compositora Ângela Lopes

ÂNGELA LOPES

Ângela Lopes é compositora e professora. Nasceu em Ovar e concluiu o Curso de Composição na classe de Cândido Lima, na ESMAE, em 2000. É membro (2000-2001) do grupo MC47 – grupo de música mista, com direcção de Virgílio Melo. Colabora igualmente com o Grupo Música Nova, com direcção de Cândido Lima. Escreve para formações diversas, instrumentais e/ou vocais, e ainda música electroacústica e música para audiovisuais e/ou multimédia.

ENTREVISTA

Qual a noção que tem da importância da música na sua vida?

A música esteve sempre presente na minha vida. No seio familiar, ela tinha o dom da ubiquidade. Difundia-se pela casa, fosse pela rádio, que era permanentemente ligado, pelos meus irmãos, pai, ou funcionários da casa, onde se ouvia a pop da época, fosse pelos gira-discos, dos meus irmãos, que tinham os LPs dos grandes grupos da época, anos 60 e 70, como os “Dire Straits”, os “Pink Floyd”, os “Queen”, os “The Beatles”, os “Supertramp” ou os “The Doors”, fosse pelo piano do meu irmão mais velho, que estudava música “clássica” na Academia de Vila da Feira, fosse pelo acordeão do meu pai, músico autodidata que desde cedo fazia bailes em festas populares, ou tocava no rancho folclórico da Ribeira de Ovar, ou mais tarde em conjuntos de música pop, rock ou popular (Até hoje, o meu pai guarda centenas e centenas de discos (LPs), e coleções de gravadores de fita antigos, gira-discos, etc.), fosse pelo cantar das minhas irmãs mais velhas que, à noite, adormeciam em despique de músicas conhecidas da época sobretudo canções brasileiras que faziam parte das telenovelas da altura, fosse pelos chilreares quase ensurdecedores de centenas (mais?) de pardais nos longos e quentes fins de tarde de verão no quintal de minha casa, hoje quando os recordo vem-me sempre à memória os “grandes números” e a “estocástica” de Iannis Xenakis (algo que à época desconhecia). Todos os meus irmãos e irmãs experienciaram a música. E eu sem dar por isso lá ia estudando o meu piano e ouvindo de toda a música até que um dia ela passou a ser a minha vida profissional. Hoje componho e ensino a composição erudita. Hoje ela é incontornável.

Qual foi o primeiro momento em que se lembra de ter tido consciência de que a música era fundamental para si?

Não sei bem mas imagino que quando tomei a decisão de fazer o Curso Superior de Composição, na Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo do Porto (ESMAE).

Que professores foram mais marcantes na formação da sua carreira musical?

Todos os professores que passaram por mim foram importantes de alguma forma mas logicamente que uns marcaram mais do que outros. Alguns pelo rigor e exatidão, outros pela liberdade e ousadia, foram alicerçando os pilares dos meus conhecimentos. Cândido Lima, Filipe Pires, Álvaro Salazar, Virgílio Melo, Miguel Ribeiro-Pereira, Francisco Melo, entre outros. E depois há os professores virtuais, que já não estão entre nós, aqueles que nos deixaram o seu pensamento por escrito, em livros, e/ou em partituras, os grandes mestres. Lassus, Palestrina, Bach, Haendel, Mozart, Beethoven, Schubert, Mahler, Messiaen, Xenakis, etc. Todos foram marcantes na minha formação.

Ao entrar na licenciatura em Composição já tinha decidido que queria ser compositora?

Não poderia ter decidido algo assim. Ser compositora é algo que se vai construindo, é uma carreira, é um histórico, uma evolução pessoal, e isso não se decide, vai-se edificando no tempo. A minha preocupação da altura era aprender o mais possível, absorver, sorver o mais possível, e realizar todos os meus projetos com o máximo de sucesso possível. Este era o meu objectivo. Quando terminei a licenciatura tinha vontade de não parar. Queria continuar a compor, era algo intrínseco. Com e sem encomendas de obras fui tateando o meu percurso, ainda em aberto. Gostava atualmente de poder compor com mais regularidade mas infelizmente não me é possível já que para além de compositora sou também pedagoga, profissão que me dá igual prazer. A docência é cada vez mais absorvente nos tempos atuais. Ainda assim, quando olho para o meu humilde catálogo, verifico que há alguma perseverança.

Qual a importância de Cândido Lima na sua formação e atividade criadora?

