Canções tradicionais do Algarve e sobre a região

Algarve

Canções sobre o Algarve

Letras

A mula puxava o carrão

[ Esteiro Novo ]

A mula puxava o carrão
Com gente fina e perfumada
Vais a pé pela areia quente
Descalço, pois não vales nada

No copejo tens todo o valor
És homem com sabedoria
Capaz de enfrentar o mar
O mestre e sua tirania

Vai trabalhar! Vai trabalhar!
Vai trabalhar! Vai trabalhar!

Há cascas e cascabulho
Cuidado, não cortes os pés!
No copo começa o barulho
Outro peixe e atum de revés

Caminhas com o moço à cintura
Do arraial ao esteiro novo
A vida continua dura
A força da mulher do povo

A caminhar, a caminhar,
A caminhar, a caminhar.

Ao longe no cerro brincavam
Os moços e moças cantavam
Traziam morraça e sapeiras
Os remos com chamuceiras

Quem remava era o barqueiro
Tónhe Sousa na sua cadência
Cansado embarca toda a gente
Seja homem mulher ou criança

Salta p’ra terra! Salta p’ra terra!
Salta p’ra terra! Salta p’ra terra!

Carregavas o “João de Olhão”
Ferro de grande envergadura
“Maria Alice” e o “Pé Morto”
Eras homem de grande estatura

Um dia foste para Angola
Lá o clima era mais quente
Meteste o pé na argola
A vida negra a muita gente

Jiku lu mesu! Jiku lu mesu!
Jiku lu mesu! Jiku lu mesu!

Letra e música: José Francisco Vieira
Intérprete: Marenostrum (in CD “Rua do Peixe Frito”, Marenostrum/Alain Vachier Music Editions, 2019)

Os Marenostrum são uma banda do Algarve formada por Zé Francisco, guitarra, bandolim e voz; João Frade, acordeão; Lino Guerreiro, saxofones e flautas; Paulo Machado, baixo e acordeão; e João Vieira, bateria e percussões.

Notas:

  1. Morraça – erva que cresce nos sapais da Ria Formosa e que depois de seca servia para fazer estrume.
  2. Sapeira – espécie de erva nativa da Ria Formosa, também conhecida por salgueira.
  3. Chamuceira ou chumaceira – peça metálica que serve para diminuir o atrito de um eixo ou de um veio (no caso, de um remo). Nos antigos barcos de pesca era feita em corda.
  4. “Jiku lu mesu” é uma expressão em quimbundo (língua do Noroeste de Angola) que significa “abre os olhos”.
Marenostrum, Rua do Peixe Frito
Marenostrum, Rua do Peixe Frito

Ao raiar do dia

[ Corrido Algarvio ]

Ao raiar do dia
Sagres vê passar…
Até no Burgau
Viram navegar.

Vinham quatro barcos
Lá no meio do mar;
Foram para Lagos
Para atracar.

Saem para terra
De malas na mão;
Correm pela vila
Até Portimão.

Seguem o caminho,
Agora à boleia;
Muda-se o destino:
É para Albufeira!

Muda-se o destino:
É para Albufeira!

Faro é em frente,
Com sua magia
Da cidade velha
Sonham com a Ria.

Lá vai o comboio
Para sotavento:
Vai até Tavira
Que inda vai a tempo.

Passa por Cacela,
Por Castro Marim;
Chega ao Guadiana,
Eis que é o fim!

Chega ao Guadiana,
Eis que é o fim!

E lá vão de roda,
Seguem para trás,
Que o carro não pára
Antes de São Brás.

Agora sem carro
Vão os quatro a pé…
Bem devagarinho
Chegam a Loulé.

Montados num burro,
Pelos montes fora,
Vão os quatro a Silves:
Correm sem demora.

Vão os quatro a Silves:
Correm sem demora.

Vão até Monchique
Que é sempre a subir:
Só param na Fóia,
Já não voltam a vir.

Que os quatro poetas,
Deitados no chão,
Olham as estrelas,
Luz da criação.

Já passaram anos
E os quatro poetas
Ainda lá repousam:
São agora pedras.

Ainda lá repousam:
São agora pedras.

Letra e música: Carlos Norton
Intérprete: OrBlua (in Livro/CD “Retratos Cinéticos”, Fungo Azul/Ocarina, 2015)

Reciclanda

Reciclanda

O projeto Reciclanda promove a reutilização, reciclagem e sustentabilidade desde idade precoce.

Com música, instrumentos reutilizados, poesia e literaturas de tradição oral, contribui para o desenvolvimento global da criança e o bem estar dos idosos. Faz ACD e ALD (formações de curta e longa duração), realiza oficinas de música durante o ano letivo e dinamiza atividades em colónias de férias. Municípios, Escolas, Agrupamentos, Colégios, Festivais, Bibliotecas, CERCI, Centros de Formação, Misericórdias, Centros de Relação Comunitária, podem contratar serviços Reciclanda.

Contacte-nos:

António José Ferreira
962 942 759

Da serra veste perfumes

[ De Sol a Sul ]

Da serra veste perfumes,
do levante inquietações.
Do tempo lhe vêm famas
do mar as consolações.
Velha Romana, Tuaregue,
maruja, aventureira,
dos mares sabida e da vida
sabe tudo, de matreira.
Minha loira, meu azul
faz-te ao mar, despe esse manto
de nevoeiro e de sal,
desnuda-te do quebranto
de seres ponto de partir.
Navega com rumo a ti,
descobre-te em Portugal,
teu porto é de hoje e aqui.

Velhas profecias,
meu 29 de Agosto.
Meu queijo de figo,
sueste agreste,
sol posto.
Meu Infante
navegante.
Cheiro a sardinha
no rosto.

Cidade, eu te escuto
tu me acolhes,
tu me afagas.
Regaço de mãe,
doce carícia de algas.
Varanda de sol a sul.
Gente firme não se cala.

Que o sonho se faça
pouco a pouco,
passo a passo.
Que a tristeza afogue na largueza dum abraço.
Que a alegria canse
este cansaço.
É hoje que a gente
vai dizer como é que quer,
seja o bicho homem
ou o bicho seja mulher.
E que venha por bem
quem vier.

Letra e música: Afonso Dias
Intérprete: Afonso Dias / Trupe Barlaventina (in CD “Lendas do País do Sul “, Concertante, 1999; CD “Geometria do Sul”, Edere, 2002)

Era um rei

[ Fado das Amendoeiras ]

Era um rei
da terra que cheira a luar
da terra vermelha que tem a centelha
do cheiro do mar.

Terra amendoeira
terraço a sangrar
albufeira dos barcos que pescam
com a lamparina da luz a piscar.
Era um rei que vivia na terra
deitado no mar.

Era um rei
que foi da Moirama lutar
à terra da neve que tem o silêncio
que faz sufocar.

País da princesa
que no seu tear
inventava a lenda da renda
nos olhos de amêndoa do amor por chegar.
Da princesa bordando tristeza
na orla do mar.

É no sul que nos dói mais o sol
é ao sol que se vê o azul
Do Algarve que roda como um girassol.
VÁ DE BRAÇOS VÁ À PESCA!
NÃO QUEREMOS BRAÇO MOLE!
À aguardente chamamos um figo
à verdade chamamos Aleixo
que ainda é mais doce que um D. Rodrigo.
NÃO O MATAM QUE EU NÃO DEIXO!
O ALEIXO É MEU AMIGO!

É o povo
da maré que cheira a suor
e quer o rei queira ou não queira
resiste num mar que é maior.

O mar da traineira, mar do pescador
este mar amar desta maneira
que é a força primeira
do mar por amor
este mar que morre na esteira
de aquém e além dor.

É no sul que nos dói mais o sol
é ao sol que se vê o azul

Letra: Ary dos Santos
Música: Fernando Tordo
Intérprete: Carlos do Carmo (in “Um Homem no País”, Polygram, 1983)

Marcadinho, puladinho

[ Corridinho Aluljé ]

Marcadinho, puladinho, joelhos em terra, moças ao ar
Barracoleza, terra firme, muita beleza
Mais acima o barranco, uma eira e um palanco
Moita de Guerra, lava-pé, boca-de-peixe
Quarteira mais abaixo, a ribeira e o riacho
Cá em Loulé toda gente bate o pé
Bate palmas, bate o queixo e as quadras do Aleixo
Oh i oh ai! marcadinho vai e nã vai
Todos dançam, ninguém sai à moda da Ti Anica
Arrabanhita, todos saltam cabanita
Uns rodam, outros não, sarnadinha, morrião

Lá vai, lá vai, roda a moça, roda bem!
Saca-rabos e galinhas pé comprido ninguém tem
Nos Barrigões encontrei uma gineta
Anda tudo aos encontrões, anda tudo arraboleta
Arraboleta, linda saia roda preta
Mas que raio de meia branca! Califórnia e Casablanca
As voltas do corridinho mandado e puladinho
Vir’ó baile! Ah moços dum raio!

