barítono José de Freitas

JOSÉ DE FREITAS

José de Freitas, de nome completo José Cirilo de Freitas Silva, nasceu na Madeira e foi padre da Congregação da Missão (Padres Vicentinos). Já depois de padre, estudou nos conservatórios do Porto e de Lisboa, onde concluiu o Curso Superior de Canto com excelente classificação. Em 1978 tornou-se artista residente do Teatro Nacional de São Carlos onde se estreou com Schaunard em La Bohème. Foi intérprete de importantes papéis de barítono e de baixo-barítono em Portugal e no estrangeiro. Foi também diretor de coros e compositor de cânticos litúrgicos.

ENTREVISTA

Qual foi o primeiro momento em que se lembra de ter tido consciência de que a música era importante para si?

O primeiro momento?! Preferiria falar de uma pequena série de momentos… Concretizando: No meu 5º ano do seminário (hoje 9º ano), cerca dos 16 anos, quando a chamada “mudança de voz” era já algo acentuada, o meu ilustre professor de música, Padre António Ferreira Telles, poucos dias após ter-me convidado para tocar harmónio em algumas cerimónias litúrgicas (ele era o harmonista oficial, obviamente) e pedir-me para, alternadamente com outro colega, iniciar os cânticos na liturgia (o equivalente a solista), veio falar comigo na véspera da festa do Padroeiro do seminário (S. José), e disse-me: “Confio muito em ti para “segurares” a 4ª voz na missa solene de amanhã.” Ora aí tem um “puzzle” com bastante significado na minha “consciência musical” de jovem seminarista…

Quais os professores que mais o influenciaram no tempo de seminário?

Vou referir-me apenas a professores de música, obviamente. Desde os primeiros anos, tive uma veneração especial por um ilustre mestre, muito “sui generis”, mas muito competente e sabedor: o Padre António Ferreira Telles, a que atrás aludi. Era excelente harmonista, compositor, ótimo harmonizador. O Pe. Fernando da Cunha Carvalho, felizmente ainda entre nós, também teve influência na minha orientação musical, e não só. Mas vou salientar, sem querer ser injusto para os atrás citados e porventura outros, o Pe. João Dias de Azevedo, que muito me ajudou sobretudo no harmónio e no órgão, no Seminário de Mafra, onde fiz o meu noviciado (1954-1956). Nesse período, cheguei a tocar órgão em algumas celebrações dominicais e festas na Basílica de Mafra… E, para completar os anos do seminário, não poderei omitir o Pe. Fernando Pinto dos Reis (1929-2010).

Depois de ir para o seminário e de ser padre, quando é que se apercebeu de que cantar era o mais importante na sua vida profissional?

Como disse, cedo me iniciei e fui crescendo na função de solista. Continuei-a ao longo de todo o curso, alternando-a com o múnus de harmonista. Terminado o curso, fui incumbido da disciplina de Música (além de outras), no seminário menor. O concílio do Vaticano II acabava de privilegiar o vernáculo na liturgia. Iniciei a renovação de todo o repertório vigente. Eu próprio dei largas a uma velha paixão e iniciei a composição de cânticos em português, incluindo o “ordinário” e o “próprio” da missa para determinadas solenidades, além de outros cânticos circunstanciais. Aconselhado por não poucos, matriculei-me no Conservatório do Porto. Canto? Composição? Duas paixões. Muito incitado e encorajado pela professora D. Isabel Mallaguerra, decidi-me mais seriamente pelo canto, sem descurar a composição musical.

Após o curso geral de canto no Conservatório do Porto, vim a concluir o Curso Superior no Conservatório Nacional com a professora D. Helena Pina Manique. Com o programa do exame do curso superior concluído com alta classificação, fui convidado para vários recitais em Lisboa e não só. Iniciei logo de seguida o curso de ópera com o professor Álvaro Benamor e D. Helena Pina Manique. Fui admitido no Coro Gulbenkian, onde estive durante alguns meses até seguir para Paris com uma bolsa de estudos.

O diretor do Teatro Nacional de São Carlos, Eng. João Paes, que já me ouvira no Conservatório, convidou-me para, temporariamente, interromper o estágio em Paris e vir a Lisboa preparar o desempenho de um importante papel numa ópera portuguesa. Bem sucedido, pediu-me para, após o estágio parisiense, seguir para Florença, afim de preparar, com o famoso Gino Bechi, o importantíssimo papel de primeiro barítono (Lord Enrico d’Ashthon) da ópera Lucia di Lamermoor, de Donizetti. Cantei esse papel em novembro de 1977, no Teatro Rivoli (Porto)…

Toda esta “bola de neve” a partir da conclusão do curso superior de canto em 1974, todo o incrível desencadear de situações até finais de 1977, todo o ano de 1977 sobretudo, tudo isso responde à sua pergunta… Parafraseando, em contraste, um fadista, diria: “Ser cantor não foi meu sonho, mas cantar foi o meu fado…”

Dos anos em que estudou Música e Canto, que professores tiveram uma influência mais decisiva?

Nos conservatórios do Porto e de Lisboa, tive a felicidade de ser orientado respetivamente pelas professoras D. Isabel Mallaguerra e D. Helena Pina Manique, e ainda, por algum tempo, pela D. Arminda Correia, sem esquecer o Prof. Álvaro Benamor (cena).

Em Paris, como olvidar o trabalho com a famoso baixo Huc-Santana e o não menos célebre barítono Gabriel Bacquier? Em Itália, e aqui em Portugal, Gino Bechi foi simplesmente precioso no trabalho vocal e cénico. Este famoso barítono, que também me honrava com a sua amizade, cantou nos anos 40, em todos os grandes palcos do mundo. A sua famosa “entrega” aos espetáculos e nos espetáculos, quer cenicamente mas sobretudo vocalmente, levou-o a tal desgaste que teve de terminar a sua carreira por volta dos 40 anos, precisamente com a idade com que eu comecei…

Foi difícil deixar de ser padre e optar pela carreira musical?

Quando, em finais dos anos 60, me matriculei no Conservatório do Porto, confesso que o meu sonho era dar uma componente artística à minha missão de padre.

Começaram a surgir, porém, situações que não deixaram de me ir perturbando. Alguma confusão começou a instalar-se nos meus horizontes… Estávamos em pleno pós-74… Sobretudo a partir de 1977, comecei a sentir-me ultrapassado pelos acontecimentos. Tinham de ser tomadas decisões… Não podia viver na ambiguidade!… Houve muitas dúvidas, muitas incertezas… O meu Padre Provincial de então propôs-me fazer as duas coisas: padre e cantor… Tudo se desenrolava vertiginosamente… Eram convites para concertos, para óperas, etc.
Cheguei mesmo a atuar durante não pouco tempo, estando ainda no exercício do ministério… Fui chegando à conclusão de que as duas funções não faziam grande sentido… Em finais de 1978, acabei por tomar a decisão: pedi para Roma a dispensa do exercício das ordens. Não tive resposta fácil. Demorou mais de dois anos. Pelo meio, um apelo a que repensasse…

Qual foi o papel da Igreja na sua vida musical?

Primeiramente, como é obvio, penso em todo o curso do seminário. Para além de todos os aspetos da formação, a música da Igreja, o canto gregoriano, ocupou uma grande parte desse período, quer na teoria, quer na prática. O nosso Cantuale, um livro específico da Congregação da Missão com os mais belos cânticos gregorianos e muitos outros, a uma ou mais vozes, dominou grande parte desses anos, as nossas vozes e as nossas almas.

No seminário Maior, durante o curso de filosofia e teologia, para além das mais belas obras de polifonia sacra, cantávamos, todos os domingos e festas, o “comum” e o “próprio” em gregoriano, de acordo com o emblemático Liber Usualis, a mais completa obra do canto da Igreja. Tudo isto, naturalmente acompanhada da parte teórica, marca indelevelmente a minha personalidade e a minha formação musical. E não esqueço que quase sempre, alternadamente, fui organista e solista…

Após a ordenação, seguiram-se anos dominados pelo Concílio do Vaticano II, com uma série extraordinária de documentos sobre a música e a liturgia em vernáculo,com o aparecimento de excelentes compositores. E foram sempre surgindo, com os diversos papas, importantes documentos sobre a música litúrgica. Não posso esquecer os “famosos” cursos gregorianos de Fátima que frequentei.

Durante os anos 1977-1995, em que a vida artística teve o seu lado prioritário, nunca deixei de estar atento aos documentos da Igreja sobre música sacra e à obra de excelentes compositores que temos.

A partir de 1997, já no pós – S. Carlos, a pedido do meu grande amigo Conégo José Serrasina que acabava de ficar à frente da Paróquia dos Anjos, em Lisboa– a minha paróquia -, comecei a orientar o coro paroquial, tomando a peito a renovação dos cânticos e a dinamização litúrgica. Baseava-me sempre nos textos de cada celebração. Após 5 anos de intenso e profícuo trabalho, abracei outro projeto – na Capela do Palácio da Bemposta (Academia Militar), onde colaborei durante 13 anos (2003 – 2016). Durante este período, compus dezenas de cânticos que vieram a ser publicados pela Academia Militar, em 2012, num volume com o título Deus é Amor. Porque o “contexto” de então era “específico”, o referido volume irá “sofrer” brevemente substancial alteração.

Qual foi a maior deceção na sua vida?

Se me permite, não apresentaria uma mas duas deceções, e ambas no âmbito do mundo lírico. A primeira, logo de início. Tinha feito 40 anos. Eram diferentes, agora, o sonho e o ideal. Imaginava que perante mim, ia surgir um meio pleno de elevação, um ambiente superior, de arte, de cultura, etc. Cedo, porém, fui verificando e concluindo que as cores que sonhara belas, não, não o eram assim tanto… A realidade era bastante mais prosaica… Bem!… Respirei fundo, bem fundo, passe a expressão… E, vamos a isso!… Mas vamos mesmo! O desafio que ora iniciava era para ganhar, era mesmo para vencer!… E foi! Não tive o caminho atapetado de rosas, longe disso, muito longe! Foram necessárias uma fibra excecionalmente forte como considero ter, uma fé inabalável em Deus como efetivamente tenho, e também, obviamente, uma grande confiança nos talentos que Deus me deu, aliados à formação que tive (não poderei esquecê-lo!) E…aí vou eu!… E nem tudo foram espinhos, digamos em abono da verdade. Tive um público que me admirava e apoiava bastante, excelentes e excecionais críticas, outras nem tanto… E, entre um pessoal que rodava as três centenas (coro, orquestra, cantores, técnicos, etc), tive não poucos amigos e admiradores! Não esqueço que, logo no começo, nos primeiros ensaios, vi lágrimas nos olhos de algum do pessoal, ao verem a minha entrada enérgica, decidida, confiante, e pensando no “mundo” donde acabava de chegar… aos 40 anos!…

A segunda deceção foi no fim. Em finais de 92, a SEC, tendo à frente o Dr. Pedro Santana Lopes, achou por bem dissolver a Companhia Portuguesa de Ópera (cantores, orquestra, etc). Éramos 14 os cantores principais. Mesmo tendo em conta que eu continuava a cantar no país e não só, esta foi sem dúvida uma grande deceção. Aos 55 anos, encontrava-me no ponto mais alto da carreira, a nível vocal e cénico, na minha opinião e na de quantos me conheciam e ouviam! Esperava estar “em grande” mais uma boa dezena de anos… Lembrei-me então das palavras de Gino Bechi, quando, certo dia, nos anos 80, após fazer as célebres e espetaculares demonstrações, vocais e cénicas, durante um ensaio, e quando já contava perto dos 80 anos, teve este desabafo: “Agora é que eu sei cantar!”

Pois é!… Parafraseando o meu mestre, diria: “Agora… é que eu sabia cantar!…”

Qual foi o momento mais alto da carreira como cantor lírico?

