Luís Henrique, professor e autor, bar do CMP, 2004, foto Olavo Tengner Barros

Luís Henrique

Professor . Autor

Luís Henrique nasceu no Porto em 1951 e morreu em 2021. De 1971 a 1974 frequentou o curso de engenharia química da Universidade do Porto que abandonou para se dedicar exclusivamente à música.

Concluiu com distinção o curso superior de piano no Conservatório de Música do Porto. Mais tarde trabalhou com as pianistas Maria João Pires, em Lisboa e Neuchâtel e Brigitte Meyer em Lausanne, Suíça. Deu recitais a solo e como acompanhador.

Dedicou-se ao estudo da organologia e acústica musical e publicou as obras “Instrumentos Musicais”, editada em 2002 pelo Serviço de Educação da Fundação Calouste Gulbenkian (2ª edição em 1994) e Acústica Musical pelo Serviço de Educação e Bolsas da FCG.

Em 1979 prestou provas públicas e foi admitido por unanimidade como professor no Conservatório de Música do Porto. Foi também professor de Organologia e Acústica Musical no curso de Produção e Tecnologias na Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo (ESMAE, Porto).

O fascínio pela acústica surgiu porque esta era uma área privilegiada que permitia combinar sua paixão pela música e pela ciência. Considerava-se um autodidacta no domínio da acústica. Quando começou não existia formação nessa área em Portugal. Fez estudos privados com Éric Émery, na Suíça onde, equiparado a bolseiro do Estado, fez um trabalho de aperfeiçoamento em acústica.

No âmbito do Fundo Social Europeu, realizou no Instituto de Ciências e Engenharia Nucleares/DEEN (INETI) uma ação de formação na área de investigação em acústica musical.

Realizou um trabalho de investigação em colaboração com o investigador José Vieira Antunes.

Em 2003 preparava um doutoramento sobre técnicas de optimização e modelação física de instrumentos musicais da família dos idiofones.

Cultura-Ípsilon, suplemento do Público publicou a 7 de abril de 2003 o artigo de Cristina Fernandes “Fui construindo o livro que gostaria que existisse”, a propósito de uma apresentação pública (a cargo do investigador José Antunes, do Instituto Tecnológico e Nuclear) na Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo (ESMAE) do Porto, nesse dia. A sessão foi organizada pelo Curso de Produção e Tecnologias da Música (PTM) e integrou-se na Semana PTM, subordinada ao tema “A organologia em Portugal. Os instrumentos acústicos – da construção à investigação”.

Pode um cantor partir um copo de cristal com a voz? Porque é que a orquestra afina pelo oboé? Porque é que as pessoas gostam de cantar no chuveiro? O que é o ouvido absoluto? Qual a diferença entre analógico e digital? Que cuidados se devem ter para preservar o ouvido?

A resposta a estas e a muitas outras questões pode encontrar-se no livro “Acústica Musical”, de Luís Henrique (Fundação Gulbenkian, 2002). Quase todos os estudantes de música das últimas décadas conhecerão o nome de Luís Henrique como o autor da antiga sebenta de Acústica usada nos conservatórios e escolas de música e pelo livro “Instrumentos Musicais”, publicado pela primeira vez pela Gulbenkian em 1987.

“Quando comecei a dar aulas de Acústica, em 1975, senti a necessidade de elaborar uma sebenta, que depois foi circulando pelo país. Era muito exígua, mas não havia mais nada”, contou Luís Henrique ao PÚBLICO.

Posteriormente apresentou um projecto à Fundação Gulbenkian para a publicação de um livro de Acústica e Organologia, mas a ambiciosa dimensão do trabalho faria com que, numa primeira fase, se concretizasse apenas o livro sobre instrumentos.

“À excepção dos ‘Elementos de Acústica Musical’, de Martins da Silva (1989), um trabalho restrito, continuava a não existir mais nada sobre o assunto em português. Quanto à literatura estrangeira era difícil encontrar um livro que me satisfizesse totalmente. Alguns eram relativamente simples e não me esclareciam completamente, outros eram muito difíceis de penetrar. Ao longo de dez anos, à medida que ia estudando os vários assuntos, fui construindo o livro que gostaria que existisse”, acrescentou.

A ideia inicial era fazer uma obra destinada aos músicos e professores de música, mas, pouco a pouco, as suas dimensões e âmbito foram-se alargando.

“Na sua base, a Acústica é uma ramo da Física, pelo que é muito difícil abordar os fenómenos sonoros sem determinados conceitos de física e matemática. Por outro lado, trata-se de uma área interdisciplinar”. Por isso, Luís Henrique considera que o livro tem capítulos que poderão interessar também a outros profissionais (físicos, engenheiros, arquitectos, fonéticos, terapeutas da fala, construtores de instrumentos, profissionais de áudio, otorrinos) e fornece alguns exemplos.

“Os espaços arquitectónicos são concebidos para cumprir uma função que está, em muitos casos, ligada a aspectos acústicos: teatros, salas destinadas a cinema, concertos, aulas ou conferências, igrejas, etc. É fundamental que se ouça o que se está a realizar e sabemos que nem todos os arquitectos dão a devida atenção a esse aspecto essencial.

Por outro lado, os princípios físicos que regem os fenómenos sonoros são os mesmos quer o som provenha do motor de um carro, quer se trate de um instrumento musical. Frequentemente, o papel do engenheiro é evitar o ruído e a vibração. Na acústica musical procura-se controlar as vibrações e maximizá-las.

O estudo de um instrumento musical do ponto de vista físico e mecânico pode ser um excelente banco de ensaio para o engenheiro. A resolução de um problema de acústica musical pode fornecer excelentes ideias para resolver um problema industrial relacionado com as vibrações”.