Ah mano Zeca!
Entra o fole!

Lá vai, lá vai, roda a moça, roda bem!
Oh i oh ai! pé comprido ninguém tem
Lá vai, lá vai, encontrei uma gineta
Oi oh ai! anda tudo arraboleta
Lá vai, lá vai, linda saia roda preta
Mas que raio de meia branca! Califórnia e Casablanca
As voltas do corridinho mandado e puladinho

Vir’ó baile!
Já está!

Notas:

  1. Barracoleza – lugar na Serra do Caldeirão, perto de Salir (onde está projectado um enorme complexo turístico com campo de golfe).
  2. Barranco – sulco feito no solo pelas enxurradas; barroca, ravina, precipício.
  3. Palanco – corda que se prende à vela, e que serve para a içar.
  4. Moita de Guerra – localidade da freguesia de Salir, concelho de Loulé.
  5. Lava-pé – planta arbustiva.
  6. Boca-de-peixe – planta.
  7. Arrabanhita – jogo de crianças em que se jogava uma guloseima e todas elas corriam para a apanhar.
  8. Cabanita – nome de uma escola básica do 2.º e 3.º ciclos, em Loulé, assim baptizada em homenagem ao Padre João Coelho Cabanita.
  9. Sarnadinha – planta herbácea, também conhecida por morrião.
  10. Morrião – planta herbácea, também conhecida por sarnadinha.
  11. Saca-rabo – mamífero carnívoro da família dos Vivérridas, de cauda muito longa, também conhecido por mangusto ou manguço.
  12. Barrigões – localidade da freguesia de Salir, concelho de Loulé.
  13. Gineta – mamífero carnívoro da família dos Vivérridas, com pelagem cinzento-clara muito manchada de negro, também conhecido por gineto, gato-bravo ou martaranho.
  14. Arraboleta – brincadeira de crianças em que elas rebolam/giram sob si mesmas.
  15. Califórnia – localidade da freguesia de Salir, concelho de Loulé.
  16. Casablanca – cidade de Marrocos, considerada a capital económica do país. Também o nome de um lugar do concelho de Loulé.

Letra: José Francisco Vieira
Música: João Frade, Paulo Machado, José Francisco Vieira, João Vieira, Paulo Jorge Temeroso
Intérprete: Marenostrum (in CD “Rua do Peixe Frito”, Marenostrum/Alain Vachier Music Editions, 2019)

Mercado de Loulé
Mercado de Loulé

Na rua do peixe frito

[ Rua do Peixe Frito ]

Na rua do peixe frito
Havia lá boa gente
Na esquina o Ti Gaspar
E o terramoto de Agadir
Havia uma porta aberta
E um prato de milho quente
Havia lá boa gente

Havia poesia e mais
Na maneira como viviam
Um acordeão encarnado
Caiu ao mar embriagado
Pescadores, guardas-fiscais
E paixão à luz do dia
Na maneira como viviam

Uma bacia com brasas
Ao ar livre a fumejar
Uma pelengana e azeite
Com peixe fresco a fritar
Corria nua Mila Coelha
Pela rua a cantararolar
Ao ar livre a fumejar

Na rua do peixe frito
Havia lá boa gente
A cara chapada do pai
Zé Manel Jesus Sacramento
Havia lá boa gente

Na rua do peixe frito
Folia madrugada adentro
Sardinhas e pão quente
Gorgulho, petisco a monte
Na casa da Tia Leonarda
Charro alimado era o sustento
Até madrugada adentro

Um candeeirinho de arame
Que iluminava a noite inteira
Um garrafão franquinhal
À porta aberta de um quintal
Uma moça linda a sorrir
Passava por lá sorrateira
Iluminava a noite inteira

Na rua do peixe frito
Havia lá boa gente
A cara chapada do pai
Zé Manel Jesus Sacramento
Havia lá boa gente

Na rua do peixe frito
Havia lá boa gente
A cara chapada do pai
Zé Manel Jesus Sacramento
Havia lá boa gente

Letra e música: José Francisco Vieira
Intérprete: Marenostrum (in CD “Rua do Peixe Frito”, Marenostrum/Alain Vachier Music Editions, 2019)

Notas:

  1. Agadir – cidade do Sudoeste de Marrocos (na costa atlântica) que, a 29 de Fevereiro de 1960, foi abalada por um sismo violento (de magnitude 5,7 na escala de Richter) que a deixou bastante destruída e causou cerca de 20 mil mortos (metade da população).
  2. Pelengana ou palangana – recipiente largo e pouco fundo, de barro ou metal, usado para servir assados ou fritos.
  3. Charro – chicharro.
  4. Franquinhal – nome do vinho feito em Santa Luzia, Tavira, até aos anos 70, por uma família de galegos fugidos da Guerra Civil Espanhola.
Marenostrum, Rua do Peixe Frito
Marenostrum, Rua do Peixe Frito

Aldeia da Meia-Praia

[ Os índios da Meia-Praia ]

Aldeia da Meia-Praia
Ali mesmo ao pé de Lagos
Vou fazer-te uma cantiga
Da melhor que sei e faço

De Monte-Gordo vieram
Alguns por seu próprio pé
Um chegou de bicicleta
Outro foi de marcha a ré

Houve até quem estendesse
A mão a mãe caridade
Para comprar um bilhete
De paragem para a cidade

Oh mar que tanto forcejas
Pescador de peixe ingrato
Trabalhaste noite e dia
Para ganhares um pataco

Quando os teus olhos tropeçam
No voo duma gaivota
Em vez de peixe vê peças
De ouro caindo na lota

Quem aqui vier morar
Não traga mesa nem cama
Com sete palmos de terra
Se constrói uma cabana

Uma cabana de colmo
E viva a comunidade
Quando a gente está unida
Tudo se faz de vontade

Tudo se faz de vontade
Mas não chega a nossa voz
Só do mar tem o proveito
Quem se aproveita de nós

Tu trabalhas todo o ano
Na lota deixam-te mudo
Chupam-te até ao tutano
Chupam-te o couro cab’ludo

Quem dera que a gente tenha
De Agostinho a valentia
Para alimentar a sanha
De esganar a burguesia

Diz o amigo no aperto
Pouco ganho, muita léria
Hei-de fazer uma casa
Feita de pau e de pedra

Adeus disse a Monte-Gordo
(Nada o prende ao mal passado)
Mas nada o prende ao presente
Se só ele é o enganado

Foram “ficando ficando”
Quando um dia um cidadão
Não sei nem como nem quando
Veio à baila a habitação

Mas quem tem calos no rabo
E isto não é segredo –
É sempre desconfiado
Põe-se atrás do arvoredo

Oito mil horas contadas
Laboraram a preceito
Até que veio o primeiro
Documento autenticado

Veio um cheque pelo correio
E alguns pedreiros amigos
Disse o pescador consigo
Só quem trabalha é honrado

Quem aqui vier morar
Não traga mesa nem cama
Com sete palmos de terra
Se constrói uma cabana

Eram mulheres e crianças
Cada um c’o seu tijolo
“Isto aqui era uma orquestra”
Quem diz o contrário é tolo

E toda a gente interessada
Colaborou a preceito
Vamos trabalhar a eito
Dizia a rapaziada

Não basta pregar um prego
Para ter um bairro novo
Só “unidos venceremos”
Reza um ditado do Povo

E se a má lingua não cessa
Eu daqui vivo não saia
Pois nada apaga a nobreza
Dos índios da Meia-Praia

Foi sempre a tua figura
Tubarão de mil aparas
Deixar tudo à dependura
Quando na presa reparas

Das eleições acabadas
Do resultado previsto
Saiu o que tendes visto
Muitas obras embargadas

Quem vê na praia o turista
Para jogar na roleta
Vestir a casaca preta
Do malfrão ** capitalista

Mas não por vontade própria
Porque a luta continua
Pois é dele a sua história
E o povo saiu à rua

Mandadores de alta finança
Fazem tudo andar pra trás
Dizem que o mundo só anda
Tendo à frente um capataz

E toca de papelada
No vaivém dos ministérios
Mas hão-de fugir aos berros
Inda a banda vai na estrada

Eram mulheres e crianças
Cada um c’o seu tijolo
“Isto aqui era uma orquestra”
Quem diz o contrário é tolo

* Texto e música: Zeca Afonso

Para o filme Índios da Meia Praia, realizado por Cunha Teles. A versão do disco não inclui todas as quadras.