Desempenhei os mais diversos papéis de 1º barítono, de baixo-barítono, papéis característicos, enfim, foram cerca de 50… Nunca tive um fracasso nos meus desempenhos. Pelo contrário! Escolher o momento mais alto?!… É difícil!… Estou a lembrar-me de não poucos… Do “Le Grand-Prêtre de Dagom” da ópera Samson et Dalila, de Saint-Saëns, em 1983. Quis preparar o papel em Lyon com o meu ex-professor de Paris, o grande barítono Gabriel Bacquier. Estou a recordar-me do “Dulcamara” da ópera L’Elisir d’Amore, de Donizetti, em 1984 e 1985… Do “Rocco”, da ópera Fidelio de Beethoven… Enfim, não vou alongar-me na citação de outras boas e belas hipóteses…

Mas vou escolher como momento mais alto uma ópera fora do estilo clássico: a ópera Kiú, do compositor espanhol Luís de Pablo, levada à cena em 1987 no Teatro Nacional de São Carlos. O meu papel de Babinshy, o pivô da ópera, na sua grande espetacularidade e dificuldade vocal e cénica, foi na verdade um momento muito alto na minha carreira! Não foi por acaso que o próprio compositor Luís de Pablo e o maestro Jesús Ramón Encimar me convidaram, 5 anos depois (dezembro de 1992 – janeiro de 1993), para interpretar em Madrid o mesmo papel!…

Quais foram os cantores líricos mundiais que mais o inspiraram?

Estavam na moda, nos anos 60, cantores líricos que deveras nos entusiasmavam. Lembro-me, por exemplo, de Mário Lanza, de Luís Mariano, de Alfredo Krauss que vim a conhecer em São Carlos, e com o qual contracenei, inicialmente, num ou noutro pequeno papel. E vários outros, quase todos tenores. O meu tipo de voz é de barítono ou de baixo-barítono. Mas foi sobretudo a partir do Curso Superior de Canto que comecei a interessar-me por vozes líricas, o que é absolutamente natural. Dado o meu tipo de voz, cerca de cinco ou seis cantores internacionais dominavam particularmente os meus gostos. Comecemos pelos alemães Dietrich Fischer-Dieskau e Hermann Prey, barítonos. O primeiro, absolutamente excecional em lied, tendo cantado praticamente tudo o que havia nesse domínio. Muitos o consideraram o maior músico do século XX. Foi inclusivamente maestro de música sacra. Ouvi-o ao vivo em Paris. Hermann Prey era superior como ator. As suas interpretações em óperas de Mozart, Rossini, Donizetti ficaram memoráveis. Outros dois barítonos ou baixo-barítonos, Fernando Corena e Rolando Panerai, eram também grandes cantores e atores, mais característicos que os anteriores. Outro barítono que, vocalmente (não cenicamente) me enchia as medidas, era Piero Cappuccilli. Era um barítono a que eu chamaria heróico-dramático, com uma incrível potência de voz. Jamais esquecerei o seu desempenho em Simon Boccanegra de Verdi, no São Carlos…

Poderia obviamente alongar-me, no que às vozes masculinas diz respeito. Mas também não posso deixar de me referir a vozes femininas que, além de nós deixarem siderados, tanto nos ensinaram! Antes de mais, Maria Callas!… Depois, uma Victoria de los Angeles que cheguei a ouvir na Gulbenkian. Fiorenza Cossotto, Mirella Freni, Christa LudwigMonserrat Caballé que ouvi em Paris dirigida por Leonard Bernstein… Uma Joan Sutherland, La Stupenda, a tal que cantou a Traviata no Coliseu na famosa noite de 24 para 25 de abril de 1974, com o já citado Alfredo Kraus… E eu estava lá!…

Quais os músicos portugueses mais influentes na sua carreira?

Por músicos, entendo compositores, professores, pianistas, ensaiadores, “pontos”, cantores, e, porque não, críticos… Antes de mais, as minhas duas professoras nos conservatórios do Porto e de Lisboa, respetivamente: Isabel Malaguerra e Helena Pina Manique. A professora D. Arminda Correia fez de forma extraordinária a breve transição entre uma e outra. Álvaro Benamor, na classe de ópera. A pianista Maria Helena Matos que me acompanhou com enorme competência desde o Conservatório Nacional, incluindo o exame final, e praticamente em todos os recitais que fui dando ao longo da carreira. O maestro Armando Vidal, músico de gema, com o qual preparei, como a generalidade dos artistas, quase todos os papéis que tinha a desempenhar nas dezenas de óperas em que fui interveniente. Entre os maestros – “pontos” – , não esquecerei o maestro Pasquali que tão competentemente orientou, durante os primeiros tempos, as nossas intervenções em palco, e o maestro Ascenso de Siqueira, grande e bom amigo e incrível ser humano… Tive a felicidade de trabalhar com encenadores como António Manuel Couto Viana, que me honrava com a sua amizade, Carlos Avillez (em várias óperas), Luís Miguel Cintra, João Lourenço

Cantores? Álvaro Malta, Hugo Casaes, Elizette Bayan, Armando Guerreiro, e outros… Lembro-me ainda de preciosas “dicas” que me deu Álvaro Malta

Compositores? Antes de mais, o Prof. Cândido Lima. Conheci-o em Paris. Conversávamos muito. Não esqueço o dia em que ele me apresentou ao seu amigo Iannis Xenakis… Fomos juntos a vários concertos. Preparei, com ele ao piano, algumas obras suas para canto. Foi meu pianista num concurso de canto em que fui premiado… Tudo isto em Paris, em 1977.

Com o grande compositor Fernando Lopes-Graça, tive a honra de preparar um importante papel de solista na sua obra As Sete Predicações d’Os Lusíadas, em vista à estreia mundial da mesma no VI Festival da Costa do Estoril (1980).
Joly Braga Santos honrava-me com a sua amizade e admiração. Com ele ensaiei o papel de solista na sua Cantata Das Sombras, sobre texto de Teixeira de Pascoaes, para primeira audição mundial no Teatro de S. Luís, a 27 de julho de 1985, com o Coro Gulbenkian, e enquadrada no XI Festival de Música da Costa do Estoril. De Joly Braga Santos nunca poderei esquecer as suas palavras, em pleno palco, no fim da última récita da sua Trilogia das Barcas, em maio de 1988: “Estou a compor uma ópera, para a Expo de Sevilha (daí a 4 anos), baseada numa obra de Frederico Garcia Llorca, Bodas de Sangue e tenho um muito bom papel para si”. Entretanto, o maestro falecia 2 meses depois, a 18 de julho de 1988, o que constituíu uma grande perda para o País, para a cultura portuguesa.

Quanto a críticos, devo dizer que, entre outros, Francine Benoit, João de Freitas Branco, José Blanc de Portugal muito me encorajaram e elogiaram!

E hoje, o que acha da evolução da ópera em Portugal?

Francamente, tenho dificuldade em responder. Há cerca de vinte e cinco anos, após a extinção da Companhia Portuguesa de Ópera e de ter dado como terminada a minha carreira lírica, abracei outro projeto e alheei-me bastante desse tema. Sei que, sobretudo por razões orçamentais, a programação se ressente, e muito. Tudo parece ser diferente. Repito: não tenho dados que me permitam fazer qualquer juízo de valor…

O que pensa do papel da música na Igreja?

Desde o Seminário Maior, fui lendo atentamente, e mais que uma vez, os documentos papais que surgiram desde o princípio do século XX:
o Motu próprio de São Pio X (1903) sobre a Restauração da Música Sacra;
a Constituição Apostólica Divini Cultus (1928) no pontificado de Pio XI, sobre a liturgia e a música sacra; a Encíclica Musicae Sacrae Disciplina (1953), do Papa Pio XII, sobre a Música Sacra, vocal e instrumental.

Logo após o Concílio do Vaticano II, surge a Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium (1963), a realçar que “a acção litúrgica reveste maior nobreza quando é celebrada com canto, com a presença dos ministros sagrados e a participação ativa do povo”. E quando fala de canto, obviamente que se refere ao canto sagrado intimamente unido com o texto. E se o canto gregoriano ocupa sempre um lugar privilegiado em igualdade de circunstâncias, não são excluídos os outros géneros de música sacra mormente a Polifonia, desde que em harmonia com o espírito da ação litúrgica, e de acordo com os diversos tempos litúrgicos, com as diversas celebrações e os vários momentos da celebração. Compositores, organistas, mestres de coro, cantores, músicos (instrumentistas) devem formar um todo para o esplendor do canto.

Alguns anos após o Concílio, a famosa Instrução Musicam Sacram (1967), da Sagrada Congregação dos Ritos, é a síntese, diria perfeita, do que à Música Sacra diz respeito, desde o canto na celebração da missa, passando pela preparação de melodias para os textos em vernáculo, depois a música para instrumental, o Canto no Ofício, etc etc.

O assunto levar-nos-ia ainda a três ou quatro intervenções de São João Paulo II, a uma célebre conferência do Cardeal Ratzinger (mais tarde Papa Bento XVI) em 1985, a uma Nota Pastoral dos nossos bispos por ocasião do Ano Europeu da Música (em novembro de 1985).

E o nosso Papa Francisco, por mais de uma vez, tem insistido que a Música Sacra e Canto Litúrgico devem estar plenamente inculturados nas linguagens artísticas atuais.

Quais os compositores que mais ouve e, desses, que obras prefere?

J.S. Bach é incontornável. Oiço com frequência, por exemplo, a Cantata do Café, cuja ária Hat man nicht mit seinen kindern fez parte do programa do meu exame do Curso Superior de Canto de Concerto, e foi uma das provas de acesso ao Coro Gulbenkian, em novembro de 1974; a Missa em Si m, cujas árias de baixo cantei; e a Paixão Segundo S. João, em que interpretei o papel de Jesus, no Porto, em abril de 1977, quando ainda estagiava em Paris…
Haëndel (O Messias, e Música Aquática); Beethoven (Sinfonias 3, 6 e 9) e a ópera Fidelio, cujo papel de Rocco desempenhei em junho de 1986; Mozart (o Requiem que, enquanto membro do Coro Gulbenkian, cantei no Coliseu em 1975, com gravação para a Erato; a Sinfonia nº 40, etc etc); Haydn (A criação, a Missa de Santa Cecília e a Sinfonia Concertante); Bizet (Carmen); Bramhs (Um Requiem Alemão);Rossini (Stabat Mater); Tchaickowsky (Romeu e Julieta e Francesa da Rimini; Dvorak (Sinfonia nº 9, O Novo mundo); Ravel (Bolero); Rodrigo (Concerto de Aranjuez); Strauss (valsas); Elgar (Concerto para violoncelo).

E muito, muito mais, obviamente.

O que o levou a colecionar livros e discos?

Certamente, e de uma forma geral, o meu gosto pela música, a ligação à Igreja, o meu profissionalismo, a cultura. É claro que tudo se desenrola de acordo com as diversas etapas da vida:

a minha função de professor de Música (além de outras disciplinas) no seminário menor, após a minha formação, e o começo dos meus estudos no Conservatório;

a minha transição para a vida pastoral, durante 3 anos;

a minha ida para Lisboa para concluir o curso Superior, do Conservatório, e a minha curta passagem pela Fundação Gulbenkian;

o meu estágio de dois anos em Paris, concluído com 2 meses em Itália;

o começo e a continuação da minha carreira lírica no Teatro Nacional de São Carlos;

os 3 anos pós-São Carlos em que continuei a minha carreira;

o abraçar de novo projeto: “trabalhar” um coro inserido numa missão pastoral na Paróquia dos Anjos (Lisboa), a minha Paróquia, a partir de 1997 e, posteriormente, de 2003 a 2016, na capela do Palácio da Bemposta (Academia Militar);

e porque não dizê-lo, as minhas viagens de automóvel, algumas longas, nos anos 70 e daí para cá, para já não falar da minha própria casa…

Como vê, são muitas as etapas e as circunstâncias em que procurei estar sempre em dia e dentro das exigências das mesmas. Livros, discos, cassetes, CDs, DVDs eram verdadeiros instrumentos de trabalho, de cultura, de ocupação, de prazer…

Julgo ter sintetizado as razões da minha importante biblioteca e discoteca, das quais progressivamente e criteriosamente, me vou voluntariamente desfazendo.

Antes da sua formação académica no conservatório, que lugar tinha a música erudita no seu papel de formador no seminário?