A primeira vez, que me lembre, que alguém me perguntava abertamente sobre a ascendência de Cândido Lima na minha música foi, há meses, um amigo catalão, meu e do Cândido (Lima), Peri, que à mesa de jantar, em Barcelona, com uma bela pizza em cima da mesa e um belo licor de limão, um limoncello, típico de Itália, pátria da esposa de Peri, me confrontava com a questão. Surpreendida com o inesperado não foi fácil responder-lhe. Peri é um não-músico, ilustrador de livros, de profissão, de uma agudeza e curiosidades únicas para quem não há limites. Cândido Lima foi e continuará a ser o meu professor de eleição. É a minha referência, sem dúvida. Cândido Lima tem um conjunto de qualidades e características únicas. Tomo-o como modelo no rigor, na precisão, na exigência (é das pessoas mais exigentes que conheci), na justeza, na inteligência, na bondade, na delicadeza, na musicalidade, na compaixão, na genialidade, na imaginação, na motivação e na paixão. Há meses Valter Hugo Mãe terminava uma crónica, a propósito do novo LP, “Oceanos”, de Cândido Lima, assim: “Um desses génios é Cândido Lima. Não serve para nos consolar. Serve para nos obrigar a pensar em tudo de novo.” (in, Jornal de Letras). Não poderia deixar de estar mais de acordo. Quando era aluna, por vezes, havia encontros fora do local da Escola, em cafés, ou outros locais públicos, comigo e com outros alunos, prática recorrente do compositor, para nos ajudar e apoiar na realização dos projetos. Lembro-me que depois desses encontros me perguntava: “E agora? Que faço?”. Tal como diz Valter Hugo Mãe, Cândido Lima (e a sua música) fazia-me repensar tudo, reformulava-me as ideias, refazia-me o pensamento, porque tudo o que dizia e fazia era profundo, estrutural, dos alicerces e das entranhas da música. Hoje, na minha atividade criadora sou livre, sou independente e sou autónoma, o que não me impede de ouvir a opinião do Cândido (Lima) sobre os meus projetos. Por hábito, só conversamos quando já concluí, ou quase, os trabalhos, e se possível (não gosto de mostrar a quem quer que seja trabalhos inacabados ou imperfeitos). Escuto-o, atentamente e respeitosamente, e depois tomo as minhas decisões. Já aconteceu, até, estarmos a compor para o mesmo projeto e eu pedir ao Cândido que não me mostre o está a desenvolver para não ser inconscientemente influenciada. Mantenho, assim, a minha integridade, a minha seriedade e o meu carácter, mesmo se corro riscos. Não faltariam histórias que o provam. Sou feliz assim. Sem dúvida… Mas sei-me abençoada.

Como vê o serviço público na Rádio e Televisão, no que se refere à música eletroacústica?

No que concerne à música electroacústica, quanto à televisão portuguesa desconheço qualquer iniciativa, já quanto à Rádio embora seja o que se possa chamar de “serviços mínimos”, tem havido alguma atividade de divulgação deste género musical, fruto de divulgadores como Miguel Azguime (e Paula Azguime), por exemplo, autor, realizador e apresentador da série “Música hoje”, na “Antena2”, programa dedicado à nova música portuguesa acústica e electroacústica. Outras séries há, de músicas contemporâneas, mas nenhuma outra com a preocupação de dar a conhecer a música portuguesa (electroacústica ou não). “Geografia dos sons” ou “Música contemporânea”, por exemplo, têm já outros objetivos.

Na verdade, hoje, a divulgação de uma obra passa mais por outros canais, como a difusão na internet, no canal “YouTube”, por exemplo. A rádio e a televisão perderam na(s) última(s) década(s) a importância que tinham desde as suas fundações. Muitos compositores, hoje, divulgam as suas obras por meios próprios e já não esperam iniciativas públicas. Diga-se, na verdade, que se não o fizerem arriscam-se a verem os seus trabalhos na gaveta.

Em 2003, a sua obra “Sequência” foi selecionada para o I Workshop “Jovens compositores” da Orquestra Gulbenkian. O que pensa do contributo da Fundação Calouste Gulbenkian para a evolução da música em Portugal?

Não sou a artista mais indicada para responder a esta pergunta. De qualquer forma reconheço que é inegável o contributo da Fundação Calouste Gulbenkian para a evolução da música em Portugal. Embora não tenha sido beneficiária direta da Fundação, pois nunca fui bolseira ou sequer tive alguma encomenda de obra da Fundação, por exemplo, participei não só nesse Workshop que refere, o I Workshop “Jovens Compositores”, com o compositor Emanuel Nunes e o maestro Guilhaume Bourgogne, como fui ainda ouvinte dos já extintos “Encontros Gulbenkian de Música Contemporânea” (1977-2002). Numa época em que a Casa da Música não existia e onde eram raros os concertos de música contemporânea no norte, havia apenas os grupos “Música Nova” e “Oficina Musical”, com direções de Cândido Lima e de Álvaro Salazar, respectivamente, isto no norte do país, e que realizavam esporadicamente concertos, restavam os LPs, as cassetes áudio e cassetes vídeo, os CDs, ou a estação de rádio “Antena2” ou, muito mais tarde, a que tive acesso, a Mezzo, canal de televisão. Sei que muitos foram os compositores portugueses apoiados pela Fundação das mais diversas formas. Ao contrário da Casa da Música, no Porto, a Fundação Gulbenkian teve uma política real de apoio aos artistas de nacionalidade portuguesa. Esse apoio foi (ou ainda o é) determinante para o crescimento musical no nosso pais. Sei, por exemplo, que eram atribuídas bolsas de estudo em Academias, escolas do ensino artístico, a alunos com dificuldades financeiras, isto há trinta e mais anos, o que não era o meu caso na altura. Só que também, nessa altura, a justiça era já questionada, já que se ouvia dizer que determinados alunos eram bolseiros pertencendo os mesmos a distintas famílias do Concelho. Verdade, ou não, é inquestionável a importância que a Fundação Gulbenkian teve no nosso país, do mais cosmopolita ao mais rural, como, por exemplo, a das carrinhas-biblioteca (ou bibliotecas itinerantes), embora não seja este um exemplo musical. Vi, há tempos, um documentário precisamente sobre esta iniciativa, na SIC Notícias, no “Jornal da Noite”, na rúbrica “Perdidos e achados”.