** Palavra algarvia que significa dinheiro.

José Afonso, Os Índios da Meia-Praia
José Afonso, Os Índios da Meia-Praia

Praia da Rocha, guitarra

[ Fado de Portimão ]

Praia da Rocha, guitarra
Doirada que o mar dedilha
Ferragudo e a maravilha
Do castelo junto à barra

Mas quer chova ou faça sol
Quer o mar deixe ou não deixe
A cidade é um anzol

Portimão sonha com peixe
Como a foz do rio Arade
Como o cais de Portimão
Há-de haver tão lindos, há-de,
Mas mais lindos é que não.

Ah! Se o luar não vier
Às redes de Portimão
Luar de peixe a morrer
Antes do fim do Verão.

“Vá fome”
Diz Zé Fataça
Que outrora foi pescador
E é agora engraxador
Junto ao coreto da praça

Então a fome é verdade
E alguns vão buscar seu pão
A mil léguas do Arade
E do cais de Portimão.

Como a foz do rio Arade
Como o cais de Portimão
Há-de haver tão lindos, há-de,
Mas mais lindos é que não.

Letra: Leonel Neves
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Procuro o sul

[ Fado Corridinho ]

Procuro o sul que me aqueça
A voz que canta esta terra
De seu clima abençoado
Que dá calor ao meu fado
E cheirinho a mar e serra

Descubro de costa a costa
Praias onde o mar descansa
Nas areias com memórias
Falésias que são histórias
De partidas, de esperança

O fado corridinho é um bailinho
Que alegra a gente
Sete passos para a frente
Mais três de cada lado do caminho
O fado corridinho é um cantar,
Um desafio algarvio, vai de roda sem parar

No ciclo de cada ano
A terra é fértil e espera
Amendoeiras em flor
Um pomar cheio de cor
Prenúncio de primavera

Nesta viagem a sul
Dou por mim em rodopio
Entro num baile mandado
Que alegra o meu fado
Com um abraço algarvio

O fado corridinho é um bailinho
Que alegra a gente
Sete passos para a frente
Mais três de cada lado do caminho
O fado corridinho é um cantar,
Um desafio algarvio, vai de roda sem parar

O fado corridinho é um bailinho
Que alegra a gente
Sete passos para a frente
Mais três de cada lado do caminho
O fado corridinho é um cantar,
Um desafio algarvio, vai de roda sem parar

Ah moço dum raio!

Letra: Jorge Mangorrinha
Música: José Francisco Vieira, Paulo Machado, João Vieira, João Frade, Paulo Jorge Temeroso
Intérprete: Marenostrum (in CD “Rua do Peixe Frito”, Marenostrum/Alain Vachier Music Editions, 2019)

Vai com trote certo

[ Carrinha Antiga ]

Vai com trote certo
Esse cavalinho
Todo empenachado
E o boleeiro esperto
Faz do seu caminho
Seu baile mandado.

Lá vai a carrinha
A carrinha antiga
Com seu toldo armado.
Uma sombra amiga
A sombra fresquinha
Sob um sol doirado

Leva os estrangeiros
Muito prazenteiros
Que vão passear.
Ver a Rocha e o mar
Mar das caravelas
Que inda é mar das velas.

E a carrinha lesta
Do Algarve florido
É folha que resta
De um romance lido
De um conto feliz
De Júlio Dinis.

Letra: José Galvão Balsa
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão* (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

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Amendoeiras em flor no Algarve

Canções do Algarve

Letras

A virgem de Guadalupe

A virgem de Guadalupe
Quando vai pela ribeira,
Descalcinha pela areia
Parece uma rianceira.

Ondinhas vêm,
Ondinhas vêm,
Ondinhas vêm do mar,
Não te vás à rianceira
Não te vás amariar.

Cada vez que passo a ponte
Sempre te encontro lavando,
A formosura que tu tens
A água a vai levando.

Ondinhas vêm,
Ondinhas vêm,
Ondinhas vêm do mar,
Não te vás à rianceira
Não te vás amariar.

Letra e música: Popular
Intérprete: Roda Pé (in CD “Escarpados Caminhos”, public-art, 2004)

Rodapé

Abalei aqui por abaixo

[ Oração à Virgem ]

Abalei aqui por abaixo
Com o três horas serão
Encontrei a Virgem Pura
Com um ramalhete na mão.

Eu lhe pedi uma folhinha
E ela me disse que não
Eu lhe tornei a pedir
E me deu seu bem do cordão.

Zebelinha tecedeira
Tece-me este cordão
Que me deu a Virgem Pura
Sexta-Feira da Paixão.

Santo Antóino é meu pai
E São Francisco é meu irmão
Os anjinhos meus parentes
Ó que linda geração!

Popular – voz masculina (Monchique, Algarve)
Recolha de José Alberto Sardinha (1981) (in CD n.º 6 de “Portugal: Raízes Musicais”, JN/BMG, 1997)

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Ai que saudade tenho do meu canto

Ai que saudade tenho do meu canto, da minha terra!
Só vejo o mar adentro e o céu a te apartar.

Ai esta vida corre e roda, roda, ai, a moer;
Não há razão, mãe, para voltar sem que fazer.

Eu hei-de ir, eu hei-de voltar à terra, ao meu lugar!
Voltar à minha mãe, ao teu regaço, ao meu penar!

Meus olhos choram longe, ai, tão cansados de esperar…
Ai esta vida corre e roda, roda, ai, a moer;
Mas eu hei-de voltar à minha terra, ao meu lugar!

Meus olhos choram longe, ai, tão cansados de esperar…
Mas eu hei-de voltar à minha terra, ao meu lugar!

Letra: Macadame
Música: Tradicional (Loulé, Algarve)
Recolha: José Alberto Sardinha (“Janeiras”, in “Portugal – Raízes Musicais”: CD 6 – Algarve e Ilhas, BMG/JN, 1997)
Intérprete: Macadame
Versão original: Macadame (in Livro/CD “Firmamento”, Macadame, 2016)

Algarve, o nome me está lembrando

[ Santa Maria, a Sem-Par ]

Algarve, o nome me está lembrando
Algarve, e a brisa passa a cantar.
E as sombras leva-as o vento voltando.
Silêncio, dizem as ondas do mar.

Morenas em bandos sobre açoteias
Janelas abertas sobre um palmar
Já vejo de longe as altas ameias
Já vejo Santa Maria, a Sem-Par.

Algarve, jardim de rosas vermelhas
Algarve, brancura de pedra e cal
Cidade dentro dum pátio sem telhas
Dormindo debaixo de um laranjal.

Nas praias, dedos de finas areias
Teu nome lembram ao vento a passar
Já vejo de longe as altas ameias
Já vejo Santa Maria, a Sem-Par.

Letra: José Afonso
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Reciclanda

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Algarve, serras mansas

Algarve, serras mansas onduladas
aos poucos aplanando-se em campinas,
praias de areia e rochas arrendadas,
verdes sapais e manchas de salinas

E o mar, mais pronto a calmas que a furores
às traineiras levando os pescadores,
peixes brilhando em raras pedrarias
e o mar, mais pronto a calmas que a furores

Às traineiras levando os pescadores
peixes brilhando em raras pedrarias,
matos floridos, árvores variadas,
farrobas, figos, amêndoas e citrinas.

Terras vermelhas, hortas afogadas
n’águas doces de noras e de minas
e o céu, tonto de sol, pintado a cores
de inverosímeis, múltiplos fulgores

Jardim das mil e uma fantasias
e o céu, tonto de sol, pintado a cores
de inverosímeis, múltiplos fulgores,
jardim das mil e uma fantasias.

Letra: António Balté
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Atira, caçador, atira

Atira, caçador, atira,
Lá no meio da parada!
O meu amor é galucho,
Atira mas não mata nada.

Atira mas não mata nada,
Atira, não mata ninguém,
Lá no meio da parada
Do quartel de Belém.

Atira, caçador, atira,
Lá no meio da parada!
O meu amor é galucho,
Atira mas não mata nada.

Atira mas não mata nada,
Atira, não mata ninguém,
Lá no meio da parada
Do quartel de Belém.

Eu fui caçar à tapada,
Cheguei lá muito feliz;
Encontrei a minha amada
E matei uma perdiz.

Sou galucho de infantaria,
Sou tropa no Alentejo
E sinto muita alegria
Quando na rua te vejo.

Atira, caçador, atira,
Lá no meio da parada!
O meu amor é galucho,
Atira mas não mata nada.

Atira mas não mata nada,
Atira, não mata ninguém,
Lá no meio da parada
Do quartel de Belém.

Eu fui-te ver ao montado
Sentada à porta do monte,
Com os teus olhos brilhantes
À espreita do horizonte.

Tinhas um sorriso aberto
Perfumando a atmosfera;
Eras a mais linda flor
Que me trouxe a Primavera.

Atira, caçador, atira,
Lá no meio da parada!
O meu amor é galucho,
Atira mas não mata nada.