Além de renovar completamente o repertório de cânticos religiosos que vinha de há longos anos (o que supunha rodear-me de bom material), comecei a interessar-me por vozes maravilhosas que os discos faziam chegar até nós (Mario Lanza, Luis Mariano, Alfredo Krauss etc, e por orquestras excecionais que nos traziam as mais belas melodias clássicas, canções famosas, música de filmes históricos…

Tive sempre a preocupação de partilhar com os meus jovens alunos algum desse maravilhoso mundo musical… Era importante para a educação da sua sensibilidade, dos seus gostos, da sua cultura.

Lembro-me, e muitos ex-alunos (quer do seminário, quer do ensino público) se recordarão de ter dado a ouvir, entre outras obras, uma pequena peça do compositor russo Alexander Borodine. Tratava-se de Nas estepes da Ásia Central. Era a caravana que surgia ao longe, a marcha dos camelos, a intensidade instrumental que “subia” a anunciar a chegada da caravana, a permanência no terreno, o retomar da marcha, os sons que se iam extinguido… até a caravana se perder de vista!… Era tudo tão belo, tão claro! Apaixonante!… O interesse era enorme. Os alunos começavam a compreender que a música tem um sentido, um conteúdo, uma intenção, uma finalidade, uma expressão!
O mesmo sucedeu com outras obras, como o Hino da Alegria, da IX Sinfonia de Beethoven! Etc etc.

Mas adverti-os sempre para que nada disto desviasse a atenção do essencial da sua formação!…

Em três palavras como se caracteriza a si mesmo?

Persistente! Perfecionista! Brioso!

Lisboa, 19 de março de 2018

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JOSÉ DE FREITAS NA COMUNICAÇÃO SOCIAL

Um barítono que é crítico de si próprio

Correio da Manhã, 28 de abril de 1986

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De padre a cantor principal de ópera no Teatro São Carlos

Diário de Notícias do Funchal, 11 de maio de 1986

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José de Freitas: de padre a cantor

Correio da Manhã, 02 de agosto de 1987

Ilha da Madeira

Canções da Madeira

Letras

A nossa Ponta do Pargo

A nossa Ponta do Pargo,
ela nove sítios tem,
começando pelo Lombo,
no Amparo a nossa mãe.

Depois segue a Lombadinha,
Salão de Cima também,
a Igreja de S. Pedro,
por padroeiro se tem.

E segue o Salão de Baixo,
grande valor nele encerra,
nele temos o farol,
que alumia o mar e a serra.

Mais o sitio do Serrado,
e a Ribeira da Vaca,
depois a Lombada Velha,
E o Cabo a que remata.

Esta nossa freguesia,
é zona de agricultura,
Também se canta e baila,
que a vida no campo é dura.

É a batata e a semilha
e o trigo para o nosso pão.
Também cultivamos vinho,
com foice e enxada na mão.

Se cultivam hortaliças.
Também os nossos legumes
e criamos animais,
com tradições e costumes.

Também temos boa fruta,
que é o pêro e a maçã
e com esforço e trabalho,
de toda esta gente sã.

Com trabalhos e canseiras,
plantamos nossas flores,
toda esta Ponta do Pargo,
Cantam a Deus seus louvores.

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A ponta de São Lourenço

A ponta de São Lourenço
É mais além um nadinha
Foi onde o rei deu à costa
Dentro das pernas da rainha.

Adeus ilha da Madeira
As costas te vou voltando
Não sei o que deixo nela
Que os meus olhos vão chorando.

À Paúl tão grande
Ao longe parece bem
Eu só queria ter
O que no Paúl tem.

A semana a cobiçar

[ Mourisca do Caniçal ]

A semana a cobiçar,
De amor ela me cobiça…
Se não lograr os teus olhos
Domingo não vou à missa!

No adro da igreja, naquele apertão,
O lenço que tinha roubaram-mo da mão.
Garota de seda de trinta mil cores…
Quem deitavas, velha, a voz de namoro?

Se não sabes onde eu moro…
Eu moro ali além,
Numa casinha de palha,
Sozinho mais minha mãe.

No adro da igreja, naquele apertão,
O lenço que tinha roubaram-mo da mão.
Garota de seda de trinta mil cores…
Quem deitavas, velha, a voz de namoro?

Ó senhor de longe, longe,
Ó senhor, d’onde vens?
Venho passar o Natal,
Natal, a casa da minha mãe.
Quem não entrar no caminho
P’ró ano já cá não vem.

No adro da igreja, naquele apertão,
O lenço que tinha roubaram-mo da mão.
Garota de seda de trinta mil cores…
Quem deitavas, velha, a voz de namoro?

São quatro p’ra baile
E cinco p’ra perto;
Eu brinco contigo
E dá-me tudo certo.

Letra e música: Tradicional (Madeira)
Recolha: Artur Andrade e António Aragão
Intérprete: Real Companhia (in CD “Orgulhosamente Nós!”, Lusogram, 2000)
Primeira versão [?]: Encontros da Eira (in CD “Retalhos de Tradição”, Almasud Records, 1998; CD “O Melhor dos Encontros da Eira”, Vidisco, 2002)

Caniçal
Caniçal (Madeira)

Da minha janela à tua

Da minha janela à tua
Do teu coração ao meu
Podia andar um navio
O navegador seria eu.

Ó mar alto, ó mar alto
Ó mar alto sem ter fundo
Mais vale andar no mar alto
Que andar nas bocas do mundo.

Quando o sobreiro der baga
A cortiça for para o fundo
Então se há-de acabar
Estas más línguas do mundo.

Se o mar fosse de azeite
Como é de água salgada
Eu ia lá fora e vinha
Sem pagar frete nem nada.

Sem pagar frete nem nada
Meu amor para o Brasil
Não pagava o passaporte
Meu amor sem de lá vir.

O meu amor me deixou só
Para amar outra menina
Mas as lágrimas que eu choro
Sai-me da testa para cima.

O meu amor me deixou só
Não por nada que eu fizesse
Foi só para amar uma louca
Isto é, casos que acontecem.

Trabalhai, dobrai o corpo
Se queres ser alguém
Olhai que nas eras de hoje
Quem não trabalha não tem.

Casei-me para descansar
Tomei dobrada canseira
Mais valia que eu tivesse
Em casa do meu pai solteira.

Tu dizes que eu sou tua
Em que papel assinei
O mundo dá muita volta
Deus sabe eu de quem serei.

Reciclanda

Reciclanda

O projeto Reciclanda promove a reutilização, reciclagem e sustentabilidade desde idade precoce.

Com música, instrumentos reutilizados, poesia e literaturas de tradição oral, contribui para o desenvolvimento global da criança e o bem estar dos idosos. Faz ACD e ALD (formações de curta e longa duração), realiza oficinas de música durante o ano letivo e dinamiza atividades em colónias de férias. Municípios, Escolas, Agrupamentos, Colégios, Festivais, Bibliotecas, CERCI, Centros de Formação, Misericórdias, Centros de Relação Comunitária, podem contratar serviços Reciclanda.

Contacte-nos:

António José Ferreira
962 942 759

Embala, preta, embala

[ Embalo da Madeira ]

Embala, preta, embala!
Embala-m’ esta menina,
Que a menina vai dormir
Porqu’ ela é pequenina!

E também tu, Maria,
Pede àquela cotovia
Que fale mais devagar,
Não vá João acordar!

Calai-vos, águas do moinho!
Mário, fala mais baixinho!
Deixa o menino dormir,
’tá no primeiro soninho.

Letra e música: Tradicional (Serra d’Água, Madeira)
Informante: Serafina da Silva (canto)
Recolha: Manuel Rocha (“Embalo”, in CD “Povo Que Canta: Recolhas Etnográficas num Portugal Desconhecido (2000/2003)”, faixa 11, EMI-VC, 2003)
Intérprete: Segue-me à Capela (in Livro/CD “San’Joanices, Paganices e Outras Coisas de Mulher”, Segue-me à Capela/Fundação GDA/Tradisom, 2015)

Era um anjo

Era um anjo, era um anjo
Meu Deus que eu tanto amei
Confesso que ainda o amo
E nunca o esquecerei.

Eu subi à ameixieira
Para apanhar uma ameixa
Arranjei um pechãozinho
O pai quer, a mão não deixa.

Nevoeiro, nevoeiro
Vai pr’a trás do teu palheiro,
Que hoje faço-te um bolo
E amanhã faço um brindeiro.

Ah mê Deus qu’eu já não posso
Subir a esta ladeira
Quand’eu chegar ao chãozinho
Eu vou dar uma carreira.

Há três dias que eu não como
Há quatro que não bebo vinho
Há cinco que eu não alcanço
Da tua boca um beijinho.

Esta é a moda da Ciranda

[ A Ciranda ]

Esta é a moda da Ciranda
É uma moda bem ligeira
Pra juntar as raparigas,
Como o trigo na joeira.

Coro

Ó Ciranda, ó cirandinha,
Vamos nos a cirandar
Vamos dar a meia volta,
Meia volta vamos dar.
Vamos dar a outra meia,
Adiante troca o par.

Adiante e troca o par,
Que o meu par já está trocado.
O amor que Deus me deu,
Aqui o tenho a meu lado.

A ciranda me convida
Para eu ir ao Cirão
Fiar uma maçaroca
Do mais fino algodão.

Vamos cantar a ciranda
Para animar este povo
Para alegria de todos
Desde o mais velho ao mais novo.

Estava a bela infanta

[ Cantiga da guerra ]

Estava a bela Infanta
No seu jardim assentada
Com pente de ouro fino
Os seus cabelos penteava.

Deitou os olhos ao mar
Viu vir uma grande armada
Capitão que nela vinha
Muito bem a guardava.

Dizei-me vós capitão
Dessa tão formosa armada
Se vistes o meu marido
Na terra que Deus pisava.

Anda tanto cavalheiro
Naquela terra sagrada
Mas dizei-me vós senhora
Os sinais que ele levava.

Levava cavalo branco
De selim de prata dourada
Na ponta da sua lança
A cruz ele levava.

Eu sou de cá

Eu sou de cá, você de lá
Sou do lado da lagoa
De dia não tenho tempo
Há noite vou de canoa.

Dei um beijo, ela zangou-se
Dei outro ela sorriu
O terceiro que lhe dei
Foi ela que me pediu.

Refrão

Eu queria passar o rio
Do rio da Assomada
Eu queria falar com a moça
A velha é que me atrapalha.

Refrão

Dei um beijo numa preta
Cheirou-me a café torrado
Foi o beijo mais gostoso
Que a minha boca têm dado.

Refrão

A minha canoazinha
Que anda à roda de vapor
Ainda está para nascer
Quem vai ser o meu amor.

Refrão

No meio daquele mar
Está uma parreira de uvas
Não há faca que as corte
Lá se perdem de maduras.

Foram dizer a meu pai

Foram dizer a meu pai
Que eu namorava bem
Também o meu pai no seu tempo
Namorou a minha mãe.

Se eu quisesse amores
Tinha mais de um cento
Bonecos de palha
Cabeças de vento.

O meu amor ontem à noite
Pela vida me jurou
Que se ia deitar ao mar
Se ele vai eu cá não vou.

Foram dizer ao meu pai
Que eu namorava alto
Também meu pai no seu tempo
Namorou três e quatro.

No tempo que eu te amava
Não amava a mais ninguém
Amava noventa e nove
Contigo fazia cem.

Foram dizer a meu pai
Que eu casava no Lanço
Leve diabo quem lhe disse
Que nunca tenha descanso.

Dizes que te vais embora
O meu coração não te quita
Se eu procurar hei-de achar
Outra cara mais bonita.

Não passes à minha porta
Nem a pé nem a cavalo
Que o meu pai é lavrador
Não quer genro fidalgo.

No meio daquele mar
Está um pinheiro florido
Não há nada mais bonito
Que a mulher e o seu marido.

Se eu quisesse amores
Que me têm dado
Tinha a casa cheia
Até ao telhado.

O anel que tu me deste
Era de vidro e quebrou-se
A amizade que eu te tinha
Era de água e derramou-se.

Subi à ameixieira
Para apanhar uma bela ameixa
Fui falar à rapariga
O pai quer a mãe não deixa.

