Fernando Albuquerque

Fernando Albuquerque

Mecenas . Promotor

Fernando de Sousa Botelho de Albuquerque, Director-Delegado da Fundação da Casa de Mateus, nasceu em Lisboa, no dia 4 de dezembro de 1941 e morreu a 14 de janeiro de 2022.

Conde de Mangualde, Vila Real e Melo, Fernando de Albuquerque fora agraciado com a Grã-Cruz da Ordem do Infante pelo Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, no dia 4 de dezembro de 2021, data em que comemorou os 80 anos.

Dedicou grande parte da sua vida ao desenvolvimento do legado de seu pai, D. Francisco de Sousa Botelho de Albuquerque, instituidor da Fundação da Casa de Mateus em 3 de dezembro de 1970.

Homem do seu tempo, D. Fernando de Sousa Botelho de Albuquerque, assumiu as funções de Diretor-Delegado da Fundação em 1973, acompanhando sempre de perto a reconstrução do Portugal democrático com uma programação, iniciada em 1977, vibrante no seu alcance cultural, artístico e político. Os seminários “Repensar Portugal”, iniciados em 1978, a transformação do panorama da música antiga em Portugal com a criação dos “Encontros Internacionais de Música da Casa de Mateus”, a instituição do “Prémio D. Diniz”, em 1980, a criação do Instituto Internacional Casa de Mateus, em conjunto com todas as Universidades e Academias Científicas portuguesas, em 1986, ou ainda a inauguração da Residência de Artistas, em 1998, são alguns dos marcos maiores de uma ação constante sempre orientada pelo cumprimento das missões estatutárias da Fundação e com a capacidade de lhes conferir uma visão singular.

Na esteira de uma tradição multi-secular, sempre preservada pela família, prestou uma particular atenção à preservação e divulgação do importante acervo documental histórico à guarda da Fundação. Em reconhecimento de toda a atividade desenvolvida, a Fundação foi agraciada em 2011 com o grau de membro honorário da Ordem do Infante D. Henrique por Sua Excelência o Senhor Presidente Aníbal Cavaco Silva.

Para além do seu trabalho enquanto Diretor-Delegado da Fundação, D. Fernando era graduado em Engenharia Química pelo Instituto Superior Técnico, diplomado em Indústria Alimentar pela Universidade de Louvain (Bélgica) e foi Professor Assistente da Universidade de Luanda entre 1967 e 1970. Foi membro do Conselho Português da Fundação Europeia da Cultura entre 1983 e 1995, membro do Conselho Nacional da UNESCO entre 1984 e 1988, membro do Hague Club entre 1996 e 2001, membro do Conselho Institucional da Fundação das Casas de Fronteira e Alorna, membro do Conselho Geral da Fundação Inês de Castro. Era, atualmente, Presidente do Conselho de administração da Lavradores de Feitoria – Vinhos de Quinta SA.

Contraiu o seu primeiro matrimónio com D. Emília Maria de Brito Rodriguez de Cela, nascida em 3 de fevereiro de 1942, e o segundo com D. Maria Amélia de Magalhães Nunes da Ponte, nascida em 31 de janeiro de 1951. Era pai de Teresa Margarida Gomez de Sousa Botelho de Albuquerque e Inês Sofia Gomez de Sousa Botelho de Albuquerque e avô de Ana de Sousa Botelho de Albuquerque Paganini e Laura Sousa Botelho de Albuquerque Cruz.

Fonte: Notícias de Vila Real

TESTEMUNHOS

Rui Vieira Nery

O meu Amigo Fernando Albuquerque era um fidalgo. Um fidalgo dos verdadeiros, mas não pela formalidade de ser, pelo nascimento. D. Fernando de Sousa Botelho de Albuquerque, 7º Conde de Vila Real, 6º de Melo e de 4º Mangualde, e herdeiro de mais uma quantidade de distinções nobiliárquicas (das quais a mais curiosa foi sempre para mim a de ser também, por direito hereditário, Senhor da Ovelha do Marão).

A fidalguia do Fernando a que me refiro vinha-lhe de uma certa maneira de olhar a História a partir de um forte sentimento de continuidade que o ligava espiritualmente a gerações sucessivas da sua família e à Casa multissecular em que todas tinham vivido, e que ele encarava não como uma fonte de distinção mas sobretudo como uma linha de transmissão de um ónus de responsabilidade – de responsabilidade pessoal e de responsabilidade pública – a cada nova geração.

A Casa de Mateus tinha de estar de pé, em toda a sua dignidade, e as suas terras tinham de produzir vinho, azeite e fruta, porque era essa a missão histórica que sempre lhe tinha cabido, mas não tanto – e sem qualquer dúvida não só – pelo estrito interesse dos seus proprietários mas porque tinha a missão histórica de continuar a ser um ícone emblemático da região, um polo de desenvolvimento local, uma fonte estável de emprego para a população, um símbolo de continuidade das produções locais tradicionais e porque lhe cabia a ele, Fernando, o ofício de zelar pelo cumprimento dessa missão, como os seus antepassados o tinham feito.

E como muitos dos Morgados de Mateus se destacaram no passado pela sua acção de promoção das Artes e das Letras – entre eles o 4º Morgado, D. Luís António, o Governador iluminista de São Paulo, que aí fez edificar às suas custas um dos primeiros teatros de Ópera públicos da América Latina, ou o 5º, D. José Maria, que em 1817 promoveu à sua custa a edição monumental dos “Lusíadas” em Paris – o Fernando Albuquerque naturalmente assumia também como parte dessa missão herdada dos seus antepassados a causa da promoção da Cultura.