Atira mas não mata nada,
Atira, não mata ninguém,
Lá no meio da parada
Do quartel de Belém.

Letra: Popular e Francisco Naia
Música: Popular
Intérprete: Francisco Naia (in CD “Francisco Naia e a Ronda Campaniça”, Francisco Naia/Ovação, 2012)

Canta na beirada andorinha

[ Laranjinha Doce ]

Canta na beirada andorinha
Chega a primavera e o amor
Uma vida inteira
Duas à espera
Noites sem dormir p’ra um beijo teu

Mil horas passadas sem saber
Horas, dias sem fim, o meu amor
Cantando dizia, noite e melodia
Pareceu-me um ano
Um só dia

Está chegando o tempo [do] ramo em flor
Laranjinha doce, meu amor
Espero por ti
Canto por aí
Vem cair, à noite, nos braços meus
Espero por ti
Canto por aí
Vem cair, à noite, nos braços meus

Nota: «”Laranjinha Doce”, Amor, Moça bonita, romance Algarvio…» (Zé Francisco)

Letra e música: José Francisco Vieira
Intérprete: Zé Francisco & Orquestra Azul (in CD “Caminho de Mar e Luz”, José Francisco Vieira/Alain Vachier Music Editions, 2013)

Da beira-sonho lês

[ Amante do Mar ]

Da beira-sonho lês
o mar que tens aos pés
Lagos que és pátria de Gil e Frei Gonçalo;
poiso de mareantes
albergaste infantes
e à aventura afrontaste o mar alto;
de pele salgada vens
com o ar quente de quem
dos horizontes bebe o cheiro e a magia;
ó loira do meu Sul
minha fronteira azul
cais de embarque, proa e guia.

Fronteira de sonhos
aberta para o mar
em jeito sensual e quente;
velha majestade
com a tua idade
devias ser mais prudente;
tiveste aventuras
e hoje com as loucuras
do teu passado altaneiro
ainda continuas
amante do mar
e amor de marinheiro.

Da beira-sonho lês
o mar que tens aos pés
Lagos que és pátria de Gil e Frei Gonçalo;
poiso de mareantes
albergaste infantes
e à aventura afrontaste o mar alto;
de pele salgada vens
com o ar quente de quem
dos horizontes bebe o cheiro e a magia;
ó loira do meu sul
minha fronteira azul
cais de embarque, proa e guia.

Fronteira de sonhos
aberta para o mar
em jeito sensual e quente;
velha majestade
com a tua idade
devias ser mais prudente;
tiveste aventuras
e hoje com as loucuras
do teu passado altaneiro
ainda continuas
amante do mar
e amor de marinheiro.

Da beira-sonho lês
o mar que tens aos pés
Lagos que és pátria de Gil e Frei Gonçalo;
poiso de mareantes
albergaste infantes
e à aventura afrontaste o mar alto;
de pele salgada vens
com o ar quente de quem
dos horizontes bebe o cheiro e a magia;
ó loira do meu Sul
minha fronteira azul
cais de embarque, proa e guia.

Letra e música: Afonso Dias
Poema dito da autoria de Sophia de Mello Breyner Andresen (excerto de “Lagos II”, 1975, in “O Nome das Coisas”, Lisboa: Moraes Editores, 1977)
Intérprete: Afonso Dias com Tânia Silva (in CD “O Mar ao Fundo”, Bons Ofícios – Associação Cultural, 2015)

Da serra veste perfumes

[ De Sol a Sul ]

Da serra veste perfumes,
do levante inquietações.
Do tempo lhe vêm famas
do mar as consolações.

Velha Romana, Tuaregue,
maruja, aventureira,
dos mares sabida e da vida
sabe tudo, de matreira.

Minha loira, meu azul
faz-te ao mar, despe esse manto
de nevoeiro e de sal,
desnuda-te do quebranto
de seres ponto de partir.

Navega com rumo a ti,
descobre-te em Portugal,
teu porto é de hoje e aqui.
Velhas profecias,
meu 29 de Agosto.
Meu queijo de figo,
sueste agreste,
sol posto.
Meu Infante
navegante.
Cheiro a sardinha
no rosto.
Cidade, eu te escuto
tu me acolhes,
tu me afagas.
Regaço de mãe,
doce carícia de algas.
Varanda de sol a sul.
Gente firme não se cala.
Que o sonho se faça
pouco a pouco,
passo a passo.
Que a tristeza afogue
na largueza dum abraço.
Que a alegria canse
este cansaço.
É hoje que a gente
vai dizer como é que quer,
seja o bicho homem
ou o bicho seja mulher.
E que venha por bem
quem vier.

Letra e música: Afonso Dias
Intérprete: Afonso Dias / Trupe Barlaventina (in CD “Lendas do País do Sul“, Concertante, 1999; CD “Geometria do Sul”, Edere, 2002)

Lendas do País do Sul

Deus te salve, ó Rosa

– Deus te salve, ó Rosa
Claro Serafim,
Pastora formosa,
Que fazeis aqui?
– Estou guardando o meu gado,
Que eu aqui “deixi”.

– Deixai vosso gado,
Que eu o guardarei,
Quero ser vosso criado,
Linda flor, meu bem.

– Não quero criados
De meias de seda;
Não quero que as “arrompa”
Cá por estas estevas.

– Sapato e meia,
Tudo “arromparei”,
Para ser vosso criado,
Linda flor, meu bem.

– Vá-se já embora,
(E) não me dê mais penas,
Que daqui a nada vem meu amo
Trazer-me a merenda.

– Venha cá, senhora,
(E) Venha cá correndo
Que o amor é louco
Já me vai vencendo…

Letra e música: Tradicional (Aljezur – Algarve)
Recolha: Michel Giacometti
Intérprete: Chuchurumel (in CD “Posta Restante”, Edição de autor, 2007)

Chuchurumel, Posta Restante

Eia, Abu Bacre

[ Evocação a Silves ]

Eia, Abu Bacre, saúda os meus lares em Silves
e pergunta-lhes se,
como penso, ainda se recordam de mim.

Saúda o Palácio das Varandas da parte de um donzel
que sente perpétua saudade daquele alcácer.

Ali moravam guerreiros como leões e brancas
gazelas. E em que belas selvas e em que belos covis.

Quantas noites passei divertindo-me à sua sombra
com mulheres de cadeiras opulentas e talhe fatigado
brancas e morenas que produziam na minha alma
o efeito das espadas refulgentes e das lanças obscuras!

Quantas noites passei deliciosamente junto a um
recôncavo do rio
com uma donzela cuja pulseira rivalizava
com a curva da corrente!

O tempo passava e ela servia-me o vinho do seu olhar
e outras vezes o do seu vaso e outras o da sua boca.

As cordas do seu alaúde feridas pelo plectro estremeciam-me
como se ouvisse a melodia das espadas nos tendões
do colo inimigo.

Ao retirar o seu manto, descobriu o talhe, florescente ramo
de salgueiro, como se abre o botão para mostrar a flor.

Eduardo Ramos, Cantico para Al Mutamid

Poema de Al-Mutamid (in “Portugal na Espanha Árabe”, vol. 1 – Geografia e Cultura, de António Borges Coelho, 1989)
Recitado por Afonso Dias / Trupe Barlaventina (in CD “Lendas do País do Sul”, Concertante, 1999)
Outras versões: António Baeta de Oliveira / Eduardo Ramos (in CD “Andalusino”, InforArte, 1999); Eduardo Ramos (in CD “Cântico para Al-Mutamid”, Ed. de Autor, 2005)

Eu já fui à tua horta

Eu já fui à tua horta
Eu já fui teu hortelão
Já comi da tua fruta
Não sei s’outros comeram ou não

Já foste à minha horta
Mas eu nunca lá te vi
Já comeste da minha fruta
Só num vento que t’eu vi

‘Tás pr’aí de boca aberta
Cara de sardinha crua
Se esta casa fosse minha
Punha-te já no meio da rua

Letra e música: Popular (Algarve)
Arranjo: Eduarda Alves; Margarida Guerreiro
Intérprete: Moçoilas (in CD “Já Cá Vai Roubado”, 2001)

Moçoilas, Já cá vai roubado

Faça “ai, ai”, meu menino

[ Embalo do Algarve ]

Faça “ai, ai”, meu menino,
Que a mãezinha logo vem!
Foi lavar os cueirinhos
À fontinha de Belém.

Vai-te embora, papá negro,
De cima desse telhado!
Deixa dormir o menino,
Está no sono descansado.

Embala, José, embala!
Embala suavemente,
Entretendo o inocente
Com esta cantiga em verso!

Dorme, dorme, meu menino,
Que a mãezinha logo vem!
Dorme, dorme, meu menino,
Que a mãezinha, ai, logo vem!