Luís Henrique menciona também áreas de investigação que estão na ordem do dia, como a síntese da fala e o seu reconhecimento automático aplicado às comunicações e telecomunicações. O livro tem 1130 páginas, mas não é caso para o leitor se assustar, já que este possui vários níveis de leitura.

O corpo principal da obra, com explicações científicas, é complementado por uma série de caixas onde são tratados vários assuntos interessantes de uma maneira qualitativa (“Os instrumentos da Filarmónica de Viena”, “O ’toucher’ do pianista”, “Os autopianos: do rolo perfurado ao MIDI”, “Como preservar a voz”, “A surdez dos músicos”, “Músico e técnico de som: diálogo de surdos?”, etc.).

No plano científico, quem tiver dificuldades pode ainda relembrar ou adquirir as noções necessárias de matemática e física em 100 páginas de apêndices.

Após uma introdução com considerações sobre arte e ciência e uma pequena história da Acústica Musical, seguem-se capítulos onde são focadas as bases físicas do som (vibrações, ondas, etc.), métodos teóricos e experimentais de análise de sons e os aspectos acústicos dos diferentes instrumentos musicais.

A voz, aspectos experimentais no fabrico de instrumentos, a acústica de salas, escalas, intervalos, afinações, percepção auditiva, registo e reprodução de sons, electrofones e síntese sonora são outras temáticas abordadas.

O livro é complementado por um CD que permite ao leitor relacionar o som dos instrumentos que está a ouvir com a sua estrutura física. Temos, por exemplo, o som de violoncelo tocado em instrumentos diferentes, comparação entre sons obtidos por palhetas ou por bocais diversos, etc.

Posteriormente, “a colaboração com o eng. José Antunes tornou-se decisiva para o desenvolvimento da componente científica da minha formação”.

Cristina Fernandes

Publicado na Meloteca a 28 de abril de 2021

Testemunhos

Algumas das reações à notícia da sua morte publicada pela Meloteca:

Foi meu professor no Conservatório de Música do Porto. Excelente como professor e pessoa!

(Ricardo Abreu)

Meu colega e amigo… acabámos o superior de piano no mesmo dia, na mesma classe. Muito triste!!!

(Eugénia Moura)

Grande livro (Instrumentos Musicais)! É essencial na minha biblioteca.

(João Tiago Oliveira)

Obrigada pela partilha. Também fui aluna do Professor Luís Henrique no CMP na disciplina de Acústica (uma autoridade em Portugal sobre esta matéria) e depois, por coisas do destino, colega na ESMAE. Recordo com saudade as suas excelentes aulas e a sua generosidade no Conservatório de Música do Porto.

(Sofia Lourenço)

Mais uma personalidade marcante. Fui um dos afortunados que aprendeu o ABC da acústica musical por ele…

(Nuno Caçote)

Um grande professor com uma bondade imensa e que tive o privilégio de o conhecer na ESMAE.

(Pedro Filipe Cunha)

Muitas horas de conversa tivemos sobre instrumentos tradicionais de todo o mundo.

(Nuno Gaspar Guimarães)

Grande professor, grande homem, um senhor.

(Jean-François Lézé)

Foi um professor maravilhoso, cheio de generosidade, sabedoria e gentileza.

(Fátima Fonte)

Que notícia tão triste… uma pessoa fantástica de enorme generosidade e saber, a quem tanto devemos no campo da Acústica e da Organologia.

(Cristina Fernandes)

Foi meu professor, e os livros dele são insubstituíveis. Têm-me acompanhado desde os tempos do Conservatório.

(Fernando Manuel Rodrigues)

Triste notícia! Deixa um legado importante para os estudos em organologia e acústica.

(Rodrigo Teodoro de Paula)

Meu professor! Dos melhores que tive…

(Paulo Bastos)

Por todo o lado têm sido publicados imensos sentimentos de pesar pela perda súbita do professor Luís Henrique. Ao mesmo tempo, vi tanta felicidade da parte de todos por terem tido o privilégio de terem convivido com ele, e descrições maravilhosas de memórias e acontecimentos, o que só prova o quanto ele foi uma pessoa extraordinária, um ser humano de uma delicadeza e empatia inigualáveis e, ao mesmo tempo, um profissional do mais alto nível.

(Carla Quelhas)

Para além do muito, muito que aprendi com Luís Henrique, meu querido professor de Acústica no Conservatório de Música do Porto, ele foi, tão simplesmente, a pessoa responsável por eu ter seguido o meu percurso profissional como músico, e não como geógrafo ou advogado. Já não o via há muitos anos, mas devo-lhe tanto, tanto… Lamento muito que tenha partido. Obrigado, Professor Luís Henrique.

(Carlos Canhoto)

Uma homenagem a este homem Maior, o Prof. Luís Henrique foi provavelmente o grande mestre do estudo da Acústica na formação de músicos em Portugal; os seus livros os manuais de referência quer de conservatórios quer das instituições de ensino superior. Fomos uns privilegiados aqueles que puderam ter assistido às suas aulas na Escola Superior de Musica e Artes do Espectáculo já depois da edição do “Acústica Musical”.

(Henrique Portovedo)

Não conhecia pessoalmente, mas é uma grande referência para a Organologia e Acústica de um modo geral…
(Maria José Borges)

Nos últimos anos, uma vez reformado, passou a dedicar uma parte do seu tempo livre à divulgação e a facultar a experimentação quer no plano acústico, quer no organológico, a crianças e jovens do ensino básico e secundário, nos conservatórios, academias e escolas profissionais por todo o país. Testemunhei isto uma vez, há uns 8 anos (salvo erro) na Figueira da Foz. Foi um enorme sucesso e alegria!

(Nuno Bettencourt Mendes)

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