É difícil ser compositora em Portugal?

Compositora, mais do que compositor, sim. Ainda há dias vi, na internet, uma campanha recente que cria uma metáfora sobre a desigualdade de género em escadas de uma estação de metro. Um projeto gráfico assinado pelo designer japonês Kazunori Shiina, baseado na Miami Ad School, nos EUA. Impressionou-me a fotografia. Tratava-se de duas escadas de saída de uma estação de metro. “Uma escada rolante, em azul, representa a trajetória masculina na esfera profissional. Já a escada com degraus estáticos, em rosa, simboliza a vida das mulheres em busca de ascensão no mercado de trabalho.” Pensei, ora cá está, ambos podemos atingir o topo, nós mulheres é que vamos ter que ter um pouco mais de canseira!

Participei, há cerca de um ano, numa tertúlia, no Festival D.M.E., precisamente sobre o assunto: “A criação numa perspectiva feminina”. Infelizmente, por diversos motivos, a única mulher-compositor participante era eu. E nessa altura, em investigação, descobri uma curiosidade. Se fosse hoje o ano de 1946, eu seria uma compositora privilegiada e distinta. “A Lei n.º 2015, de 28 de Maio de 1946 alargou o corpo eleitoral feminino, considerando eleitoras para a Assembleia Nacional e para a Presidência da República as mulheres maiores e emancipadas, com curso geral dos liceus, do Magistério Primário, das Belas-Artes, do Conservatório Nacional e do Conservatório de Música do Porto e dos institutos comerciais e industriais, as chefes de família (divorciadas, viúvas, judicialmente separadas e solteiras) que soubessem ler e escrever ou pagassem ao Estado quantia não inferior de 100$00 por impostos diretos, e as casadas alfabetizadas ou que pagassem contribuição predial não inferior a 200$00. Eram eleitores os homens que soubessem ler e escrever ou que pagassem pelo menos 100$00 por ano ao Estado.” (in “O voto das mulheres em Portugal”). Ora como pertencendo ao corpo docente do Conservatório estaria abrangida pela lei.

Alguma vez se sentiu em desvantagem na música por ser mulher?

Diretamente ou escancaradamente, não. O machismo e o conservadorismo, hoje, e na nossa sociedade, são normalmente camuflados, quando existem. O que existe são alguns episódios que, lidos à distância, são, até, curiosos e fazem sorrir. Como foi aqui referido, em 2003, a minha obra “Sequência”, para orquestra, foi selecionada para o I Workshop “Jovens Compositores”, da Fundação Calouste Gulbenkian. Na preparação da ida para Lisboa, um colega preveniu-me, dizendo-me que era muito jovem e “mulher” e que, por isso, nos ensaios, deveria mostrar-me firme e consistente, terminante e resistente. Foram conselhos inofensivos que na verdade servem para mulheres ou homens pois devemos acreditar e defender o que fazemos. No fim, o Workshop correu muito bem. A Orquestra Gulbenkian e o maestro, Guilhaume Bourgogne, foram extraordinariamente profissionais e respeitadores da minha música, atenciosos, elegantes e agiram com grande cortesia e gentileza para comigo. Há até algo que guardo com grande simpatia, uma recordação que trouxe e nunca o disse ou mostrei a alguém porque não me parecia “de bem” fazê-lo. Quando fui levantar os materiais da obra, “Sequência”, numa das partes vinha escrito, a lápis, no cabeçalho, “A bela”. Para mim esta expressão foi mais do que a expressão de aparência, para mim ela reflete sentimentos e índole. E, por isso, guardo-a como uma bom sensação.

Num outro episódio, aí as consequências de uma má avaliação da partitura de música poderiam ser graves. Olhares superficiais, análises desatentas, precipitações que advém do facto de esta ser uma partitura feminina, não tenho dúvida.

Estou, há meses, às voltas com uma obra para o “Duo Contracello”, um projeto para violoncelo, contrabaixo, electroacústica e vídeo, com a colaboração da jovem artista plástica, Inês Silva, a concluir o mestrado na Escola das Belas Artes, do Porto. O projeto é um tributo às mulheres emancipadoras do princípio do século XX que, de uma forma profunda ou simbólica, contribuíram para a libertação e emancipação da mulher e igualdade dos direitos, na sociedade ocidental. A lista das mulheres homenageadas, na obra, é uma de muitas possíveis. São sete, quatro de nacionalidade portuguesa e as restantes de outras nacionalidades de países ocidentais. Carolina Beatriz Ângelo, a primeira mulher a votar em 1911, na primeira república (minutos um e dois da obra); Emma Goldman, feminista, ativista, anarquista, sindicalista, defensora dos direitos das mulheres, mulher emancipada (minutos dois e três da obra); “Milú”, a primeira portuguesa-aviadora civil (minutos três e quatro da obra); Rosalind Franklin, ou “the “Dark Lady”, autora da famosa “fotografia 51”, que foi a base do trabalhos dos cientistas premiados com o Nobel James Watson, Maurice Wilkins e Francis Crick, no estudo do ADN, trabalho de Franklin que nunca foi reconhecido (por ser mulher…???) (minutos quatro e cinco da obra); Rosa Ramalho, mulher do povo, do mundo rural, que ascende ao mundo dos artistas eruditos (minutos cinco e seis da obra); Peggy Guggenheim, mecenas da arte (minutos seis e sete da obra); Florbela Espanca, aquela que melhor expressa o feminismo na poesia (minutos sete e oito (coda) da obra).