Letra e música: Tradicional (Alvor, Portimão, Algarve)
Recolha: Michel Giacometti (“Faça ‘ai, ai’, meu menino”, in LP “Algarve”, série “Antologia da Música Regional Portuguesa”, Arquivos Sonoros Portugueses/Michel Giacometti, 1962; 5CD “Portuguese Folk Music”: CD 5 – Algarve, Strauss, 1998; 6CD “Música Regional Portuguesa”: CD 6 – Algarve, col. Portugal Som, Numérica, 2008)
Intérprete: Segue-me à Capela*
Primeira versão de Segue-me à Capela (in Livro/CD “San’Joanices, Paganices e Outras Coisas de Mulher”, Segue-me à Capela/Fundação GDA/Tradisom, 2015)

Ir à bóia de Santana

[ Bóia de Sentença ]

Ir à bóia de Santana
Tinha a sentença rezada
Essa bóia da sentença
Que por mim foi baptizada

Quem me rezou a sentença
Foi o meu patrão ratado
Tem mesmo cara de fome
E tem o nariz furado

Medicamentos me pôs
Lá na caixa de farmácia
P’ra os senhores vou contar
Até lhe acham graça

Um pouco de algodão
E “eneivaquim” contada
Pôs umas gotas de álcool
De mercúrio não me deu nada

Lá parti para a viagem
P’ra Freetown, ir pescar
Ir à ilha das bananas
São muitas horas p’lo mar

Tudo pode acontecer
Pode vir bem ou vir mal
Pode a gente adoecer
Ou apanhar temporal

Quando os patrões se opuseram
Esses homens nem falaram
Lá foram para a sentença
Foram e nem piaram

Esses que vão p’ra a sentença
Vão porque são obrigados
Mas a mim não mandam eles
Comigo estão enganados

Tanto que eles diziam
E nada os via fazer
Essas palavras serviam
P’ra outros homens perder

Garganta de rouxinóis
Com olhinhos de aldrabões
Dentes de mentirosos
E boca de trapalhões

Garganta de rouxinóis
Com olhinhos de aldrabões
Dentes de mentirosos
E boca de trapalhões

Trapalhões, trapalhões,
Trapalhões, trapalhões,
Trapalhões, trapalhões…

Letra: Hermínio José Machado
Música: José Francisco Vieira
Intérprete: Zé Francisco & Orquestra Azul (in CD “Caminho de Mar e Luz”, José Francisco Vieira/Alain Vachier Music Editions, 2013)

“Leva, Leva!” (in LP “Algarve”, série “Antologia da Música Regional Portuguesa”, Arquivos Sonoros Portugueses/Michel Giacometti, 1962; “Portuguese Folk Music”: CD 5 – Algarve, Portugal Som/Strauss, 1998; “Música Regional Portuguesa”: CD 6 – Algarve, Portugal Som/Numérica, 2008)

Manelzinho

Manelzinho, ora você chora…
Você chora, alguém lhe deu.
Qual seria a falsa ingrata
Que o Manelzinho ofendeu?

Tocam nos sinos no Porto
E o meu coração é teu.
Qual seria a falsa ingrata
Que o Manelzinho ofendeu?

Manelzinho, ora você chora…
Você chora, alguém lhe deu.
Qual seria a falsa ingrata
Que o Manelzinho ofendeu?

Anda lá para diante
Que eu atrás de ti não vou!
Não me pede o coração
Amar a quem me deixou.

Manelzinho, ora você chora…
Você chora, alguém lhe deu.
Qual seria a falsa ingrata
Que o Manelzinho ofendeu?

Manelzinho, ora você chora…
Você chora, alguém lhe deu.
Qual seria a falsa ingrata
Que o Manelzinho ofendeu?

Letra e música: Tradicional (Algarve)
Arranjo: Artesãos da Música
Intérprete: Artesãos da Música
Versão discográfica dos Artesãos da Música (in CD “Puleando”, Artesãos da Música/ARMA, 2012)

Mestre Zé cantou um dia

[ Faz Cá Falta a Armação ]

Mestre Zé cantou um dia
Teu nome, Maria Faia
Pouca gente então sabia
Dos índios da Meia-Praia
Gente honrada e lutadora
Em Lagos, Luz e meia arraia

Também nós somos do Sul
Da Vila Santa Luzia
Já cá canta o Ti Saul
E a velha sabedoria
Faz cá falta a armação
O saveiro e o calão

Os velhos lobos do mar
Que agora ficam em terra
Mandou a Europa de lá
Abateram embarcações
Os senhores da nova guerra
Mandam mais, são os patrões

Em Espanha fazem-se ao mar
E nós parados a ver
Na lota manda o espanhol
Onde exerce o seu poder
Enfrentemos mar e sol
Mais vale quebrar que torcer

Se há fé de tudo mudar
Em cada volta do mundo
Se o sal da baixa-mar
É igual ao que há no fundo
Vamos de novo lutar
Com a força do deus Neptuno

Também nós somos do Sul
Da Vila Santa Luzia
Já cá canta o Ti Saul
E a velha sabedoria
Faz cá falta a armação
O saveiro e o calão

Letra: Nuno Manuel Faria
Música: José Francisco Vieira
Intérprete: Zé Francisco & Orquestra Azul (in CD “Caminho de Mar e Luz”, José Francisco Vieira/Alain Vachier Music Editions, 2013)

Meu Algarve, cheio de luz

Meu Algarve, cheio de luz,
és o sol que me ilumina,
u ma estrela que reluz,
o amor que me domina.

És o meu sol branco e doirado
a tua luz me seduz,
paraíso inconquistado,
meu Algarve, minha luz.

És o sol que me ilumina,
minha flor, meu girassol,
a semente que germina,
meu Algarve, cheio de sol.

És uma estrela a brilhar
a minha constelação,
um jardim à beira-mar,
a minha flor em botão.

Letra: Maria José Fraqueza
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Meu Algarve das baladas

[ Corridinho, corridinho ]

Meu Algarve das baladas
Não és bem como te cantam
Mais que moiras encantadas
Tens moiras que nos encantam

Corridinho, corridinho
Antes que a morte apareça
Corridinho, corridinho
Vamos lá viver depressa.

Cava a terra, pisa o mosto
Puxa a rede e continua
A ‘balhar’ até dá gosto
O suor que a gente sua

Corre, pula, rodopia
Até manhanita, moça
Já alugámos o dia
Mas a noite é toda nossa.

Tia Anica da Fuzeta
Tia Anica de Loulé
Da barra da saia preta
Ou da caixa de rapé.

Fala, fala se és capaz
Cantorica, bailarica,
Que no céu não poderás
Já sem corpo, Tia Anica

Letra: Leonel Neves
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Meu Algarve encantador

I. Meu Algarve encantador,
P’ra o poeta e p’ra o pintor
Tens motivos de sobejo…
Até eu, se tivesse arte,
Queria ao mundo mostrar-te
Como te sinto e te vejo.

II. Meu Algarve encantador,
A parte da tua alegria,
Tens o encanto, a magia,
Das amendoeiras em flor.

III. Meu q’rido Algarve, em Janeiro,
Ao turista endinheirado,
Escondes o corpo ulcerado
No fatinho domingueiro.

IV. Só vêem flores os olhos
Desses ilustres senhores,
Mas no Algarve, os abrolhos
São muito mais do que as flores.

V. Mas quem, como eu, o conhece,
Sabe que ele, infelizmente,
Por dentro é muito diferente
Do que por fora parece.

(António Aleixo, in Este Livro Que Vos Deixo, 1969)

Milho verde, milho verde

Deu-me a mim muito trabalho

Milho verde, milho verde
Milho verde, maçaroca
À sombra do milho verde
Namorei uma cachopa

Namorei uma cachopa
Namorei um rapazinho
À sombra do milho verde
Milho verde, miudinho

Milho verde, milho verde
Milho verde, folha larga
À sombra do milho verde
Namorei uma fidalga

Namorei uma fidalga
Namorei o meu amor
Milho verde, milho verde
E à sombra não faz calor

Nem chove nem faz calor
Nem chove nem cai orvalho
E o amor para ser meu
Deu-me a mim muito trabalho

Letra e música: Popular (Algarve)
Arranjo: Eduarda Alves; Margarida Guerreiro
Intérprete: Moçoilas (in CD “Já Cá Vai Roubado”, 2001)

Não há noite mais alegre

Não há noite mais alegre
Que a noite de Natal
Onde nasceu Deus Menino
Antes do galo cantar

Deu o galo três cantadas
Deu o menino nascido
Bendito seja o ventre
Qu’o trouxe nove meses escondido

E a mula como era maldosa
Destapava-o com a ferradura
Mas o boi como era manso
Destapava-o com a armadura

Deus a bem disse ao aboio
Deus lhe deu a bênção
Toda a terra aqui milagre
Toda ela cheira a pão

Sejam altas, sejam baixas
Sejam nada as dê lição
Cada bago dê um moio
Cada moio dê um milhão

Letra e música: Popular (Algarve)
Arranjo: Eduarda Alves; Margarida Guerreiro; José Martins
Intérprete: Moçoilas (in CD “Já Cá Vai Roubado “, 2001)

No Garb realça o azul deuses morenos

As Hespérides são moças algarvias

No Garb realça o azul deuses morenos
À doçura dos figos submetidos.
Vieram gregos. Ficaram Sarracenos.
Nardos enfolham seus nomes esquecidos.

