Cândida Matos por Denys Stetsenko

MARIA CÂNDIDA MATOS

ENTREVISTA

Como começou a sua descoberta da arte dos sons?

Muito cedo, com cerca de 4 anos. Havia um piano em casa, e comecei a brincar com ele muito cedo.
Lembro-me de fingir que tocava e haver muitos aplausos.

Qual foi o seu primeiro instrumento?

O piano. Toquei desde os 7 anos, e concluí o Curso Superior em 1984, no Conservatório Nacional.
Toquei piano durante pelo menos 20 anos.

O que a levou a estudar Cravo em Amsterdão?

Tinha começado há pouco a estudar o instrumento, estava fascinada e queria conhecer o mundo do cravo e da música antiga. Já me tinha apercebido dos limites do nosso país nesse contexto. Havia muito pouca gente a fazer música antiga no nosso país, nessa altura. Eu queria ir conhecer o grande centro da música antiga, onde a tradição cravística era enorme. Queria estar onde pudesse ter um contacto mais próximo com toda essa valiosa realidade musical.

Viu na Holanda muitas diferenças no ensino do instrumento em relação a Portugal?

Quando fui para a Holanda o Curso Superior de Cravo ainda não existia no nosso país, ia ser inaugurado, com a criação da Escola Superior de Música de Lisboa. Na Holanda havia já uma longa e forte tradição, no ensino tínhamos nomes de grandes cravistas como Gustav Leonhardt, Ton Koopman, Bob Van Asperen, Jacques Ogg, nas principais escolas da Holanda.

As aulas de cravo eram em casa do professor, fora de Amsterdam, não havia faltas nem sumários, nada disso, o que seria impensável em Portugal, e que era indicativo de uma mentalidade muito diferente no âmbito do ensino. O curso tinha as vertentes de solista ou de professor, distinção essa que não existia nem existe cá.

Além de cravista, é professora. É uma vantagem realizar as duas atividades?

Acho que as duas actividades estão interligadas e se complementam. Não será por acaso que muitos cravistas são famosos também por serem notáveis professores. Enquanto professora, manter-me activa como cravista é fundamental, é uma referência para os meus alunos e dará sentido e maior qualidade ao meu ensino. Um professor que não toca, como poderá ser um bom professor?

Por outro lado, ser professora também tem vantagens para a actividade de músico, pois aprende-se muito a ensinar. Sempre gostei de ensinar, e comecei muito cedo, particularmente, pediam-me aulas porque eu tocava bem. Há muito repertório que descubro e aprendo porque estou a ensinar, procurando peças variadas e apropriadas para cada aluno.

Contudo, nem sempre é fácil conciliar a actividade pedagógica com os concertos. Os nossos horários pedagógicos deviam ser mais reduzidos, para nos permitir ter mais tempo para tocar. Devido ao ensino não estudo tanto quanto gostaria, nem dou tantos concertos. Muitos projectos pessoais vão sendo adiados, por falta de tempo, e sonho sempre com o dia em que terei menos alunos, e mais tempo para tocar…

Nunca pensou ficar a trabalhar na Holanda ou ir para outro país?

Sempre pensei em viver em Portugal, é no meu país que gosto de viver, apesar de, profissionalmente, na música antiga, não ser o lugar mais atraente. Mas, de facto, há tanto para fazer nesse campo que também faz sentido viver e trabalhar aqui. Afinal de contas, em vez de apenas nos lamentarmos, podemos e devemos fazer algo no sentido da divulgação e ensino do cravo e da música antiga no nosso país.

Qual foi o primeiro momento em que se lembra de ter tido consciência de que a música era fundamental para si?

Com cerca de 6 anos, quando descobri que podia reproduzir num teclado melodias que conhecia. Ainda tenho de cor a primeira melodia completa que toquei, apenas com os dedos indicadores de cada mão. Logo a seguir fui ter as primeiras lições de piano, a meu pedido.

Que professores foram mais marcantes na sua vida artística?