E, a propósito do vídeo e das opções estéticas da artista, escrevia-me a Inês Silva “Espero que gostes, eu fiquei contente com as imagens que resultaram, usei a tua ideia de palimpsesto e o entrançado para a edição. Cada mulher tem uma imagem associada e vai aparecendo sobrepondo-se à anterior e desaparecendo de cena quando o seu tempo acaba. Tentei exemplificar isso com a imagem acima. As nuvens são um vídeo continuo sem cortes que fica do inicio ao fim, representa a leveza e pureza e está dentro do tema que é a água mas em estado gasoso. Os clipes em que entra a corrente de água obviamente simboliza a força da mulher. As cores psicadélicas e a paleta mais escura são uma opção estética minha, poderia optar por usar tons ditos menos “terríficos” mas de certa forma servem para contrariar a tendência ou estereótipo de que a arte produzida por mulheres têm de ser sempre muito românticas (flores, corações, paletas claras, quentes e de tons pastéis, a família e o lar como temática, etc.), o género não define a produção artística.” De facto o género não tem que definir a produção artística mas se a definir, e repito “se”, que não seja, por isso, entendida como inferior, de somenos ou inconveniente. Que seja a marca positiva da diferença, do pluralismo, da diversidade e do complemento.

Sou convicta que a feminilidade é-o e que não é preciso mascararmo-nos de homens para chegarmos ao topo das escadas (do metro).

Como professora, acha que os alunos já entram no conservatório com mais preparação de que há 20 anos?

Sim e não. Sob muitos aspectos, sim, porque há hoje acesso a muito mais informação, há mais meios, maior divulgação musical, maior acesso a partituras e a interpretações de renome, maior acesso às escolas do ensino artístico, evidentemente, tudo está mais próximo e isso presta-se a melhores e maiores desempenhos. Sob outros aspectos, não, porque reparo que se tem privilegiado um certo tipo de cultura e de ensino suspeitos em algumas das escolas atuais. Reparo particularmente na formação de iniciação onde, hoje, “criativos” lecionam descurando algumas matérias fundamentais para a compreensão musical em todo o percurso académico do aluno. Lapsos repreensíveis. Por outro lado, reparo que a “grande” música, hoje, partilha o espaço com repertórios duvidosos porque são as grandes audiências que importam. Não há a preocupação em formar o gosto do aluno e deve-se porque também se aprende a “gostar”, quando se compreende, quando se entranha, só que é mais fácil ceder, é menos penoso e menos ingrato. Este é um caminho que não sigo.

O que é para si a música electroacústica?

A música electroacústica, na história, é uma fusão de duas correntes distintas, a música concreta e a música electrónica (ler “Qui a inventé les musiques electroacoustiques?” capítulo de um fabuloso livro “Les musiques électroacoustiques”, de Michel Chion e Guy Reibel, por exemplo, ou outras bibliografias fundamentais para entender a música electroacústica como “Qué es la música electrónica?”, de Herbert Eimert ou “Qué es la música concreta?”, de Pierre Schaeffer, livros aqui ao lado, na estante, entre outras bibliografias fundamentais sobre a questão, nas línguas originais, o alemão ou o francês, isto para estudiosos académicos). A revolução que começa nos primórdios anos 40/50 contínua hoje, a música electroacústica sempre em renovação, fusões, em constantes updates, que se torna difícil defini-la atualmente. Para mim tem sido desde a música obtida através de sintetizadores, “música sintetizada” (por exemplo, usei o sintetizador da Yamaha Sy77), já em desuso, passando pelo uso de processadores de efeitos, em hardware, “música processada”, ou pelo uso de equalizadores também em hardware, “música filtrada”, ou ainda gravadores de fita como a cassete ou o DAT, “música gravada” (mais tarde transformada) etc., também em desuso hoje, esta é a música analógica, até chegarmos à música por computador, mais atual, a música digital, na era digital. E aqui então os updates de softwares e hardwares são constantes, quase diários, o que me deixa “nervosa”. Quando já domino a máquina vem sempre algo novo que me confunde os neurónios. Mas é inevitável. A propósito, ainda ontem vi, na internet, no “YouTube”, um documentário, bem interessante, acerca da evolução da música electrónica em Portugal, desde os anos 60, “Tecla Tónica”, documentário de Eduardo Morais e com a participação por exemplo de António de Sousa Dias, entre outros. É sobretudo uma abordagem da electrónica em contexto da música pop, trata sobretudo da utilização dos primeiros meios electrónicos nas bandas pop, a música dos sintetizadores, fora dos meios mais eruditos, ainda assim e uma vez que, muitas vezes, estes dois mundos se misturaram e misturam ainda, é também uma excelente perspectiva da evolução das electroacústicas em Portugal.