À noite ordenham luas nos terraços,
Dão leite à sombra. Abrolham os perfumes.
Silêncio. Só de um lírio ouvem-se os passos.
Madruga a pesca, rompe um mar de lumes.

Esvoaçam suas túnicas de abelhas
Entre vinhas, seus bêbados recintos;
E quando a amendoeira nas orelhas
Põe flores, deram-lhe os deuses esses brincos.

Vem de turbante o sol e toma posse
De corpos, cactos, milhos e vinhedos.
Excita o açúcar na batata-doce
E despe as almas gregas dos penedos.

Ouro firme, crepúsculos de cinabre
Senhorio de azul. Balcões mouriscos.
Ferve a prata na pesca. O cheiro abre
No ar quente uma vulva de mariscos.

Jardins da Hespéria? Ninfeu de ondas macias,
O mar. As ninfas guardam os pomares.
As Hespérides são moças algarvias
Todas jasmim, da testa aos calcanhares.

Garb de praia e pele magia e lendas,
Branco de extasiadas geometrias.
Absorto o tempo. São gregas as calendas
Com pálpebras de mouras gelosias.

Laranjas, cal, areia e rocha ardente
Têm sede da luz que dá mais vida.
Índigos deuses. Ardor. Tudo é presente.
Causa clara de beira-mar garrida.

Poema de Natália Correia (in “O Armistício”, 1985)
Recitado por Afonso Dias (in CD “Geometria do Sul”, Edere, 2002)
Outra Versão: Carla Moreira / Trupe Barlaventina (in CD “O Perfume da Palavra”, Concertante, 1999)

No Palácio das Varandas

[ Do Palácio das Varandas ]

No Palácio das Varandas
namorei moiras de sonho
escrevi meus versos de luz.
De ruiva cor eram o trono
e o sangue que me sangraram
com espadas sombras de cruz.
Naveguei Arade abaixo
‘té ao azul que gritava
Valentias de aventura.

Em preparos de abalada
do abrigo da enseada
fiz-me ao sonho e à sepultura
trepei agruras de pedra
espojei-me em areias de seda
nadei águas de amargura
Levei os cheiros do monte
plantei estevas no horizonte
flori o mar e a lonjura.

Num tempo antigo de igreja
a santidade da inveja
impôs-se a golpes de espada,
neste sul, do sul sobeja
mais geometria das almas
do que agressões de cruzada.
O Guadiana é travesso
e faz caber num só verso
um povo de duas águas.

Em capital de canções
manda o baile de emoções
esta orgia de poetas.
A velha Garb se ufana
de em mistérios ser estranha
como convém aos profetas.
A velha Garb se ufana
de em mistérios ser estranha
como convém aos profetas.

Hoje o Garb é ribeirinho
e o montanheiro, sozinho
é velhice e sais de pedra.
Da beira-mar para o sol
há que acender o farol
do norte que aponta a serra.
Da beira-mar para o sol
há que acender o farol
do norte que aponta a serra.

Letra: Afonso Dias
Música: Alfredo Correeiro
Intérprete: Afonso Dias (in CD “Geometria do Sul”, Edere, 2002)

Nome de Maria

Nome de Maria
Tão bonito é
Salva-me a minha alma
Que ela vossa é

Que ela vossa é
Sempre o há-de ser
Salva-me a minha alma
Quando eu morrer

Quando eu morrer
Quando eu acabar
Salva-me a minha alma
Para bom lugar

Para bom lugar
Para o Paraíso
Salva-me a minha alma
Dia do Juízo

Dia do Juízo
Para a eternidade
Salva-me a minha alma
Mãe da Piedade

Mãe da Piedade
Senhora das Dores
Salva-me a minha alma
Mãe dos pecadores

Mãe dos pecadores
Senhora da Luz
Salva-me a minha alma
Meu doce Jesus

Meu doce Jesus
Mãe do Nazareno
Salva-me a minha alma
Para sempre, Ámen.

E Jesus é meu
E eu quero ser vosso
Por isso lhe rezo
Este Pai-Nosso.

Popular – voz feminina (Monchique, Algarve)
Recolha de José Alberto Sardinha (1981) (in CD n.º 6 de “Portugal: Raízes Musicais”, JN/BMG, 1997)

Ó água que vais correndo

[ Verde-Gaio ]

Ó água que vais correndo
Mansamente vagarosa,
Passa pelo meu jardim,
Rega-me lá uma rosa!

Água da Fóia corre alta,
Por canais vai à cidade;
Eu não sou rica, mas tenho
Amores à minha vontade.

O ladrão do Verde-Gaio
Foi-se gabar à rainha
Que era dono do morgado
E nem sequer sapatos tinha.

E nem sequer sapatos tinha
Nem dinheiro para os comprar;
O ladrão do Verde-Gaio
Foi-me falso no amar.

Eu tenho à minha janela
O que tu não tens à tua:
Um vaso de violetas
Que perfuma toda a rua.

Bem sei que me andais mirando
Por debaixo do chapéu;
Se eu não sou do vosso gosto
Quem quer anjos vai ao céu.

O ladrão do Verde-Gaio
Foi-se gabar à rainha
Que era dono do morgado
E nem sequer sapatos tinha.

E nem sequer sapatos tinha
Nem dinheiro para os comprar;
O ladrão do Verde-Gaio
Foi-me falso no amar.

O ladrão do Verde-Gaio
Foi-se gabar à rainha
Que era dono do morgado
E nem sequer sapatos tinha.

E nem sequer sapatos tinha
Nem dinheiro para os comprar;
O ladrão do Verde-Gaio
Foi-me falso no amar.

Letra e música: Tradicional (Algarve)
Intérprete: Afonso Dias com Teresa Silva
Primeira versão de Afonso Dias, com Teresa Silva (in CD “Andanças & Cantorias”, Bons Ofícios – Associação Cultural, 2016)

O Algarve é branco

O Algarve é branco, manchado
De espuma branca do mar
Quando o mar endiabrado
Anda com ela a brincar

O Algarve é branco
Nas belas chaminés tão rendilhadas
Das suas casas singelas
Todas de branco caiadas

O Algarve é branco nas praias
Quando as ondas, uma a uma
As vestem de brancas saias
Feitas de rendas de espuma

O Algarve é branco
Nas velas dos seus barcos navegando
Em mar azul, sem procelas
Que de branco o vão pintando

O Algarve é branco nos dias
Que as amendoeiras em flor
Lembram neve em terras frias
Tão semelhantes na cor

O Algarve é branco
À noitinha, quando a lua, ao despertar,
Enche a paisagem inteirinha
De luz branca de luar

O Algarve é branco
À noitinha, quando a lua, ao despertar,
Enche a paisagem inteirinha
De luz branca de luar

Letra: Elisa Maçanita
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Ó Maria, vem bailar

[ Bailarico Algarvio (Corridinho) ]

– Ó Maria, vem bailar o corridinho!
– Ó Manel, não me faltes ao respeito!
– Ó Maria, que as penas do teu peitinho…
E eu não sou Maneleto!
– Ó Maneleto, que eu já te tenho dito:
Cá comigo só se baila com preceito!
– Ó Maria, não sejas tão esquisita,
Que bailamos ao toque da concertina!
Raios me parta se há alguma mais bonita,
Ai que tem como tu a pele tão fina…

Que bem que bailas, ó Maria, mas que bem!
Andas no ar como uma pena levezinha.
Só tenho pena que as penas que o peito tem,
Só tenho pena que as penas não sejam minhas…

Que bem que bailas, ó Maria, mas que bem!
Andas no ar como uma pena levezinha.
Só tenho pena que as penas que o peito tem,
Só tenho pena que as penas não sejam minhas…

– Ó Maria, vem bailar o corridinho!
– Ó Manel, não me faltes ao respeito!
– Ó Maria, que as penas do teu peitinho…
E eu não sou Maneleto!
– Ó Maneleto, que eu já te tenho dito:
Cá comigo só se baila com preceito!
– Ó Maria, não sejas tão esquisita,
Que bailamos ao toque da concertina!
Raios me parta se há alguma mais bonita,
Ai que tem como tu a pele tão fina…

Que bem que bailas, ó Maria, mas que bem!
Andas no ar como uma pena levezinha.
Só tenho pena que as penas que o peito tem,
Só tenho pena que as penas não sejam minhas…

Que bem que bailas, ó Maria, mas que bem!
Andas no ar como uma pena levezinha.
Só tenho pena que as penas que o peito tem,
Só tenho pena que as penas não sejam minhas…

Letra e música: Tradicional (Tavira, Algarve)
Recolha: Grupo Folclórico de Tavira
Intérprete: Cardo-Roxo (in CD “Alvorada”, Cardo-Roxo, 2015)

Cardo-roxo, Alvorada

O Sol é que alegra o dia

[ Arquinhos ]

Cantiga:

O Sol é que alegra o dia
Pela manhã quando nasce;
Ai de nós o que seria
Se o Sol um dia faltasse!