Os meus primeiros professores, Mário de Sousa Santos e Joel Canhão, a quem devo muito. Com eles aprendi a trabalhar com seriedade e humildade. Foram duas personalidades musicais fundamentais para a minha formação. Posteriormente, ainda no piano, Campos Coelho. Era um grande Mestre, com uma enorme sabedoria, que transmitia com um magia muito própria. Na música de câmara, Olga Prats, aprendi imenso com ela, foi muito marcante, professora de uma enorme entrega e generosidade. No cravo, a Professora Cremilde Rosado Fernandes, com quem dei os primeiros passos na transição do piano para o cravo, grande referência na música portuguesa para tecla e, em particular, no clavicórdio. Posteriormente, Ketil Haugsand, foi o professor com quem tive mais aulas de cravo e ao longo de mais tempo, um cravista muito inspirador e um grande músico.
.

Que música ouvia na sua juventude?

J. S. Bach, Mozart, Beethoven, Chopin, Debussy, Ravel, Stravinsky. Mas também ouvia Beatles, Simon & Garfunkel, Rolling Stones, Bob Dylan, Doors, MPB, Zeca Afonso, Blues e Jazz, como qualquer jovem.

A tradição cristã tem alguma influência na sua vida?

Tive uma educação cristã, sim. Mas o melhor da missa era ouvir o meu professor Joel Canhão a tocar o órgão da Capela da Universidade de Coimbra, aos domingos de manhã.

Que entidades destaca pelo seu contributo musical nos últimos 35 anos em Portugal?

Respondendo apenas na minha perspectiva de músico, e pela minha experiência concreta, posso salientar:
A Fundação Calouste Gulbenkian, que tem feito muito pela música no nosso país, com a orquestra, o coro, bolsas de estudo, e trazendo cá muitos músicos de qualidade. Iniciativas como a dos Concertos no Museu permitiram a muitos músicos nacionais apresentarem os seus projectos em público na FCG.

No que toca ao Estado, a Secretaria de Estado da Cultura, nos anos 90, apoiou muitas actividades musicais e teve um papel importante na dinamização de concertos. Lembro-me dos “Concertos Itinerantes” em que as escolas eram convidadas a participar, e assim muitos professores que eram concertistas podiam fazer as suas propostas, e ir tocar em diversos pontos do país. Tudo isso acabou, infelizmente, e as entidades do Estado têm vindo a reduzir o seu apoio à música.

Na música antiga há a destacar a Academia de Música Antiga de Lisboa, com um enorme e valioso trabalho ao longo de vários anos, com organização regular de cursos internacionais, masterclasses e concertos. Teve um papel fundamental na minha formação e foi uma pena que esses cursos tenham terminado. Desde então (2010) não tem havido nada com a mesma dimensão e o mesmo nível internacional a acontecer no nosso país, ficou uma lacuna enorme nesse campo.

Quais lhe parecem as maiores dificuldades e vantagens que se colocam hoje aos cravistas portugueses na atualidade?

O desinvestimento que tem havido na área cultural tem afectado muito os músicos. Tem havido muita gente a tocar sem receber, para não ficarem parados nem esquecidos, muitos outros tocam e ficam a dever-lhes o cachet, situação que já se tornou banal. Os cachets também desceram bastante, em relação ao que se praticava há alguns anos. O acesso aos apoios do Estado também se tornou muito complicado, muito burocrático. A vida de músico não está fácil nesse aspecto.

No entanto, parece-me que o pior já passou e que tem havido ultimamente alguma melhoria neste panorama tão desolador. Foram criados ou retomados alguns festivais, e há um interesse e entusiasmo crescentes pelo cravo e pela música antiga, o que dá alguma esperança para quem está agora a estudar.

No nosso país a maioria do trabalho dos cravistas é em Baixo Contínuo, a tocar com grupos e/ou orquestras de câmara. Não podemos falar propriamente de carreiras como solistas, pois apenas se fazem concertos a solo esporadicamente. Mas, apesar de haver bastantes grupos a fazer propostas para os festivais, muitos deles não tocam com regularidade porque há poucos concertos. Orquestras barrocas, também são ainda muito poucas e normalmente só precisam de um cravista.

Outra questão são os agentes culturais, os programadores dos espectáculos. Tem sido frequente contactarem-me em cima da hora, mesmo até na véspera de um primeiro ensaio, para eventos importantes que supostamente deveriam ser planeados com a devida antecedência. Que nível musical se espera alcançar assim? E muitas vezes não encontram ninguém disponível e dá a impressão de que não há cravistas…é uma pena que, no nosso país, muita coisa seja preparada tão à pressa, sem respeito pelos músicos nem pelo público. É toda uma mentalidade que custa mudar.