O que a levou a enveredar especialmente pela música electroacústica?

Penso que devo ter escrito, não sei bem quando, num dos meus currículos, que enveredei especialmente pela música electroacústica. Deve vir daí a pergunta. Na verdade há momentos da nossa vida de compositor que parece que nos dedicamos mais a algumas áreas do que a outras. De facto, houve ocasiões em que parecia que só compunha ou assessorava no campo da música electroacústica. As razões foram sendo sobretudo pragmáticas, porque muitas das encomendas de obras eram com a condição de possuírem também, ou só, música electroacústica, ou porque era convidada para fazer parte de projetos com música electroacústica, como a minha colaboração, no Mosteiro dos Jerónimos (Lisboa), na projeção da obra “Mixtur”, de Karlheinz Stockhausen (durante o Festival “Música Viva 2006”), ou, na Casa da Música (Porto), na projeção da obra “Madonna of Winter and Spring”, de Jonathan Harvey, com a presença do compositor (durante o Festival “Música Viva 2007”), ou a minha colaboração na realização electroacústica de algumas obras do compositor Cândido Lima, como nas obras “MÚSICAS DE VILLAIANA-coros oceânicos”, ou “Optic Music – quadros cinéticos”, ou “ERÉTYICA-ai Deus i u é?”. Agora mesmo, termino uma obra com electroacústica, para o “Duo Contracello” e inicio outra, ainda sem título, para viola de arco e electroacústica, para o Festival “Aveiro_Síntese”, para o próximo ano, 2018. A obra para o “Duo Contracello”, é um projeto audiovisual, com a colaboração de uma jovem artista das belas-artes, em início de carreira, Inês Silva, autora da criação visual, um vídeo. Mas houve outras razões, na verdade esta é uma área em que sempre me senti bem a realizar, e que me dá imenso prazer, e na qual tive sempre alguns bons resultados. Recordo-me que enquanto estudante a minha classificação final mais elevada foi na realização do projeto final de electroacústica. Recordo-me também que o compositor António de Sousa Dias, um dia, e depois de ouvir um trabalho meu electroacústico, me disse “Que fazes ainda aqui?” (em Portugal, queria ele dizer-me). Por outro lado, tenho alguns antecedentes familiares que vão neste sentido. O meu pai (e irmãos) estiveram ligados à música pop/popular, isto nos anos 70 e 80 sobretudo, e em casa convivia com os novos meios electrónicos, as guitarras, os sintetizadores, os processadores etc. Ouvir falar de cabos, de ligações electrónicas, de instrumentos electrónicos, etc. Era-me familiar embora não lidasse com tal à altura. Mas a composição musical é sempre a composição seja ela electroacústica ou só acústica e o prazer da composição é transversal aos diversos géneros musicais. A abstração musical, a elaboração e estruturação de uma obra, o gosto de compor está para além dos meios e da sua concretização.

A música electroacústica traz mais dificuldades ou mais vantagens aos compositores portugueses na atualidade?

Vantagens, sem dúvida. A questão é que a música electroacústica, hoje, é incontornável. A música contemporânea passa fatalmente pela música electroacústica. A música electroacústica expande a música acústica. Leva-a e eleva-a para além. Abre novas portas, timbricamente, acusticamente, orquestralmente, espacialmente, de cor, de registos, entre outros parâmetros. Hoje, por exemplo, ela é mais um instrumento na orquestra “clássica”. Já é um clássico, diria. No início estranhou-se mas hoje já está entranhada tal como tantos outros instrumentos que não eram comuns na orquestra clássica e que hoje são aceites e já estruturantes. Olhe-se a percussão na orquestra do século XX (e XXI)!

Depois há outras qualidades, na música electroacústica o compositor é também o intérprete e não depende de outros para a concretização da partitura. A partitura e a obra são o mesmo. Eliminam-se intervenientes. Deixa de haver mediadores entre partitura/compositor e música/intérprete. O compositor tem resultados imediatos, o que é atrativo. Há outra liberdade, diria, e pode dar lugar, por exemplo, a uma maior experimentação musical porque não se depende de alguém externo. Pode-se ser mais ousado e arrojado.

Claro que haverá algumas desvantagens, ou dificuldades, como se queiram chamar. É menos propensa a grandes públicos, públicos conservadores que esperam de um concerto ao vivo não música acusmática mas um espetáculo visual, circense da interpretação, por um músico-interprete, sobretudo das suas obras mais conhecidas e as mais célebres. Em meios mais conservadores, esta é ainda a problemática, é bem verdade.

O que acha da edição e publicação de música na era digital?

Um caso fascinante mas problemático para os criadores.

Qual é a maior decepção musical na sua vida? Ou nunca teve?

Talvez não as chame de decepções musicais mas de imperfeições musicais. Sobretudo no que toca a gravações áudio, gravações em CD, ou à música electroacústica, e o tomar de decisões que ficam para sempre, permanentes. Há alguns casos que me ficaram atravessados na garganta. Sou perfeccionista (e minuciosa), conto tudo aos milissegundos, e agradam-me os números, sinto-me segura assim, por isso quando tenho que tomar decisões meramente sensoriais tenho dificuldades e dúvidas. Sinto-me insegura. O que hoje me pareceu o ideal, amanhã já não. É por isso que tenho dificuldade em reouvir a minha música gravada. Penso sempre que, aqui ou ali, não tomei a melhor das decisões fosse na composição escrita, fosse em estúdio. E pensar que é para sempre!