Deitei o limão correndo
À tua porta parou
Quando o limão tem malícia
Que fará quem o deitou.

Ó meu amor vem cá à noite
Tenho ceia para te dar
É café e milho frito
E beijinhos ao caminhar.

Se fores daqui para fora
Diz para que terra vais
Deixa-me o teu nome escrito
Numa pedrinha no cais.

Meu amor, ó meu amor
Que agravo de mim tiveste?
O terreiro já tem erva
Há tanto que aqui não vieste.

O meu amor diz que vinha
Diz que vinha, mas não veio
Amanhã pelas nove horas
Tenho carta no correio.

O meu amor vai-se embora
Não vale a pena chorar
A melhor coisa a fazer
É pôr outro em seu lugar.

Já lá vai o sol abaixo
Com Maria pela mão
Maria vai rosadinha
Manuel cor de limão.

Rapariga do diabo
Deus te queira dar saúde
Andava para te enganar
Rapariga nunca pude.

Tenho um castanheiro na serra
Não lhe ponhas o machado
Que a sombra do castanheiro
Tem o meu amor deitado.

Ajudai-me a cantar
Que eu não posso cantar só
O meu coração magoado
Só dele pode haver dó.

Os meus olhos de chorar
Já nenhuma graça tem
Já avisei os meus olhos
Que não chorem por ninguém.

Dei-lhe um limão correndo
Pela rua nova abaixo
Quanto mais o limão corre
Quantos mais amores acho.

Madeira

Madeira
É tão linda assim
É como uma linda rosa
Plantada no meu jardim.

Madeira toda
Cercada de mar
Toda ela é um jardim
Para os Madeirenses cheirar.

Os que visitam a Madeira
Ficam muito encantados
Em ver as lindas montanhas
E os seus lindos prados.

A Madeira é um jardim
No mundo não há igual
Suas belezas não têm fim
É filha de Portugal.

Nas serras do norte
Respiramos ar puro
Eu muito lá passei
É por isso que eu juro.

Fazem-se muitos remédios
Com o mel das abelhinhas
Quando dão à luz os bebés
As mulheres ficam meninas.

Madeira és
Para mim um jardim em flor
Onde colhi muitas flores
Para o altar do Senhor.

Madeira em ti
Está minha terra natal
Onde vivi e aprendi
A fugir de todo o mal.

Meu amor, o teu lencinho

Meu amor o teu lencinho
Guardo com muito carinho
Nunca mais te esqueças dele
Recorda na despedida.

Quando a minha partida
Me acenas com ele.
Vou pedir à Virgem Santa
Que me dê coragem tanta.

Que abrande a minha dor
Desse seu branco lencinho
Ter enxerga do bercinho
Onde embala o nosso amor.

Não sei o que fiz à Lua

Não sei o que fiz à Lua
Não me dá no terreiro
Vou mandá-la prender
Nas grades de um limoeiro.

Não sei o que fiz à Lua
Não me dá claridade
Vou mandá-la prender
Na cadeia da cidade.

Amarrei o sol à lua
Na ponta de um guardanapo
O sol era pequenino
Fugiu-me para um buraco.

Não te encostes à parreira

[ Em Tempo de Vindimas ]

Não te encostes à parreira
Qu’a parreira larga pó!
Encosta-te à minha cama:
Sou solteiro e durmo só!

Ai, venha vinho, venha vinho!
Venha mais meio galão!
Quem quiser beber vinho
Ponha a boca ao garrafão.

Ai, venha vinho, venha vinho!
Venha mais meia canada!
Quem quiser beber vinho
Ponha a boca na levada.

Ai Maria! Ai Maria!
Não é coisa que se faça:
Tu queres é beber o vinho
Daqui da minha cabaça.

Minha mãe não quer que eu beba
Nem vinho nem aguardente;
Nada no mundo me alegra,
Só contigo estou contente.

Se tu quiseres qu’eu cante,
Dá-me um copo de vinho!
Que o vinho é coisa santa,
Faz o cantar miudinho!

Se os senhores querem qu’eu cante,
Dêem-me vinho ou dinheiro!
Qu’esta minha gargantinha
Não é fole de ferreiro!

Se os senhores querem qu’eu cante,
Dêem-me vinho ou dinheiro!
Qu’esta minha gargantinha
Não é fole de ferreiro!

Letra: Popular (quadras recolhidas por Lília Mata, no Sítio da Ribeira dos Pretetes, Caniço, Santa Cruz, Ilha da Madeira)
Música: Carlos Alberto Moniz
Intérprete: Carlos Alberto Moniz
Versão original: Carlos Alberto Moniz (in Livro/2CD “O Vinho dos Poetas”: CD 2, Carlos Alberto Moniz/Ovação, 2014)

No meio daquele mar

No meio daquele mar
Tem uma parreira de uvas
Não há faca que as corte
Já se perdem de maduras.

A parreira dá-me um cacho
O cacho dá-me um baguinho
Quero fazer água pé
Já que meu pai não tem vinho.

Vim-me embora para a cidade
Que o campo já me aborrece
Dentro da cidade eu tenho
Quem penas por mim padece.

Subi ao céu numa escada
E desci num cacho de uvas
Só Deus é que pode ajudar
Estas pobres viúvas.

Meu amor vem cá à noite
Tenho uma coisa para lhe dar
Cafezinho, milho frito
E um beijinho ao caminhar.

O meu amor era um cravo

O meu amor era um cravo
Que aquele craveiro deu
E todo o mundo tem inveja
Daquele cravo ser meu.

Mandei fazer um jaleque
No Pico da Band’Além
Se não casares comigo
Não casas com mais ninguém.

Maria porque não tens
Uma cédula com’as outras?
A vontade era boa…
As moedas eram poucas!

Ó minha mãe

Ó minha mãe, minha mãe
Não me chame sua folha
Chama-me uma destravada
Que nasci para a triste vida.

Minha mãe, minha mãe
Triste vida sem mulher
É bonita corre a fama
É feia ninguém a quer.

Lua, lua
Lua, luar
Pega o meu filhinho
Ajuda-me a criar.

Quando eu era pequenina
Minha mãe me aninhava
Até eu adormecia
Com beijos que ela me dava.

Manuel mais Maria
São filhos da mesma mãe
Manuel é mais bonito
Maria que culpa tem?

Quando eu nasci à noite
Nem uma estrela brilhava
A lua minha madrinha
Lá no céu me alumiava.

Oh meu amor

Oh meu amor, meu querido,
Amor do meu coração,
Quem me dera te poder ver,
Que nunca mais te vi não.

Se tu visses o que eu vi,
Lá no Rio de Janeiro,
O macaco a bater palmas,
Na testa do sapateiro.

Mariquinhas da levada,
Rega o teu manjericão,
Que hoje eu sou levadeiro,
Amanhã serei ou não.

Quando estiver a morrer

Quando estiver para morrer
E para deixar esta vida
Jesus, Maria e José
Hão-de ser minha guarida.

Hão-de rodear-me o leito
Com carinho maternal
P’ra que as forças do inferno
Não possam fazer-lhe mal.

Jesus e a mãe santíssima
Mais o meu Pai São José
Com amor hão-de dizer-me:
Não foi vã a tua fé.

Todos três hão-de fazer-me
Ao morrer Cruz na testa,
São José fechar-me os olhos
A morte para mim é festa.

Que bom é deixar o mundo
Amparado por teus pés
Maria, Jesus e José
Não me deixarão jamais.

São Vicente

[ Hino de São Vicente ]

São Vicente, São Vicente
Capelinha à beira mar
Não esqueças São Vicente
Ande lá por onde andar.

Vem cá assim
Não fujas de ao pé de mim
Vem cá assim
Não fujas de ao pé de mim.

Com o povo de São Vicente
Nem a polícia se mete
Vamos todos prá rambóia
Nem que chovam canivetes.

São Vicente, te és linda terra

São Vicente tu és linda terra
Tu és minha, tu és singular
Não esqueças São Vicente
Andes lá por onde andar

Tens costumes bem antigos
Que honram a tua gente
Por toda a parte tem fama
O jaqué de São Vicente

Tuas serras alterneiras
Olhando o fundo da ribeira
Tuas paisagens verdejantes
As mais lindas da Madeira.

São Vicente mora no calhau
Casinha de pedra portinha de pau.

Sapato que a mim não serve

Sapato que a mim não serve,
Fora do meu pé deitei,
Não mim importa que outro logre,
Amores que eu rejeitei.

Se eu tivesse não pedia,
Coisa nenhuma a ninguém,
Como não tenho peço,
Uma filha a quem as tem.

Ó melro-preto vadio,
Vai cantar a onde quer,
É como o rapaz solteiro,
Enquanto não tem mulher.

Namorar não é pecado,
A quem é desimpedido,
Namorar homens casados,
É um desvairado sentido.

Em frente de mim estão olhos
Olhos que me estão matando
Tu vais dar contas a Deus
Das penas que me estás dando.

Todas nós formamos berço

Todas nós formamos um berço
Para Jesus adormecer
Em nós todas um sacrário
Para conosco ele cantar.

Trigo louro, trigo louro
Empresta-me a tua cor
Quero ir ao Calisberto
Servir a Nosso Senhor.

Cantiguinhas que eu sabia
Todas o vento me levou
Só as de Nossa Senhora
Na memória me ficou.

Carlos Alberto Moniz
Amendoeiras em flor no Algarve

Canções do Algarve

Letras

A virgem de Guadalupe

A virgem de Guadalupe
Quando vai pela ribeira,
Descalcinha pela areia
Parece uma rianceira.

Ondinhas vêm,
Ondinhas vêm,
Ondinhas vêm do mar,
Não te vás à rianceira
Não te vás amariar.

Cada vez que passo a ponte
Sempre te encontro lavando,
A formosura que tu tens
A água a vai levando.

Ondinhas vêm,
Ondinhas vêm,
Ondinhas vêm do mar,
Não te vás à rianceira
Não te vás amariar.

Letra e música: Popular
Intérprete: Roda Pé (in CD “Escarpados Caminhos”, public-art, 2004)

Rodapé

Abalei aqui por abaixo

[ Oração à Virgem ]

Abalei aqui por abaixo
Com o três horas serão
Encontrei a Virgem Pura
Com um ramalhete na mão.

Eu lhe pedi uma folhinha
E ela me disse que não
Eu lhe tornei a pedir
E me deu seu bem do cordão.

Zebelinha tecedeira
Tece-me este cordão
Que me deu a Virgem Pura
Sexta-Feira da Paixão.

Santo Antóino é meu pai
E São Francisco é meu irmão
Os anjinhos meus parentes
Ó que linda geração!

Popular – voz masculina (Monchique, Algarve)
Recolha de José Alberto Sardinha (1981) (in CD n.º 6 de “Portugal: Raízes Musicais”, JN/BMG, 1997)

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Ai que saudade tenho do meu canto

Ai que saudade tenho do meu canto, da minha terra!
Só vejo o mar adentro e o céu a te apartar.

Ai esta vida corre e roda, roda, ai, a moer;
Não há razão, mãe, para voltar sem que fazer.

Eu hei-de ir, eu hei-de voltar à terra, ao meu lugar!
Voltar à minha mãe, ao teu regaço, ao meu penar!

Meus olhos choram longe, ai, tão cansados de esperar…
Ai esta vida corre e roda, roda, ai, a moer;
Mas eu hei-de voltar à minha terra, ao meu lugar!

Meus olhos choram longe, ai, tão cansados de esperar…
Mas eu hei-de voltar à minha terra, ao meu lugar!

Letra: Macadame
Música: Tradicional (Loulé, Algarve)
Recolha: José Alberto Sardinha (“Janeiras”, in “Portugal – Raízes Musicais”: CD 6 – Algarve e Ilhas, BMG/JN, 1997)
Intérprete: Macadame
Versão original: Macadame (in Livro/CD “Firmamento”, Macadame, 2016)

Algarve, o nome me está lembrando

[ Santa Maria, a Sem-Par ]

Algarve, o nome me está lembrando
Algarve, e a brisa passa a cantar.
E as sombras leva-as o vento voltando.
Silêncio, dizem as ondas do mar.