Moças, façam arquinhos!
Moças, façam arcadas
P’ra passar o meu benzinho,
P’ra passar a minha amada!

P’ra passar a minha amada,
O meu benzinho,
Moças, arquinhos!
Moças, arcadas!

P’ra passar o meu benzinho,
A minha amada, |
Moças, arquinhos!
Moças, arcadas!

O meu benzinho…

A minha amada…

Arquinhos (dança de roda)
Letra e música: Tradicional (Ourique / Castro Verde, Alentejo)
Informantes: Grupo Coral e Etnográfico “As Papoilas do Corvo” (Aldeia do Corvo), Manuel Bento (Aldeia Nova) e Pedro Mestre (Sete)
Recolha: Lia Marchi (in “Caderno de Danças do Alentejo”, Associação Pédexumbo e Olaria Cultural, 2010 – p. 36-37)
Intérprete: Aqui Há Baile (in CD “Caderno de Danças do Alentejo – adaptações”, Associação Pédexumbo/Caracol Secreto, 2013)

Ó Sol, vibrante sol

[ O meu Algarve ]

Ó Sol, vibrante sol, do meu Algarve de oiro,
que fazes palpitar os peitos e os jardins
no mesmo grande amor, fecundo, imorredoiro,
que rebenta, na Vida, em olhos e jasmins:
ó Sol que pões no Céu um brilho violento
e fazes chamejar, ao longe, os horizontes,
que pões fogo no ar e pões brasas no vento
e que vais calcinar a epiderme aos montes,
adoro a tua luz vigorosa e sadia,
que modula no campo a música das cores,
que rega, em nossa alma, os cactos da Alegria
e esculpe nas sementes os bustos das flores.
Cai-me sobre o olhar: banha-me em teu fulgor,
ó Sol que pões no Céu um latejante azul:
Dá-me a tua alegria e dá-me o teu vigor,
ó Sol, imortal sol, do meu país do Sul…

Poema (excerto): João Lúcio (in “O Meu Algarve”, 1905)
Música: Pedro Guerreiro
Intérprete: Carla Moreira / Trupe Barlaventina (in CD ” Lendas do País do Sul “, Concertante, 1999)

Olá vizinha prenda o seu galo

Olá vizinha prenda o seu galo
Qu’a minha galinha ricócó
Quer namorá-lo
Quer namorá-lo
Eu não m’importa
Galo à janela ricócó
Galinha à porta

Cró, cró, cró
A galinha foi-se embora
E o galinho ficou só

Letra e música: Popular (Algarve)
Arranjo: Margarida Guerreiro; Teresa Muge
Vassouras: Eduarda Alves, Margarida Guerreiro, Teresa Colaço, Teresa Muge
Intérprete: Moçoilas (in CD “Já Cá Vai Roubado”, 2001)

Perguntei ao Sol

[ Ponta nova do Algarve ]

Perguntei ao Sol se viu
E à lua se conheceu,
Às estrelas se encontraram
Um amor que já foi meu.

Ponta nova do Algarve
Está feita numa romã,
Onde o meu amor passeia
Domingo pela manhã.

Domingo pela manhã
Na segunda-feira à tarde,
Está feita numa romã
Ponta nova do Algarve.

O meu amor é aquele
Que não me tira o chapéu,
Tem a porta para a rua
E o telhado para o céu.

Ponta nova do Algarve
Está feita numa romã,
Onde o meu amor passeia
Domingo pela manhã.

Domingo pela manhã
Na segunda-feira à tarde,
Está feita numa romã
Ponta nova do Algarve.

Letra e música: Popular (Algarve)
Recolha: José Alberto Sardinha (Castro Marim, 1994) (in CD n.º 6 de “Portugal – Raízes Musicais”, ed. JN/BMG, 1997)
Intérprete: Diabo a Sete (in CD “Parainfernália”, Açor/Emiliano Toste, 2007)

Praia da Rocha

[ Fado de Portimão ]

Praia da Rocha, guitarra
Doirada que o mar dedilha
Ferragudo e a maravilha
Do castelo junto à barra

Mas quer chova ou faça sol
Quer o mar deixe ou não deixe
A cidade é um anzol
Portimão sonha com peixe

Como a foz do rio Arade
Como o cais de Portimão
Há-de haver tão lindos, há-de,
Mas mais lindos é que não.

Ah! Se o luar não vier
Às redes de Portimão
Luar de peixe a morrer
Antes do fim do Verão.

“Vá fome”
Diz Zé Fataça
Que outrora foi pescador
E é agora engraxador
Junto ao coreto da praça

Então a fome é verdade
E alguns vão buscar seu pão
A mil léguas do Arade
E do cais de Portimão.

Como a foz do rio Arade
Como o cais de Portimão
Há-de haver tão lindos, há-de,
Mas mais lindos é que não.

Letra: Leonel Neves
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Quatro horas da madrugada

[ Naufragou Valentina ]

Quatro horas da madrugada
Barcos p’rá pesca iam
Naufragou Valentina
Barco de Santa Luzia

Apelido Cavalo Raio
Que tanta fama deixou
À barra de Vila Real
Esse barco naufragou

Veio o vento de repente
Que nem um remate de bola
O barco que os salvou
Foi uma parelha espanhola

Aldemiro de Mateus
Seria o primeiro a faltar
Pela forte maresia
Arrebatado pelo mar

Manuel Milho e Joaquim
De suas mulheres se lembraram
Até que chegou a parelha
Que os naufragados salvava

Naufragou Valentina
Barco de Santa Luzia
O barco que os salvou
Barco de Punta Umbria

Para que fique na ideia
Esta grande e triste imagem
Se chegarem a naufragar
Nunca percam a coragem

Com toda a força gritava
Na maior aflição
O mestre fez desmerecer
A sua tripulação

Naufragou Valentina
Barco de Santa Luzia
O barco que os salvou
Barco de Punta Umbria

Naufragou Valentina
Barco de Santa Luzia
O barco que os salvou
Barco de Punta Umbria

Letra: Hermínio José Machado
Música: José Francisco Vieira
Intérprete: Zé Francisco & Orquestra Azul (in CD “Caminho de Mar e Luz”, José Francisco Vieira/Alain Vachier Music Editions, 2013)

Quem vive nos ardis da ilusão

Quem vive nos ardis da ilusão
E, assim, vai fugindo do amigo
Poderá encontrar consolação?

Quando será que estarei
Livre de desdém tão fero
Cujos fortes esquadrões
Me dão guerra que eu não quero.
Juro pela luz altaneira
Que em suas tranças se divisa:
Não sou cobra traiçoeira
Das que mudam de camisa.

De negras madeixas
Amo uma gazela
Um sol é o seu rosto
E palmeira é ela
De ancas opulentas.
Há entre seus lábios
De néctar o gosto.
Ó sede, se intentas
Sua boca beijar
Não o vais lograr.
Ó sede, se intentas
Sua boca beijar.

No encanto não tem
Rival tal senhora,
E fora do sonho,
Quem bela assim fora?
Qual espadas seus olhos
Lhe brilham; e rosas
Lhe enfeitam a face
Na sombra vistosas
Mas se as vais olhar
As farás murchar.
Lhe enfeitam a face
Na sombra as rosas.

Dá paz ao ardor
De quem te deseja.
Contenta o amor
E faz dom de ti,
Vamos lá, sorri,
Quando a boca beija.
Me disse na hora:
“Pecar me refreia”
Respondi-lhe: “Ora!
Não é coisa feia.”
Me disse na hora:
“Pecar me refreia”

Uma vez era noite
De bem longa festa.
Eu adormeci
E ela acordou-me com esta:
“Teu sono vai longo,
Toca a levantar!”
Então me beijou
E eu pus-me a cantar:
“Fazem reviver
Teus lábios a arder!”.
Então me beijou
E eu pus-me a cantar.