Enquanto compositora e pedagoga, qual foi, até à data, o momento em que se sentiu mais realizada?

Como pedagoga sinto-me realizada sempre que consigo gerar, do lado de lá, prazer. Prazer pela composição (complexificação). Prazer pela análise (descodificação). Quando crio e produzo vontade e curiosidade. Quando me fazem perguntas. Quando inventam porque já lhes está no sangue. Quando me ouvem com os olhos. Quando me sorvem as palavras. Quando me questionam, até mesmo em jeito de provocação. Quando me respondem com imaginação. Quando me pedem “Ó Professora, quando nos traz música sua?”. Quando me dizem que vão ter saudades. Quando me oferecem uma simples flor. Quando sorriem. Aí sei que o meu dever ficou cumprido.

Como compositora sinto-me realizada de cada vez que alcanço o fim de um projeto. Nenhum em especial, nenhum em particular. Cada qual é um desafio. Por si só.

Quais foram os compositores que mais a marcaram e inspiraram?

Em momentos diferentes da vida foram-me marcando ou influenciando autores diversos como Olivier Messiaen, Iannis Xenakis, Pascal Dusapin, Cândido Lima, Luigi Nono, György Ligeti, Igor Stravinsky, Johann Sebastian Bach, Franz Schubert, Frédéric Chopin, Orlando di Lassus, Claude Debussy, Pierre Boulez, Bruno Maderna, Luciano Berio, Arnold Schoenberg, Anton Webern e compositores anónimos de canto gregoriano, entre outros, já citados nesta entrevista, que me marcaram, como, por exemplo, Rebecca Sounders, Elena Firsova, Peter Eötvös ou Helmut Lachenmann. É impossível falar de um ou meia-dúzia de compositores apenas.

O que acha da evolução da música erudita em Portugal?

Parece-me ser um período favorável em Portugal. Há mais compositores, mais músicos-intérpretes, mais escolas, mais cursos artísticos, mais grupos musicais, mais orquestras (algumas com qualidade questionável, é certo), mais “Casas da Música”, mais alunos de música, mais público (?). Normalmente a quantidade cria qualidade. Se compararmos as descrições que compositores de gerações mais velhas fazem, acerca de interpretações de obras suas, com as descrições/opiniões de gerações mais novas, estas estão a anos-luz! Há músicos-intérpretes em Portugal de qualidade excepcional com carreiras fabulosas cá e/ou no estrangeiro. Poderia enumerar dezenas deles. Mesmo no campo da música erudita-contemporânea, hoje, há mais músicos abertos a novas experiências.

Portugal é hoje um país mais descentralizado do que há 50 anos?

Sem dúvida que sim. Há 50 anos atrás, e falando no campo musical, quantas escolas do ensino artístico havia? Meia dúzia, se tanto. Os conservatórios de Música de Lisboa e Porto, a Academia de Música de Vila da Feira, os recentes conservatórios de música de Aveiro e Braga (que se torna escola pública só em 1971) e a recém criada Academia de Música de Santa Cecília. Estudei e trabalhei na direção de uma das primeiras escolas privadas do país que muito contribuiu para a descentralização do ensino artístico da música em Portugal, a Academia de Música da então designada Vila da Feira, com fundação em 1955. Muitas escolas foram fundadas posteriormente, com grande sucesso, pelo país fora, públicas e privadas. As escolas profissionais, no nosso pais, tiveram também, e sem dúvida, um papel importantíssimo para a descentralização da música (a partir dos anos 90). Percorreram, muitas delas, os lugares mais recônditos do país e formaram (e formam ainda) músicos de primeira água fora dos grandes centros que nem Porto ou Lisboa. Claro que não se pode esquecer o papel fundamental das bandas filarmónicas, importantes núcleos receptores e formadores de músicos (amadores), muitas desde o século XIX (hoje de músicos profissionais). Sim, sem dúvida que Portugal é hoje um país mais decentralizado, musicalmente falando. Nas décadas mais recentes penso que o problema maior já não era o da descentralização mas sim o da des-elitização do ensino. Penso que foi a partir do mandato da ex-ministra da educação, Maria de Lurdes Rodrigues (ministra a partir de 2005), que o Estado passou a olhar, com mais atenção, para a disciplina “Música”. Programou reformas mais consistentes e permitiu, a partir de então, a expansão do ensino artístico da música. O crescimento exponencial de regimes de ensino articulados e integrados que vieram permitir o estudo gratuito da música foram determinantes para terminar com o problema maior de décadas, que já não era a descentralização mas sim a des-elitização deste tipo de ensino. Hoje, a questão parece-me resolvida, em parte, porque acho que ainda se pode fazer mais e melhor. Por exemplo, acabar com as listas de alunos candidatos excluídos em escolas públicas e privadas (por inexistência de vagas). Será que o país poderia absorver no ensino artístico todos, ou quase todos, os alunos que assim o desejassem?

