagem

[ Volta ao mundo ]

Fui de viagem para me esquecer de ti
Porque de mim já me esquecera e nem vi
Mas não havia rua, praça nem jardim
Que não trouxesse a tua imagem, ai de mim!

Cheguei a ver-te noutro mundo, outro lugar
Aonde não havia nada pra esperar
Nos mares longe onde não tinha mais ninguém
Dentro de mim ouvia a tua voz também

Em todo o lado, meu amor
Toda a viagem, meu amor
Trago no peito a tua imagem junto a mim

Vivo em saudade meu amor
E tudo diz ao meu redor
Que a nossa história não é feita deste fim

Mas no regresso volto à vida e tu não estás… para mim.

Letra: Cátia Oliveira
Música: Catarina Rocha
Intérprete: Catarina Rocha

Não queiras

[ Fado Passado ]

Não queiras
Versos lindos de cantar
Nem rosas
Como dias por abrir
O nosso amor passou, amor
O nosso amor não basta
Não basta…

Não digas
Quantas horas foram poucas
Que noites
Duas sombras a alongar
Agora é só sonhar, amor
O nosso amor não canta
Não canta…

Dou voltas
Numa rua que foi nossa
À espera
De uma casa onde morar
A gente vai vivendo, amor
E o nosso amor não passa
Não passa…

Reciclanda

Reciclanda

O projeto Reciclanda promove a reutilização, reciclagem e sustentabilidade desde idade precoce.

Com música, instrumentos reutilizados, poesia e literaturas de tradição oral, contribui para o desenvolvimento global da criança e o bem estar dos idosos. Faz ACD e ALD (formações de curta e longa duração), realiza oficinas de música durante o ano letivo e dinamiza atividades em colónias de férias. Municípios, Escolas, Agrupamentos, Colégios, Festivais, Bibliotecas, CERCI, Centros de Formação, Misericórdias, Centros de Relação Comunitária, podem contratar serviços Reciclanda.

Contacte-nos:

António José Ferreira
962 942 759