Para o meu olhar arreigado de plebeu republicano e de homem de Esquerda esta lógica aristocrática era-me completamente estranha e até, no limite, incompreensível, mas depressa percebi, na prática, que os seus resultados eram bem concretos.

Mateus ali estava, preservada com um desvelo incansável e aberta a milhares e milhares de visitantes como uma das maravilhas do Barroco português, as vindimas sucediam-se ano após ano para produzirem alguns dos melhores vinhos portugueses, as hortas da Casa davam tomates com um perfume e um sabor que eu já me tinha esquecido que podiam existir.

E, graças à dedicação do Fernando, Mateus promoveu os primeiros e os mais relevantes cursos internacionais de Música Antiga, com nomes fundamentais como Gustav e Marie Leonhardt, Max von Egmont ou Anne Bylsma. Todos os Verões, num raio de acção que se espalhava pelas igrejas de cidades, vilas e aldeias do Douro, havia dezenas de concertos com artistas como Teresa Berganza, Dalton Baldwin, Moura Limpany, Dagoberto Linhares e tantos mais, muitas vezes em lugares onde nunca antes se tinha ouvido uma nota de Música Clássica.

E havia depois o Prémio Dom Diniz, uma das mais prestigiadas distinções literárias portuguesas, os seminários de tradução que juntavam poetas de toda a Europa, os encontros de reflexão sobre as grandes temáticas da contemporaneidade inspirados pelo clima de concentração e de diálogo sereno e discreto que a Casa suscitava. Deixei de me preocupar com a aparente bizarria das motivações arcaicas que porventura podiam levar o meu Amigo Fernando a dedicar-se deste modo à causa em que acreditava para admirar nele o homem de Cultura humanística invulgar, o engenheiro capaz de pôr em andamento e manejar esta máquina complexa e multifacetada perante desafios sempre novos, o gestor visionário que conseguia obter e combinar esforços e recursos de todas as fontes disponíveis, com uma persistência e uma teimosia irresistíveis e sem outra ambição que não fosse a de viabilizar a sua obra.

Rui Vieira Nery ]

Sofia Lourenço

Personalidade única e que tanto marcou a cultura em Portugal, recebo com muita tristeza esta notícia. Também pertenço às gerações que muito usufruíram da vitalidade única da Casa de Mateus (ainda me ocorrem a pianista Alicia de Larocha, o barítono Matthias Goerne, os estágios de tradução com a minha mãe, a Fiama P. Brandão e tantos outros). (Sofia Lourenço)

Osvaldo Ferreira

O Fernando recebeu-me algumas vezes na sua casa, sempre com muita elegância e com enorme generosidade. Dirigi várias vezes nos festivais de Mateus, com a Orquestra Gulbenkian e depois com a Orquestra do Algarve. Ficam belas memórias e um enorme legado. (Osvaldo Ferreira)

Miguel Jalôto

Fui um privilegiado. Mateus mudou a minha vida, e a minha gratidão é eterna. O Senhor Conde foi um Homem admirável. (Miguel Jalôto)

Paulo Lameiro

Sou um dos muitos privilegiados que mudou a vida por muitos momentos nesses verões em Mateus. Gostava de estar à mesa com ele, naquela cozinha de sonho, e guardo na memória uma das nossas discussões acerca da casta “Farrampil”, e foi ali em Mateus que ele me explicou porque é que Fernão Pires na minha região de Leiria é especialmente designada por Farrampil. Sem telemóveis ainda, fez questão de imediato telefonar a um dos seus enólogos para melhor me explicar esta territorialidade. Sendo as terras e os amanhos mais comuns nas nossas conversas, apaixonei-me pela casa, e num dos anos cheguei a fazer eu a visita guiada a alguns turistas. O seu fascínio por aqueles seus dois cães que faziam tremer todos os convidados. As cozinheira com que conversei horas (Emília e Vitória?!!) ainda hoje quando cheiro cedro intenso viajo de imediato para aquele túnel, ainda hoje quando como framboesas apanhadas de fresco voo para aquela eira, eira onde ouvi tantos cantores de toda a Europa contar histórias de palco noite dentro, com as estrelas mais luminosas de Portugal. Aquele céu. Ai o que vivi agora ao ler este texto. Gratidão imensa ao Conde Fernando. Fidalguias? Pouco sei. Fascínio total por ele, condessa Amélia, e a casa que souberam manter e partilhar generosamente com tantas centenas de jovens, colocando-nos a aprender e viver no paraíso com os melhores. (Paulo Lameiro)

Mário de Alcântara Carreira

Ainda há muito pouco tempo o Olavo Tengner Barros e eu tivemos o prazer de desfrutar da sua amável companhia e familiares. (Mário de Alcântara Carreira)

Maria João Carmo

O meu primeiro curso internacional de Música foi em Mateus pelas nãos deste Senhor. Mateus mudou a minha vida. Aí começou a viagem de uma vida como cantora. As primeiras lições foram com Max van Egmond e Marius van Altena acompanhada ao piano pelo meu amigo e colega Maarten Hilenius. Um muito obrigada a este Senhor com S grande, Conde de Mateus. Um homem de grandes actos culturais, humanistas e de grande promoção da Música no nosso país. Fez a diferença na descentralizacão da Cultura neste país. Pela sua mão passou um mundo de músicos nacionais e internacionais de renome, de grande talento e valor artístico. Que perda grande para Portugal e para o mundo! Que descanse em Paz e que a sua vida seja inspiracão para as próximas gerações. (Maria João Carmo)