As academias de música e conservatórios regionais tiveram um papel importante na evolução da interpretação e da composição em Portugal?

Claro que sim. E acrescento às academias e conservatórios, as escolas profissionais e as escolas superiores, politécnicos e universidades. Nos últimos anos, foram várias as universidades ou politécnicos que apostaram em cursos do ensino artístico da música, Interpretação, Composição ou Ciências Musicais. No que diz respeito à Composição, a área que melhor domino, não será por acaso que se vive atualmente uma fase denominada por muitos de “segundo renascimento da música portuguesa”. Há imensos compositores jovens, tantos que ao contrário do antigamente em que se contavam pelos dedos das mãos aqueles que eram profissionais, e que eram todos (re)conhecidos, hoje, grande parte não sei quem são, porque são imensos e de diversas escolas e universidades portuguesas ou estrangeiras. É o boom na Composição. E muitos de grandes sucessos cá e fora do país.

Quais são, em sua opinião, as mulheres mais marcantes na música em Portugal dos séculos XX-XXI?

Não é fácil enumerar compositoras marcantes porque posso não ser totalmente justa. Ainda assim, em Portugal referiria: Berta Alves de Sousa (de quem ouvi, há cerca de um ano, uma peça para piano muito, mas muito bem escrita, que adorei, e que me ficou na memória “Tema e Variações para piano”, baseada numa canção popular, tocada em Lisboa, no O’culto da Ajuda, por Helena Marinho), Constança Capdeville, Clotilde Rosa, Paula Azguime (figura central e fundamental para a composição feminina pelo seu papel indispensável na divulgação, organização, investigação, projeção sonora, manipulação das novas tecnologias, interpretação, realização de “bandas” electroacústicas e em outros papéis que a Paula Azguime tem desempenhado ao longo de muitos anos e em parceria com Miguel Azguime), Isabel Soveral, Sara Carvalho, Patrícia Sucena Almeida, Ângela da Ponte, Ana Seara. Apesar de estarmos a viver um “segundo renascimento musical” não há muitas mulheres-compositoras quando comparadas com o número extraordinariamente elevado de homens-compositores. Para o confirmar, fui ao “Centro de Investigação e Informação da Música Portuguesa” (MIC) e na lista de compositores verifico que num total de cem por cento de compositores, 75% são do sexo masculino e apenas 25% são do sexo feminino (sensivelmente). Penso que esta percentagem não estará longe dos números da restante Europa. Salvaguardo a possibilidade de algumas das compositoras não estarem na base de dados.

O que acha da evolução da igualdade de género no campo da música no nosso país?

Em muitas áreas da música pode-se, hoje, falar de uma paridade absoluta de género. A menina que falava francês e tocava piano, hoje, fala inglês e toca piano, clarinete, tuba, fagote, violino, violoncelo, ou percussão, entre outros instrumentos. Vejam-se as escolas liceais e superiores artísticas de música ou as orquestras e as bandas filarmónicas, por exemplo. E quanto ao ensino, esta é uma área, como se reconhece, de tradição feminina, mesmo nos cargos de decisões ao mais alto nível, seja nos cargos ministeriais da educação, seja de gestão na própria escola. O mesmo não acontece em outras áreas artísticas da música onde, por vezes, penso se não seria preferível aprovar uma lei da paridade de género como foi feito, por exemplo, para a Assembleia da República ou para as administrações das empresas públicas e impor quotas aos compositores, aos maestros ou aos administradores, presidentes ou diretores artísticos? É só para sorrir claro, não será por aí o caminho. De facto estas são, por oposição, profissões e lugares tradicionalmente masculinos. A mudança nos costumes é demorada. Vejam-se, por exemplo, os cargos de diretores gerais ou artísticos e presidentes das maiores casas artísticas de música no país, maioritariamente do sexo masculino: Casa da Música (Paulo Sarmento e Cunha-Diretor Geral), CCB (Elísio Summavielle-Presidente), TNSC (Patrick Dickie-diretor artístico), Orquestra Sinfónica do Porto Casa da Música (Leopold Hager-Direção musical), Teatro Nacional D. Maria II (Tiago Rodrigues-Diretor Artístico), Fundação Calouste Gulbenkian (Risto Nieminen-Diretor do Serviço de Música), entre outros exemplos. Na verdade, a participação feminina nas coisas públicas é bastante recente no nosso país. Se pensarmos que só depois do 25 de Abril de 1974, o direito de voto se tornou universal em Portugal, sem quaisquer condicionalismos ou entraves ao voto feminino, isto apesar de a primeira mulher a votar, Carolina Beatriz Ângelo, uma mulher emancipada que foge à regra e que consegue eleger contra todas as probabilidades, acontecer em 1911, isto durante a primeira república! Há que dar tempo ao tempo.

Quais os compositores que ouve mais no dia a dia?