Morenas em bandos sobre açoteias
Janelas abertas sobre um palmar
Já vejo de longe as altas ameias
Já vejo Santa Maria, a Sem-Par.

Algarve, jardim de rosas vermelhas
Algarve, brancura de pedra e cal
Cidade dentro dum pátio sem telhas
Dormindo debaixo de um laranjal.

Nas praias, dedos de finas areias
Teu nome lembram ao vento a passar
Já vejo de longe as altas ameias
Já vejo Santa Maria, a Sem-Par.

Letra: José Afonso
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Reciclanda

Reciclanda

O projeto Reciclanda promove a reutilização, reciclagem e sustentabilidade desde idade precoce.

Com música, instrumentos reutilizados, poesia e literaturas de tradição oral, contribui para o desenvolvimento global da criança e o bem estar dos idosos. Faz ACD e ALD (formações de curta e longa duração), realiza oficinas de música durante o ano letivo e dinamiza atividades em colónias de férias. Municípios, Escolas, Agrupamentos, Colégios, Festivais, Bibliotecas, CERCI, Centros de Formação, Misericórdias, Centros de Relação Comunitária, podem contratar serviços Reciclanda.

Contacte-nos:

António José Ferreira
962 942 759

Algarve, serras mansas

Algarve, serras mansas onduladas
aos poucos aplanando-se em campinas,
praias de areia e rochas arrendadas,
verdes sapais e manchas de salinas

E o mar, mais pronto a calmas que a furores
às traineiras levando os pescadores,
peixes brilhando em raras pedrarias
e o mar, mais pronto a calmas que a furores

Às traineiras levando os pescadores
peixes brilhando em raras pedrarias,
matos floridos, árvores variadas,
farrobas, figos, amêndoas e citrinas.

Terras vermelhas, hortas afogadas
n’águas doces de noras e de minas
e o céu, tonto de sol, pintado a cores
de inverosímeis, múltiplos fulgores

Jardim das mil e uma fantasias
e o céu, tonto de sol, pintado a cores
de inverosímeis, múltiplos fulgores,
jardim das mil e uma fantasias.

Letra: António Balté
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Atira, caçador, atira

Atira, caçador, atira,
Lá no meio da parada!
O meu amor é galucho,
Atira mas não mata nada.

Atira mas não mata nada,
Atira, não mata ninguém,
Lá no meio da parada
Do quartel de Belém.

Atira, caçador, atira,
Lá no meio da parada!
O meu amor é galucho,
Atira mas não mata nada.

Atira mas não mata nada,
Atira, não mata ninguém,
Lá no meio da parada
Do quartel de Belém.

Eu fui caçar à tapada,
Cheguei lá muito feliz;
Encontrei a minha amada
E matei uma perdiz.

Sou galucho de infantaria,
Sou tropa no Alentejo
E sinto muita alegria
Quando na rua te vejo.

Atira, caçador, atira,
Lá no meio da parada!
O meu amor é galucho,
Atira mas não mata nada.

Atira mas não mata nada,
Atira, não mata ninguém,
Lá no meio da parada
Do quartel de Belém.

Eu fui-te ver ao montado
Sentada à porta do monte,
Com os teus olhos brilhantes
À espreita do horizonte.

Tinhas um sorriso aberto
Perfumando a atmosfera;
Eras a mais linda flor
Que me trouxe a Primavera.

Atira, caçador, atira,
Lá no meio da parada!
O meu amor é galucho,
Atira mas não mata nada.

Atira mas não mata nada,
Atira, não mata ninguém,
Lá no meio da parada
Do quartel de Belém.

Letra: Popular e Francisco Naia
Música: Popular
Intérprete: Francisco Naia (in CD “Francisco Naia e a Ronda Campaniça”, Francisco Naia/Ovação, 2012)

Canta na beirada andorinha

[ Laranjinha Doce ]

Canta na beirada andorinha
Chega a primavera e o amor
Uma vida inteira
Duas à espera
Noites sem dormir p’ra um beijo teu

Mil horas passadas sem saber
Horas, dias sem fim, o meu amor
Cantando dizia, noite e melodia
Pareceu-me um ano
Um só dia

Está chegando o tempo [do] ramo em flor
Laranjinha doce, meu amor
Espero por ti
Canto por aí
Vem cair, à noite, nos braços meus
Espero por ti
Canto por aí
Vem cair, à noite, nos braços meus

Nota: «”Laranjinha Doce”, Amor, Moça bonita, romance Algarvio…» (Zé Francisco)

Letra e música: José Francisco Vieira
Intérprete: Zé Francisco & Orquestra Azul (in CD “Caminho de Mar e Luz”, José Francisco Vieira/Alain Vachier Music Editions, 2013)

Da beira-sonho lês

[ Amante do Mar ]

Da beira-sonho lês
o mar que tens aos pés
Lagos que és pátria de Gil e Frei Gonçalo;
poiso de mareantes
albergaste infantes
e à aventura afrontaste o mar alto;
de pele salgada vens
com o ar quente de quem
dos horizontes bebe o cheiro e a magia;
ó loira do meu Sul
minha fronteira azul
cais de embarque, proa e guia.

Fronteira de sonhos
aberta para o mar
em jeito sensual e quente;
velha majestade
com a tua idade
devias ser mais prudente;
tiveste aventuras
e hoje com as loucuras
do teu passado altaneiro
ainda continuas
amante do mar
e amor de marinheiro.

Da beira-sonho lês
o mar que tens aos pés
Lagos que és pátria de Gil e Frei Gonçalo;
poiso de mareantes
albergaste infantes
e à aventura afrontaste o mar alto;
de pele salgada vens
com o ar quente de quem
dos horizontes bebe o cheiro e a magia;
ó loira do meu sul
minha fronteira azul
cais de embarque, proa e guia.

Fronteira de sonhos
aberta para o mar
em jeito sensual e quente;
velha majestade
com a tua idade
devias ser mais prudente;
tiveste aventuras
e hoje com as loucuras
do teu passado altaneiro
ainda continuas
amante do mar
e amor de marinheiro.

Da beira-sonho lês
o mar que tens aos pés
Lagos que és pátria de Gil e Frei Gonçalo;
poiso de mareantes
albergaste infantes
e à aventura afrontaste o mar alto;
de pele salgada vens
com o ar quente de quem
dos horizontes bebe o cheiro e a magia;
ó loira do meu Sul
minha fronteira azul
cais de embarque, proa e guia.

Letra e música: Afonso Dias
Poema dito da autoria de Sophia de Mello Breyner Andresen (excerto de “Lagos II”, 1975, in “O Nome das Coisas”, Lisboa: Moraes Editores, 1977)
Intérprete: Afonso Dias com Tânia Silva (in CD “O Mar ao Fundo”, Bons Ofícios – Associação Cultural, 2015)

Da serra veste perfumes

[ De Sol a Sul ]

Da serra veste perfumes,
do levante inquietações.
Do tempo lhe vêm famas
do mar as consolações.

Velha Romana, Tuaregue,
maruja, aventureira,
dos mares sabida e da vida
sabe tudo, de matreira.

Minha loira, meu azul
faz-te ao mar, despe esse manto
de nevoeiro e de sal,
desnuda-te do quebranto
de seres ponto de partir.

Navega com rumo a ti,
descobre-te em Portugal,
teu porto é de hoje e aqui.
Velhas profecias,
meu 29 de Agosto.
Meu queijo de figo,
sueste agreste,
sol posto.
Meu Infante
navegante.
Cheiro a sardinha
no rosto.
Cidade, eu te escuto
tu me acolhes,
tu me afagas.
Regaço de mãe,
doce carícia de algas.
Varanda de sol a sul.
Gente firme não se cala.
Que o sonho se faça
pouco a pouco,
passo a passo.
Que a tristeza afogue
na largueza dum abraço.
Que a alegria canse
este cansaço.
É hoje que a gente
vai dizer como é que quer,
seja o bicho homem
ou o bicho seja mulher.
E que venha por bem
quem vier.

Letra e música: Afonso Dias
Intérprete: Afonso Dias / Trupe Barlaventina (in CD “Lendas do País do Sul“, Concertante, 1999; CD “Geometria do Sul”, Edere, 2002)

Lendas do País do Sul

Deus te salve, ó Rosa

– Deus te salve, ó Rosa
Claro Serafim,
Pastora formosa,
Que fazeis aqui?
– Estou guardando o meu gado,
Que eu aqui “deixi”.

– Deixai vosso gado,
Que eu o guardarei,
Quero ser vosso criado,
Linda flor, meu bem.

– Não quero criados
De meias de seda;
Não quero que as “arrompa”
Cá por estas estevas.

– Sapato e meia,
Tudo “arromparei”,
Para ser vosso criado,
Linda flor, meu bem.

– Vá-se já embora,
(E) não me dê mais penas,
Que daqui a nada vem meu amo
Trazer-me a merenda.

– Venha cá, senhora,
(E) Venha cá correndo
Que o amor é louco
Já me vai vencendo…

Letra e música: Tradicional (Aljezur – Algarve)
Recolha: Michel Giacometti
Intérprete: Chuchurumel (in CD “Posta Restante”, Edição de autor, 2007)

Chuchurumel, Posta Restante

Eia, Abu Bacre

[ Evocação a Silves ]

Eia, Abu Bacre, saúda os meus lares em Silves
e pergunta-lhes se,
como penso, ainda se recordam de mim.

Saúda o Palácio das Varandas da parte de um donzel
que sente perpétua saudade daquele alcácer.

Ali moravam guerreiros como leões e brancas
gazelas. E em que belas selvas e em que belos covis.

Quantas noites passei divertindo-me à sua sombra
com mulheres de cadeiras opulentas e talhe fatigado
brancas e morenas que produziam na minha alma
o efeito das espadas refulgentes e das lanças obscuras!

Quantas noites passei deliciosamente junto a um
recôncavo do rio
com uma donzela cuja pulseira rivalizava
com a curva da corrente!

O tempo passava e ela servia-me o vinho do seu olhar
e outras vezes o do seu vaso e outras o da sua boca.

As cordas do seu alaúde feridas pelo plectro estremeciam-me
como se ouvisse a melodia das espadas nos tendões
do colo inimigo.

Ao retirar o seu manto, descobriu o talhe, florescente ramo
de salgueiro, como se abre o botão para mostrar a flor.

Eduardo Ramos, Cantico para Al Mutamid

Poema de Al-Mutamid (in “Portugal na Espanha Árabe”, vol. 1 – Geografia e Cultura, de António Borges Coelho, 1989)
Recitado por Afonso Dias / Trupe Barlaventina (in CD “Lendas do País do Sul”, Concertante, 1999)
Outras versões: António Baeta de Oliveira / Eduardo Ramos (in CD “Andalusino”, InforArte, 1999); Eduardo Ramos (in CD “Cântico para Al-Mutamid”, Ed. de Autor, 2005)

Eu já fui à tua horta

Eu já fui à tua horta
Eu já fui teu hortelão
Já comi da tua fruta
Não sei s’outros comeram ou não

Já foste à minha horta
Mas eu nunca lá te vi
Já comeste da minha fruta
Só num vento que t’eu vi

‘Tás pr’aí de boca aberta
Cara de sardinha crua
Se esta casa fosse minha
Punha-te já no meio da rua

Letra e música: Popular (Algarve)
Arranjo: Eduarda Alves; Margarida Guerreiro
Intérprete: Moçoilas (in CD “Já Cá Vai Roubado”, 2001)

Moçoilas, Já cá vai roubado

Faça “ai, ai”, meu menino

[ Embalo do Algarve ]

Faça “ai, ai”, meu menino,
Que a mãezinha logo vem!
Foi lavar os cueirinhos
À fontinha de Belém.

Vai-te embora, papá negro,
De cima desse telhado!
Deixa dormir o menino,
Está no sono descansado.

Embala, José, embala!
Embala suavemente,
Entretendo o inocente
Com esta cantiga em verso!

Dorme, dorme, meu menino,
Que a mãezinha logo vem!
Dorme, dorme, meu menino,
Que a mãezinha, ai, logo vem!

