Armandinho, guitarra, fado, Lisboa

Armandinho

Guitarra . Composição

Guitarrista e compositor, Armando Augusto Salgado Freire, ou Armando Freire, mais conhecido por Armandinho, nasceu em Lisboa, no Pátio do Quintalinho, perto da Rua das Escolas Gerais, em Alfama, a 11 de outubro de 1891 e faleceu em Lisboa a 21 de dezembro de 1946.

Com o pai aprendeu a tocar bandolim mas, aos dez anos, começou a interessar-se pela guitarra portuguesa e quatro anos depois, em 1905 fez a sua primeira actuação em público, no Teatro das Trinas, iniciando desta forma a sua carreira como instrumentista, profissão em que ficaria conhecido pelo nome de Armandinho.

A sua carreira foi impulsionada quando, em 1914, conheceu o mais famoso guitarrista da época – Luís Carlos da Silva, conhecido por Luís Petrolino, e se tornou seu discípulo. Ainda assim, manteria diversas profissões seja como meio-oficial de sapateiro, moço de bordo, operário da Companhia Nacional de Fósforos, servente do Casão Militar ou fiscal do Mercado da Ribeira.

Armandinho apresentou-se pela primeira vez em público em 1905, com apenas 14 anos, no velho Teatro das Trinas, na Madragoa. Mas a sua estreia como guitarrista profissional tem lugar no Olímpia Club, situado na Rua dos Condes, acompanhado à viola por João da Mata Gonçalves.

Em 1925 acompanhou cantadores e cantadeiras no Solar da Alegria, local de culto dos amantes do Fado que, amiúde, ali se deslocavam para se deliciarem com as “improvisações” de Armandinho ou para ouvi-lo interpretar as composições do seu Mestre, Luís Petrolino.

Em 1926 fez a primeira gravação em Portugal em microfone de bobine eléctrica móvel. Gravou seis composições, acompanhado na viola por Georgino de Sousa, para a His Master’s Voice, que em Portugal era financiada e vendida pela Valentim de Carvalho.

Dois anos depois, em 1928, também acompanhado por Georgino de Sousa, Armandinho gravou em duas sessões no Teatro S. Luís, um conjunto de fados, variações em tons diferentes uma marcha, mais uma vez editados no formato de 78 rpm. Estas faixas serão reeditadas em CD pela editora Heritage, em 1994.

Armandinho foi dos primeiros a realizar digressões artísticas fora do continente português. Em 1922 anunciou a sua ida a Espanha e a Inglaterra com João da Mata Gonçalves (cf. “Guitarra de Portugal”, 4 de novembro de 1922). Entre 1932 e 1933 deslocou-se em digressão pelas Ilhas portuguesas, por Angola e Moçambique, acompanhado pelo mesmo violista e por Martinho d’Assunção, Ercília Costa, Berta Cardoso e Madalena de Melo.

Sobre as suas digressões, relata o próprio em 1936, na publicação “Azes do Fado”:

“Constituímos um pequeno grupo, que foi muito bem acolhido: Ercília Costa, João da Mata, Martinho de Assunção e eu. Mais tarde, animados pelo êxito deste primeiro voo, organizámos uma «tournée» à África (…). Percorremos as Costas Ocidental e Oriental. (…). A terceira «tournée» em que entrei, porventura a mais importante, já pelo número de artistas, já pelo reportório, foi ao Brasil, Argentina e Uruguai. Era a Embaixada do Fado, embaixada luzidia em que figuravam, além da minha humilde pessoa, Maria do Carmo, Maria do Carmo Torres, Lina Duval, Branca Saldanha, José dos Santos Moreira, Alberto Reis, Felipe Pinto, Joaquim Pimentel e Eugénio Salvador.”

Nesta última digressão Lina Duval e Eugénio Salvador apresentavam coreografias.

Músico autodidacta, tocava de ouvido e, para além de um excelente executante, era também autor de grandes melodias. Autor de muitos fados e variações que sobrevivem até aos dias de hoje criou temas que se tornaram “clássicos”, casos de “Fado Armandinho”, “Fado de S. Miguel”, “Fado do Cívico”, “Fado do Bacalhau”, “Fado Mayer”, “Fado do Ciúme”, “Fado Estoril”, “Variações em Ré Menor”, “Variações em Ré Maior”, “Ciganita”, “Fado Fontalva”, “Fado Conde da Anadia”, entre muitos outros.

O guitarrista afirma que a sua primeira composição foi o “Fado Armandinho” e, para o teatro, foi o “Fado do Cívico”, cantada por Estêvão Amarante na revista “Torre de Babel”, levada à cena no Teatro Apolo em 1917. Depois, também para teatro, compôs o “Fado do Bacalhau”, interpretado por José Bacalhau a que se seguiram numerosas colaborações.

São inúmeras as vozes fadistas que acompanhou quer em actuações em espectáculos e casas de fado quer em gravações discográficas, a título de exemplo salientamos: Alberto Costa, Maria Vitória, Ângela Pinto, Adelina Ramos, Berta Cardoso, Madalena de Melo ou Ercília Costa, entre muitos outros.

Armandinho atuou nas mais emblemáticas casa de fado de Lisboa, e, em 1930, tornou-se empresário, quando abriu o seu próprio espaço no Parque Mayer, o Salão Artístico de Fados, onde atuou durante alguns anos, mas depressa tomou consciência de que teria de se repartir por digressões e espectáculos pelo que abandonou este projeto. Atuou, ainda, em inúmeras casas particulares, especialmente nas casas da fidalguia como, por exemplo, nas da Família Burnay, Fontalva e Castelo Melhor.

Para além de João da Mata, Georgino de Sousa ou Martinho d’Assunção, outros grandes violistas tocaram com ele, entre os quais se destacam Abel Negrão, Fernando Reis, Santos Moreira ou Pais da Silva.

As suas interpretações são suaves e subtis, incluem pianinhos que retirava da guitarra tocando com as suas próprias unhas e, para determinados efeitos tímbricos, recurso à surdina.

Armandinho revelou-se um marco na execução da guitarra portuguesa, criando “escola” onde se filiaram outros grandes nomes como José Marques Piscalareta, Carvalhinho, José Nunes, Jaime Santos, Raul Nery ou Fontes Rocha, entre outros.

O guitarrista exibia uma técnica adaptada aos fadistas que acompanhava, criando uma espécie de diálogo que evidenciava as particularidades interpretativas dos cantadores e que lhe permitia assumir uma posição de igualdade com os fadistas e não a subalternização dos guitarristas muito vulgarizada nas primeiras décadas do século XX. As suas interpretações tinham tal força que inspiraram ao poeta Silva Tavares as seguintes quadras:

“A guitarra – alma da raça,
Amante do meu carinho,
Tem mais perfume e desgraça
Nas mãos do nosso Armandinho.

Benditos os dedos seus
Que arrancam assim gemidos
Tal como se a voz de Deus
Falasse aos nossos ouvidos.”

Armandinho faleceu a 21 de dezembro de 1946 na sua casa situada na Travessa das Flores, em Lisboa, deixando o Fado de luto como escreveu na sua capa o jornal “Guitarra de Portugal” de 1 de Janeiro de 1947. Deixou viúva e um filho, também guitarrista: Armindo Freire.

Foi um dos membros fundadores da Sociedade de Escritores e Compositores Teatrais Portugueses em 1927. Desta forma assumiu-se como responsável pela recolha de muitas melodias de Fado e pelo registo dos seus autores naquela sociedade, facto que nos permite o conhecimento actual de muitas destas melodias.

Museu do Fado

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