Por fim, ainda se faz ao piano muito do repertório que é do cravo, e que não faz sentido musical no piano, que ainda é visto como o rei dos instrumentos de tecla. Pensa-se que pode substituir com sucesso um cravo ou um órgão, o que me parece uma ideia musicalmente muito infeliz. Concretamente no que respeita aos cravistas acompanhadores, nas escolas, nos concursos, o seu papel deveria ser muito maior. Se, neste contexto, os cravistas reivindicarem para si o repertório barroco, que lhes pertence, muito do que ainda hoje é feito pelos pianistas acompanhadores, poderá vir a ser feito ao cravo. Esse processo tem vindo a decorrer desde há alguns anos mas ainda há um grande percurso pela frente. Cabe também aos restantes músicos fazerem questão de realizarem o reportório da época barroca com cravo e não com piano.

Qual considera ter sido, até à data, o momento mais alto da sua carreira?

É difícil destacar um momento. Houve inúmeros concertos muito especiais, com músicos com quem toco há muitos anos como o Olavo Barros, a Tera Shimizu e o Philip Yeeles. Mas, se entendermos por carreira aquilo que é mais mediático, poderei referir: como solista, o concerto no Mosteiro dos Jerónimos, nas comemorações dos 300 anos do nascimento de Carlos Seixas; como solista com orquestra, as várias vezes que toquei o 5º Brandeburguês ou os concertos para 2 e 3 cravos de J. S. Bach; em música de câmara, o concerto na Temporada 2018 da Fundação Calouste Gulbenkian com o Ensemble Alorna, Solistas da FCG.

Teve alguma deceção musical significativa?

Sim, claro, faz parte da vida de músico (!…), por exemplo uma bolsa de estudo que não consegui obter, e me obrigou a alterar os meus planos de vida. Ou ainda algum concerto cancelado em cima da hora, alguma proposta de concerto para um festival que não foi aceite…mas, no final de contas, e com o passar dos anos, acho que tenho tido bastante sorte no meu percurso musical.

Tenho mais decepções no que toca aos meus alunos. Houve alunos excelentes que não seguiram uma carreira musical, muitas vezes por receio de não conseguirem ter um emprego estável. Alguns alunos excepcionais, com “asas para voar”, abandonaram o estudo do cravo quando entraram na Universidade, o que é decepcionante.

É professora de Cravo no Conservatório Nacional e já lecionou nos conservatórios de Aveiro e Coimbra. Como vê a evolução do ensino do instrumento em Portugal?

Nos últimos 30 anos houve uma enorme divulgação do cravo ao nível do ensino, hoje em dia há dezenas de escolas pelo país onde se lecciona cravo, o ensino do instrumento está efectivamente em expansão, em todos os níveis, iniciação, básico, secundário e superior.

Mas, não interessa ter mais professores e mais alunos, se o ensino não tiver qualidade. Uma questão importante é o nível dos professores dos primeiros anos de aprendizagem. Para termos um ensino de qualidade, é preferível que o professor, desde o início do percurso musical, seja alguém com uma vida musical activa e interessante, sendo assim inspirador para o aluno. Isso nem sempre acontece, pois muitas vezes são os professores menos habilitados que dão aulas aos principiantes. Mas isso é um problema do ensino em geral…

Também é fundamental que o meio cultural circundante seja interessante a nível musical/cravístico, para o ensino ter qualidade. Nesse contexto, tendo em conta as limitações do nosso meio, uma abertura ao exterior, um intercâmbio com as melhores escolas, professores e cravistas da Europa e do mundo tem de acontecer. Houve recentemente o I Concurso Internacional de Cravo no nosso país, em Oeiras, e, num evento que deveria interessar imenso a todos os que estão ligados ao cravo, vi lá apenas 3 colegas e 3 ou 4 alunos. Essa mentalidade fechada que ainda existe no nosso país é muito limitadora e prejudicial ao desenvolvimento, que não se faz sem boas referências. É importante sabermos o nosso lugar no mundo do cravo. E o contacto directo com os músicos não substitui de modo algum aquilo a que temos acesso pela internet.