Letra e música: Tradicional (Alvor, Portimão, Algarve)
Recolha: Michel Giacometti (“Faça ‘ai, ai’, meu menino”, in LP “Algarve”, série “Antologia da Música Regional Portuguesa”, Arquivos Sonoros Portugueses/Michel Giacometti, 1962; 5CD “Portuguese Folk Music”: CD 5 – Algarve, Strauss, 1998; 6CD “Música Regional Portuguesa”: CD 6 – Algarve, col. Portugal Som, Numérica, 2008)
Intérprete: Segue-me à Capela*
Primeira versão de Segue-me à Capela (in Livro/CD “San’Joanices, Paganices e Outras Coisas de Mulher”, Segue-me à Capela/Fundação GDA/Tradisom, 2015)

Ir à bóia de Santana

[ Bóia de Sentença ]

Ir à bóia de Santana
Tinha a sentença rezada
Essa bóia da sentença
Que por mim foi baptizada

Quem me rezou a sentença
Foi o meu patrão ratado
Tem mesmo cara de fome
E tem o nariz furado

Medicamentos me pôs
Lá na caixa de farmácia
P’ra os senhores vou contar
Até lhe acham graça

Um pouco de algodão
E “eneivaquim” contada
Pôs umas gotas de álcool
De mercúrio não me deu nada

Lá parti para a viagem
P’ra Freetown, ir pescar
Ir à ilha das bananas
São muitas horas p’lo mar

Tudo pode acontecer
Pode vir bem ou vir mal
Pode a gente adoecer
Ou apanhar temporal

Quando os patrões se opuseram
Esses homens nem falaram
Lá foram para a sentença
Foram e nem piaram

Esses que vão p’ra a sentença
Vão porque são obrigados
Mas a mim não mandam eles
Comigo estão enganados

Tanto que eles diziam
E nada os via fazer
Essas palavras serviam
P’ra outros homens perder

Garganta de rouxinóis
Com olhinhos de aldrabões
Dentes de mentirosos
E boca de trapalhões

Garganta de rouxinóis
Com olhinhos de aldrabões
Dentes de mentirosos
E boca de trapalhões

Trapalhões, trapalhões,
Trapalhões, trapalhões,
Trapalhões, trapalhões…

Letra: Hermínio José Machado
Música: José Francisco Vieira
Intérprete: Zé Francisco & Orquestra Azul (in CD “Caminho de Mar e Luz”, José Francisco Vieira/Alain Vachier Music Editions, 2013)

“Leva, Leva!” (in LP “Algarve”, série “Antologia da Música Regional Portuguesa”, Arquivos Sonoros Portugueses/Michel Giacometti, 1962; “Portuguese Folk Music”: CD 5 – Algarve, Portugal Som/Strauss, 1998; “Música Regional Portuguesa”: CD 6 – Algarve, Portugal Som/Numérica, 2008)

Manelzinho

Manelzinho, ora você chora…
Você chora, alguém lhe deu.
Qual seria a falsa ingrata
Que o Manelzinho ofendeu?

Tocam nos sinos no Porto
E o meu coração é teu.
Qual seria a falsa ingrata
Que o Manelzinho ofendeu?

Manelzinho, ora você chora…
Você chora, alguém lhe deu.
Qual seria a falsa ingrata
Que o Manelzinho ofendeu?

Anda lá para diante
Que eu atrás de ti não vou!
Não me pede o coração
Amar a quem me deixou.

Manelzinho, ora você chora…
Você chora, alguém lhe deu.
Qual seria a falsa ingrata
Que o Manelzinho ofendeu?

Manelzinho, ora você chora…
Você chora, alguém lhe deu.
Qual seria a falsa ingrata
Que o Manelzinho ofendeu?

Letra e música: Tradicional (Algarve)
Arranjo: Artesãos da Música
Intérprete: Artesãos da Música
Versão discográfica dos Artesãos da Música (in CD “Puleando”, Artesãos da Música/ARMA, 2012)

Mestre Zé cantou um dia

[ Faz Cá Falta a Armação ]

Mestre Zé cantou um dia
Teu nome, Maria Faia
Pouca gente então sabia
Dos índios da Meia-Praia
Gente honrada e lutadora
Em Lagos, Luz e meia arraia

Também nós somos do Sul
Da Vila Santa Luzia
Já cá canta o Ti Saul
E a velha sabedoria
Faz cá falta a armação
O saveiro e o calão

Os velhos lobos do mar
Que agora ficam em terra
Mandou a Europa de lá
Abateram embarcações
Os senhores da nova guerra
Mandam mais, são os patrões

Em Espanha fazem-se ao mar
E nós parados a ver
Na lota manda o espanhol
Onde exerce o seu poder
Enfrentemos mar e sol
Mais vale quebrar que torcer

Se há fé de tudo mudar
Em cada volta do mundo
Se o sal da baixa-mar
É igual ao que há no fundo
Vamos de novo lutar
Com a força do deus Neptuno

Também nós somos do Sul
Da Vila Santa Luzia
Já cá canta o Ti Saul
E a velha sabedoria
Faz cá falta a armação
O saveiro e o calão

Letra: Nuno Manuel Faria
Música: José Francisco Vieira
Intérprete: Zé Francisco & Orquestra Azul (in CD “Caminho de Mar e Luz”, José Francisco Vieira/Alain Vachier Music Editions, 2013)

Meu Algarve, cheio de luz

Meu Algarve, cheio de luz,
és o sol que me ilumina,
u ma estrela que reluz,
o amor que me domina.

És o meu sol branco e doirado
a tua luz me seduz,
paraíso inconquistado,
meu Algarve, minha luz.

És o sol que me ilumina,
minha flor, meu girassol,
a semente que germina,
meu Algarve, cheio de sol.

És uma estrela a brilhar
a minha constelação,
um jardim à beira-mar,
a minha flor em botão.

Letra: Maria José Fraqueza
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Meu Algarve das baladas

[ Corridinho, corridinho ]

Meu Algarve das baladas
Não és bem como te cantam
Mais que moiras encantadas
Tens moiras que nos encantam

Corridinho, corridinho
Antes que a morte apareça
Corridinho, corridinho
Vamos lá viver depressa.

Cava a terra, pisa o mosto
Puxa a rede e continua
A ‘balhar’ até dá gosto
O suor que a gente sua

Corre, pula, rodopia
Até manhanita, moça
Já alugámos o dia
Mas a noite é toda nossa.

Tia Anica da Fuzeta
Tia Anica de Loulé
Da barra da saia preta
Ou da caixa de rapé.

Fala, fala se és capaz
Cantorica, bailarica,
Que no céu não poderás
Já sem corpo, Tia Anica

Letra: Leonel Neves
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Meu Algarve encantador

I. Meu Algarve encantador,
P’ra o poeta e p’ra o pintor
Tens motivos de sobejo…
Até eu, se tivesse arte,
Queria ao mundo mostrar-te
Como te sinto e te vejo.

II. Meu Algarve encantador,
A parte da tua alegria,
Tens o encanto, a magia,
Das amendoeiras em flor.

III. Meu q’rido Algarve, em Janeiro,
Ao turista endinheirado,
Escondes o corpo ulcerado
No fatinho domingueiro.

IV. Só vêem flores os olhos
Desses ilustres senhores,
Mas no Algarve, os abrolhos
São muito mais do que as flores.

V. Mas quem, como eu, o conhece,
Sabe que ele, infelizmente,
Por dentro é muito diferente
Do que por fora parece.

(António Aleixo, in Este Livro Que Vos Deixo, 1969)

Milho verde, milho verde

Deu-me a mim muito trabalho

Milho verde, milho verde
Milho verde, maçaroca
À sombra do milho verde
Namorei uma cachopa

Namorei uma cachopa
Namorei um rapazinho
À sombra do milho verde
Milho verde, miudinho

Milho verde, milho verde
Milho verde, folha larga
À sombra do milho verde
Namorei uma fidalga

Namorei uma fidalga
Namorei o meu amor
Milho verde, milho verde
E à sombra não faz calor

Nem chove nem faz calor
Nem chove nem cai orvalho
E o amor para ser meu
Deu-me a mim muito trabalho

Letra e música: Popular (Algarve)
Arranjo: Eduarda Alves; Margarida Guerreiro
Intérprete: Moçoilas (in CD “Já Cá Vai Roubado”, 2001)

Não há noite mais alegre

Não há noite mais alegre
Que a noite de Natal
Onde nasceu Deus Menino
Antes do galo cantar

Deu o galo três cantadas
Deu o menino nascido
Bendito seja o ventre
Qu’o trouxe nove meses escondido

E a mula como era maldosa
Destapava-o com a ferradura
Mas o boi como era manso
Destapava-o com a armadura

Deus a bem disse ao aboio
Deus lhe deu a bênção
Toda a terra aqui milagre
Toda ela cheira a pão

Sejam altas, sejam baixas
Sejam nada as dê lição
Cada bago dê um moio
Cada moio dê um milhão

Letra e música: Popular (Algarve)
Arranjo: Eduarda Alves; Margarida Guerreiro; José Martins
Intérprete: Moçoilas (in CD “Já Cá Vai Roubado “, 2001)

No Garb realça o azul deuses morenos

As Hespérides são moças algarvias

No Garb realça o azul deuses morenos
À doçura dos figos submetidos.
Vieram gregos. Ficaram Sarracenos.
Nardos enfolham seus nomes esquecidos.

À noite ordenham luas nos terraços,
Dão leite à sombra. Abrolham os perfumes.
Silêncio. Só de um lírio ouvem-se os passos.
Madruga a pesca, rompe um mar de lumes.

Esvoaçam suas túnicas de abelhas
Entre vinhas, seus bêbados recintos;
E quando a amendoeira nas orelhas
Põe flores, deram-lhe os deuses esses brincos.

Vem de turbante o sol e toma posse
De corpos, cactos, milhos e vinhedos.
Excita o açúcar na batata-doce
E despe as almas gregas dos penedos.

Ouro firme, crepúsculos de cinabre
Senhorio de azul. Balcões mouriscos.
Ferve a prata na pesca. O cheiro abre
No ar quente uma vulva de mariscos.

Jardins da Hespéria? Ninfeu de ondas macias,
O mar. As ninfas guardam os pomares.
As Hespérides são moças algarvias
Todas jasmim, da testa aos calcanhares.

Garb de praia e pele magia e lendas,
Branco de extasiadas geometrias.
Absorto o tempo. São gregas as calendas
Com pálpebras de mouras gelosias.

Laranjas, cal, areia e rocha ardente
Têm sede da luz que dá mais vida.
Índigos deuses. Ardor. Tudo é presente.
Causa clara de beira-mar garrida.

Poema de Natália Correia (in “O Armistício”, 1985)
Recitado por Afonso Dias (in CD “Geometria do Sul”, Edere, 2002)
Outra Versão: Carla Moreira / Trupe Barlaventina (in CD “O Perfume da Palavra”, Concertante, 1999)

No Palácio das Varandas

[ Do Palácio das Varandas ]

No Palácio das Varandas
namorei moiras de sonho
escrevi meus versos de luz.
De ruiva cor eram o trono
e o sangue que me sangraram
com espadas sombras de cruz.
Naveguei Arade abaixo
‘té ao azul que gritava
Valentias de aventura.

Em preparos de abalada
do abrigo da enseada
fiz-me ao sonho e à sepultura
trepei agruras de pedra
espojei-me em areias de seda
nadei águas de amargura
Levei os cheiros do monte
plantei estevas no horizonte
flori o mar e a lonjura.

Num tempo antigo de igreja
a santidade da inveja
impôs-se a golpes de espada,
neste sul, do sul sobeja
mais geometria das almas
do que agressões de cruzada.
O Guadiana é travesso
e faz caber num só verso
um povo de duas águas.

Em capital de canções
manda o baile de emoções
esta orgia de poetas.
A velha Garb se ufana
de em mistérios ser estranha
como convém aos profetas.
A velha Garb se ufana
de em mistérios ser estranha
como convém aos profetas.

Hoje o Garb é ribeirinho
e o montanheiro, sozinho
é velhice e sais de pedra.
Da beira-mar para o sol
há que acender o farol
do norte que aponta a serra.
Da beira-mar para o sol
há que acender o farol
do norte que aponta a serra.

