Regina Pacini
Soprano
Ainda muito criança a pequena Regina começou a frequentar o nosso primeiro teatro lírico, levada pela mão de seu pai. Aí se habituou a ouvir as melhores vozes daquela época, a conhecer as óperas do repertório corrente e a aprender os segredos do palco.
Pietro Pacini morreu novo, com cinquenta e cinco anos. Em Maio de 1882 partiu de comboio para Madrid a fim de contratar uma companhia italiana de opereta para o Teatro do Coliseu. No caminho para a capital espanhola adoeceu com uma doença febril e viu-se obrigado a voltar para casa, que era então no nº 8 da Rua Nova dos Mártires. Aí veio a falecer pouco tempo depois, na madrugada de 31 de Maio de 1882. Em 01 de Junho, pelas 16.30 horas, o corpo de Pietro Pacini era transportado para o Cemitério Oriental de Lisboa, onde ficou sepultado.
A pequena Regina deixou então de frequentar diariamente o teatro, mas o seu gosto pelo canto já tinha despontado. No Largo de Camões costumava então fazer o seu negócio um passarinheiro que, com um instrumento habilmente oculto na boca, imitava os trinados do rouxinol. Um dia a futura cantora deixou as amigas estupefactas ao fazer a mesma imitação, mas sem qualquer artefacto, apenas com a sua garganta privilegiada.
Essas mesmas amigas e depois outros amigos íntimos da família Pacini, reconhecendo os raros dotes vocais e o grande entusiasmo da pequena Regina, acabaram por convencer a mão da jovem, não sem dificuldade, a deixá-la frequentar uma aula de canto. A escola do professor recaiu em Napoleone Vellani, o mais famoso daquela época. Vellani aceitou a jovem aluna (então com 14 ou 15 anos) e acedeu a ensiná-la gratuitamente, já que Feliza Quintero não podia, de modo algum, suportar tal encargo. Contudo, a única hora de que ainda dispunha, era às onze da noite. E assim, todos os dias de aula, àquela hora a pequena Regina, acompanhada por sua mãe ou pela criada da casa, percorria duas vezes a pé o caminho para a casa de Vellani, fosse Verão ou Inverno, para receber a lição do mestre.
Regina Pacini progrediu rapidamente graças aos ensinamentos do mestre e também graças à sua generosidade, pelos quais, aliás, soube sempre ser grata. Iniciara-se o ano de 1887. Regina Pacini tinha apenas dezasseis anos, mas as suas extraordinárias qualidades artísticas permitiam-lhe abordar facilmente o repertório operático corrente para vozes do seu tipo.
O barítono Cotogni e o maestro Marino Mancinelli, que haviam sido grandes amigos de Pietro Pacini, depois de ouvirem a jovem pretenderam fazê-la estrear-se no Covent Garden, cuja orquestra era dirigida por Luigi Mancinelli. Regina chegou mesmo a partir para a capital inglesa, em Janeiro desse ano, acompanhada por Cotogni, para cantar A Sonâmbula (Amphion, 01 de Fevereiro de 1887), mas a ópera já havia sido cantada nessa temporada pela Russel e a empresa não quis arriscar-se a repeti-la com uma principiante. Ainda se encarou a hipótese de Regina cantar a “Zerlina” do D. João, mas era já demasiado tarde e a ideia foi abandonada. Protelada assim a estreia da nossa compatriota no Covent Garden, Cotogni e Marino Mancinelli resolveram convencer o empresário Campos Valdez (e conseguiram) a aceitar a estreia de Regina Pacini no Teatro Real de S. Carlos.
Houve ainda que vencer a forte resistência de Leliza Quintero, que não via com bons olhos a entrada da filha na carreira lírica. Foi aí providencial a acção persuasiva do padre italiano Prospero Peragallo, grande conselheiro e amigo da família Pacini, talvez principalmente de Regina, a quem baptizara havia quase dezassete anos.
A estreia de Regina Pacini no Teatro Real de S. Carlos deu-se em 05 de Janeiro de 1888, na véspera, portanto, do seu décimo sétimo aniversário. Oreste Gennari foi “Elvino” e Pablo Meroles foi o “Conde Rodolfo”. O espectáculo foi dirigido por Arturo Pontecchi. A ópera de estreia foi A Sonâmbula e o acolhimento do público e da crítica não poderia ser mais caloroso. No fim do espectáculo, no meio de um entusiasmo louco, o público chamou-a catorze vezes ao proscénio.
Era uma excelente soprano, famosa em toda a Europa. Com “La Somnambula” em 05-01-1887, alcançando notável êxito, apesar da verdura e inexperiência dos seus 16 anos.
Igual sucesso obteve com a sua actuação noutras óperas, que interpretou não só em Portugal mas também em Espanha, Inglaterra, Itália e Rússia. Além do Teatro de S. Carlos, actuou no Teatro Gil Vicente (Porto), Her Majesty’s Theatre, (Londres), Royal Albert Hall, (Londres), Surrey House, (Londres), Teatro Manzoni, (Milão), Teatro Politeama Garibaldi, (Palermo), Teatro Real de Madrid, Teatro de S. João, (Porto), Teatro Gayarre, (Bilbau), Teatro Principal, (Cádis), Teatro de Sam Fernando, (Sevilha), Teatro Cervantes (Málaga), Teatro Gran Capitan (Córdova), Teatro Isabel la Católica (Granada), Palácio Real (Madrid), Teatro Lírico (San Sebastian), Teatro Benetar (Gibraltar), Cartagena, Teatro Principal (Saragoça), Teatro Campoamor (Oviedo), Teatro Calderón (Valladolid), Assembleia Portuense (Porto), Coliseu dos Recreios (Lisboa), Teatro Imperial (Varsóvia), Teatro Imperial (Moscovo), etc. Fez a sua despedida dos palcos em 11-03-1904.
A 29-04-1907 casou com Manuel Avelar, então exilado em Portugal por ter participado em três movimentos revolucionários e que veio a ser Presidente da Argentina e, por esse motivo, Regina Pacini chegou a ser primeira dama da Argentina.
O seu nome faz parte da Toponímia de: Seixal (Freguesia de Fernão Ferro).
Fonte:
“Cantores de Ópera Portugueses”, (Mário Moreau, II Volume, Bertrand Editora, Edição de Novembro de 1987.