Dá paz ao ardor
De quem te deseja.
Contenta o amor
E faz dom de ti,
Vamos lá, sorri,
Quando a boca beija.
Me disse na hora:
“Pecar me refreia”
Respondi-lhe: “Ora!
Não é coisa feia.”
Me disse na hora:
“Pecar me refreia”

Uma vez era noite
De bem longa festa.
Eu adormeci
E ela acordou-me com esta:
“Teu sono vai longo,
Toca a levantar!”
Então me beijou
E eu pus-me a cantar:
“Fazem reviver
Teus lábios a arder!”.
Então me beijou
E eu pus-me a cantar.

Eduardo Ramos, Andalusino

Poema (adaptado): Al-Mutamid (in “O Meu Coração é Árabe”, de Adalberto Alves)
Música: Eduardo Ramos
Intérprete: Eduardo Ramos (in CD “Andalusino”, InforArte, 1999; CD “Cântico para Al-Mutamid”, Ed. de Autor, 2005)

Rio Guadiana

Rio Guadiana, que vais p’ró mar
Correm-te as águas tão gentis
Em terra estranha…
Toma cuidado, olha que em Espanha
Criam-se as mágoas que me inquietam
Dum pesadelo…

Frescas manhãs em Abril
Onde andarão lembranças mil…

Clara Joana foi-se hoje embora
Deixa a saudade num portado
Ninguém a chora
A felicidade é coisa simples
Vai de barquinha rio abaixo
Nunca mais torna…

Frescas manhãs em Abril
Onde andarão lembranças mil…

Espelho da cara da nossa gente
Tira a confiança a quem te mente
Ai se te vejo no Alentejo
Sem laranjais, sem trigo d’oiro
És a fonte dos meus receios

Frescas manhãs em Abril
Onde andarão lembranças mil…

Vitorino, Flor de la Mar

Letra e música: Vitorino
Intérprete: Vitorino (in “Flor de La Mar”, EMI-VC, 1983; reed. 1992)

Siga a roda, siga ela

[ Romance da Donzela Guerreira ]

(“Siga a roda, siga ela,
Que agora se vai contar
A história duma donzela
Que à guerra vai guerrear!”)

– As guerras se apregoaram
Entre França e Aragão:
Ai de mim que já sou velho,
Sem ter um filho varão!…
Sem ter um filho varão!… ­

Responde a filha mais moça
Com toda a resolução:
– Venham armas e cavalos
Que eu serei filho varão. –

(“A roda sempre a girar,
Que a história vai começar!”)
– Tendes as tranças compridas,
Filha, conhecer-vos-ão.
– Venham pentes e tesouras,
Vê-las-eis cair no chão!
Vê-las-eis cair no chão!

– Tendes os olhos garridos,
Filha, conhecer-vos-ão.
– Quando passar pela armada
Porei os olhos no chão!

(“Vai rodando sem parar,
Que o baile está a animar!”)

– Tendes peitos muito altos,
Filha, conhecer-vos-ão.
– Venham fardas apertadas,
Que eles logo abaixarão!
Que eles logo abaixarão!

– Tendes as mãos muito finas,
Filha, conhecer-vos-ão.
– Venham já guantes de ferro,
De lá nunca sairão!

(“A donzela triunfou
E prá guerra caminhou!
Logo o capitão da armada
Dos seus olhos se encantou…
E julgando-a disfarçada,
Em casa se aconselhou.”)

– Convidai-o vós, meu filho,
Para convosco dormir;
Que se ele for mulher,
Não se há-de querer despir.

– Linda cama pra mulher,
Mas ai, quem a fora convidar…
Mas dois homens numa cama?
Quem os mandará açoitar!

(“Sem mais nada descobrir,
Torna ele a insistir.”)

– Convidai-o vós, meu filho,
Para ir ao rio nadar;
Que se ele for mulher,
Logo se há-de acobardar.

– Águas doces são pra damas,
Mas ai, quem as fora convidar…
Porém, não servem pra homens
Senão as águas do mar!

(“Roda agora c’o seu par,
Que a história vai terminar!”)

Monta, monta, cavaleiro,
Se me queres acompanhar;
Se quereis ser o meu marido,
Minha mão te quero dar!
Minha mão te quero dar!

Sete anos andei na guerra
Mas ai, E fiz de filho varão;
Ninguém me conheceu nunca
Senão o meu capitão:
Conheceu-me pelos olhos,
Que por outra coisa não!

Letra: Tradicional
Música: Vítor Reino
Intérprete: Maio Moço (in CD “Canto Maior, Tradisom, 2002)
Outras versões: Amélia Muge – Donzela Guerreira (in CD “Novas Vos Trago”, Tradisom, 1998); José Barros e Navegante – “Donzela que vai à guerra” (in CD “Rimances”, JBN, 2001)

Tem o poial de um vizinho

[ Toada de Aljezur ]

Tem o poial de um vizinho
o telhado de outro ao fundo:
entre eles passa um caminho
de ambos e de todo o mundo.

Topo das casas-escadas:
Castelo, quem lá te pôs?
Cobres moiras encantadas,
descobres várzeas de arroz.

Sonhar rosas, pedir cravos
bom é que aos pobres se oiça…
Que os corpos sejam escravos,
as almas são outra loiça!

Que os corpos sejam escravos,
as almas são outra loiça!
Sonhar rosas, pedir cravos
bom é que aos pobres se oiça…

Eis a capital da Serra
do Espinhaço de Cão!
Mato com nódoas de terra,
muita pedra, pouco pão.

Mato com nódoas de terra,
muita pedra, pouco pão.
Eis a capital da Serra
do Espinhaço de Cão!

Vila de Aljezur,
arrasada sejas
de cravos e rosas
até às igrejas!

(Se nada valem os montes
que o concelho anda a lavrar,
talvez venda os horizontes
que tem à beira do mar…)

(Talvez venda os horizontes
que tem à beira do mar…
Se nada valem os montes
que o concelho anda a lavrar.)

Vila de Aljezur,
arrasada sejas
de cravos e rosas
até às igrejas!

Que faz tanta casa junta
subindo uma encosta louca?
Diz talvez que a gente é muita,
diz talvez que a terra é pouca.

Diz talvez que a gente é muita,
diz talvez que a terra é pouca.
Que faz tanta casa junta
subindo uma encosta louca?

Vila de Aljezur,
arrasada sejas
de cravos e rosas
até às igrejas!

Letra: Leonel Neves
Música: Afonso Dias
Intérprete: Afonso Dias com Tânia Silva (in CD “O Mar ao Fundo”, Bons Ofícios – Associação Cultural, 2015)

Vai, minha lanchinha à vela

[ Lanchinha à Vela ]

Vai, minha lanchinha à vela
Lá longe o horizonte
Vejo nuvens de esperança
Notícias de Levante

Se o mar a mim me engana
Tormentas, tempestades
Vai, minha lanchinha à vela
Antes que seja tarde

Trago cheiro a maresia
Gengibre e fruta sã
Levo a brisa pela proa
Rainha, minha romã

Vai, minha lanchinha à vela
Que a noite não tem fim
Vai buscar a chama eterna
Canela e alecrim

Vai, minha lanchinha, vai
Por mares e marés
Vai em busca de bonança
Mostrar quem tu és

Vai, minha lanchinha à vela
Lá longe o horizonte
Vejo nuvens de esperança
Notícias de Levante [3x]

Letra e música: José Francisco Vieira
Intérprete: Zé Francisco & Orquestra Azul (in CD “Caminho de Mar e Luz”, José Francisco Vieira/Alain Vachier Music Editions, 2013)

Vê-se ranchos de raparigas

[ Al Algarve ]

Vê-se ranchos de raparigas
a desfolhar uma rosa,
cantando lindas cantigas,
formando bailes de roda.

Refrão:

Ai, Algarve, tens amendoeiras floridas!
Ai, Algarve, tens o nome da canção!
Ai, Algarve, tens tão lindas raparigas!
Ai, Algarve, tens tão lindo Portimão!

Envolvidas na canção
fazem arraiais de feira,
gritam “viva Portimão”,
viva a flor da amendoeira.

Envolvida nas cantigas
só eu ficarei no pó
que as amendoeiras despidas
causam pena, metem dó.

Letra: Anónimo
Música: António Vinagre
Intérprete: Grupo Coral de Portimão (in CD “Algarve”, Tradisom, 200?)

Vimos dar as Boas Festas

Vimos dar as Boas Festas,
Já que Deus as nos deixou:
É nascido o Deus-Menino,
De manhã se baptizou.

Depois dele baptizado
Nesse tão humano dia,
Para a Glória foi levado
Com prazer e alegria.

Letra e música: Popular (Algarve / Estremadura)
Recolha: José Alberto Sardinha
Intérprete: Maio Moço (in CD “Canto Maior, Tradisom, 2002)

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