Letra: Afonso Dias
Música: Alfredo Correeiro
Intérprete: Afonso Dias (in CD “Geometria do Sul”, Edere, 2002)

Nome de Maria

Nome de Maria
Tão bonito é
Salva-me a minha alma
Que ela vossa é

Que ela vossa é
Sempre o há-de ser
Salva-me a minha alma
Quando eu morrer

Quando eu morrer
Quando eu acabar
Salva-me a minha alma
Para bom lugar

Para bom lugar
Para o Paraíso
Salva-me a minha alma
Dia do Juízo

Dia do Juízo
Para a eternidade
Salva-me a minha alma
Mãe da Piedade

Mãe da Piedade
Senhora das Dores
Salva-me a minha alma
Mãe dos pecadores

Mãe dos pecadores
Senhora da Luz
Salva-me a minha alma
Meu doce Jesus

Meu doce Jesus
Mãe do Nazareno
Salva-me a minha alma
Para sempre, Ámen.

E Jesus é meu
E eu quero ser vosso
Por isso lhe rezo
Este Pai-Nosso.

Popular – voz feminina (Monchique, Algarve)
Recolha de José Alberto Sardinha (1981) (in CD n.º 6 de “Portugal: Raízes Musicais”, JN/BMG, 1997)

Ó água que vais correndo

[ Verde-Gaio ]

Ó água que vais correndo
Mansamente vagarosa,
Passa pelo meu jardim,
Rega-me lá uma rosa!

Água da Fóia corre alta,
Por canais vai à cidade;
Eu não sou rica, mas tenho
Amores à minha vontade.

O ladrão do Verde-Gaio
Foi-se gabar à rainha
Que era dono do morgado
E nem sequer sapatos tinha.

E nem sequer sapatos tinha
Nem dinheiro para os comprar;
O ladrão do Verde-Gaio
Foi-me falso no amar.

Eu tenho à minha janela
O que tu não tens à tua:
Um vaso de violetas
Que perfuma toda a rua.

Bem sei que me andais mirando
Por debaixo do chapéu;
Se eu não sou do vosso gosto
Quem quer anjos vai ao céu.

O ladrão do Verde-Gaio
Foi-se gabar à rainha
Que era dono do morgado
E nem sequer sapatos tinha.

E nem sequer sapatos tinha
Nem dinheiro para os comprar;
O ladrão do Verde-Gaio
Foi-me falso no amar.

O ladrão do Verde-Gaio
Foi-se gabar à rainha
Que era dono do morgado
E nem sequer sapatos tinha.

E nem sequer sapatos tinha
Nem dinheiro para os comprar;
O ladrão do Verde-Gaio
Foi-me falso no amar.

Letra e música: Tradicional (Algarve)
Intérprete: Afonso Dias com Teresa Silva
Primeira versão de Afonso Dias, com Teresa Silva (in CD “Andanças & Cantorias”, Bons Ofícios – Associação Cultural, 2016)

O Algarve é branco

O Algarve é branco, manchado
De espuma branca do mar
Quando o mar endiabrado
Anda com ela a brincar

O Algarve é branco
Nas belas chaminés tão rendilhadas
Das suas casas singelas
Todas de branco caiadas

O Algarve é branco nas praias
Quando as ondas, uma a uma
As vestem de brancas saias
Feitas de rendas de espuma

O Algarve é branco
Nas velas dos seus barcos navegando
Em mar azul, sem procelas
Que de branco o vão pintando

O Algarve é branco nos dias
Que as amendoeiras em flor
Lembram neve em terras frias
Tão semelhantes na cor

O Algarve é branco
À noitinha, quando a lua, ao despertar,
Enche a paisagem inteirinha
De luz branca de luar

O Algarve é branco
À noitinha, quando a lua, ao despertar,
Enche a paisagem inteirinha
De luz branca de luar

Letra: Elisa Maçanita
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Ó Maria, vem bailar

[ Bailarico Algarvio (Corridinho) ]

– Ó Maria, vem bailar o corridinho!
– Ó Manel, não me faltes ao respeito!
– Ó Maria, que as penas do teu peitinho…
E eu não sou Maneleto!
– Ó Maneleto, que eu já te tenho dito:
Cá comigo só se baila com preceito!
– Ó Maria, não sejas tão esquisita,
Que bailamos ao toque da concertina!
Raios me parta se há alguma mais bonita,
Ai que tem como tu a pele tão fina…

Que bem que bailas, ó Maria, mas que bem!
Andas no ar como uma pena levezinha.
Só tenho pena que as penas que o peito tem,
Só tenho pena que as penas não sejam minhas…

Que bem que bailas, ó Maria, mas que bem!
Andas no ar como uma pena levezinha.
Só tenho pena que as penas que o peito tem,
Só tenho pena que as penas não sejam minhas…

– Ó Maria, vem bailar o corridinho!
– Ó Manel, não me faltes ao respeito!
– Ó Maria, que as penas do teu peitinho…
E eu não sou Maneleto!
– Ó Maneleto, que eu já te tenho dito:
Cá comigo só se baila com preceito!
– Ó Maria, não sejas tão esquisita,
Que bailamos ao toque da concertina!
Raios me parta se há alguma mais bonita,
Ai que tem como tu a pele tão fina…

Que bem que bailas, ó Maria, mas que bem!
Andas no ar como uma pena levezinha.
Só tenho pena que as penas que o peito tem,
Só tenho pena que as penas não sejam minhas…

Que bem que bailas, ó Maria, mas que bem!
Andas no ar como uma pena levezinha.
Só tenho pena que as penas que o peito tem,
Só tenho pena que as penas não sejam minhas…

Letra e música: Tradicional (Tavira, Algarve)
Recolha: Grupo Folclórico de Tavira
Intérprete: Cardo-Roxo (in CD “Alvorada”, Cardo-Roxo, 2015)

Cardo-roxo, Alvorada

O Sol é que alegra o dia

[ Arquinhos ]

Cantiga:

O Sol é que alegra o dia
Pela manhã quando nasce;
Ai de nós o que seria
Se o Sol um dia faltasse!

Moças, façam arquinhos!
Moças, façam arcadas
P’ra passar o meu benzinho,
P’ra passar a minha amada!

P’ra passar a minha amada,
O meu benzinho,
Moças, arquinhos!
Moças, arcadas!

P’ra passar o meu benzinho,
A minha amada, |
Moças, arquinhos!
Moças, arcadas!

O meu benzinho…

A minha amada…

Arquinhos (dança de roda)
Letra e música: Tradicional (Ourique / Castro Verde, Alentejo)
Informantes: Grupo Coral e Etnográfico “As Papoilas do Corvo” (Aldeia do Corvo), Manuel Bento (Aldeia Nova) e Pedro Mestre (Sete)
Recolha: Lia Marchi (in “Caderno de Danças do Alentejo”, Associação Pédexumbo e Olaria Cultural, 2010 – p. 36-37)
Intérprete: Aqui Há Baile (in CD “Caderno de Danças do Alentejo – adaptações”, Associação Pédexumbo/Caracol Secreto, 2013)

Ó Sol, vibrante sol

[ O meu Algarve ]

Ó Sol, vibrante sol, do meu Algarve de oiro,
que fazes palpitar os peitos e os jardins
no mesmo grande amor, fecundo, imorredoiro,
que rebenta, na Vida, em olhos e jasmins:
ó Sol que pões no Céu um brilho violento
e fazes chamejar, ao longe, os horizontes,
que pões fogo no ar e pões brasas no vento
e que vais calcinar a epiderme aos montes,
adoro a tua luz vigorosa e sadia,
que modula no campo a música das cores,
que rega, em nossa alma, os cactos da Alegria
e esculpe nas sementes os bustos das flores.
Cai-me sobre o olhar: banha-me em teu fulgor,
ó Sol que pões no Céu um latejante azul:
Dá-me a tua alegria e dá-me o teu vigor,
ó Sol, imortal sol, do meu país do Sul…

Poema (excerto): João Lúcio (in “O Meu Algarve”, 1905)
Música: Pedro Guerreiro
Intérprete: Carla Moreira / Trupe Barlaventina (in CD ” Lendas do País do Sul “, Concertante, 1999)

Olá vizinha prenda o seu galo

Olá vizinha prenda o seu galo
Qu’a minha galinha ricócó
Quer namorá-lo
Quer namorá-lo
Eu não m’importa
Galo à janela ricócó
Galinha à porta

Cró, cró, cró
A galinha foi-se embora
E o galinho ficou só

Letra e música: Popular (Algarve)
Arranjo: Margarida Guerreiro; Teresa Muge
Vassouras: Eduarda Alves, Margarida Guerreiro, Teresa Colaço, Teresa Muge
Intérprete: Moçoilas (in CD “Já Cá Vai Roubado”, 2001)

Perguntei ao Sol

[ Ponta nova do Algarve ]

Perguntei ao Sol se viu
E à lua se conheceu,
Às estrelas se encontraram
Um amor que já foi meu.

Ponta nova do Algarve
Está feita numa romã,
Onde o meu amor passeia
Domingo pela manhã.

Domingo pela manhã
Na segunda-feira à tarde,
Está feita numa romã
Ponta nova do Algarve.

O meu amor é aquele
Que não me tira o chapéu,
Tem a porta para a rua
E o telhado para o céu.

Ponta nova do Algarve
Está feita numa romã,
Onde o meu amor passeia
Domingo pela manhã.

Domingo pela manhã
Na segunda-feira à tarde,
Está feita numa romã
Ponta nova do Algarve.

Letra e música: Popular (Algarve)
Recolha: José Alberto Sardinha (Castro Marim, 1994) (in CD n.º 6 de “Portugal – Raízes Musicais”, ed. JN/BMG, 1997)
Intérprete: Diabo a Sete (in CD “Parainfernália”, Açor/Emiliano Toste, 2007)

Praia da Rocha

[ Fado de Portimão ]

Praia da Rocha, guitarra
Doirada que o mar dedilha
Ferragudo e a maravilha
Do castelo junto à barra

Mas quer chova ou faça sol
Quer o mar deixe ou não deixe
A cidade é um anzol
Portimão sonha com peixe

Como a foz do rio Arade
Como o cais de Portimão
Há-de haver tão lindos, há-de,
Mas mais lindos é que não.

Ah! Se o luar não vier
Às redes de Portimão
Luar de peixe a morrer
Antes do fim do Verão.

“Vá fome”
Diz Zé Fataça
Que outrora foi pescador
E é agora engraxador
Junto ao coreto da praça

Então a fome é verdade
E alguns vão buscar seu pão
A mil léguas do Arade
E do cais de Portimão.

Como a foz do rio Arade
Como o cais de Portimão
Há-de haver tão lindos, há-de,
Mas mais lindos é que não.

Letra: Leonel Neves
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Quatro horas da madrugada

[ Naufragou Valentina ]

Quatro horas da madrugada
Barcos p’rá pesca iam
Naufragou Valentina
Barco de Santa Luzia

Apelido Cavalo Raio
Que tanta fama deixou
À barra de Vila Real
Esse barco naufragou

Veio o vento de repente
Que nem um remate de bola
O barco que os salvou
Foi uma parelha espanhola

Aldemiro de Mateus
Seria o primeiro a faltar
Pela forte maresia
Arrebatado pelo mar

Manuel Milho e Joaquim
De suas mulheres se lembraram
Até que chegou a parelha
Que os naufragados salvava

Naufragou Valentina
Barco de Santa Luzia
O barco que os salvou
Barco de Punta Umbria

Para que fique na ideia
Esta grande e triste imagem
Se chegarem a naufragar
Nunca percam a coragem

Com toda a força gritava
Na maior aflição
O mestre fez desmerecer
A sua tripulação

Naufragou Valentina
Barco de Santa Luzia
O barco que os salvou
Barco de Punta Umbria

Naufragou Valentina
Barco de Santa Luzia
O barco que os salvou
Barco de Punta Umbria

Letra: Hermínio José Machado
Música: José Francisco Vieira
Intérprete: Zé Francisco & Orquestra Azul (in CD “Caminho de Mar e Luz”, José Francisco Vieira/Alain Vachier Music Editions, 2013)

Quem vive nos ardis da ilusão

Quem vive nos ardis da ilusão
E, assim, vai fugindo do amigo
Poderá encontrar consolação?