Continuando, outro problema é o facto de muitos dos alunos de cravo não possuírem instrumento próprio, o que limita imenso o seu nível técnico e musical, e a sua progressão. Como se pode formar um aluno se ele estuda em casa num teclado eléctrico, ou num piano, e toca apenas uma hora de cravo por semana na aula? Não há milagres! Mas ter um cravo implica fazer um investimento que não está ao alcance de todos os que estudam, e o mercado de 2ª mão ainda é pequeno no nosso país. E, ainda, ter um cravo significa ter de aprender a afiná-lo, o que é uma tarefa que ainda assusta muitos e que não está ao alcance dos mais pequenos, que precisarão de apoio em casa.

Por fim, os instrumentos que existem nas escolas, e aqui temos também verificado alguma evolução. Não faz sentido adquirir instrumentos tão fracos que, em lugar de estimularem os alunos, vão provocar desânimo, pelo seu mau funcionamento mecânico e fraca qualidade sonora. Sem ser irrealista, acho que há um mínimo de qualidade que ainda não é tido em conta em muitas escolas, em parte por falta de verba, o que é compreensível, mas também por falta de conhecimento e de referências, o que é pior. Muitas vezes gasta-se a verba disponível num instrumento que não vale mesmo a pena.

Mas é muito positivo e dá um grande esperança no futuro o facto de haver tantas escolas já com o curso de cravo, de norte a sul do país, em todos os níveis de ensino, o que não acontece em vários países onde só há cravo a nível superior.

Quem é para si “o/a cravista”?

Aquele que sabe tocar cravo deve conhecer o repertório do instrumento ao longo da história, tanto a solo como de música de câmara. Ser cravista implica estudar e realizar baixo cifrado, e fazer música de conjunto, é uma componente fundamental. E, já agora, cravista que se preze conhece as afinações históricas e afina o seu instrumento de acordo com o repertório que for tocar. Como para qualquer músico, é preciso reunir um certo número de condições, tais como qualidades musicais, qualidades de trabalho, boa formação junto de bons professores e contacto directo com músicos de qualidade. Não será certamente um cravista aquele que apenas tira um curso de cravo, e que depois não continua a investir na sua formação.

Qual o seu repertório predileto?

Gosto do repertório alemão – J. S. Bach, que está sempre presente nos meus estudos, e filhos- C. P. E. Bach, W. F. Bach; Weckmann, Froberger; tenho grande empatia com o repertório francês – Rameau, Couperin, Forqueray; também gosto muito do repertório italiano antigo – Frescobaldi, Picchi; dos portugueses, Carlos Seixas.

Na música de câmara, gosto principalmente do repertório com violino e com traverso. As sonatas para violino e cravo obligatto de J. S Bach estão entre as minhas obras preferidas e mais tocadas, e também Biber, Schmelzer, Léclair; com traverso, as sonatas de J S. Bach, C. P. E. Bach, e os compositores franceses. Gosto particularmente da forma “trio sonata”, para violino, traverso e baixo contínuo.

Lembra-se de algum momento embaraçoso em palco?

Oh, sim, claro! Se me lembrasse de todos os momentos embaraçosos que me aconteceram em palco daria para escrever um livro. Costuma dizer-se que no palco tudo pode acontecer, e, de facto, acontece! Uma página mal virada, um músico que falhou uma entrada e nos deixa sozinhos a fazer contínuo, um foco de luz que se apaga de repente, uma corda ou plectro que se parte, teclas que deixam de funcionar, enfim!… o que importa é que a música continue, apesar de tudo!

Que outro instrumento gostaria de tocar?

Além de piano (que já toquei ) e cravo, toco também clavicórdio, desde há alguns anos. Se ainda pudesse, gostaria de tocar fortepiano e também órgão, tudo dentro dos instrumentos de tecla. Mas uma vida só não chega…

Qual é a sua relação com o piano?

Foram 20 anos da minha vida, de dedicação muito intensa. Agora é uma boa recordação.
Mantenho o meu primeiro piano na sala, e fiz questão de o mandar reparar. Um dia que tenha tempo poderei vir a tocar um pouco, mas neste momento tenho outros instrumentos aos quais me estou a dedicar, o cravo e o clavicórdio.

Se não tivesse sido cravista, o que provavelmente teria sido?

Pianista…

Tem livro de cabeceira?