Os clássicos, nas aulas, desde canto gregoriano, passando pelos primeiros polifonistas como Pérotin, até à grande polifonia de Orlando di Lassus, Giovanni da Palestrina, Adrian Willaert, ou outros, sucedendo-se os compositores da tonalidade como, por exemplo, Johann Sebastian Bach, Franz Schubert, Robert Schumann, Frédéric Chopin, Gustav Mahler, Franz Liszt, Richard Wagner, até aos compositores que iniciam a modernidade como Claude Debussy, Maurice Ravel ou Alexander Scriabin e os seguintes como Igor Stravinsky, Arnold Schoenberg, Anton Webern, Maurice Ohana, Olivier Messiaen, Iannis Xenakis, etc.

Por exemplo, fiz ouvir, numa das aulas de fim de ano letivo, numa das turmas de terceiro ano de Análise e Composição, a 4ª sinfonia de Charles Ives, uma das obras mais excepcionais do início do século XX, audição acompanhada de partitura, que deixou os alunos estonteantes com o “caos harmónico”, no dizer de Ligeti, sobretudo dos segundo e quarto andamentos.

Em casa, agora mesmo, ouvi “Coral para L.G. (Lopes Graça)” e “It only takes two minutes to…”, ambas de Cândido Lima, para quarteto de cordas e piano, a primeira, e para saxofone e electrónica, a segunda, gravações ao vivo nos “Reencontros de Música Contemporânea” (RMC), 2017, em Aveiro. Mas também ouvi “Kraanerg”, de Iannis Xenakis. Outros exemplos das últimas escutas em casa são, por exemplo, “Le Tic Toc Choc”, de Couperin, por Sokolov, ou “Oiseaux tristes”, de Ravel, para piano, das peças “Miroirs”. Ainda ontem vi, por acaso, na RTP2, a série “This is Opera”, com Ramón Gerner, um grande comunicador, e embora seja este um programa de grande público apresenta sempre intérpretes de excelência. A série tratava da magnífica ópera “Pélleas et Melisande”, de Claude Debussy, e isso trouxe-me à memória um verão em que ouvi pela primeira vez esta genial obra do compositor e que fiquei electrizada, estupefacta, hipnotizada, alienada seguindo a audição com o libreto do simbolista Maurice Maeterlinck.

Nos concertos, ao vivo, a lista é infindável, sobretudo dos contemporâneos. Há meses, fui a uma sessão com um compositor para mim desconhecido (e desconhecido para a maioria em Portugal, infelizmente), isto no Gato Vadio, Armando Santiago, compositor português, a viver no Canadá, uma verdadeira surpresa pela qualidade musical de exceção. Ouvi uma obra para coro, de que não me recordo o título, excepcionalmente bem escrita e outra para orquestra, “Grupos”, penso que era este o título, com timbres e combinações inusitadas e únicas, de uma orquestração genial, mesmo. E ainda no campo das memórias não esqueço audições ao vivo de obras como “A Sagração da primavera”, de Igor Stravinsky, no Coliseu, em Lisboa, dirigida por Pierre Boulez, há uns anos largos, ou o “Prometeo”, de Luigi Nono, também no Coliseu de Lisboa, e há bastantes anos também, aliás a minha primeira escuta de uma obra contemporânea ao vivo, e que me atingiu a alma, ou ainda “Jonchaies”, de Iannis Xenakis, para orquestra, uma obra fenomenal. Obras marcantes do século XX e escutas inesquecíveis. Ainda em concertos, ao vivo, não quero deixar de mencionar duas compositoras (e já que respondi anteriormente a questões sobre o género na composição musical) Elena Firsova e Rebecca Sounders, compositoras que tive a oportunidade de ouvir, ao vivo, na Casa da Música, de nacionalidades russa e inglesa, respectivamente, e que me ficaram retidas na memória como compositoras e músicos dotadas de sensibilidades e qualidades musicais únicas e de excelência.

Sou frequentadora assídua da Casa da Música, seja da orquestra ou do “Remix” e tenho ouvido imensos compositores e imensas obras ao vivo, contemporâneos e não-contemporâneos (embora pese mais a balança para os compositores dos séculos XX e XXI) como, por exemplo, não vai há muito tempo ouvi Beethoven, concerto para violino em Ré maior, pelo grande violinista Frank Zimmermann. Exemplos de compositores que ouvi mais recentemente são, a série de compositores ingleses da atualidade como, Peter Maxwell Davis, Harrison Birtwistle, James Dillon, mas também compositores portugueses como, Luís de Freitas Branco, Fernando Lopes-Graça, Fernando Lapa, João Pedro Oliveira, Cândido Lima, Jorge Peixinho, Luís Tinoco, Isabel Soveral, ou os compositores alemães como o fantástico e genial Helmut Lachemmann, ou Schoenberg, Webern e Berg (os clássicos do século XX), ou compositores russos, como não esqueço, os “Prokofievs”, avô e neto, geniais (não sei se mais um que o outro…o tempo dirá), Sergei e Gabriel, ou ainda Peter Eötvös, compositor húngaro, e a obra belíssima e inesquecível, para mim, “Atlantis”. A lista de autores musicais e obras é infindável mas acho que dá a ideia do que vou elegendo para ouvir no meu “dia-a-dia”.

Em três adjetivos, como se caracteriza a si mesma?

Pacífica
Moderada
Delicada
Livre
(Desculpe que foram quatro adjetivos).

Quer partilhar algum dos seus sonhos?

Ser feliz!

Ângela Lopes

Porto, 15 de agosto de 2017

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