Quando será que estarei
Livre de desdém tão fero
Cujos fortes esquadrões
Me dão guerra que eu não quero.
Juro pela luz altaneira
Que em suas tranças se divisa:
Não sou cobra traiçoeira
Das que mudam de camisa.

De negras madeixas
Amo uma gazela
Um sol é o seu rosto
E palmeira é ela
De ancas opulentas.
Há entre seus lábios
De néctar o gosto.
Ó sede, se intentas
Sua boca beijar
Não o vais lograr.
Ó sede, se intentas
Sua boca beijar.

No encanto não tem
Rival tal senhora,
E fora do sonho,
Quem bela assim fora?
Qual espadas seus olhos
Lhe brilham; e rosas
Lhe enfeitam a face
Na sombra vistosas
Mas se as vais olhar
As farás murchar.
Lhe enfeitam a face
Na sombra as rosas.

Dá paz ao ardor
De quem te deseja.
Contenta o amor
E faz dom de ti,
Vamos lá, sorri,
Quando a boca beija.
Me disse na hora:
“Pecar me refreia”
Respondi-lhe: “Ora!
Não é coisa feia.”
Me disse na hora:
“Pecar me refreia”

Uma vez era noite
De bem longa festa.
Eu adormeci
E ela acordou-me com esta:
“Teu sono vai longo,
Toca a levantar!”
Então me beijou
E eu pus-me a cantar:
“Fazem reviver
Teus lábios a arder!”.
Então me beijou
E eu pus-me a cantar.

Dá paz ao ardor
De quem te deseja.
Contenta o amor
E faz dom de ti,
Vamos lá, sorri,
Quando a boca beija.
Me disse na hora:
“Pecar me refreia”
Respondi-lhe: “Ora!
Não é coisa feia.”
Me disse na hora:
“Pecar me refreia”

Uma vez era noite
De bem longa festa.
Eu adormeci
E ela acordou-me com esta:
“Teu sono vai longo,
Toca a levantar!”
Então me beijou
E eu pus-me a cantar:
“Fazem reviver
Teus lábios a arder!”.
Então me beijou
E eu pus-me a cantar.

Eduardo Ramos, Andalusino

Poema (adaptado): Al-Mutamid (in “O Meu Coração é Árabe”, de Adalberto Alves)
Música: Eduardo Ramos
Intérprete: Eduardo Ramos (in CD “Andalusino”, InforArte, 1999; CD “Cântico para Al-Mutamid”, Ed. de Autor, 2005)

Rio Guadiana

Rio Guadiana, que vais p’ró mar
Correm-te as águas tão gentis
Em terra estranha…
Toma cuidado, olha que em Espanha
Criam-se as mágoas que me inquietam
Dum pesadelo…

Frescas manhãs em Abril
Onde andarão lembranças mil…

Clara Joana foi-se hoje embora
Deixa a saudade num portado
Ninguém a chora
A felicidade é coisa simples
Vai de barquinha rio abaixo
Nunca mais torna…

Frescas manhãs em Abril
Onde andarão lembranças mil…

Espelho da cara da nossa gente
Tira a confiança a quem te mente
Ai se te vejo no Alentejo
Sem laranjais, sem trigo d’oiro
És a fonte dos meus receios

Frescas manhãs em Abril
Onde andarão lembranças mil…

Vitorino, Flor de la Mar

Letra e música: Vitorino
Intérprete: Vitorino (in “Flor de La Mar”, EMI-VC, 1983; reed. 1992)

Siga a roda, siga ela

[ Romance da Donzela Guerreira ]

(“Siga a roda, siga ela,
Que agora se vai contar
A história duma donzela
Que à guerra vai guerrear!”)

– As guerras se apregoaram
Entre França e Aragão:
Ai de mim que já sou velho,
Sem ter um filho varão!…
Sem ter um filho varão!… ­

Responde a filha mais moça
Com toda a resolução:
– Venham armas e cavalos
Que eu serei filho varão. –

(“A roda sempre a girar,
Que a história vai começar!”)
– Tendes as tranças compridas,
Filha, conhecer-vos-ão.
– Venham pentes e tesouras,
Vê-las-eis cair no chão!
Vê-las-eis cair no chão!

– Tendes os olhos garridos,
Filha, conhecer-vos-ão.
– Quando passar pela armada
Porei os olhos no chão!

(“Vai rodando sem parar,
Que o baile está a animar!”)

– Tendes peitos muito altos,
Filha, conhecer-vos-ão.
– Venham fardas apertadas,
Que eles logo abaixarão!
Que eles logo abaixarão!

– Tendes as mãos muito finas,
Filha, conhecer-vos-ão.
– Venham já guantes de ferro,
De lá nunca sairão!

(“A donzela triunfou
E prá guerra caminhou!
Logo o capitão da armada
Dos seus olhos se encantou…
E julgando-a disfarçada,
Em casa se aconselhou.”)

– Convidai-o vós, meu filho,
Para convosco dormir;
Que se ele for mulher,
Não se há-de querer despir.

– Linda cama pra mulher,
Mas ai, quem a fora convidar…
Mas dois homens numa cama?
Quem os mandará açoitar!

(“Sem mais nada descobrir,
Torna ele a insistir.”)

– Convidai-o vós, meu filho,
Para ir ao rio nadar;
Que se ele for mulher,
Logo se há-de acobardar.

– Águas doces são pra damas,
Mas ai, quem as fora convidar…
Porém, não servem pra homens
Senão as águas do mar!

(“Roda agora c’o seu par,
Que a história vai terminar!”)

Monta, monta, cavaleiro,
Se me queres acompanhar;
Se quereis ser o meu marido,
Minha mão te quero dar!
Minha mão te quero dar!

Sete anos andei na guerra
Mas ai, E fiz de filho varão;
Ninguém me conheceu nunca
Senão o meu capitão:
Conheceu-me pelos olhos,
Que por outra coisa não!

Letra: Tradicional
Música: Vítor Reino
Intérprete: Maio Moço (in CD “Canto Maior, Tradisom, 2002)
Outras versões: Amélia Muge – Donzela Guerreira (in CD “Novas Vos Trago”, Tradisom, 1998); José Barros e Navegante – “Donzela que vai à guerra” (in CD “Rimances”, JBN, 2001)

Tem o poial de um vizinho

[ Toada de Aljezur ]

Tem o poial de um vizinho
o telhado de outro ao fundo:
entre eles passa um caminho
de ambos e de todo o mundo.

Topo das casas-escadas:
Castelo, quem lá te pôs?
Cobres moiras encantadas,
descobres várzeas de arroz.

Sonhar rosas, pedir cravos
bom é que aos pobres se oiça…
Que os corpos sejam escravos,
as almas são outra loiça!

Que os corpos sejam escravos,
as almas são outra loiça!
Sonhar rosas, pedir cravos
bom é que aos pobres se oiça…

Eis a capital da Serra
do Espinhaço de Cão!
Mato com nódoas de terra,
muita pedra, pouco pão.

Mato com nódoas de terra,
muita pedra, pouco pão.
Eis a capital da Serra
do Espinhaço de Cão!

Vila de Aljezur,
arrasada sejas
de cravos e rosas
até às igrejas!

(Se nada valem os montes
que o concelho anda a lavrar,
talvez venda os horizontes
que tem à beira do mar…)

(Talvez venda os horizontes
que tem à beira do mar…
Se nada valem os montes
que o concelho anda a lavrar.)

Vila de Aljezur,
arrasada sejas
de cravos e rosas
até às igrejas!

Que faz tanta casa junta
subindo uma encosta louca?
Diz talvez que a gente é muita,
diz talvez que a terra é pouca.

Diz talvez que a gente é muita,
diz talvez que a terra é pouca.
Que faz tanta casa junta
subindo uma encosta louca?

Vila de Aljezur,
arrasada sejas
de cravos e rosas
até às igrejas!

Letra: Leonel Neves
Música: Afonso Dias
Intérprete: Afonso Dias com Tânia Silva (in CD “O Mar ao Fundo”, Bons Ofícios – Associação Cultural, 2015)

Vai, minha lanchinha à vela

[ Lanchinha à Vela ]

Vai, minha lanchinha à vela
Lá longe o horizonte
Vejo nuvens de esperança
Notícias de Levante

Se o mar a mim me engana
Tormentas, tempestades
Vai, minha lanchinha à vela
Antes que seja tarde

Trago cheiro a maresia
Gengibre e fruta sã
Levo a brisa pela proa
Rainha, minha romã

Vai, minha lanchinha à vela
Que a noite não tem fim
Vai buscar a chama eterna
Canela e alecrim

Vai, minha lanchinha, vai
Por mares e marés
Vai em busca de bonança
Mostrar quem tu és

Vai, minha lanchinha à vela
Lá longe o horizonte
Vejo nuvens de esperança
Notícias de Levante [3x]

Letra e música: José Francisco Vieira
Intérprete: Zé Francisco & Orquestra Azul (in CD “Caminho de Mar e Luz”, José Francisco Vieira/Alain Vachier Music Editions, 2013)

Vê-se ranchos de raparigas

[ Al Algarve ]

Vê-se ranchos de raparigas
a desfolhar uma rosa,
cantando lindas cantigas,
formando bailes de roda.

Refrão:

Ai, Algarve, tens amendoeiras floridas!
Ai, Algarve, tens o nome da canção!
Ai, Algarve, tens tão lindas raparigas!
Ai, Algarve, tens tão lindo Portimão!

Envolvidas na canção
fazem arraiais de feira,
gritam “viva Portimão”,
viva a flor da amendoeira.

Envolvida nas cantigas
só eu ficarei no pó
que as amendoeiras despidas
causam pena, metem dó.

Letra: Anónimo
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Vimos dar as Boas Festas

Vimos dar as Boas Festas,
Já que Deus as nos deixou:
É nascido o Deus-Menino,
De manhã se baptizou.

Depois dele baptizado
Nesse tão humano dia,
Para a Glória foi levado
Com prazer e alegria.

Letra e música: Popular (Algarve / Estremadura)
Recolha: José Alberto Sardinha
Intérprete: Maio Moço (in CD “Canto Maior, Tradisom, 2002)

Campino

Nesta terra há um rio

[ Fado Ribatejo ]

Nesta terra há um rio antigo de saudade
que nos dá vida e sonho e encantamento
e a paz que o campo tem e a verdade
de quem vive outro sítio, outro momento.

Ter o Tejo aqui, assim, ao pé da porta
é um berço de força e de saber.
Traz-se ao peito o gosto da paixão
enquanto o sol nos fala ao entardecer.

Viver assim é outro modo, outra maneira,
outra vida, outro sonho a comandar.
Passa o tempo escorregando à minha beira,
cantam-se fados à noite para lembrar

E o sol e a gente e o campo e a cidade
e a cheia, esse chão de água a cobrir tudo
e a alma imensa de um povo sem idade
não mudes tu, meu povo, que eu não mudo.

Nesta pátria Ribatejo se ama e canta
se dança, se trabalha e se resiste
e onde o peito alcance haverá chama
ninguém é mais alegre nem mais triste.

E doce e forte e sereno ao mesmo tempo
como os cavalos ao longe, ao pôr do sol
existe aqui um templo que é eterno
na lenda e no feitiço do Almourol.

E o sol e a gente e o campo e a cidade
e a cheia, esse chão de água a cobrir tudo
e a alma imensa de um povo sem idade
não mudes tu, meu povo, que eu não mudo.

Letra e música: Pedro Barroso
Intérprete: João Chora (in CDs “João Chora”, 1999; “Ao Vivo na Chamusca”, 2001)

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Loja Meloteca, recursos musicais criativos para a infância

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Pode ser do seu interesse o Musorbis, sítio do património musical dos concelhos, ou o Instrumentário Português, que já contém 100 instrumentos tradicionais no País.

No Ribatejo

[ Canção do Ribatejo ]

Intérprete: João Chora

João Chora

João Chora

João Chora, cantor