Os meus livros de cabeceira têm sido desde há algum tempo sobre Técnica Alexander, por exemplo o Indirect Procedures, de Pedro de Alcântara, ou The Art of Swimming.

Quais os seus passatempos não musicais?

Ir à praia, andar de bicicleta, conviver com os amigos, passear e viajar. Gosto do ar livre e do contacto com a natureza. Pratico natação, duas vezes por semana. Também tenho imenso prazer em ficar em casa, a relaxar, com os meus gatos, a realizar as tarefas domésticas, a ler e a apanhar um pouco de sol no jardim.

Com que grande músico gostaria de tocar?

Com W. F. Bach, gostaria imenso de o ter conhecido e tocado com ele o seu Concerto para 2 Cravos em Fá Maior!

Quais os compositores que ouve mais?

Todo o repertório de cravo desde a música mais antiga: virginalistas – J. Bull e W. Byrd, italianos – Frescobaldi, passando pelo séc. XVII- Louis Couperin, Forberger, até ao séc XVIII – J. S. Bach e filhos, D. Scarlatti, e compositores do Barroco Francês. Gosto de ouvir particularmente gravações com instrumentos históricos, e com os meus cravistas preferidos.

Também ouço Jazz, e a Antena 2, para variar um pouco.

Qual a sua relação com o público?

À partida, a ideia de nos expormos publicamente pode ser intimidante. Estar em palco não é fácil, é bastante duro, envolve um grande dose de energia, uma preparação meticulosa a vários níveis, e muita concentração. E, com a experiência, sabemos que, apesar de toda a nossa competência, muita coisa pode correr mal, pois nem tudo depende de nós. Só a vontade de tocar, de fazer música, nos leva a ultrapassar todas as dificuldades. A experiência de partilhar as emoções que vivemos com a música, provocando-as no ouvinte, é preciosa. Valorizo imenso o contacto com o público, é um dos nossos principais objectivos enquanto músicos. Tocamos sempre para um ‘público’, nem que seja imaginário. Mas o público anónimo é sempre uma surpresa. Gostei de tocar em muitos sítios diferentes, tanto longe dos grandes centros, em pequenas povoações, como em palcos mais mediáticos e frequentados por elites culturais.

As reacções à música podem ser muito diversas e há experiências muito gratificantes onde menos se espera. De certa maneira, prefiro o público que não conhece de todo a música erudita e que reage aos concertos com grande pureza e entusiasmo, do que algum público ‘habitué’ dos grandes centros, que, cheio de preconceitos, se julga muito culto a nível musical. Esse tipo de público que, depois de um concerto fabuloso, onde todos aplaudiram de pé e os músicos tocaram 3 encores, faz a pergunta da praxe, “gostaste do concerto?” Como se todos tivessem não só o direito, mas o dever de serem críticos. A essas pessoas escapa toda a magia de um bom concerto, pois não estão lá para ouvir música ao vivo e desfrutar dessa preciosa experiência, mas apenas para criticar.

Quanto à minha relação pessoal com o público, é de uma certa distância, não sou de todo um ‘animal de palco’. Não gosto de falar em público, por exemplo, mas às vezes falo um pouco porque sei que o público aprecia e agradece. Também agradeço ao público proporcionar-me aperfeiçoar o meu repertório a um nível que não faria certamente se não tivesse que o tocar em concerto. Gosto de me preparar bem para os concertos, respeito o público e procuro dar o meu melhor.

O que é que a música lhe dá?

Através da música fiz viagens muito interessantes e conheci lugares lindíssimos. Tive a oportunidade de tocar em monumentos emblemáticos, palácios, igrejas, capelas, teatros, e salas de concertos, o que é um privilégio. Também conheci muita gente através da música, pessoas extraordinárias que ficaram na minha vida. Posso dizer que vivo através da música, é a forma principal de me relacionar com o mundo. Mas, além disso, tocando, relaciono-me ainda com o que há de mais sublime, numa dimensão muito além desta esfera da realidade. Tive um amigo músico que costumava dizer que os músicos são dos poucos seres humanos que vivem os seus sonhos.

Em três adjetivos, como se caracteriza a si mesma?

Não me consigo definir, nem será da minha competência fazê-lo, por um lado por ser redutor, e por outro porque seria muito duvidoso…

17 de agosto de 2018

Partilhe
Share on facebook
Facebook