Jorge Croner de Vasconcelos
Composição
VASCONCELLOS Moniz de Bettencourt, Jorge Croner de Sant’Anna e (n. Lisboa, 11 Abr. 1910; m. Lisboa, 9 Dez. 1974).
Compositor, professor e pianista.
Jorge Croner de Vasconcellos descende de uma família de músicos notáveis no âmbito da música erudita.
O pai, Alexandre Bettencourt (1868-1945), eminente violinista, discípulo durante quatro anos em Paris do mestre Hubert Léonard, foi professor no Conservatório Nacional (classe de Violino).
Mathilde das Nogueiras (1859-1941), irmã do pai, foi cantora de ópera de nomeada, tendo-se associado em Paris com a famosa Pauline Viardot-Garcia.
A mãe, Laura Croner (1887-1962), violinista e pianista de talento, provinha de uma longa linhagem musical, começada em Portugal nos princípios do séc. XIX por Joseph Croner, músico germânico, cujos dois filhos — António José Croner (1826-1888) e Raphael José Croner (1828-1884), bisavô e tio-bisavô de Jorge Croner de Vasconcellos — foram concertistas notáveis, respectivamente na flauta e no clarinete.
Cezaltina Croner (1864-?) e Regina Croner Cascais (1903-1982), filha e neta de Raphael, ambas pianistas, continuaram juntamente com Jorge Croner de Vasconcellos a linha musical até os nossos dias.
Começando Solfejo e Piano com a mãe, Jorge Croner de Vasconcellos estudou depois Piano com Alexandre Rey Colaço e Composição com Luís de Freitas Branco, Francisco de Lacerda e Eduardo Libório, cursando contemporaneamente Ciências Histórico-Filosóficas na Faculdade de Letras (Universidade de Lisboa).
Em 1934 recebeu da Junta de Educação Nacional uma bolsa para estudar em Paris, onde se manteve até ao Verão de 1937. Aí estudou Harmonia, Contraponto e História da Música com Nadia Boulanger; Composição, primeiro com Paul Dukas, depois com Roger Ducasse; Piano com Giraud-Latarse; Interpretação com Alfred Cortot. Beneficiou ainda dos ensinamentos de Igor Stravinski.
Em 1938 foi nomeado professor interino de Composição do Conservatório Nacional, lugar que desempenhou até à morte.
A obra de Jorge Croner de Vasconcellos cobre praticamente todos os géneros de música de câmara e sinfónica, exceptuando a ópera. Tecnicamente, caracteriza-se pelo relevo conferido à dissonância, como elemento estrutural e colorístico. Serviu-se com liberdade e discrição dos idiomas correntes antes do fim da II Guerra Mundial — modalismo, escala de tons inteiros, politonalismo, formação de acordes por sobreposição de intervalos diferentes da 3.ª.
Conservou da música tonal a ideia de centro tonal e de cadência, mas alargou aos 12 tons o conceito de tonalidade, e praticou cadências a intervalos diversos da 5.ª descendente ou 4.ª ascendente. Como Paul Hindemith, seu contemporâneo, procurou uma linguagem musical que superasse o cromatismo romântico herdado de Wagner e o atonalismo da Segunda Escola de Viena. Porém, o instinto meridional afastou-o dos sistemas intelectuais estanques. O seu estilo exibe variedade e vitalidade dos ritmos, opulência da harmonia e, em geral, elegância e concisão. Do ponto de vista expressivo, pode talvez sintetizar-se: um etos frequentemente melancólico; expressão directa da emoção; claridade e transparência da forma; capacidade de exprimir paixão, mas dificuldade na expressão da força; por vezes, franco sentido humorístico.
Como professor, evitou o dogmatismo, tomou-se num guia experiente e seguro. A sua classe de Composição favoreceu a eclosão de personalidades as mais diversas, desde Constança Capdeville a Maria de Lourdes Martins, Armando Santiago, Filipe de Sousa, entre outros. Excelente pianista, quer como acompanhador quer a solo, abandonou a carreira de solista após 1943, por motivos de saúde.
GIL MIRANDA, VASCONCELOS Jorge Croner, “Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX”, Dir. Salwa Castelo-Branco, Lisboa: Temas e Debates/Círculo de Leitores, 2010 – Vol. IV, p. 1317)